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CAPÍTULO I FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.2 A Abordagem de Inglês Para Fins Específicos (IFE)

1.2.1 Origens do IFE no Brasil e no Mundo

Esta seção fornecerá um breve histórico sobre a origem do IFE no Brasil e no mundo tendo como fontes principais de consulta Hutchinson e Waters (1991), Dudley-Evans e St John (1998) e Ramos (2005).

Hutchinson e Waters (1991) relatam que o surgimento do IFE no mundo decorre do período pós-segunda guerra mundial quando houve a ascensão dos Estados Unidos como potência global e, ao mesmo tempo, a aceitação da língua inglesa como idioma principal de comunicação entre várias pessoas que desejavam entrar em contato e aprender, especificamente, conteúdos de duas áreas que estavam em expansão na época: comércio e tecnologia. Os autores ainda reforçam, através de Swales (1971), que o Inglês para Ciência e Tecnologia (ICT) teve fator particularmente importante para o desenvolvimento do IFE no mundo. Dudley-Evans e St John (1998) também apontam o crescimento da Ciência, Tecnologia e Negócios como fator resultante do desabrochamento do IFE, bem como levantam outros motivos tais como o poderio econômico de alguns países com riqueza petrolífera e o aumento de alunos provindos de variadas regiões para estudar nos Estados Unidos, Reino Unido e Austrália.

Dudley-Evans e St John (1998) descrevem quatro tendências do ESP, surgidas após o período pós-segunda guerra, com base em publicações de materiais de ensino. A primeira tendência, Análise de Registro18, aparece nos

anos 60 com a publicação do livro texto The Structure of Technical English, de A. J. Herbert (1965). Esta primeira tendência caracterizava-se por conter um formato similar à estrutura de enciclopédias com a adição de exercícios envolvendo aspectos gramaticais. Aspectos negativos tais como a densidade dos textos e a repetição de exercícios com os mesmos propósitos, que não

mostravam eficiência na aprendizagem do conteúdo técnico, delinearam estudos para o surgimento de uma segunda tendência: Análise do Discurso e da Retórica19. Esta segunda tendência apresentava a ideia de relacionar forma

e uso da língua, tentando ainda eliminar o grau de previsibilidade que os materiais didáticos da primeira tendência externavam. Os materiais didáticos deste segundo movimento mostravam preocupação em desenvolver as quatro habilidades (compreensão oral e escrita e produção oral e escrita); não havia, contudo, ênfase em nenhuma dessas habilidades, nem abordavam estratégias de leitura, as quais seriam implementadas na terceira tendência Análise de Habilidades de Estudo20. Esta terceira tendência ficou marcada por associar as

atividades profissionais com o conteúdo proposto nos materiais didáticos, bem como houve o surgimento de estratégias de leitura nas lições dos livros textos. Finalmente, a quarta e última tendência denomina-se Análise de Necessidades de Aprendizagem21, surgida no final dos anos 70 e início dos anos 80, e parte

da perspectiva de que um curso de IFE deve absorver as reais necessidades dos aprendizes, levando em consideração suas habilidades já adquiridas em estudos acadêmicos anteriores.

No Brasil, de acordo com Ramos (2005), o IFE foi introduzido nos anos 70 na área de ensino-aprendizagem de francês. No fim da referida década, uma pesquisa envolvendo 26 universidades estabeleceu a necessidade do conhecimento da língua inglesa em áreas diversas, gerando um projeto que implementou cursos de compreensão escrita. Vale ressaltar que a nomenclatura Inglês Instrumental – adotada amplamente pela mídia e pelos próprios livros lançados no mercado – segundo a autora em questão, leva ao mito de que o IFE trabalha apenas com a habilidade de leitura e apenas com áreas técnicas. Faz-se relevante ainda acrescentar que o Projeto Nacional de Inglês Instrumental, nos anos 80, foi estendido às Escolas Técnicas (hoje os Institutos Federais), reforçando a associação entre Inglês Instrumental e compreensão escrita (RAMOS, 2005, p. 117).

Apesar da ideia equivocada de que a abordagem de IFE trabalhe apenas com a compreensão escrita e apenas contemple literatura técnica,

19 No original: Rhetorical and Discourse Analysis.

20 No original: Analysis of the Study Skills. O termo Study Skills refere-se ao uso de estratégias de leitura, as quais são definidas na seção 1.2.3 Estratégias de Leitura neste trabalho.

como foi acima explicitado, esta pesquisa, baseada no contexto técnico em que foi inserida e nas informações obtidas pelos participantes da pesquisa e professores da área de informática, adotou a referida abordagem como modelo didático para a organização e construção do Curso FIC, mesmo tendo consciência da existência de abordagens contemporâneas como a Pedagogia de Gênero (HYLAND 2007; MARTIN; ROSE, 2008; ROSE; MARTIN, 2012). Além disso, a Pedagogia de Gênero está comumente associada à compreensão e produção escrita. Como esta última habilidade não foi contemplada no Curso FIC, o uso da referida abordagem se tornaria incoerente no contexto desta pesquisa. Ainda assim, em algum momentos do capítulo IV Análise e Discussão dos Resultados, enxertaremos alguns conceitos da Pedagogia de Gênero de forma pontual a fim de solidificar algumas análises, sem prejuízo do embasamento norteador da elaboração da nossa intervenção pedagógica. Ademais, destacamos e exemplificamos, atualmente no Brasil e, mais especificamente, no Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da UFRN, trabalhos científicos englobando as abordagens de IFE e/ou da Pedagogia de Gênero como as de Cavalcanti (2016), Cooper (2012) e Sarmento (2012).

Tendo justificado a escolha do IFE como norteador para a elaboração do Curso FIC, passaremos a descrever algumas características fundamentais imbuídas na supracitada abordagem.

Robinson (1991) afirma que

qualquer empreendimento de Inglês para Fins Específicos (IFE) envolve três domínios de conhecimento: linguagem, pedagogia e conteúdo (o conteúdo das disciplinas de especialidade dos alunos).22

(ROBINSON, 1991, p. 18)

Nesse sentido, o Curso FIC teve como fundamentação um programa de inglês para informática, que se enquadra na categoria de inglês voltada à ciência e tecnologia, como demonstra Hutchinson e Waters (1991), ao esboçar o entendimento de haver três ramificações para a abordagem IFE: Inglês para Negócios e Economia; Inglês para as Ciências Sociais e Inglês para Ciência e Tecnologia.

22 No original: Any ESP enterprise involves three realms of knowledge: language, pedagogy and content (the content of the student’s specialist disciplines).

Para a construção de um programa com abordagem IFE, algumas perguntas elucidativas devem ser formuladas para traçar um plano de elaboração que esteja coerente com a teoria mencionada. Hutchinson e Waters (1991, p. 21/22) propõem usar o modelo de Os homens honestos de Kipling23,

que pode ser resumida da seguinte forma: quem estará envolvido no processo e por quê? (foco no público); quando e onde a aprendizagem acontecerá? (foco na duração e no lugar do curso); o que o os alunos precisam aprender? (foco no programa); como a aprendizagem será alcançada? (foco no processo didático).

É com este embasamento que o Curso FIC empregou determinadas estratégias de leitura com conteúdos vistos nos dois primeiros anos do curso técnico de informática. Contudo, é imprescindível, primeiramente, observar um instrumento que indique o que o público-alvo necessita, dentro da área específica de informática, para ampliar a compreensão escrita. Este instrumento chama-se Análise de Necessidades e será descrito no subitem seguinte.