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Capítulo 2. Capitalismo neoliberal e trotskismo no Brasil

4. O trotskismo brasileiro

O trotskismo no Brasil aproxima-se do quadro histórico do trotskismo internacional: é representado por inúmeras organizações que se reivindicam “trotskistas”. Todas essas organizações mereceriam um estudo próprio, assim como um estudo de suas relações com as correntes trotskistas internacionais. Contudo, não é esse o objetivo deste trabalho.

Nossa pesquisa não almeja fazer um balanço histórico das correntes trotskistas, pelo contrário, consiste na análise das posições políticas das correntes trotskistas na década de 1990 e início dos anos 2000.65 Ater-nos-emos apenas à análise das principais correntes trotskistas, ao nosso ver: Democracia Socialista, Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado e a corrente petista O Trabalho.

Os critérios adotados para ampliar ou restringir o leque de correntes a serem levadas em conta foram dois: o peso que as correntes apresentam na cena política brasileira da década de 1990 e a importância que tiveram nos últimos 25 anos, correspondentes à formação do Partido dos Trabalhadores, à criação da

65 Contudo, não devemos esquecer que o trotskismo brasileiro não é um movimento político

característico da etapa atual. Desde o início do século XX, já se podia encontrar defensores dessa tradição teórico-política no país. Mais especificamente, o trotskismo brasileiro surgiu, no final da década de 1930, a partir de movimentos internos ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) de oposição às posições adotadas por sua direção. Há que se destacar o importante papel que teve o brasileiro Mário Pedrosa na divulgação inicial das idéias trotskistas, nesses primeiros anos, e na criação da primeira organização trotskista brasileira (conhecida por Grupo Comunista Lenin). Cf. José Castilho Marques Neto, Solidão revolucionária: Mário Pedrosa e as origens do trotskismo no Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1993.

Central Única dos Trabalhadores e à luta pelo fim da ditadura militar e pela volta do processo democrático no país.

Considerando as correntes trotskistas estudadas, podemos dizer que a corrente trotskista (ou pelo menos que se reivindica do trotskismo) Democracia Socialista – que permanece como corrente interna do Partido dos Trabalhadores – está numa posição menos marginal no cenário político brasileiro. Essa corrente adquiriu um destaque relativo no cenário político nacional, na década de 1990, através da conquista de prefeituras, principalmente a da capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, que permitiu a ascensão do Partido dos Trabalhadores ao governo do Estado. Também obteve significativos avanços na luta interna pela hegemonia e, mais tarde, até pela direção no interior do partido.

O PSTU, por sua vez, surge do rompimento da corrente Convergência Socialista com o Partido dos Trabalhadores. Levando-se em conta o número de filiados, pode-se dizer que ele é o maior partido trotskista brasileiro da década de 1990. A partir de 1994, ano de sua fundação, o PSTU aparece no cenário político nacional como o principal partido trotskista, marcado por uma forte oposição ao modelo neoliberal, como também às reformulações do PT – que davam um caráter eleitoreiro ao partido e abandonavam suas declarações iniciais a favor da reforma social.

Tanto a Convergência Socialista como a Democracia Socialista tiveram um papel importante na criação e na história do Partido dos Trabalhadores. Outra corrente trotskista, presente nessa luta, foi a corrente O Trabalho, antiga

Organização Socialista Internacionalista. Decidimos, então, considerar esta última em nossa pesquisa, pois apesar de ter hoje um menor peso na cena política brasileira e no PT, teve, anos atrás, uma importância relativa na composição do partido e na luta de idéias na sociedade brasileira (sobretudo no movimento estudantil, onde atuou com o nome de Liberdade e Luta - Libelu). Essa corrente aparece, dentro do PT nos dias atuais, como um contraste à corrente Democracia Socialista, pois, ao contrário desta, não ascendeu na luta pela hegemonia no partido, nem na sociedade brasileira, ficando no isolamento.

O surgimento e o fortalecimento das três correntes trotskistas têm algumas características em comum. Todas as três correntes foram fortalecidas, algumas precedidas, pela constituição de um veículo de informação impresso e periódico. Assim, o jornal Em Tempo, organizaria as bases que iriam formar a corrente Democracia Socialista; o jornal Convergência Socialista daria a unidade à corrente formada a partir do Movimento Convergência Socialista; e o jornal O Trabalho fortaleceria e engrossaria as fileiras da já existente Organização Socialista Internacionalista (que depois viria assumir o nome do próprio jornal). É importante situar esse período, pois todos os periódicos surgiram no final da década de 1970, época caracterizada pela crise do regime militar, pelo ascenso do movimento operário e pela articulação dos movimentos civis a favor da democracia. Assim, nasceriam: o jornal Em Tempo, em dezembro de 1977; o jornal O Trabalho, em maio de 1978; e o jornal Convergência Socialista, em março de 1979.

