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O projeto arquitetônico, de acordo com Goldschmidt (1983), se baseia no processo contínuo e interativo de se autocorrigir, por meio de tentativa e erro, a fim de suprir necessidades e solucionar conflitos ou problemas de desenho que venham a surgir. Inicialmente, as informações necessárias para a elaboração de um projeto são coletadas de modo rudimentar, cabendo ao arquiteto projetista selecioná-las, categorizá-las e analisá-las de acordo com o que se planeja e o que for relevante para a realização do conceito proposto. Além disso, um processo de desenvolvimento de um projeto formal é altamente dinâmico, decisões se manifestam e se movem para todas as direções, por isso cada escolha deve ser claramente solucionada, a fim de que se produza um projeto com intensões claras. Esses fatores obrigam a produção de muitos artefatos para a concepção e o desenvolvimento do projeto. Nesse sentido, os recursos de modelagem e de fabricação digital ampliam a possibilidade de atuação do arquiteto.

Nos últimos anos a proliferação desses métodos de modelagem (MG e MP) e de fabricação digital tornou possível ao arquiteto conceber e investigar espaços por meio de recursos de visualização em 3D e por modelos físicos de um modo mais intenso. O advento dessas tecnologias, no âmbito da arquitetura, permite a criação de novas formas e de espaços mais complexos, que demandariam muita habilidade, paciência e destreza para serem concebidos e fabricados pelos métodos tradicionais (manuais). Como bem afirmou Antoine Picon, “a digitalização permite de fato

que o arquiteto manipule formas extremamente complexas e visualize de modo mais livre as modificações feitas no projeto” (PICON, 2004, p. 209).

Como o projeto de arquitetura normalmente passa por um processo de refinamento que é alcançado por meio de um procedimento sequencial de transformações e particularizações do projeto, há constantes necessidades de operar com várias formas de representação e de visualização das ideias. Nesse sentido, a modelagem paramétrica é um recurso de grande importância para operar constantes transformações ocorridas durante o processo de projeto.

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Além disso, de acordo com Goldschmidt (1983), algumas das diretrizes para a construção de um novo projeto se baseiam no teste de soluções já propostas que obtiveram sucesso em sua aplicação, no emprego de softwares novos e na procura de novas estruturas tipológicas. É possível ainda incorporar uma solução predefinida em um novo projeto. A criação de novas concepções tipológicas demanda um esforço a mais do intelecto do arquiteto, que é capaz de propor sua visão sobre a melhor solução de determinada necessidade. Nesse sentido a modelagem paramétrica permite reutilizar conhecimentos armazenados em algoritmos, de modo a avançar mais rapidamente em soluções de projeto.

Por outro lado, a fabricação de protótipos físicos auxilia no desenvolvimento de uma série de modelos tangíveis que facilitam a compreensão da forma. O manuseio de um modelo físico propõe um melhor entendimento da tectônica e das diferentes relações espaciais, ajudando o arquiteto a concretizar seu pensamento e chegar a uma solução projetual (SASS; OXMAN, 2006). Consequentemente a modelagem 3D e a fabricação de modelos físicos enriquecem o processo de projeto, tornando a prospecção dos espaços mais intensa.

Como foi possível apontar anteriormente, cada processo de FD apresenta qualidades e limitações. Cada processo de criação de modelos físicos auxilia no processo de entendimento da geometria e construtibilidade da forma. Diferentes métodos de fabricação – aditivos, subtrativos e fabricação 2D – devem ser cautelosamente empregados de acordo com as necessidades específicas de projeto. Assim, a busca pelo processo de FD mais adequado a cada situação de projeto deve ser decorrente de uma análise criteriosa das proporções e peculiaridades da peça a ser fabricada.

A fabricação de modelos físicos proporciona melhor avaliação e representação do projeto proposto durante a etapa de concepção (ANDRADE; RUSCHEL; MOREIRA, 2011; LAWSON, 2011). A avaliação é a fase onde os critérios de articulação espacial serão analisados, desde os físicos, como desempenho e estética até os abstratos, como a percepção espacial que usuários e transeuntes terão do objeto proposto. A representação é a articulação entre diferentes etapas do processo de projeto. Se aplica no caso da prototipagem como um método de percepção visual

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muito eficiente, ao ponto que resulta em uma forma concreta.

A sequência de decisões, que compreende a análise, a síntese e a avaliação, é contínua e articulada. (...) Deficiências no projeto detectadas na avaliação podem levar à revisão da síntese, com melhorias, ajustes ou mudanças nas soluções, e resultar em redefinições de metas, restrições e requisitos de projeto na análise. O sucesso da articulação da sequencias de decisões depende da qualidade da comunicação entre essas fases (ANDRADE; RUSCHEL; MOREIRA, 2001. p. 91).

Projetar é um ato dinâmico, uma interação entre fazer, ver, refazer e descobrir. Nesse âmbito, procedimentos de representação computacional têm como papel auxiliar o arquiteto na busca da geometria que melhor se adeque ao terreno, ao partido e ao programa proposto. A utilização de diferentes métodos de representação estimula o processo de reinterpretação da forma.

O grande poder das novas tecnologias computacionais é a capacidade de calcular rapidamente formulas matemáticas complexas, viabilizando geometrias igualmente complexas. Ambientes paramétricos possibilitam ao arquiteto programar relações entre diferentes componentes do projeto, alterando as variáveis do objeto (parâmetros) (FLORIO, 2011).

