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CAPÍTULO 4 – A PRÁTICA TEATRAL

4.2 O uso dos jogos teatrais

O que nos vêm à cabeça quando falamos de jogos? Para muitos uma brincadeira, imagens de uma infância; para outros uma troca de olhares, sentimentos e toques, imagens de uma adolescência. Para alguns, possibilidades de usarmos nossas máscaras, imagens de uma fase adulta. Para muitos profissionais, possibilidades de introduzir um campo relaxado e através do lúdico, deixar que venham à tona todos estes substantivos acima descridos.

Os jogos têm vertentes em várias fases das nossas vidas, o que vai propiciar as nossas disposições em aceitá-los e exercê-los. Através deles podemos chegar a experiências significativas. Para o estruturalista estadunidense John Dewey (1973, p.117), este conceito de experiência é um fator central: vida, experiência e aprendizagem estão unidas. A função da escola encontra-se em possibilitar uma reconstrução permanente feita através dessa experiência. Na ótica do pedagogo há uma aprendizagem maior quando nós professores propiciamos aos alunos, experiências interessantes, quando criamos um local propício de relaxamento e de reconhecimento: de si mesmo, do outro, do espaço e da teoria estudada.

O processo de ensino e aprendizagem está baseado em uma compreensão de que o saber é constituído por conhecimentos e vivências que se entrelaçam de formas dinâmicas. A experiência torna-se um ato de constante reconstrução: o belo e o estético como formas de atingir um estágio de sensibilidade. O que se propõe é uma pedagogia renovada que vem através das ações e da experiência. A percepção do belo e do estético passando pelo empírico, a arte como pensamento inteligente e integrante.

De acordo com Regina Monteiro (1994, p.17), há uma necessidade imperiosa de movimento e ação que se manifestam desde o aparecimento da sociedade humana e sua consequente cultura, através de uma atividade livre, alegre e divertida que é o jogo. Na prática pedagógica, o que vemos é a necessidade de proporcionarmos um estágio de confiança e de brincadeiras para atingirmos um ambiente favorável. Tanto com os grupos de teatros como com o alunado, os jogos entram para propiciarem esse outro estágio de movimento e ação, de participação conjunta em um processo criativo.

Na práxis teatral, os alunos não devem ficar passivos, só ouvindo. As participações são fundamentais não apenas para tornar os encontros mais lúdicos e produtivos, mas também para atingirmos outro estágio de relacionamentos, um corpo pronto aos processos criativos que advém dessa prática.

Nas concepções de Ingrid Koudela (1992, p.25), na relação autoritária, a regra é percebida como lei. Na lúdica, a regra do jogo pressupõe um processo de interação. Assim os jogos passam a ter um objetivo e também funções recreativas e estéticas; passam a ter um tempo de duração com um local determinado. A palavra jogo passa a ser um termo que pode escapar das nossas mãos; algumas atividades implicam uma repetição cega e compulsiva que nos pode conduzir a uma patologia e outras, implicam limites como liberdade e criatividade.

Para Pablo Knappe (1997, p.39), os limites aparecem em formas de regras que delimitam o que é permitido e o que é proibido. A liberdade significa que no espaço do jogo podemos experimentar e expressar-nos além daquilo que é comum na vida real, na vida alheia ao mundo do jogo. A imaginação não se dirige tanto à criação de objetos como à espontaneidade que abre novos campos no caminhar do experimentador.

O jogo se insere no teatro não apenas estruturado como técnica de aquecimento, mas também propiciando o aparecimento de uma atmosfera permissiva. Nas leituras de Viola Spolin (1985, p.19), “no jogo existe alguma coisa em jogo que transcende as necessidades imediatas da vida”, conferindo um sentido à ação, todos se encontram no tempo presente, envolvidos uns com os outros, prontos para a livre relação, comunicação, resposta, experimentação e fluência para novos horizontes. O lúdico existe em um espaço informal sem lugares fixos e onde a alegria é tão bem-vinda como as demais emoções.

O homem sempre teve como tendência básica a necessidade de compreender o Universo. No seu anseio de liberdade e curiosidade, desde sempre tentou usar a ação, a imitação e a representação, como meio de expressão procurando assim influenciar a natureza

para viver melhor. A necessidade imperiosa de movimento-ação se manifesta desde o aparecimento da sociedade humana e sua consequente cultura.

As constantes mudanças na sociedade e na cultura, no decorrer do tempo, criaram padrões de se avaliar o aproveitamento do homem no mundo, através de uma falsa ideia de ordem e de aparente liberdade. Esse sistema de valorização do homem e de sua capacidade criativa converteu sua possibilidade de ação em algo na qual sobra seriedade e falta liberdade; produzir ou apreciar o belo e o estético, assim como se permitir a reaprender a jogar, tendo uma experiência significativa é reencontrar o lúdico, a liberdade, a religare. Um reencontro da liberdade através não só de respostas prontas, mas também na procura de formas novas para os desafios da vida.

Dentro desse raciocínio, o jogo passa a ser uma atividade voluntária, tendo como característica fundamental o fato de ser livre. Também tem como característica o isolamento, a limitação. Ele inicia-se e em determinado momento acabou. Na elaboração das propostas de aulas e dos ensaios, percebemos quanta coisa estava em jogo naqueles jogos. Não apenas os envolvimentos dos atores, atrizes, alunos e alunas dentro de um grupo, mas também o envolvimento deles na vida e na retomada da palavra nas concepções de Paulo Freire.

O ambiente lúdico fez com que as brincadeiras sejam incorporadas às cenas. O riso pode estruturar o sentimento de coesão grupal e passa a ser instrumental de encontros para elaborações cênicas e também de encontros sociais. Nos grupos de teatros, muito mais do que nas aulas, a partir dos jogos começa-se a delinear tais encontros que passam a ter importância no cotidiano daquelas pessoas, ajudando-as não apenas a produzirem um espetáculo, mas também, a se estruturarem como membros de um grupo e de uma sociedade.