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OS ASPECTOS CENTRAIS DA SOBERANIA E AS MUDANÇAS NA CONDIÇÃO

CAPÍTULO 1 O USO DA FORÇA E SUA REGULAMENTAÇÃO

1.5. OS ASPECTOS CENTRAIS DA SOBERANIA E AS MUDANÇAS NA CONDIÇÃO

O conceito de soberania remete-se à formação dos Estados Nacionais Modernos, no final da Idade Media e início da Idade Moderna, com a centralização do poder nas mãos do soberano. Essa concepção de soberania não existia na Antiguidade. A pólis grega era formada por um conjunto privilegiado de cidadãos que decidiam a condução da vida política da sociedade. Assim, o colono, o operário, o membro de uma comunidade conquistada não podiam ser considerados “cidadãos”.  

O “cidadão” era uma espécie de soberano em sua propriedade, com escravos, mulher e filhos sob suas ordens, com tempo livre suficiente para os assuntos da cidade.250 Igualmente, na antiga sociedade romana para ser nobre era necessário viver no ócio  e com dignidade "otium cum dignitate". A origem da palavra “negócio” em latim (neg-otium) encontra-se na idéia de “negação do ócio”. O trabalho era um castigo próprio para escravos (douleiá, trabalho em grego, decorre de doulos, escravo).

Nesse sentido, Aristóteles em sua obra “Política”, esclarece que “bem conhecidas, agora, as partes componentes de um Estado, é preciso falar, primeiramente, da economia do lar, já que o Estado é formado pela reunião de famílias.” 251 O que todos os filósofos gregos pareciam ter por certo é que a liberdade situa-se exclusivamente na esfera política, que a necessidade é primordialmente um fenômeno pré-político, característico da organização do lar privado; e que a força e a violência são justificadas nesta última esfera por serem os únicos meios para vencer a necessidade, por exemplo, subjugando escravos.252

A distinção entre as esferas da vida privada e esfera da vida pública corresponde à existência das esferas da família e da política como entidades diferentes e separadas, pelo menos desde o surgimento da cidade-estado; mas a ascendência da esfera social, que não era nem privada nem pública no sentido restrito do termo, é um fenômeno relativamente novo,

250

REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 208.

251

ARISTÓTELES, op. cit., p. 15

252

cuja origem coincidiu com o surgimento da era moderna e que encontrou sua forma política no estado nacional.253

O rei, por meio do Estado fortalecido passou a regular as relações jurídicas entre o Estado e seus súditos dentro do seu limite territorial. A noção de soberania passou a conceber o direito a partir de um princípio centralizador. O objetivo do soberano era ser senhor de todos os seus súditos, sem que com isso reconhecesse ser senhor de si mesmo, isto é, não estava sujeito a limite de poder algum.

Foi a partir da criação dos Estados nacionais modernos que a noção de soberania surgiu como um conceito chave que irá dominar a organização jurídica do poder. A noção de soberania como fundamento do Estado moderno, personificada na figura do monarca, resultou na unificação do poder, com a promoção do desenvolvimento de uma vida econômica.

Essa noção justifica a pretensão de imposição do Estado monárquico contra o papado e os poderes feudais, passando as leis naturais e divinas a serem aceitáveis, na medida em que não se materializam em uma instância de poder temporal.254 Contudo, o Estado nacional moderno nasce absolutista, por circunstância e necessidade, mas seus monarcas estão ungidos pelo direito divino, visto que o poder secular ao libertar-se gradativamente do poder religioso, o faz sem desprezar o potencial de legitimação. A soberania passa a concebida como indivisível e absoluta.255

O primeiro Estado nacional moderno a ser formado foi no século XIV em Portugal: em 1385, a Revolução de Avis teve como resultado a centralização do poder, sob o governo de D. João de Avis, aclamado rei de Portugal. Como exemplos de absolutismo podem ser citados: na Inglaterra, a dinastia Tudor (apogeu) e Stuart (declínio); na França, a dinastia Valois e Bourbon (apogeu), com destaque para Luís XIV, o Rei Sol, símbolo do absolutismo.

