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4.10 CAPITAL FINANCEIRO DOS AGRICULTORES PESQUISADOS

4.10.2 Origem da renda por permanência

Para compreendermos a origem da composição da renda dos pesquisados, elencamos as treze variáveis com maior recorrência na aplicação dos questionários durante a pesquisa

48 É uma medida que expressa o grau de dispersão de um conjunto de dados. Ou seja, o desvio padrão indica o

quanto um conjunto de dados é uniforme. Quanto mais próximo de 0 for o desvio padrão, mais homogêneos são os dados.

exploratória. Contudo, no total da amostra dos 263 questionários, as variáveis como atividades não-agrícolas (comércio, indústria etc.), turismo rural, processamento de produtos, apicultura, caprinocultura, arrendamento de terras e aluguel de imóvel na cidade obtiveram frequência abaixo de cinco respostas. Deste feito, consideramos aquelas variáveis com maior representatividade na composição da renda familiar dos pesquisados.

Para melhor compreensão, correlacionamos a origem da renda por permanência ou não no PNPB. As seis variáveis utilizadas apresentaram resultados estatisticamente significativos para o nosso estudo, o que, certamente, contribuirá para ampliar a reflexão acerca dos estudos sobre os fatores que influenciaram no alcance da dimensão social do programa do biodiesel nas regiões estudadas.

De acordo com a tabela 14, observamos que ter sistema de produção diversificado pode ser uma variável com potencial explicativo para a permanência dos agricultores no programa. O resultado do Teste Qui-quadrado foi estatisticamente significativo para a variável (p<<,000). Para aqueles que nada da renda familiar provém de outros cultivos além da soja e da mamona, apenas 34,8% permaneceram, ou seja, ter outras fontes de geração de renda pode ser uma variável importante, evitando assim, a dependência de um único cultivo para a reprodução do grupo familiar. Observamos o equilíbrio estatístico entre os que até 25% da renda provem de outras produções, 57,9% permaneceram e 42,1% não permaneceram; porém chamamos a atenção para a diferença entre os que até 50% da renda vem de outras produções agrícolas, 82,3% permaneceram e apenas 17,7% não permaneceram.

Tabela 14 - “outras produções agrícolas” por permanência ou não no PNPB

Variável (%) Situação no PNPB

Total Permaneceu Não permaneceu

Outras produções agrícolas (trigo, feijão, milho, verduras, mandioca, frutas, verduras etc.) Nada 16 30 46 34,8% 65,2% 100,0% Até 25% 66 48 114 57,9% 42,1% 100,0% Até 50% 79 17 96 82,3% 17,7% 100,0% Até 75% 6 1 7 85,7% 14,3% 100,0% Total 167 96 263 63,5% 36,5% 100,0%

Teste Qui- quadrado (p< ,000) Fonte: pesquisa de campo.

Os dados nos levam a intuir que contar com um portfólio diversificado de atividades agrícolas, sendo essas responsáveis pela composição da renda familiar, tem sido um elemento importante para os agricultores pesquisados se manterem PNPB.

Do ponto de vista das teorias que debatem a importância da diversificação dos meios de vida rural, Ellis (1998, p. 2) entende ser uma estratégia o “processo pelo qual as famílias constroem um portfólio diversificado de atividades e capacidades de apoio social para sobrevivência e para melhorar seu padrão de vida”. As unidades familiares dos agricultores pesquisados que não permaneceram no programa apresentaram pouca diversificação produtiva; muitas delas contam apenas com o cultivo da mamona para vendas eventuais e milho para alimentar os animais de pequeno porte, “as criações”.

De acordo com Ellis (2000, p. 57) apud Schneider (2010, p. 92),

[...] os determinantes da diversificação dos meios de vida rurais são variados e podem estar relacionados a aspectos edafoclimáticos ou socioeconômicos que se manifestam através da sazonalidade, dos riscos, da vulnerabilidade, das migrações, dos efeitos do mercado de trabalho, do acesso a créditos e outros ativos.