O surgimento da Democracia Socialista esteve diretamente relacionado com a publicação do jornal Em Tempo. Este, em sua fase inicial, contou com a

participação de membros do Movimento Revolucionário 8 de Outubro, conhecido por MR-8, e de membros da Ação Popular que optaram por sair posteriormente, no início de 1979, insatisfeitos com o apoio dado pelo jornal ao nascente Partido dos Trabalhadores. Outras duas correntes, ambas de inspiração trotskista, participavam do projeto do jornal. Uma delas era formada por militantes mineiros, oriundos do movimento estudantil da Universidade Federal de Minas Gerais, da Universidade Católica e de Juiz de Fora, além de militantes na oposição metalúrgica de Belo Horizonte. Esta corrente era denominada pela sigla O. (de Organização).66 A outra corrente, conhecida como Nova Proposta, foi formada a partir de estudantes do Rio Grande do Sul, em 1974. Em 1978, os militantes de Nova Proposta decidiram organizar-se como corrente interna do MDB (chamada de Tendência Socialista).67 Assim, em um congresso, organizado em dezembro de 1979, nasceria a corrente Democracia Socialista.68

Os militantes que organizaram o jornal Convergência Socialista vinham do Movimento Convergência Socialista que, por sua vez, foi lançado em 1978, por militantes do Partido Socialista dos Trabalhadores. Este último tinha sido criado em julho de 1977, a partir da Liga Operária, organização de exilados brasileiros no Chile que tiveram a influência de Mário Pedrosa e se uniram à Fração Leninista

66 Dentre os militantes que se organizavam na O. havia ex-militantes da Ação Popular (como

Aluísio Marques), da Colina e da Juventude Universitária Católica (como João Machado). Cf. Murilo Leal Pereira Neto e Dainis Karepovs, “Os trotskismos no Brasil (1966-2000)”. Em Marcelo Ridenti e Daniel A. Reis (org.), História do Marxismo no Brasil – Volume VI. Campinas, Editora da Unicamp, no prelo.

67 Essa corrente teria contatos estreitos com o Secretariado Unificado da Quarta Internacional. Seu

principal dirigente seria Raul Anglada Pont. Cf. Idem, Ibidem.

Trotskista (fração interna do Secretariado Unificado da Quarta Internacional) e ao argentino Nahuel Moreno.69

O fortalecimento e a união da corrente Convergência Socialista também estiveram diretamente relacionados com o sucesso do jornal. A partir do segundo semestre de 1977, o recém-nascido Partido Socialista dos Trabalhadores passou a praticar um peculiar “entrismo” em um jornal alternativo chamado Versus.70 A partir de março de 1978, Versus já estaria sob o controle dos trotskistas, que se tornaram maioria em seu Conselho de Redação. Esse foi o embrião do jornal Convergência Socialista, publicado a partir de julho de 1979 e que surgiu a partir da extinção do jornal Versus, resultado do rompimento da frente editorial que o publicava. Por essas razões, Versus foi fundamental no apoio do lançamento da Convergência Socialista, ocorrido no dia 28 de janeiro de 1978.71

Vejamos por último o caso da corrente O Trabalho. A Organização Socialista Internacionalista decorreu da fusão de dois grupos: a Organização Marxista Brasileira e o Grupo Comunista 1º de Maio. O primeiro, fundado em 1975, era composto por militantes da Fração Bolchevique-Trotskista,72 do Grupo

69 Segundo Pereira Neto e Karepovs, os exilados Maria José Lourenço, Waldo Mermelstein e Jorge

Pinheiro migraram para a Argentina após o golpe de Pinochet no Chile, aonde entraram em contato com o grupo de Nahuel Moreno. Posteriormente, viriam ao Brasil para organizar a Liga Operária. O atual dirigente do PSTU, e primeiro candidato de um partido trotskista à presidência do Brasil, José Maria de Ameida, foi fruto do trabalho da Liga Operária em Santo André, em 1976. Cf.

ibidem.

