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Profissão, vocação e o acesso à universidade

5. O conceito de competência e a relação trabalho versus ensino superior

5.4. Profissão, vocação e o acesso à universidade

A orientação profissional se tornou uma prática majoritária voltada para escolha do Ensino Superior, composta de forma absoluta por pessoas de classe média e alta. Isso permite afirmar que os projetos para o futuro, incluindo o profissional, não estavam disponíveis para a população de baixa renda.

O direito de escolha não era até então acessível aos trabalhadores. Àqueles que tiveram o “privilégio” do trabalho remunerado, restava apenas a disponibilidade para o exercício de toda e qualquer profissão. Ainda é comum nos dias de hoje ler no currículo profissional de pessoas sem escolaridade a citação “à disposição da empresa”: uma súplica por todo tipo de trabalho. Ser escolhido pode ser o suficiente para aqueles que não têm condições de escolher.

De acordo com a abordagem sócio-histórica, a orientação deve propor ao candidato os meios necessários para que este tenha o direito de escolher o curso que possa atender às suas necessidades, considerando todos os aspectos que o sujeito julgar importantes (BOCK, 2010)

Esse esclarecimento se faz necessário principalmente para a quebra do paradigma vocação, como proposto pela abordagem clínica. Os testes psicológicos se propõem a identificar possíveis vocações profissionais, o que induz o pensamento minado religiosamente de que o sujeito nasce predeterminado a um exercício profissional, e suas escolhas estão aquém desta relação determinista. A orientação profissional implica profundamente um processo decisório, em que o

sujeito deve se identificar e se perceber como alguém que reconhece o próprio caminho e, de algum modo, guia-se ou necessita de alguma ajuda para isso. Hoje, este tipo de orientação recebe diferentes nomes: orientação vocacional, profissional, educacional ou até mesmo ocupacional. (MELO-SILVA; LASSANCE; SOARES, 2004)

E como cada uma dessas expressões é definida na língua portuguesa? O conceito vocacional tem sido entendido como referente à vocação. Vocação, do latim vocatione, significa ato de chamar, escolha, chamamento, predestinação, tendência, disposição, talento, aptidão. O conceito profissional é definido “como respeitante ou pertencente à profissão, ou a certa profissão”; “que exerce uma atividade por profissão ou ofício”. No senso comum, a terminologia mais utilizada é orientação vocacional, sobretudo nas intervenções no campo da Psicologia. Muitos autores fazem uso dos dois conceitos como sinônimos enquanto outros definem o vocacional como mais amplo, ou seja, o sentido que se atribui à vida que inclui o profissional, relativo ao exercício de uma profissão, de uma ocupação. O conceito orientação educacional consiste em um “processo intencional e metódico destinado a acompanhar, segundo técnicas específicas, o desenvolvimento intelectual e a personalidade integral dos estudantes, sobretudo os adolescentes, orientação escolar”. (FERREIRA, 1986, p. 1.232, apud MELO-SILVA, LASSANCE, SOARES, 2004)

A busca por orientação profissional ocorre quando o sujeito está planejando os rumos de seu futuro profissional. No Brasil, alunos do ensino médio, de escolas privadas, são os que mais buscam esse tipo de apoio, apresentando também como primeira opção as universidades públicas, que, além de serem gratuitas, são reconhecidas de modo nacional e internacional.

O vestibular, forma utilizada no país para ingresso nas universidades brasileiras, é capaz de excluir em torno de 90% dos candidatos do Ensino Superior público. E é sabido que as chances de aprovação dos egressos de escolas particulares são maiores do que as chances para os egressos de escolas públicas. Com isso, a universidade particular acaba sendo o destino da grande massa. Divisores sociais que determinam desde então melhores condições para alguns e condições precárias para outros, que serão estendidas para o mercado de trabalho e para toda uma vida.

Várias críticas são feitas a esse sistema de seleção, que tenta por meio de uma ou duas provas definir quais são os alunos preparados para a universidade. Em outros países, a análise do currículo, o histórico escolar, e até mesmo a indicação de professores auxiliam o ingresso do candidato à universidade. De qualquer forma, escolher um curso de nível superior envolve questões sociais,

econômicas e psicológicas – uma rede de fatores formais e informais que interferem no processo de escolha da profissão e devem, assim, ser considerados.

[...] É comum a participação ativa dos pais nesse processo de ingresso na universidade. A escolha da carreira pode se dar durante o curso universitário, em um trabalho conjunto com os orientadores educacionais da instituição universitária. Uma das desvantagens em relação ao sistema brasileiro é que a universidade não é profissionalizante. No sistema norte- americano o aluno só se profissionaliza em uma área específica na pós- graduação. Assim, alonga o período de formação e dificulta a possibilidade de pessoas de baixa renda continuarem no sistema de educação superior, permanecendo com a formação genérica. Uma das vantagens desse sistema consiste na valorização de um conjunto de elementos utilizados para avaliar os candidatos às vagas, pois leva em consideração as atividades extracurriculares, por exemplo, atividades na comunidade, estágios, participação em times esportivos da escola, entre outras. O sistema de exame vestibular no Brasil difere também do Bacalauréat (BAC), o sistema francês. Enquanto o referido exame é realizado na saída do ensino médio e habilita o jovem a ingressar no mercado do trabalho ou em qualquer curso superior (para a área na qual ele foi aprovado no BAC), no Brasil o vestibular é um exame de entrada no ciclo superior, para um determinado curso em uma universidade para o qual o exame específico foi realizado. (MELO-SILVA, LASSANCE, SOARES, 2004)

No Brasil, foi criado em 1998 o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), que tem como objetivo avaliar o desempenho dos estudantes no final do ciclo e aproveitar as pontuações conquistadas para o acesso às universidades, sejam estas públicas ou privadas. E também é utilizado o Programa Universidade para Todos ProUni/MEC (2015) –, que oferece bolsas de estudos.

Quanto à orientação profissional, é possível identificar práticas isoladas em algumas escolas particulares que têm projetos direcionados à escolha. O Colégio Rio Branco, em São Paulo, é um exemplo. Além das escolas, há consultórios e clínicas psicológicas que oferecem orientação mediante pagamento. Para as populações carentes, restam os projetos desenvolvidos dentro das comunidades e das ONGs de modo pontual e pouco divulgado. A Universidade de São Paulo também tem um Núcleo de Orientação que atende desde o ensino fundamental até o redirecionamento de carreira.

Algumas instituições privadas de Ensino Superior também estão investindo em orientação e apoio ao estudante, mesmo para aqueles já matriculados, como por exemplo a Universidade Anhembi-Morumbi e a Universidade Nove de Julho.