Este poder ilimitado foi justificado por grandes pensadores como Hobbes, Bodin, Bossuet e, sobretudo, Maquiavel, em sua mais célebre obra “O Príncipe” na qual defendeu o Estado nacional moderno. Segundo Maquiavel, por meio do absolutismo se evoluiria para a democracia. Defendia um Estado forte, independente da Igreja, um governo absolutista em

253

ARENDT, op. cit. p. 37. 254

SOARES, op. cit., p. 97. 255

BARROSO, Luis Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 9.

favor do qual todos os meios são justificáveis, estando a “razão de Estado” acima de qualquer outro ideal.

Com o absolutismo, o monarca não encontra limites para o exercício de seu poder nem dentro nem fora do Estado. Delineou-se, na verdade, em seus traços essenciais, o novo e indiscutível princípio de legitimidade do príncipe no Estado: o princípio de soberania, a "summa legibusque soluta potestas", da qual no último quarto do século XVI Bodin deu a

sistematização teórica definitiva.256

A concepção de soberania em Bodin tem como maior característica, a ilimitação. Os Estados têm poder de autodeterminação absoluta, de maneira que no relacionamento com outros Estados não há necessidade de respeito a preceitos não positivados. Bodin em sua obra “Les six livres de la republique” (“Os Seis Livros da República”) considera a soberania o poder absoluto e perpétuo da "república". Os príncipes soberanos seriam os representantes de Deus na Terra.  Para ele “a soberania do rei é originária, ilimitada, absoluta, perpétua e irresponsável em face de qualquer outro poder temporal ou espiritual” 257.

Thomas Hobbes em sua obra “O Leviatã”, defendeu a idéia de que o rei salvou a civilização da barbárie e, portanto, por meio de um contrato social, a população deveria ceder ao Estado todos os poderes para contenção do caos social. Hobbes defendia a teoria da origem do Estado pela força, afirmando que os homens, em estado de natureza, eram inimigos uns dos outros, e, viviam em constante guerra. E como toda guerra termina com a vitória dos mais fortes, o Estado teria surgido para organizar o grupo dominante, dando-lhe condições para manter o poder de domínio sobre os vencidos.

Por meio do contrato social, os homens renunciariam ao seu direito em favor da lei. Esse contrato teria como pressuposto que cada homem estaria abrindo mão de sua liberdade absoluta sobre todos e todas as coisas, tendo-a limitada pela liberdade dos outros. Todavia, o contrato, por si, não asseguraria a limitação da liberdade. Assim, o Estado surgiria para disciplinar as relações entre os homens ("... os pactos sem a espada não passam de palavras...").  

Lord Edward Coke (1522-1634) sustentou a existência de fundamental rights dos cidadãos ingleses, principalmente no que tange à proteção da liberdade pessoal contra a prisão

256

BOBBIO, op. cit., p.672, nota 90.

257

arbitrária e o reconhecimento do direito à propriedade, sendo o criador da tríade vida, liberdade e propriedade. John Locke incluiu a “resistência”nesta famosa tríade.

O pensador John Locke viveu o período das duas revoluções burguesas inglesas do século XVII (1649 e 1688). Defendeu a limitação dos poderes reais e os direitos naturais de cada um. Para evitar uma situação natural de guerra, os homens precisariam abandonar o estado natural, formando a sociedade política, por meio de um pacto por eles elaborado. Esse pacto de consentimento almejava garantir os direitos previamente existentes, isto é, a vida, a liberdade e a propriedade.

Haverá sociedade política somente quando cada um dos membros renunciar ao próprio poder natural, passando-os às mãos da comunidade em todos os casos que não lhe impeçam de recorrer à proteção da lei por ela estabelecida. (...) Os que estão unidos em um corpo, tendo lei comum estabelecida e judicatura para a qual apelar, com autoridades para decidir controvérsias e punir os ofensores, estão em sociedade civil com os outros... 258

Esse pensamento divergia em relação ao de Hobbes, para quem o pacto entre os homens retira-lhes todo o poder e o cede ao soberano, a quem só lhes restava obedecer. Locke defendeu uma limitação da soberania baseada na defesa dos direitos subjetivos dos indivíduos. Essa noção de governo pelo consentimento, com poderes limitados, é retratada em sua obra “Two Treatises of Government” (“Segundo Tratado sobre o Governo”) considerada como a expressão clássica das idéias políticas liberais.