70 Versus caracterizar-se-ia por defender um “latino-americanismo popular”. Cf. ibidem. 71 Cf. ibidem.

72 Uma ruptura com o Partido Operário Revolucionário posadista iniciada em abril de 1968 por Vito

Letízia e Vera Lúcia Stringhini, no Rio Grande do Sul. Cf. ibidem. É importante ressaltar, que o Partido Operário Revolucionário (conhecido pela sigla POR), foi a principal expressão do trotskismo brasileiro no período de 1952 a 1966. Foi criado a partir de uma delimitação da Quarta

Internacional (até então, Secretariado Internacional). A partir da criação de um Bureau Latino-

Americano da Quarta Internacional, o argentino J. Posadas ficou incumbido de reorganizar o trotskismo latino-americano. Assim, em meados de 1952, Guillermo Marcelo Almeyra veio ao

Outubro73 e da Organização pela Mobilização Operária.74 Já o Grupo Comunista 1º de Maio seria composto a partir de uma organização estudantil, criada em 1968, por ex-militantes do Partido Operário Revolucionário.75 A decisão da união dos

dois grupos teria surgido em uma reunião realizada em Paris, em dezembro de 1975, na reunião do Bureau Internacional do Comitê de Reorganização pela Reconstrução da Quarta Internacional.76

Durante o final da década de 1970, a Organização Socialista Internacionalista lograria agrupar ao seu redor uma grande parcela de estudantes. Sua corrente estudantil ficou conhecida como Liberdade e Luta (Libelu). Assim, a partir do trabalho de base no meio estudantil, a organização contaria com representações em vários estados brasileiros.77

Brasil, por delegação de Posadas, reconstruir o núcleo trotskista, que estava em uma profunda crise. Surgiria, então, o POR a partir da publicação do jornal Frente Operária, em 1952. Este, seria publicado de forma mais ou menos regular até o ano de 1990. Cf. Murilo Leal Pereira Neto, Outras

histórias: contribuição à história do trotskismo no Brasil – 1952/1966. O caso do POR (Partido

Operário Revolucionário). Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo FFLCH, 08/9/1997.

73 Fundado em 1970, em Paris. Cf. Murilo Leal Pereira Neto e Dainis Karepovs, op. cit.

74 Uma dissidência do Grupo Comunista 1º de Maio, animada por Paulo Skromov, presidente do

Sindicato dos Coureiros, e com base operária no Grande ABC. Cf. Ibidem.

75 Dentre os nomes que compunham o grupo, estavam Fábio Munhoz e Otaviano de Fiori. Cf.

ibidem.

76 O Comitê Internacional de Reorganização pela Reconstrução da Quarta Internacional foi

formado em 1972, a partir da aliança da Organisation Communiste Internacionaliste (OCI) francesa, cujo principal dirigente era Pierre Lambert, com a argentina Política Obreira (PO), dirigida por Jorge Altamira, e pelo boliviano Partido Obrero Revolucionário (POR), de Guillermo Lora. Cf.

ibidem.

77 Segundo Pereira Neto e Karepovs, as bases da Organização Socialista Internacionalista, no final

dos anos 1970, estavam situadas nos Estados do Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Brasília, Paraíba e Ceará. Com a reorganização da União Nacional dos Estudantes, em junho de 1979, a organização ampliar-se-ia para Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Pernambuco, Goiás, e interiores de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul. Cf. Ibidem.

O jornal O Trabalho, seria publicado a partir de 1º de Maio de 1978. Sua função seria a de ser o porta-voz da organização para agrupar politicamente militantes ao seu redor.78

Ao contrário de algumas organizações de esquerda que optavam pela luta armada, pela formação de guerrilhas contra o governo militar, a Democracia Socialista, a Convergência Socialista e a Organização Socialista Internacionalista levantavam bandeiras como a da formação de uma Assembléia Nacional Constituinte e a defesa da volta da democracia no Brasil.79 Assim, as tarefas

práticas, colocadas pelas correntes, giravam em torno da luta pela liberdade de imprensa e de opinião, através da sustentação de jornais socialistas; da campanha pela anistia e pela libertação dos presos políticos; do combate pela reconstrução de organismos como a União Nacional dos Estudantes, pela construção de um novo movimento sindical e pela liberdade de organização política, com o fim do bipartidarismo. Surgiriam, dessa forma, alguns problemas estratégicos aos trotskistas; diziam respeito à forma como iriam definir uma linha de intervenção que conciliasse a luta pelas questões das liberdades democráticas e pela derrubada da ditadura com as questões ligadas às transformações políticas e sociais rumo ao socialismo.80

