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3. CRIMINOLOGIA

3.2 Do objeto e respectivos conceitos

Conforme a definição de Criminologia anteriormente apresentada consideramos o objeto desta ciência: o “crime, a pessoa do infrator, a vítima e o controle social do comportamento delitivo” e para acompanharmos os termos designados por Shecaira (2004), autor de nossa referência, consideraremos objeto desta ciência: o delito, o criminoso, a vítima e o controle social do delito.

3.2.1 Do delito

Considerando a visão do direito penal sobre o delito, Shecaira (2004) apresenta que para “o direito penal o crime é a ação típica, ilícita e culpável [...] uma visão centrada no comportamento do indivíduo.” 83, prescindindo dessa visão, o autor apresenta a visão ampla da criminologia, considerando o delito “como um fenômeno comunitário e como um problema social” 84.

Shecaira (2004) acrescenta a reflexão quanto à criminalização de determinada conduta em determinado contexto histórico e pressupõe quatro elementos constitutivos do conceito criminológico do delito85, a saber:

81 Morillas Cueva, LORENZO. Metodologia y ciência penal.Granada: Universidade de Granada, l990, p. 316 apud Shecaira, 2004, p. 40.

82 Cf. Shecaira, 2004, p.40. 83 Shecaira, 2004, p.43. 84 Ibid., p. 43.

85 Para maiores detalhes conferir Shecaira, 2004, p. 44 a 47, onde o autor utiliza a sociedade e a legislação brasileira como exemplo.

1. a incidência massiva na população; 2. a incidência aflitiva do fato praticado;

3. a persistência espaço-temporal do fato que se quer imputar de delituoso;

4. o inequívoco consenso a respeito de sua etiologia e de quais técnicas de intervenção seriam mais eficazes para o seu combate;

3.2.2 Do criminoso

Para a apresentação do conceito - criminoso, Shecaira (2004) passeia pela construção histórica e teórica do referido conceito, e suas diversas concepções, desde a visão clássica, que considera o criminoso um pecador; à visão positivista, considerando o determinismo biológico e social; à visão correcionalista, considerando o criminoso um ser inferior e incapaz devendo, portanto, ser tutelado pelo Estado; à visão marxista, destacando o determinismo social e econômico; para chegar à sua definição:

[...] entende-se que o criminoso é um ser histórico, real, complexo e enigmático. Embora seja, na maioria das vezes, um ser absolutamente normal, pode estar sujeito às influências do meio (não a determinismos). Se for verdade que é condicionado, tem vontade e uma assombrosa capacidade de transcender, de superar o legado que recebeu e construir seu próprio futuro. Está sujeito a um consciente coletivo, como todos estamos, mas também tem a capacidade ímpar de conservar sua própria opinião e superar- se, transformando e transformando-se. Por isso, as diferentes perspectivas não se excluem; antes, completam-se e permitem um grande mosaico sobre o qual se assenta o direito penal atual. (Shecaira, 2004, p. 49 e 50)

3.2.3 Da vítima

Shecaira (2004) destaca na literatura “três grandes momentos, no que concerne ao protagonismo das vítimas nos estudos penais: a ‘idade de ouro’ da vítima; a neutralização do poder da vítima (com a adoção do processo penal inquisitivo); e a revalorização do papel” 86 da vítima com os estudos criminológicos.

O estudo da vítima passa a ser objeto de atenção e abordagem sistemática pela Criminologia no século XX, em decorrência da atenção às atrocidades ocorridas na 2ª Guerra Mundial, principalmente em relação aos judeus, vítimas do nazismo.

Buscando uma classificação, o autor supracitado, aponta a diferença entre vitimização primária, secundária e terciária, segundo o parâmetro adotado na literatura específica, a saber:

Considera-se haver vítima primária quando um sujeito é diretamente atingido pela prática de ato delituoso. A vítima secundária é um derivativo das relações existentes entre as vítimas primárias e o Estado em face do aparato repressivo (polícia, burocratização do sistema, falta de sensibilidade dos operadores do direito envolvidos com alguns processos bastante delicados etc.). Já a vítima terciária é aquela que, mesmo possuindo um envolvimento com o fato delituoso, tem um sofrimento excessivo, além daquele determinado pela lei do país. É o caso do acusado do delito que sofre sevícias, torturas ou outros tipos de violência (às vezes dos próprios presos), ou que responde a processos que evidentemente não lhe deveriam ser imputados [...] (Shecaira, 2004, p. 55).

3.2.4 Do controle social do delito

Shecaira (2004) contextualiza que toda sociedade ou grupos sociais constroem suas regras para orientar a conduta humana e balizar a convivência comunitária. Para tanto, necessitam e criam “mecanismos disciplinadores” que têm como objetivo garantir a coesão

social. Nesse sentido, o autor supracitado, define controle social como sendo:

[...] o conjunto de mecanismos e sanções sociais que pretendem submeter o indivíduo aos modelos e normas comunitários. Para tanto, as organizações sociais lançam mão de dois sistemas articulados entre si. De um lado tem-se o controle social e informal, que passa pela instância da sociedade civil: família, escola, profissão, opinião pública, grupos de pressão, clubes de serviço etc. Outra instância é a do controle social formal, identificada com a atuação do aparelho político do Estado. São controles realizados por intermédio da Polícia, da Justiça, do Exército, do Ministério Público, da Administração Penitenciária e de todos os consectários de tais agências, como controle legal, penal etc. (Shecaira, 2004, p. 56).

Nessa definição o autor chama nossa atenção para o funcionamento articulado entre os sistemas de controles formal e informal, pois o controle formal é acionado em decorrência das falhas das instâncias de controle informal. Nessa perspectiva as agências de controle formais atuam de forma coercitiva, seletiva e discriminatória, “pois o status prima sobre o merecimento” 87 , sendo sua efetividade questionável.

Conforme definição de controle social apresentada, o autor supracitado inclui o direito penal como instrumento de controle social formal, o qual apresenta o princípio da legalidade e atua em consonância com um “sistema de controle social e de seleção de maior

amplitude dentro do Estado” 88. Traduzindo-se a pena de privação de liberdade na manifestação extremada do controle penal, sendo a mesma “mais do que um controle: é a expressão absoluta de seu caráter repressivo” 89, bem como do poder legítimo e da manutenção do Estado.90