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Jesus disse que era preciso amar o inimigo, mas nunca sugeriu que tínhamos de viver ou casar com ele. Inteligência espiritual ou emocional, dá no mesmo: ele tinha razão. Amar de forma saudável não implica que devamos justificar ao outro cada um de nossos comportamentos, dar provas de seriedade moral ou jurar que não somos parte de uma rede terrorista, como exige o amor desconfiado.

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STRATÉGIAS DE SOBREVIVÊNCIA AFETIVA

Para se relacionar com o estilo paranoide, a maioria das pessoas recorre a duas formas básicas de enfrentamento: submeter-se de forma resignada ao interrogatório do outro sem retrucar ou se rebelar da audiência acusatória. Vamos a cada uma delas e às consequências.

Acatar a vigilância paranoide e dar “explicações” cada vez que sejam requeridas

Uma paciente casada com um homem extremamente desconfiado resumia assim a sua tática de sobrevivência: “Eu sei que deveria ser mais forte, mas a única maneira de ‘levar a vida’ é dar tranquilidade a ele e fazer com que veja que sou uma pessoa confiável”. Eles estavam há mais de vinte anos juntos e ela devia dar provas para demonstrar o bom comportamento. As pessoas que utilizam essa estratégia mantêm a ilusão de controle da situação; no entanto, o que tal união faz é reforçar a desconfiança do paranoide e que o outro perca a cada dia mais autonomia.

Vejamos alguns comportamentos que definam essa atitude:

Evitar tomar iniciativas para não alimentar suspeitas.

Evitar as críticas ou qualquer tipo de questionamento entre o casal, mesmo que sejam mínimos e justificados. O paranoico verá ali a origem de uma conspiração contra a sua integridade pessoal e reagirá com hostilidade e receio.

Evitar brigas ou discussões, já que qualquer alegação ficará gravada a fogo na memória dele e ele a usará sempre como “prova” em causa própria. É preciso ser muito claro e específico em cada coisa que seja dita e feita para evitar mal-entendidos.

Para evitar os ciúmes, é melhor ter apenas um ou dois amigos ou amigas (aceitos pelo paranoico), sair pouco, prestar contas com frequência e limitar a liberdade.

Manifestar contínuas mostras de respeito e lealdade. Oferecer a ele todas as informações solicitadas.

Aprender a lidar com as crises de ansiedade, que serão muitas e intensas. Não tomar a iniciativa em questões sexuais porque isso causará dúvidas nele.

Você é capaz de viver sob a vigilância e observação de seu parceiro como se você fosse uma pessoa potencialmente desleal ou traiçoeira? Nem o casamento é uma prisão domiciliar santificado pelo amor, nem o namoro é um exame de idoneidade moral.

Não acatar nenhuma exigência irracional e se declarar em desobediência

Se você se negar a entrar no jogo destrutivo do amor desconfiado, será confirmado como o inimigo principal do seu parceiro. Não se acomodar às exigências será visto por ele como um ato imperdoável de alta traição, e, se antes ele duvidava de você, confirmará amplamente as suspeitas. Assim, colocar um paranoide em seu devido lugar não é uma tarefa fácil porque a ansiedade dele será diretamente proporcional ao seu grau de liberdade.

Alguns dos comportamentos que definem essa atitude são:

Se não existe confiança, não há relação sadia. Com ou sem ajuda, o paranoico deve aceitar correr os riscos naturais de qualquer relação.

Isso implica que a relação deve ser recíproca e equilibrada no que diz respeito à liberdade de cada um.

O rancor não é aceitável em nenhuma das suas modalidades. Se há ressentimentos incrustados, o amor irá se extinguir.

Exigir o direito à informação sobre os bens econômicos compartilhados, que são geralmente escondidas pelo sujeito paranoico devido ao medo de ser vítima de um “golpe matrimonial”.

Deixar claro que qualquer tentativa de agressão ou de perseguição indevida terá resposta e será denunciada às autoridades.

Eliminar o mau hábito de justificar tudo e dar explicações incômodas e ofensivas sobre a própria conduta.

Não ser cúmplice em comportamentos ou atitudes paranoicas a respeito de outras pessoas inocentes.

Apontar os erros e os desvios quando ocorrerem.

Colocar como condição que o parceiro faça consultas psiquiátricas ou psicológicas.

Muitos apaixonados paranoicos não suportam a liberdade do companheiro e preferem cortar a relação por “segurança pessoal” (o que poderia ser considerado um bom final). Mas outros farão uso do direito à legítima defesa e poderão fazer represálias violentas e/ou assediadoras, o que não assegura um desenlace maduro e pacífico como deveria ser. Você poderia tentar um diálogo construtivo e mostrar que, se ele não mudar a maneira de ser, a relação acabará, mas será como arar no deserto, porque a sua decisão de “poder chegar a prescindir dele” será avaliada como uma afronta moral ou como prova irrefutável de que há uma terceira pessoa.

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ONDE NEGOCIAR

?

Como disse no começo, a premissa de uma pessoa paranoico-vigilante é demolidora porque, faça o que fizer, tudo será usado contra você, e, ainda que não seja um infiel em série ou uma “golpista compulsiva”, implícita ou explicitamente, tratarão você como tal. Essa atitude não deixa muito espaço para a negociação. Como sustentar uma boa relação com quem o considera desleal e coloca em dúvida a sua solvência ético-moral a todo instante?

As pessoas que estiveram afetivamente sozinhas por muito tempo e depois encontraram alguém que valesse a pena sabem que uma das maiores satisfações é sentir que

agora são dois para passar pela vida. A reconfortante e bela

ideia do companheiro ou companheira não parece existir no sujeito paranoico. Sua visão em espiral não lhe permite processar o amor e a amizade que o companheiro oferece. Não há comparsas, somente atacantes em potencial.

Devo reconhecer que alguns sujeitos paranoicos conseguem mudanças com ajuda profissional. No entanto, as melhoras não costumam se estender à vida afetiva, porque a desconfiança básica como estilo de vida é muito difícil de ser erradicada. Se não há confiança, fica impossível ter uma boa relação. Não importa como a apresentemos: a desconfiança injusta e não fundamentada sempre afeta o acusado; algo se quebra quando a pessoa que diz amá-lo põe em dúvida a sua honestidade. O que negociar, então? Depende de cada um: de quanto amor sente, de seus princípios e valores, de como concebe a relação e, sobretudo, quanto peso você dá para a “confiança interpessoal”. Você decide.

Como reconhecer uma pessoa paranoide antes