Impregnado pelas idéias iluministas, Jean-Jacques Rousseau defendeu a transferência nominal do poder do soberano para o povo, em uma abstração aristocrático-burguesa que, com o tempo, iria democratizar-se.259Em sua obra “Contrato Social” Rousseau sustentou que o homem é bom por natureza e que a passagem do Estado Natural para o Estado Social é a garantia do exercício da liberdade de todos:

Como é impossível aos homens engendrar novas forças, mas apenas unir e dirigir as existentes, não lhes resta outro meio, para se conservarem, senão formando, por agregação, uma soma de forças que possa arrastá-los sobre a resistência, pô-los em movimento por um único móbil e fazê-los agir de comum acordo.260

258

LOCKE, John. Segundo Tratado sobre o Governo. In: Coleção os Pensadores. São Paulo: Abril, 1978, p. 67.

259

BARROSO, op. cit., p. 9.

260

Defendeu a soberania popular, sendo que os governantes teriam a responsabilidade de exercer o poder de acordo com a vontade do povo, ou seja, todo o poder emana do povo. O contrato social seria a garantia que as liberdades individuais não se chocariam entre si, garantindo a igualdade dos pactuantes. A soberania popular é inalienável e incomunicável, correspondendo ao exercício da vontade geral, que jamais se pode alienar, e que o soberano, que nada mais é senão um ser coletivo, não pode ser representado a não ser por si mesmo; é perfeitamente possível transmitir o poder, porém, não a vontade.261 Segundo Rousseau:

Grotius nega que todo poder humano seja estabelecido em favor dos governados. Sua mais freqüente maneira de raciocinar consiste sempre em estabelecer o direito pelo fato. Poder-se-ia empregar um método mais conseqüente, não porém mais favorável aos tiranos. É, pois duvidoso, segundo Grotius, saber se o gênero humano pertence a uma centena de homens, ou se esta centena de homens é que pertence ao gênero humano, mas ele parece pender, em todo o seu livro, para a primeira opinião. É este também o sentimento de Hobbes. Eis assim a espécie humana dividida em rebanhos de gado, cada qual com seu chefe a guardá-la, a fim de a devorar262.

Segundo Rousseau, as leis são atos constituídos pela vontade geral, impessoais e abstratos. O monarca deve se submeter às leis, uma vez que é titular de um poder que advém da vontade geral: “que quem se recusar a obedecer à vontade geral a isto será constrangido pelo corpo em conjunto, o que apenas significa que será obrigado a ser livre”.263 Assim, a partir da Revolução Francesa (1789) a soberania passou a ser concebida como soberania popular, emanada na vontade popular, circunscrita aos domínios da lei, ou seja, o governo deve obediência ao povo, que o elege e igualmente pode destituí-lo.

O termo soberania vem sendo empregado pelos doutrinadores desde o século XVI, vindo, desde então, a ser tratado sob óticas diversas e com nuances muitas vezes distintas. Entretanto, estas conceituações tornaram-se tecnicamente mais precisas, caminhando de um conceito eminentemente político para uma visão também jurídica. Partindo-se de um conceito jurídico-político Miguel Reale define soberania: “É o poder de organizar-se juridicamente e

261

ROUSSEAU. op. cit., p. 38.

262 ibid. 263

de fazer valer dentro de seu território a universalidade de suas decisões nos limites dos fins éticos de convivência” 264.

Em termos jurídicos, a soberania é compreendida como um poder, qualidade ou elemento constitutivo do Estado. É uma concepção de poder estatal incontestável, exercido sobre os indivíduos em um determinado limite territorial do Estado. No que tange à sua relação externa, a soberania pode ser vista como independência, com o reconhecimento de outros poderes iguais, mas nenhum que lhe seja superior265.