Ainda de acordo com a diversificação dos meios de vida rurais, Schneider (2010, p. 89) compreende que a “quanto mais diversificada for uma unidade produtiva ou um estabelecimento agropecuário, maiores serão as chances e oportunidades de ter opções para fazer escolhas”.

Para Ellis (1998), os sistemas de microcrédito rural nos países pobres desempenham importante papel para a diversidade dos meios de vida rurais. Nessa perspectiva, acreditamos que a partir dos estudos de Ellis ( 2000) é possível compreendermos analiticamente que o grupo de agricultores que permaneceram no PNPB é configurado por aqueles com sistemas de produção menos diversificados, se comparados com o que não permaneceram, caracterizados pela dependência de recursos externos. O grupo dos que permaneceram registrou os maiores percentuais de acesso às políticas de crédito, conforme apresentaremos no subtítulo “acesso a programas de crédito agrícola”.

Ainda sobre a origem da composição da renda familiar, observamos na tabela 15 uma tendência daqueles agricultores que menos dependem da complementação da renda com prestação de trabalhos agrícolas fora da sua propriedade familiar de permanecerem no programa. Conforme podemos observar, 76,1% dos agricultores que informaram não ter nenhum percentual da renda familiar oriunda de trabalhos agrícolas para terceiros permaneceram no programa. Ou seja, não precisar prestar serviços agrícolas para terceiros na condição de safristas (temporários) pode estar relacionado com a permanência no programa.

Dos agricultores que informaram contar com até 25% dessa renda, 89,7% não permaneceram no programa, e até 50% da renda, 73,3 % também não. Em síntese, na medida em que aumenta o percentual da composição da renda familiar oriunda da prestação de trabalhos agrícolas na condição de temporários ou safristas para terceiros, aumenta o número de agricultores que não permanecem no programa.

Tabela 15 - Realizam “trabalhos agrícolas como safristas e temporários49 correlacionada com a permanência no

PNPB

Situação no PNPB

Variável (%) Permaneceu Não Permaneceu Total

Trabalha para terceiros (safristas, temporários) Nada 159 50 209 76,1% 23,9% 100,0% Até 25% 4 35 39 10,3% 89,7% 100,0% Até 50% 4 11 15 26,7% 73,3% 100,0% Total 167 96 263 63,5% 36,5% 100,0% Teste Qui-quadrado (p<,000) Fonte: Pesquisa de campo.

O deslocamento, mesmo que temporário, para outras regiões ou intra-estadual representa importante estratégia de reprodução social e econômica incorporada nas práticas dos agricultores pesquisados na região Nordeste. Para Martins (1988, p. 45), “migrante temporário é aquele que vai e volta e o processo social que ele vive é o de sair e retornar”. Para o autor, numa perspectiva sociológica, o migrante temporário ao sair modifica as relações sociais, altera a organização da família e a divisão do trabalho familiar. E nesse contexto, na maioria das vezes os membros da família que ficam não conseguem manter as atividades da propriedade. Para o autor, essa condição de migração temporária marca as características da agricultura familiar mais empobrecida.

Para Martins (1998), “os agricultores que migram temporariamente para outras zonas rurais em busca de trabalho [...] são, geralmente, pequenos proprietários, pequenos arrendatários, parceiros ou meeiros” (MARTINS, 1988, p. 47).

De acordo como presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Morro do Chapéu-BA e de Caracol no Piauí, os agricultores que aderiram ao PNPB e, mais

49 O trabalhador temporário é aquele que se contrata por um período no qual se conhece o início e o término do

contrato. Já o trabalhador safrista é aquele regido pelas regras do contrato por prazo determinado, mas com a ressalva que o término de seu contrato se dá quando terminam os serviços de colheita ( CLT).

especificamente, os que não permaneceram no programa, são aqueles que saem das suas roças por volta do mês de setembro e retornam no mês de março, quando iniciam as primeiras chuvas para plantio. Os recursos financeiros adquiridos durante o período de trabalho como safristas temporários são utilizados para a manutenção das despesas básicas da família e preparar as terras para novo ciclo produtivo (entrevistado 13).