Colocavam-se novas questões a todo movimento de esquerda que havia lutado pela derrubada da ditadura militar. No projeto de construção de um Partido Socialista brasileiro, as correntes trotskistas tinham de levar em conta toda a

78 Cf. ibidem.

79 Cf. entrevista com Carlos Bauer. Apud: Murilo Leal Pereira Neto e Dainis Karepovs, “Os

conjuntura. Havia a proposta do general Euler Bentes de Monteiro, representando o MDB, para as eleições de outubro de 1978, com vistas à abertura política através da Frente Nacional pela Redemocratização. Brizola também propunha uma saída, através da reconstrução do Partido Trabalhista Brasileiro. Almino Afonso lançara a proposta de formação de um Partido Socialista. E, por sua vez, os sindicalistas “autênticos” propunham a criação de um Partido dos Trabalhadores.

Com a aprovação da Lei de Anistia e da Lei Orgânica dos Partidos, que acabava com o bipartidarismo, ambas em 1979, o debate entre a esquerda democrática focalizou-se na questão de qual seria o partido a apoiar. Nesse contexto, a participação das correntes trotskistas foi importante. Como não tinham nenhum comprometimento com a estrutura do velho sindicalismo, todas elas afirmavam a necessidade de constituição de um partido independente, operário; rejeitando, assim, as saídas “frentistas”, representadas pelo MDB, e as do antigo trabalhismo, representado por Leonel Brizola. Iam na mesma linha que Lula e os “sindicalista autênticos”, rumo à constituição de um Partido dos Trabalhadores.81

80 Cf. Murilo Leal Pereira Neto e Dainis Karepovs, op. cit.

81 Vale ressaltar que desde a constituição do Movimento pela Convergência Socialista, em janeiro

de 1978, esta corrente já colocaria na ordem do dia a constituição de uma partido socialista. Num primeiro momento, a Democracia Socialista defenderia o apoio à Frende Nacional pela Redemocratização, nas “organizações massivas” para reforçá-la e questionar o regime militar, uma vez que alguns pontos do seu programa interessavam aos trabalhadores e às classes populares. Sua perspectiva era a de que a luta contra a ditadura não era contraditória com o socialismo. O apoio à setores populares do MDB aparecia, assim, para a corrente, como uma tática rumo à construção de um partido dos trabalhadores independente. Já a Organização Socialista Internacionalista resistiu, num primeiro momento, à constituição do Partido dos Trabalhadores. Nas eleições de 1978, por exemplo, ela defendeu o voto nulo. Sua principal bandeira nesse período era a defesa de uma Assembléia Constituinte Democrática e Soberana, com poder, eleita com total liberdade partidária e com voto extensivo a soldados, marinheiros e analfabetos. Ela só ingressaria nas fileiras do Partido dos Trabalhadores num segundo momento, após sua 1ª Conferência

Após a construção do Partido dos Trabalhadores e sua legalização, abria- se um novo período de lutas para as correntes trotskistas. O período que transcorre entre os anos 1983 e 1989 é de profunda importância para o cenário político brasileiro. Definiram-se as formas de transição do regime ditatorial rumo à democracia e a natureza do novo regime. Tiveram destaque: a luta pelas eleições diretas, conhecida como movimento das “Diretas Já!”; os trabalhos em torno da Assembléia Constituinte, assim como da nova Constituição, promulgada em 1988; e como ponto final desse processo, as eleições presidenciais de 1989. O PT teve um papel central nesse processo: pressionou em direção às eleições diretas, participou dos trabalhos da Constituinte e polarizou a cena política brasileira ao lançar uma candidatura à presidência baseada em um projeto popular. Por sua vez, as correntes trotskistas tiveram pela frente os combates no interior do próprio partido para influir sobre esse processo.

O resultado dessa polarização, em 1989, acabou com a vitória de Fernando Collor de Melo e marcou o início da implantação do neoliberalismo no Brasil. Durante o período de 1990 em diante, as correntes trotskistas encontraram pela frente o ascenso da hegemonia neoliberal no país. Além do mais, sofreram as conseqüências práticas da implantação do neoliberalismo como, por exemplo, o aumento do desemprego que minou o movimento operário, fazendo com que os sindicatos mudassem sua luta por ampliação de direitos para uma luta por manutenção de empregos. No plano internacional, assistiram à queda do muro de Berlim, à reestruturação do capitalismo de mercado na Rússia e nos países do

Leste Europeu, fatos que impuseram uma crise aos partidos comunistas e jogaram toda a esquerda mundial na defensiva.

