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5. O conceito de competência e a relação trabalho versus ensino superior

5.3. Orientação Profissional

A Orientação Profissional no Brasil foi desenvolvida, inicialmente, sob três perspectivas: a Psicométrica, a Clínica e, por último, a Psicossocial. A aplicação da Psicologia às relações de trabalho apareceu na década de 20, principalmente em razão da regulamentação dos cursos destinados à profissionalização para o comércio, a indústria e a agricultura.

O cenário político-econômico brasileiro era composto com o governo ditatorial de Getúlio Vargas (1930-1945) e por meio da mudança de um modelo de economia agrário-exportador para um modelo de economia urbano-industrial. Somente no governo do General Dutra a educação e a cultura ganharam ênfase. A partir da década de 40, iniciou-se um processo de atenção à formação para o trabalho das grandes massas, localizadas nos centros urbanos, motivo suficiente para provocar o desenvolvimento de técnicas voltadas para orientação, considerada naquele momento apenas como vocacional. (ABADE, 2005)

Em 1947, foi criado o Instituto de Seleção e Orientação Profissional (ISOP), da Fundação Getúlio Vargas, que, no estado do Rio de Janeiro, desenvolveu, nos dez primeiros anos de seu funcionamento, um trabalho voltado, sobretudo, para a implantação de técnicas de seleção e orientação profissional, cujo público-alvo era a classe média alta, e a proposta, a preparação da futura geração de uma elite dirigente.

Logo depois, em 1949, criou-se o Serviço de Orientação e Seleção Profissional (SOSP), em Belo Horizonte, no Estado de Minas Gerais. O SOSP foi criado pela Lei nº 482, de 11 de novembro de 1949, com o objetivo de orientar vocações no meio escolar e estabelecer critérios para a seleção de pessoal destinados à administração pública e às organizações particulares. O SOSP foi o primeiro instituto no país sob responsabilidade governamental.

O SOSP foi criado pela Lei nº 482, de 11 de novembro de 1949, com o objetivo de orientar vocações no meio escolar e estabelecer critérios para a seleção de pessoal destinados à administração pública e às organizações particulares. Os projetos desenvolvidos tanto pelo SOSP quanto pelo ISOP enquadravam-se na perspectiva da administração científica do trabalho. O psicotécnico era o profissional que adquiria o domínio do conhecimento sobre a natureza humana e buscava adaptá-la ao novo contexto da sociedade urbano-industrial. (ABADE, 2005)

A orientação profissional, neste período, tinha como princípio preparar pessoas para o aumento da produtividade. Esse movimento buscava identificar o homem certo para o lugar certo. A orientação estava limitada a induzir jovens a fazer escolhas que favorecessem o desenvolvimento do mercado econômico e produtivo.

Direcionando os indivíduos para diferentes profissões pelas suas capacidades, sem considerar as diferentes condições de classe ou a história de vida do sujeito, a Orientação Profissional transformava as determinações sociais em características inerentes ao indivíduo. Ao exame dessa abordagem das origens da Orientação Profissional no Brasil é possível notar que ela se constitui no início do século XX como uma modalidade estritamente psicométrica. Os empresários foram seus principais defensores, e os engenheiros, os pioneiros neste campo de atuação. (ABADE, 2005)

A privatização do Ensino Superior na década de 1960 fez com que novos olhares fossem lançados sobre o tema orientação profissional, porém ainda voltados para os interesses da elite, excluindo trabalhadores dessa modalidade de educação. Em 1968, o currículo da formação em Psicologia passa por reestruturação, e disciplinas que envolviam dinâmica de grupo, seleção e o trabalho ganham espaço curricular. A partir da década de 1970, a revista Arquivos Brasileiros de Psicotécnica foi substituída por publicações de Informação Ocupacional (IO): descrições de diferentes ocupações e profissões de nível técnico e universitário. A partir dessa década, em cada número da revista havia uma publicação que informava sobre alguma ocupação: o que faz o profissional, local de trabalho, estudos e exigências. Nesse período também foram registrados os primeiros trabalhos de Orientação Profissional em grupo. (ABADE, 2005)

Na década de 1980, a orientação profissional para população de baixa renda entra na pauta e passa a fazer parte do interesse dos pesquisadores mais comprometidos com a diferença social no Brasil. O país passava pelo momento de transição do regime militar e houve movimentos da psicologia para os problemas vividos pela maioria da população. Os ensaios publicados nos periódicos de psicologia da época questionavam os determinantes, a liberdade de escolha profissional, e as pesquisas tinham a preocupação de validar e adaptar os testes vocacionais para o contexto brasileiro.

