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O problema central deste estudo consistiu em saber como se podia potenciar o ensino e a aprendizagem em ciência com o recurso a MCCV. Na operacionalização do problema delinearam-se os seguintes objectivos: analisar os conteúdos dos MCCV, comparar MCCV portugueses e estrangeiros, identificar características pedagógicas das exposições e actividades online de Biologia e descrever as perspectivas e explorações dos alunos e professores relativamente aos MCCV. A formulação destes objectivos teve subjacente a obtenção de dados que permitam utilizar os MCCV pela escola de um modo que sustente um ensino de qualidade, assim como aprendizagens significativas pelos alunos.

Estas formulações implicaram identificar, compreender e interpretar as perspectivas e explorações dos alunos e professores relativamente aos MCCV, o que conduziu à selecção de métodos que permitissem aceder aos pontos de vista pessoais e, portanto, a significados produzidos endogenamente. Atendendo a esses objectivos considerou-se que a investigação teria de decorrer sem a manipulação de variáveis e sem que qualquer controlo se exercesse sobre os acontecimentos. Assim, optou-se por seguir uma abordagem qualitativa, de cariz descritivo-interpretativo, pois a intenção era

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fazer um exame intenso, minucioso e sistemático da exploração de MCCV por alunos e professores, visando compreender como é que os MCCV podem ser utilizados no contexto formal da escola. Mais precisamente, pretendia-se investigar um fenómeno dentro do contexto, usando uma multiplicidade de fontes de dados (Yin, 2003).

Consideraram-se como objectos de estudo, os MCCV disponíveis na WWW e as situações de interacção alunos-MCCV e professores-MCCV.

Da revisão de literatura efectuada não emergiram estudos nesta linha, ou seja cujo objectivo fosse estabelecer a ponte entre a utilização dos MCCV e o ensino formal das ciências. Foram parcas, também, as sugestões de metodologia encontradas, nomeadamente, que precisassem a forma de levar a cabo a implementação no terreno de uma investigação visando obter respostas para questões de natureza semelhante à das delineadas neste estudo. De facto, o não conhecimento da existência de estudos nesta linha levou a que não se encontrassem, enunciadas na literatura, pistas em termos de questões em aberto, limitações de estudos, sugestões metodológicas, que permitissem servir de ligação ou de raiz a esta investigação e que lhe servissem de sustento.

Pelas razões apontadas e dada a natureza das opções metodológicas tomadas e que tiveram por base as questões formuladas, à medida que se efectuava a concepção e o planeamento da investigação surgiu desde cedo a vontade e a necessidade de iniciar no terreno a recolha de dados de forma a ir obtendo respostas às questões da investigação e, simultaneamente, informação que servisse para optimizar a forma como se iria processar a própria investigação na busca das respostas às questões. Como referem alguns autores, o desenho da investigação foi-se desenvolvendo e adaptando à medida que o estudo progredia, seguindo uma característica típica dos designs de tipo qualitativo (Borg e Gall, 1989).

Na primeira fase da investigação, a necessidade de identificar os conteúdos disponibilizados pelos MCCV, tanto nacionais como estrangeiros conduziu a uma análise dos dados de forma integrada, aliando técnicas de análise de conteúdo qualitativa (Flick, 1998) à transformação de dados qualitativos em quantitativos, através da análise da representatividade de conteúdos, previamente codificados.

Na identificação dos recursos e da estrutura organizativa dos MCCV, seguiu-se um método de análise heurístico, tendo em consideração que se realizou uma análise sistemática de determinados elementos, em função de uma série de categorias estabelecidas previamente. O primeiro passo para a elaboração do instrumento, nesta fase da investigação, foi identificar as categorias heurísticas que descrevem os

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conteúdos presentes nos MCCV. Este tipo de procedimento enquadrou-se numa perspectiva tanto quantitativa como qualitativa, embora se deva salientar que a sua finalidade, mais do que quantificar, foi a de identificar os conteúdos e as suas categorias. A determinação da representatividade dos conteúdos nos diversos MCCV teve como objectivo caracterizar os MCCV portugueses.

A problemática dos MCCV em Portugal está totalmente inexplorada, em primeiro lugar, porque a sua implementação é recente e, em segundo lugar, porque não existe ou é esporádica uma tradição de colaboração entre instituições universitárias e MCC/MCCV, que permita um acompanhamento do processo ou, no mínimo, a produção de documentos escritos. Neste sentido, este trabalho assume um carácter, de certo modo, exploratório.

No que se refere à segunda e terceira fase procedeu-se ao estudo das perspectivas dos alunos e professores relativamente aos MCCV e do modo como os exploram. Embora não se considere que se tenha atingido o grau de saturação dos dados, pareceu ser suficiente, com os obtidos, revelar significados, que permitiram construir um primeiro modelo explicativo das dinâmicas que têm lugar quando se utilizam MCCV por alunos e professores. Esses dados foram igualmente suficientes para construir uma tipologia de perspectivas, permitindo revelar pormenores das várias estratégias intrínsecas que determinam e condicionam o comportamento de cada sujeito ou grupo (alunos ou professores) e a sua maior ou menor eficácia.

