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4.2 INTERESSE DAS ONGs PELA POBREZA

4.2.3 As ONGs superam a pobreza?

O quadro de pobreza apresentado também fez surgirem, nas últimas décadas, mecanismos destinados à superação desse problema.

Identifica-se, nos anos 90, que esse processo se tornou mais explícito quando as políticas sociais adquiriram uma essência assistencialista, precarizada, focalizada, compensatória e temporária ou vinculada a padrões mínimos, não superando os problemas que evoluem a cada década sob novas manifestações.

Vencer a pobreza passou a ser a tônica dos discursos do Estado, na metade dos anos 90, que a colocou como uma responsabilidade não só de sua alçada mas da sociedade como

um todo. Esse discurso encontra sintonia entre as ONGs que, anteriormente, já haviam destacado a pobreza como seu núcleo de atenção. Nesse sentido, as ONGs elegem a educação básica como uma das estratégias essenciais para enfrentar esse problema.

A questão central para as ONGs que atuam na América Latina foi, então, “como apropriar-se das proposições de Jomtien e inseri-las na realidade latino-americana? Considerando, segundo sua análise de conjuntura, que esse continente além de uma grave crise econômica vive também as crises social, política e cultural (FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFÂNCIA, 1992, p.12). Por outro lado, essas organizações apontam a perspectiva de assumirem um trabalho educacional com os setores mais pobres da sociedade.

Os ‘cinturões’ de pobreza das urbes latino-americanas se expandiram e, no final dos anos setenta e princípio dos oitenta, o marginalizado da área rural se une ao desempregado tipicamente urbano, resultado da crise econômica e do desmantelamento das indústrias. Deste modo, a crise teve um efeito duplo: por um lado, incrementou o número dos sem trabalho ou parados e, por outro, introduziu uma ruptura no processo de mobilidade social ascendente, via incorporação ao emprego urbano; processo que, apesar de lento, era o único existente. Neste contexto, não parece nada estranho o surgimento do narcotráfico e da violência em grande escala (CONTEXTO & EDUCAÇÃO, 1992, p. 24).

Conforme citação do relatório Delors (2003, p. 450), em 1995, a Cúpula Mundial para o desenvolvimento social que se realizou em Conpenhague apresentou um quadro demonstrativo da pobreza no mundo: “mais de um bilhão de seres humanos vivem numa pobreza absoluta, passando a maior parte deles fome todos os dias e mais de 120 milhões de pessoas no mundo estão oficialmente no desemprego e muitas, mais ainda, no subemprego”.

Ainda, segundo o relatório, esse quadro de pobreza é agravado pela falta de políticas de educação.

Para superar essas estatísticas, destaca esse relatório que a educação básica deve ampliar-se no mundo aos 900 milhões de adultos analfabetos, aos 130 milhões de crianças não escolarizadas, aos mais de 100 milhões de crianças que abandonaram prematuramente a

escola. Acrescentando ainda que nos anos 90 a população de jovens chegou a quase dois bilhões. Concorda-se que a educação básica deva ser ampliada, mas não por ações temporárias e fragmentadas.

Os dados negativos de relatórios e documentos elaborados em conferências mundiais ou de relatórios elaborados pelos organismos internacionais sobre a educação mundial (conferência de Jomtien, relatório Delors), são um indicador de que as relações econômicas nacionais e internacionais são a origem, a substância e a ferramenta de manutenção desse quadro.

Hoje se faz pressão sobre a cultura, a escola e o mundo do trabalho, os direitos sociais e de cidadania política e também sobre o Estado e a sociedade, como se fossem entes à margem do econômico e do político, comportamento que só contribui para aumentar a distância entre o problema da pobreza e a resolução deste.

As possibilidades de superação da pobreza fomentam a necessidade de o governo estabelecer prioridades e dividir responsabilidades que devem ser fortalecidas e consolidadas em gestões locais e parcerias. Mas essa preocupação gerou programas focalizados, por meio dos quais o governo criou cinco áreas de programas compensatórios: política social setorial (relativa aos serviços básicos, entre estes a educação básica); política de apoio ao desenvolvimento da capacidade produtiva dos pobres; política de apoio à organização social dos pobres; políticas de emprego e renda e políticas assistenciais de emergência (RACZYNSKI apud LAVINA apud GARCIA et al., 2003). Para esse autor, essas políticas concretizam o paradigma institucional do tratamento da questão da pobreza, na atualidade do contexto neoliberal, “o da mobilização social dos pobres pela sua própria redenção” (RACZYNSKI apud LAVINAS apud GARCIA et al 2003, p. 44). Assim, cidades, comunidades, governos locais e terceiro setor (neste, principalmente as ONGs), tornam-se o cenário onde toma corpo, a partir de então, o debate e as ações para superação da pobreza.

Pelo discurso da autonomia, esses parceiros defendem a organização dos pobres como um elemento fundamental da agenda social da última década, considerados, agora, sujeitos das políticas de representação dos interesses dos grupos destituídos de recursos, condições e cidadania.

Esse processo de superação da pobreza abre espaço à participação das ONGs na educação, pois a pobreza como foco da educação é um dos discursos mais propalados por essas organizações. A educação passa a ser vista como redentora da auto-estima e da possibilidade de restabelecer aos pobres a capacidade produtiva e competitiva. Desse modo, as ações de combate à pobreza ligam-se às ações de educação, qualquer que seja a esfera de governo ou a pasta ministerial.

Nesse conjunto de parcerias, as ações deslocam-se do sistema de proteção social como um todo e transformam-se em programas assistenciais a requerer parcerias, voluntariado e caritatismo.

No campo da educação, há um leque tão ampliado e fragmentado de ações que se torna difícil identificar até onde esse trabalho proporciona acesso à educação ou exerce o controle sobre as demandas pela educação, oferecendo mínimos a cada cidadão conforme a situação vivenciada.