O conceito de soberania apresenta dois lados de uma mesma moeda, isto é, de um lado tem-se sua faceta interna, na qual o poder é exercido pelo Estado sobre o povo circunscrito aos seus limites territoriais; e de outro lado sua faceta externa, na qual se reconhece a independência e a proibição de intervenção em assuntos internos de outros Estados, em um patamar de igualdade entre os demais da sociedade internacional, possibilitando um diálogo entre os mesmos, sobre temas de interesses mundiais. Nos dizeres de Carré de Malberg “na ordem interna e externa, não se vêem mais que duas faces de uma única soberania266”.

A soberania passou a ser um dos pilares do jogo entre as nações, cuja construção remete à já citada Paz de Westfália, em 1648. A partir desse marco histórico, é reconhecida a soberania dos territórios e dos governos constituídos. A Paz de Westfália marcou de modo geral o início do sistema laico de relações internacionais, com a separação absoluta entre o poder temporal e espiritual, com a criação de uma estrutura legal e política das relações inter- estatais modernas, formada por Estados livres, autônomos e independentes. 

A soberania estatal é viga mestra para a manutenção da unidade política de um Estado, isto é, um Estado solidamente constituído com seus elementos essenciais, ou seja, povo, território, soberania e finalidade 267. No tocante à legitimação do poder estatal, inicialmente marcada pelo absolutismo, com a herética tese do direito divino dos reis, evoluiu-se para a democracia representativa.

O nacional deixou de ser um mero súdito para se tornar um legítimo cidadão,

264

REALE, Miguel. Teoria do Direito e Estado. 2.ed. São Paulo: Ed. Martins, 1960, p. 127.

265

DALARI, Pedro Paulo de Abreu. Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 1998, p.37. 266

PAUPÉRIO, A. Machado. O conceito polêmico de soberania. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p. 28 267

Nas palavras de Konrad Hesse: “Formação da unidade política não significa a produção de um estado harmônico de concordância geral, de todo, não a abolição de diferenciações sociais, políticas ou organizacional- institucionais por unificação total. Ela não pode ser pensada sem a existência e o significado de conflitos para a convivência humana. Conflitos são capazes do entorpecimento, de um ficar parado em formas superadas; eles são, embora não sozinhos, força movente, sem a qual transformação histórica não iria se efetuar”. HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Tradução da 20. ed. Alemã por Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1998, p. p. 30.

integrando-se, portanto, mais adequadamente ao seu Estado. Em obras doutrinárias do último quarto do século XX, podem-se encontrar caracterizações contemporâneas do termo soberania. Como a obra do constitucionalismo moderno de língua portuguesa, escrita por Canotilho:

A soberania, em termos gerais e no sentido moderno, traduz-se em um poder supremo no plano interno e em um poder independente no plano internacional. Se articularmos a dimensão constitucional interna com a dimensão internacional do Estado poderemos recortar os elementos constitutivos deste: poder político de comando; que tem como destinatários os cidadãos nacionais (povo = sujeitos do soberano e destinatários da soberania); reunidos em um determinado território. A soberania no plano interno (soberania interna) traduzir-se-ia no monopólio da edição do direito positivo pelo Estado e no monopólio da coação física legítima para impor a efetividade das suas regulações e dos seus comandos. Neste contexto se afirma também o caráter originário da soberania, pois o Estado não precisa recolher o fundamento de suas normas noutras normas jurídicas. A soberania internacional (termo que muitos constitucionalistas afastam preferindo o conceito de independência) é, por natureza, relativa (existe sempre o alter ego soberano de outro Estado), mas significa, ainda assim, a igualdade soberana dos Estados que não reconhecem qualquer poder acima deles.268

Atualmente, a soberania encontra-se relativizada pela globalização que inclusive trouxe à criação de organismos internacionais multilaterais efetivamente influentes em inúmeras questões de interesses mundiais. A soberania absoluta também tem sido relativizada, quando os Estados, procurando se defender dos efeitos da globalização econômica e do neoliberalismo, passam a se associar em blocos econômicos regionais, atuando de modo conjunto em determinados setores para conferir maior eficácia às suas ações.