4.10.2.1 Origem da renda por permanência nos programas de auxílio governamental

Ainda sobre a origem da composição da renda familiar dos agricultores pesquisados, consideramos a importância dos programas governamentais de transferência de renda e aposentadoria especial, sobretudo no contexto das famílias rurais mais fragilizadas economicamente.

As tabelas 16 e 17 revelam que a dependência dos programas de transferência de renda, aposentadorias e pensões na composição da renda familiar do pesquisado aumentou o percentual de não permanência no PNPB. Conforme observamos na tabela 14, entre aqueles agricultores que declararam ter até 25% do percentual da renda familiar oriunda de aposentadorias e pensões, 71,4% desses permaneceram no programa. A situação se inverte para os agricultores que declaram que até 75% da renda tem origem nessa fonte, já que 90,0% desses agricultores não permaneceram no programa.

Tabela 16 - Aposentadorias ou pensões por permanência no PNPB

Situação no PNPB

Variável (%) Permaneceu Não permaneceu Total

Aposentadorias ou pensões Nada 154 64 218 70,6% 29,4% 100,0% Até 25% 10 4 14 71,4% 28,6% 100,0% Até 50% 1 10 11 9,1% 90,9% 100,0% Até 75% 2 18 20 10,0% 90,0% 100,0% Total 167 96 263 63,5% 36,5% 100,0%

Teste Qui- quadrado (p<,000) Fonte: Pesquisa de campo.

É importante mencionarmos que esses agricultores aposentados que ilustram a estatística dos que permaneceram se inserem na nova investida da usina de produção de

biodiesel instalada em Iraquara. Como o programa caiu no descrédito por parte dos agricultores, os extensionistas estão selecionando agricultores mais velhos em comunidades estratégicas com o intuito de atrair a confiança dos agricultores mais jovens. Esses 12 são agricultores da comunidade Gameleira, no município de Iraquara-BA. Desse modo, podemos afirmar que não é constante a presença da renda oriunda de aposentadorias entre os agricultores que permaneceram no programa, e sim entre aqueles que não permaneceram.

Situação similar foi encontrada entre aqueles agricultores que contam com a complementação da renda familiar através dos programas de transferência do Governo Federal. Conforme ilustrado na tabela 17, observamos que entre os agricultores com nenhum percentual da renda familiar oriundo de programas sociais, 70,3% permaneceram e 29,7% não permaneceram no programa. Dos que contam com até 25% da renda provenientes dos programas sociais, 15,8% permaneceram e 84,2% não permaneceram; e por último, dos que dependem até 50% dos programas sociais 20% permaneceram e 80% não permaneceram no programa.

Tabela 17 - “Ajuda do governo” por permanência no PNPB Situação no PNPB

Variável (%) Permaneceu Não permaneceu Total

Ajuda do governo (ex. Bolsa família) Nada 161 68 229 70,3% 29,7% 100,0% Até 25% 3 16 19 15,8% 84,2% 100,0% Até 50% 3 12 15 20,0% 80,0% 100,0% Total 167 96 263 63,5% 36,5% 100,0%

Teste Qui- quadrado (p<,000) Fonte: Pesquisa de campo.

Os dados evidenciam a vulnerabilidade econômica dos agricultores pobres que não conseguiram se manter no PNPB. Para esses agricultores não é possível sobreviver apenas com a renda agropecuária de seus estabelecimentos. Para o grupo social de agricultores considerados pobres, as aposentadorias e programas de transferência de renda figuram importantes receitas para a manutenção das famílias. Essa vulnerabilidade econômica também marca a forma desigual como esses agricultores acessam os programas de crédito agrícola, conforme o subitem seguinte.