A opção pela heterogeneidade dos participantes, alunos e professores com características diversas (que relatam casos e os casos em si) permitiu, uma visão de “varrimento”, mas não a penetração do olhar. O olhar penetrante fixou-se num número restrito de casos propriamente ditos (Gummesson, 2000; Yin, 2005), e não num único indivíduo ou apenas dois ou três. Pode-se considerar, portanto, neste trabalho um conjunto de dados, cuja análise permitiu detectar as linhas de exploração, senão como ela efectivamente acontece, pelo menos como ela é encarada por alguns dos seus protagonistas.

A razão para a escolha de uma metodologia qualitativa prendeu-se, também, com a necessidade de recolher informação de sujeitos, neste caso alunos e professores, em diferentes situações e, provavelmente, com perspectivas diferentes relativamente ao uso das TIC em contexto educativo. A investigação qualitativa é uma abordagem que rejeita encarar as pessoas como uma soma de medidas psicológicas e tem a pretensão de capturar as suas experiências, medos, emoções, ansiedades, crenças, esperanças,

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comportamentos e irracionalidades (Tuckman, 2002), sendo rica em dados descritivos, aberta e flexível e focando a realidade de forma complexa e contextualizada (Lüdke e André, 1986). Deste modo, procurou-se compreender o comportamento a partir do próprio quadro de referência dos indivíduos tendo sido o lugar natural a fonte directa dos dados, onde o acto, a palavra e o gesto são enquadrados no seu contexto, de modo a ganhar-se o máximo de significado.

Ao pretender-se que a investigação educacional contribua para um avanço na compreensão do conhecimento profissional e da forma como ele se desenvolve, é fundamental aceder aos significados que os alunos e professores dão às situações que vivem no seu dia-a-dia profissional, aos processos que seguem para interpretá-las e às justificações que dão para as suas opções. Para Bauersfeld (1988), a situação por si não é o mais importante, interessando, isso sim, como é que a situação é percebida pelo professor, como é que ele a interpreta e como é que ele actua nela. Bruner (1990) considera que o significado é o motor da acção humana intencional e que se trata de uma construção cultural, algo exterior à pessoa, na medida em que não é gerado por ela mas antes através de um processo de modelação cultural estabelecido na interacção entre ela e as outras pessoas. Este autor defende, ainda, que o significado depende da intencionalidade da pessoa (dando importância às crenças, desejos e empenhamentos pessoais), revela-se quer na acção quer no discurso (realçando a necessidade em associá-los para uma melhor compreensão do significado) e é situado (é função das circunstâncias em que se produz).

O facto dos significados deverem ser procurados de forma transversal, através do pensamento e da acção do sujeito participante e do contexto onde ele actua, leva a aceitar-se que os testemunhos (escritos ou orais) realizados pelos alunos e professores (ou por outra pessoa qualquer) contenham sempre informação limitada, pois são apenas um reflexo parcial do contexto.

Para Jaworski (1994), ocorrem, normalmente, duas posições numa investigação do tipo qualitativo-interpretativo. Uma é a que leva o investigador a olhar para o que se passa no contexto educativo na procura de acontecimentos que mostrem, de alguma forma, a teoria que acaba por descrevê-los. Parte-se de um sistema teórico aplicando-o num conjunto de dados - a chamada investigação dedutiva. A outra leva o investigador a observar, a descrever os acontecimentos do contexto educativo e a analisá-los desejando retirar algo que facilite a reflexão que possa conduzir à geração de uma teoria que explique os dados obtidos – a chamada abordagem indutiva, mais utilizada neste

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trabalho. Sob o ponto de vista prático, não é muito clara a distinção entre as duas. Na realidade, no trabalho de campo, as perguntas que se fazem, aquilo que se observa, o lugar onde se realiza o trabalho são função daquilo que o investigador procura. O investigador, à partida, não é uma tábua rasa e possui conhecimentos e opiniões sobre o problema que quer tratar.

Esta perspectiva descritiva-interpretativa é sobretudo uma orientação teórica que se apoia em duas grandes correntes. Por um lado, na fenomenologia, em que a preocupação fundamental daquele que investiga é compreender o sentido dos acontecimentos e as interacções das pessoas comuns nas suas situações particulares. Por outro, no interaccionismo simbólico, o qual pressupõe que: (a) a experiência humana é mediada pela interpretação – não tendo os objectos, as situações e os acontecimentos significado em si próprios, mas sendo-lhes este atribuído pelas pessoas, (b) estes sentidos são produto da interacção social entre os seres humanos e (c) estes sentidos são produzidos e modificados através de um processo interpretativo que cada pessoa vive permanentemente ao lidar com os símbolos que vai encontrando no seu dia-a-dia (Melzer, Petras e Reynolds, 1975).

Tal como refere Silverman (2000), a investigação qualitativa de tipo interpretativo centra-se, essencialmente, em processos e dinâmicas dependendo, mais do que qualquer outra, de forma decisiva do investigador. Ela procede por indução, reformulando os seus objectivos, problemáticas e instrumentos no curso do seu desenvolvimento e baseia-se numa descrição pormenorizada que vai além dos factos e das aparências, apresentando com grande riqueza de pormenor o contexto e as interacções sociais que ligam os diversos participantes entre si.

Esta abordagem conduziu a um procedimento de recolha de dados que envolveu diversas técnicas e instrumentos: questionários de resposta aberta, entrevistas semi- estruturadas, registo áudio e vídeo e observação participante e não participante.