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4. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

4.4 OBSTÁCULOS À ATUAÇÃO DOCENTE

Ainda no contexto da pesquisa, os participantes assinalaram o que eles consideram obstáculos, normalmente, enfrentados no exercício da profissão. De modo geral, estes dizem respeito às condições de trabalho o que inclui remuneração, número de horas semanais, recursos materiais, espaço físico, entre outros. Igualmente, os entrevistados enfatizaram a formação e a valorização profissional como entraves à sua atuação. Vale registrar que fizeram parte deste estudo professores de escolas públicas e de escolas particulares. Obviamente, as

queixas relacionadas às condições de trabalho, em sua maioria, emergiram de docentes que atuam em instituições públicas. Por outro lado, identificou-se também que a maior parte dos participantes de escolas particulares estão satisfeitos com as condições de trabalho que eles têm, chegando em muitas falas, a elogiarem as instituições onde atuam pelo interesse e investimento na formação continuada de seus profissionais. Certamente, trata-se de uma pequena parcela de professores que trabalham em escolas consideradas de elite que podem usufruir deste tipo de benefício. Entretanto, mesmo diante de condições de trabalho diversificadas, para docentes de escolas públicas e particulares, no que tange à questão da remuneração, os participantes tendem a indicar este fator como um dos maiores obstáculos da profissão.

Sobre essa questão, Sousa (2003) diz que não é possível pensar em alcançar qualidade na educação sem considerar como ponto de partida uma política de valorização, de formação e de qualificação do professor, o que implica criar melhores condições de trabalho, reconhecer e valorizar a profissão e, sobretudo, uma remuneração que seja compatível com a responsabilidade assumida por estes profissionais. Como se pode perceber, a baixa remuneração a que se referem os participantes revela a desvalorização da atividade neste segmento, o que inevitavelmente confere baixo status ao profissional que atua na educação infantil e, conseqüentemente ausência de perspectivas de futuro na área. Nesse sentido, cabe salientar que, conforme lembra Leite (2005, p.195), " a eficácia da educação infantil depende, em grande parte, de um quadro de profissionais altamente qualificados e fortemente motivados e compromissados..."

Alguns participantes de escolas particulares entendem como obstáculo a interferência familiar. Para eles a família acaba exigindo muito não apenas dos profissionais como da própria criança. Há inclusive professores que destacam a expectativa de aprendizagem que têm os pais como um dos fatores que podem trazer influências negativas para o processo de ensino e aprendizagem. Por outro lado, professores de escolas públicas, de modo geral, se queixam da ausência da família na vida escolar das crianças, o que na opinião deles acontece principalmente porque ainda predomina, entre alguns pais, uma concepção de educação infantil como um segmento sem fins específicos.

Nos primeiros anos de vida de uma criança, a escola e a família constituem os dois mais importantes contextos de desenvolvimento. São espaços privilegiados e únicos, nos quais a vida cotidiana infantil acontece (SAMBRANO, 2006). Bassedas, Huguet e Solé (1999) advertem que é preciso assinalar que são diferentes os contextos da escola e família.

Nessas instâncias, a criança encontrará coisas, pessoas e relações diversas. Neste sentido, as autoras enfatizam a necessidade de que exista uma relação estável e construtiva entre a escola e a família, já que o objetivo deve ser o de compartilhar a ação educativa, somando esforços e não distanciando-os do desenvolvimento infantil. Em relação a este aspecto, Sambrano (2006, p.139) acrescenta que as duas instituições têm funções importantes, distintas e complementares, sendo a relação entre elas "indispensável, complexa e desafiadora".

Como mencionado no Capítulo de Resultados, os participantes, de modo geral, estão convencidos de que a sociedade e, mais especificamente alguns pais, não valorizam a educação infantil. Tal fato pode ser justificado em virtude da falta de conhecimento, preconceito e estereótipos que ainda são associados ao trabalho que é desenvolvido neste nível educativo. Sobre essa questão, Bassedas, Huguet e Solé (1999) ressaltam que é importante que as famílias conheçam e valorizem o que se faz no cotidiano da educação infantil. Para as autoras, este é um dos meios para se romper com a idéia tradicional de que a criança pequena freqüenta a escola para brincar e que, portanto, não é necessário muito conhecimento para os professores que atuam neste início da escolarização. Romper estereótipos também ajudará os pais a modificarem a representação que têm da educação nesta fase da vida, afirmam as especialistas na área. Corroborando essa idéia, Sambrano (2006) salienta que é necessário promover uma ação de esclarecimento junto às famílias sobre o trabalho desenvolvido no âmbito da educação infantil.

É importante lembrar que os professores entrevistados nesta pesquisa reivindicam reconhecimento profissional. Os participantes enfatizaram muito em seus discursos a não valorização do professor de educação infantil. Neste ponto, cabe-nos indagar se a falta de valorização decorreria apenas da sociedade, ou advém também dos próprios profissionais que atuam neste segmento? Isto porque, em alguns dos depoimentos, podemos perceber que os entrevistados se sentem vitimados pela própria categoria que tradicionalmente está em situação de menor prestígio diante das outras etapas da educação básica. Para além disso, Micarello (2006) aponta que os professores de educação infantil não percebem uma legitimação de seus saberes profissionais. Kramer (2000b) menciona que os professores de educação infantil são uma categoria em 'vias de formação' em 'vias de se fazer'. Essa idéia talvez possa explicar o sentimento de insegurança quanto à natureza do trabalho que se realiza nas instituições de educação da criança pequena. A identidade da educação infantil como "servicinho" tem subjacente a imagem de que, para atuar na área, é suficiente realizar qualquer atividade, não sendo importante, portanto, a formação de seus profissionais e seus

ideais pedagógicos. Esta noção contrapõe a educação infantil à profissionalidade (NUNES; SANTOS; VARGENS; KRAMER, 2005). Sob essa perspectiva, o que se pode inferir é que alguns dos participantes não se sentem pertencentes a grupo profissional, neste caso, os de professores de educação infantil. Daí decorre a reivindicação não somente pelo reconhecimento social, mas, sobretudo, pelo profissional.