Sabemos também que após as eleições de 1989 houve uma caminhada gradual do PT rumo a um abrandamento do seu antigo programa. Passou, assim, a adotar alguns dos pressupostos neoliberais e a seguir no caminho da Terceira Via – denominada mais tarde de Governança Progressista –, incorporando medidas paliativas contra a pobreza em um programa que mantinha os pressupostos neoliberais.82 Junto com essa acomodação programática, o PT

passaria a ocupar, cada vez mais, espaços na institucionalidade. A cada eleição, aumentava o número de vereadores, deputados, prefeitos e governadores. Logo, o PT e os seus quadros adaptavam-se à administração neoliberal a que o país vinha sendo submetido.

Durante esse período, as correntes Democracia Socialista e O Trabalho permaneceram no PT. Já os militantes da Convergência Socialista, romperam com o PT – houve uma “expulsão branca” – e criaram o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado, em 1994.

As correntes Democracia Socialista e O Trabalho sofreriam algumas mudanças. A primeira reformularia sua concepção estratégica; já a segunda, sofreria uma cisão em seu interior que quase comprometeu sua própria existência.

Durante a década de 1990, a Democracia Socialista procurou adaptar seu programa à realidade petista, que via aumentar consideravelmente sua

participação na institucionalidade burguesa. Como sabemos, a corrente reivindica- se herdeira da tradição trotskista e, como tal, nos primeiros anos de PT, primava pela independência organizativa dos trabalhadores em todas as instâncias rumo a uma tomada do poder político. Como, então, conciliar a nova realidade petista a um programa revolucionário? Foi assim, que a Democracia Socialista, adota no início da década de 1990 uma nova estratégia, caracterizada por seus dirigentes de “a estratégia de pinça”.

A “estratégia de pinça”, criada pela Democracia Socialista, tem como objetivo a implantação da “democracia socialista”83 através da tomada do poder político e da socialização dos meios de produção, obra a ser efetuada pelos próprios trabalhadores.

E qual a tática que propõe? Como a época atual não está caracterizada pela iminência de uma crise revolucionária e também de uma revolução socialista – e aqui já temos um ponto de rompimento com a tradição teórica trotskista, oriundo das concepções de Mandel –, a corrente coloca que o próximo período seria caracterizado pela necessidade de um acúmulo de forças do movimento operário (através da constituição de uma “dualidade de poderes”) e pelo avanço sobre os espaços da institucionalidade burguesa. Ou seja, utilizam a metáfora da pinça para dar a entender que o movimento revolucionário deve se dar em dois

82 Cf. pesquisa realizada por Danilo E. Martuscelli em Andriei C. G. Gutierrez, Danilo E. Martuscelli

e Fernando Ferrone Corrêa, “PT, PCdoB e PSTU sobre o capitalismo neoliberal”, op. cit.

83 Conceito desenvolvido por Ernest Mandel que defende uma “ditadura do proletariado na qual

haveria plena democracia”. O autor descarta, assim, a forma do modo de governo implantado na Rússia pós-revolução. Propõe um sistema multipartidário, defendendo o “reconhecimento de qualquer partido que respeite a constituição socialista na prática – na teoria pode: ter um programa anti-socialista e divulgar propaganda anti-socialista, mas não terá permissão para lançar bombas

planos rumo ao núcleo central do poder burguês: o Estado.84 Caberia, assim, ao partido revolucionário a “articulação” dos dois movimentos em direção ao objetivo: “dirigir o duplo movimento dos trabalhadores, na institucionalidade e nas lutas sociais, sobre os centros de dominação burguesa”.85

Segundo essa estratégia, a necessidade de formação de um “bloco antimonopolista” , entre outras,86 seria vital para a vitória dos trabalhadores. Sua função seria “isolar os núcleos de resistência do grande capital”, através da luta pela hegemonia no campo dos setores sociais aos quais interessaria a democracia: “a coesão do enorme bloco dos assalariados, com toda a sua diferenciação, a atração da pequena burguesia urbana e rural, além da