A simulação por parâmetros, desenvolvida na modelagem paramétrica, possibilita calcular rapidamente diferentes relações espaciais para o mesmo objeto. Por meio de cálculos paramétricos é possível criar novas famílias de formas e geometrias que possuem uma relação topológica. A criação e o estudo da forma conferem ao arquiteto a habilidade de construir algoritmos que têm um conjunto de regras entre diferentes componentes, permitindo traçar e desenvolver uma série de relações entre pontos, curvas e segmentos de retas. É possível recombinar geometrias, controlar versões de uma forma (versioning) (SHELDEN; WITT, 2011), permitir influências externas em uma geometria sem perder o controle ou a precisão (SHARPLES HOLDEN PASQUARELLI, 2002).

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O desenvolvimento de softwares e plug-in de modelagem paramétrica, como o Grasshopper, possibilitou traduzir algoritmos complexos em ícones visuais, permitindo uma aproximação dos que não dominam linguagem de programação à criação de algoritmos. O trabalho que utiliza um software de modelagem com tecnologia NURBS, em paralelo com um de modelagem paramétrica, resulta em um processo altamente dinâmico, onde uma simples alteração dos parâmetros no algoritmo resulta na visualização geométrica no software de modelagem, ensejando o surgimento de uma família de resultados.

A palavra chave para o uso de processos digitais em projeto de arquitetura é “experimentação”. A FD tem como vantagem a produção de uma variedade de modelos e protótipos de alta precisão. Com a MP, é possível experimentar diferentes opções e ideias, experimentar diferentes possibilidades formais.

Lawrence Sass (2000) vê o uso da MP e da FD como métodos investigativos. A análise dos projetos de Andrea Palladio, realizada por Sass (2000), demonstra como esses recursos ampliam a possibilidade de investigação de projetos. Com a FD foi possível representar detalhes construtivos que demandariam muita destreza, caso fossem feitos a mão.

Muitas vezes a representação tradicional em duas dimensões (planta, corte e fachada) não é suficiente para entender um espaço composto por geometrias não ortogonais ou espaços curvilíneos. O dinamismo espacial na obra de Niemeyer é um bom exemplo disso. Como será visto nos capítulos 3 e 4, a articulação de diversas formas curvas, constituídas por uma sucessão de arcos de circunferências, pela fusão entre elementos, pelas grandes cascas de concreto, gera uma amálgama de elementos construtivos de grande plasticidade. Esse fato faz com que os espaços internos variem, dificultando sua interpretação por desenhos ortográficos. Assim, nesta pesquisa, os recursos de MG, MP e FD ampliaram a capacidade de interpretação das formas e espaços concebidos por Oscar Niemeyer.

A ambiguidade do projeto de arquitetura se reflete na representação arquitetônica. Até as técnicas mais convincentes de representação não correspondem totalmente à experiência da realidade construída. Jamais vemos uma construção em planta baixa ou elevação, para não falar dos cortes ou da perspectiva axonométricas modernista, que pressupõe um observador localizado numa posição impossível (PICON, 2004, p. 208).

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Picon (2004) sugere que a ambiguidade na representação se contrapõe à percepção natural dos espaços físicos. De fato, a visualização proporcionada pela perspectiva facilita o entendimento do dinamismo espacial. Contudo, a natureza da proposta arquitetônica requer o conhecimento do espaço em três dimensões. Mesmo a perspectiva é bidimensional. Como bem afirmou Bruno Zevi (1996), o melhor jeito de se entender a arquitetura é percorrer os seus espaços, de modo a presenciar as peculiaridades da forma.

A quarta dimensão em arquitetura segundo Zevi (1996) é “o deslocamento sucessivo do ângulo visual”. É o percorrer o espaço interno e externo, é observar a obra sobre diferentes pontos de vista. Devido à escala das construções, a percepção espacial do conjunto de uma obra arquitetônica é muito mais difícil do que a de uma escultura. A criação de modelos físicos proporciona um maior entendimento do espaço, dando ao observador a possibilidade de rotacionar um objeto arquitetônico.

Na últimas décadas as ferramentas digitais ampliaram o desenvolvimento do processo de projeto e da representação do edifício em diferentes escalas (POTTMAN et. al 2007). A criação de modelos físicos com o auxílio de softwares de MG e MP, assim como por técnicas de FD, proporciona um maior entendimento do espaço, possibilitando análises talvez impossíveis de serem realizadas apenas com a observação do edifício construído. É possível com o modelo digital verificar mais atentamente as propriedades relacionadas à geometria, à variação do espaço interno tridimensional. Modelos físicos auxiliam no entendimento da tectônica da forma, isto é, da relação entre a estrutura e a forma arquitetônica (OXMAN; OXMAN, 2014), além de auxiliar na percepção do espaço arquitetônico (SASS; OXMAN, 2006). A visualização e a simulação por meios computacionais contribuem de modo decisivo na investigação de aspectos geométricos como observado em Goldschmidt (1983), Oxman (2006) e Andrade; Ruschel; Moreira (2011). Além disso, a fabricação digital de modelos físicos possibilita a exploração tátil de potenciais resultados, observado em Sass (2000; 2006), Volpato (2006) e Pupo (2009). Demonstra-se que protótipos rápidos ampliam a capacidade de percepção

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espacial da forma desenvolvida no computador e permitem a criação de geometrias complexas sem intervenção humana (PUPO, 2009; FLORIO, 2011; VEIGA; FLORIO, 2015).

A experimentação auxiliada por recursos digitais tem forte ligação no estudo sistemático de formas ao empregar processos de modelagem computadorizada e prototipagem. Como será visto nos capítulos seguintes, a análise digital, amparada pelos recursos de MG, MP e FD, é um eficiente método para adquirir conhecimento e ao mesmo tempo um método didático para ensinar os conceitos e processos criativos da forma, por meio de modelagem computacional.