Nesse momento, a orientação profissional foi discutida como processo no qual o sujeito, diante do dilema da escolha profissional, torna-se consciente da própria identidade, o que torna o processo dinâmico e multideterminado. Os autores

mais citados em publicações brasileiras são: Super, Pelletier e Bohoslavsky (MELO- SILVA & JACQUEMIN, 2001, p. 20; apud ABADE, 2005).

Em 1990, o ISOP foi extinto e, a partir de então, a produção científica deixou de estar concentrada nos Arquivos Brasileiros de Psicologia. Desde 1970, novos periódicos foram criados, como a revista Psico da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Psicologia Teoria e Pesquisa, da Universidade de Brasília, e Psicologia: Reflexão e Crítica, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, entre outras. No início da década de 90, as publicações sobre Orientação Profissional, que haviam diminuído bastante nos anos 70 e 80, voltam a aparecer nos seguintes periódicos: Psicologia Argumento (Paraná), Cadernos de Psicologia (Belo Horizonte), Estudos de Psicologia (Campinas), Estudos de Psicologia (Natal).

Em 1993, foi criada a Associação Brasileira de Orientação Profissional (ABOP), com o objetivo de consolidar um espaço onde existia a possibilidade de construção da identidade do orientador profissional, bem como a organização da categoria e a definição de políticas para esse campo de atividades no país. A ABOP organizou e lançou, em 1997, o primeiro número da Revista da ABOP, atualmente denominada Revista Brasileira de Orientação Profissional, e até hoje vem contribuindo para tornar novamente expressiva a produção de trabalhos de Orientação Profissional. (ABADE, 2005)

Um estudo preliminar sobre práticas em Orientação Profissional no Brasil indicou que as teorias psicológicas ainda sustentam a prática da Orientação Profissional no Brasil. Entre os treze serviços analisados (Melo-Silva, Bonfim, Esbrogeo e Soares, 2003), oito atuam conforme referencial teórico psicanalítico, dois no sócio-histórico, um no referencial psicopedagógico, outro nas teorias desenvolvimentistas de Pelletier e Super, um psicodramático e outro evolutivo-cognitivista (Melo-Silva e Jacquemin, 2001). Difere da maioria a abordagem sócio-histórica (Melo-Silva, Bonfim, Esbrogeo e Soares, 2003). A Abordagem integrada em Orientação Profissional desenvolvida por Maria Célia Lassance na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), com base nas ideias de Super; o Modelo de Ativação da Aprendizagem proposto por Maria da Glória Hissa e Mariita Pinheiro, com base em Bohoslavsky, Pichon-Rivière, Perls, Piaget e Paulo Freire; o paradigma ecológico em Orientação Profissional desenvolvido por Jorge Sarriera e a Abordagem sócio-histórica de Orientação Profissional proposta por Sílvio Bock são alguns exemplos de novas abordagens desenvolvidas no Brasil atualmente. (SPARTA, 2003; ABADE, 2005)

O processo de desenvolvimento da orientação profissional no Brasil se iniciou com olhares para a população elitista do país. Os futuros líderes e membros

da alta sociedade eram aqueles que recebiam, de fato, orientação profissional. Os estudos, as pesquisas e os interesses, de modo geral, estavam pautados em quem poderia financiar e intervir no processo. A partir da década de 60, e com a expansão de acesso ao Ensino Superior, a orientação profissional começou a ser vista de outra maneira. No entanto, em pleno século XXI, ainda prevalece como maioria os estudos com referência clínica e psicométrica. A escolha profissional para as classes populares continua sendo um desafio. Para a sociedade como um todo, pensar em um sistema de classes, conduzido por valores e ideologias excludentes, pode tornar utópica a possibilidade de que a população de baixa renda consiga realmente fazer uma escolha, seja ela social, econômica ou profissional.