O atual estágio da globalização trouxe algumas limitações sofridas pelos Estados, tendo em vista a grande interdependência entre eles e a vinculação com uma agenda internacional sobre temas comerciais, ambientais e sociais que almejam a padronização de comportamentos a nível internacional.

Dessa maneira, a globalização não se traduz apenas em um modo de produção capitalista, mas decorre da universalização dos padrões sócio-culturais e da necessidade de enfrentamento dos problemas mundiais que afetam a todos indistintamente, como a questão relativa à paz mundial. Todavia, o aspecto econômico da globalização promove a mercantilização das relações sociais e dos campos jurídicos nacionais, o que pode trazer como

268

CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1997, p. 83 e 84.

consequência, o abalo à ordem jurídico-política e às diferentes instituições estatais e civis que a regulam, afetando a própria face do Estado269.

Nesse contexto há que se ressaltar o que Dani Rodrik já havia denominado como “mantra da liberalização”, ou seja, vislumbrar-se de exemplos estrangeiros de liberalização econômica, sem considerar particularidades nacionais, levando à proliferação de discursos ideológicos, do populismo econômico e à desilusão das expectativas criadas pelas vantagens da globalização270.

As crises periódicas que enfrenta o sistema capitalista, nas quais, a mão invisível preconizada por Adam Smith, bem sintetizada na sua clássica frase, “a ambição individual serve ao bem comum” não consegue explicar que, apesar do mercado ser responsável pela geração de riquezas, ele não a distribui de forma equânime, nem no plano da economia interna nem entre os Estados. A globalização não resultou em um campo nivelado de competição, mas encontra-se sob um consórcio de autoridades financeiras que representam os interesses dos países desenvolvidos delimitado pelo Consenso de Washington, cujo escopo é impor disciplinas de mercado estritas a países individualmente considerados, mas que estão dispostas a desrespeitar as regras quando o mercado encontra-se sob ameaça271.

Hobsbawn manifesta ceticismo em relação à globalização, uma vez que, o final do século XX, ficou caracterizado pela tensão entre esse processo de globalização cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instituições públicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acomodarem a ele272.

Paradoxalmente, apesar do processo ser de fato global, somente uma parcela diminuta da população mundial tem acesso aos benefícios e vantagens trazidas pela globalização. Na época contemporânea, há duas versões básicas de globalização: uma hegemônica e satânica, que é a globalização neoliberal do capitalismo sem pátria, sem fronteiras, sem escrúpulos; outra a globalização da democracia, de caminhada lenta273.

269

KLAES, M. M. O fenômeno da globalização e seus reflexos no campo jurídico. In: OLIVEIRA, O. M. (Org.). Relações internacionais e globalização: grandes desafios. Ijuí: Ed. Unijuí, 1998, p. 191.

270

BARRAL, Welber. O comércio internacional. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 134.

271

SOROS, George. O novo paradigma para os mercados financeiros. A crise atual e o que ela significa. Rio de Janeiro: Agir, 2008, p.120.

272

HOBSBAWN, op. cit., p. 24.

273

BONAVIDES, Paulo. A globalização e a soberania: aspectos constitucionais. In: Revista do Instituto dos Advogados Brasileiro v. 34, n. 92, p. 26, abr./jun. 2000, p. 35.

O princípio da soberania resguarda que as decisões fundamentais se dêem de acordo com o interesse nacional, de maneira independente em relação a outros países e organismos, pautando-se pela observância das normas de ordem pública e aquelas inerentes à autonomia decisória do país.274 Segundo Angel Modesto Paredes "la noción de soberania comprende: la idea de igualdad entre los Estados, la de su libertad y la de de su independencia"275.

Perry Anderson retrata os direitos humanos como sendo o caminho pelo qual a noção de soberania dos Estados subordinados foi ultrapassada em favor de um arbitrário “direito de ingerência” dos Estados imperialistas. Segundo esse autor:

“(...) pode-se dizer que no campo das idéias a nova hegemonia mundial está baseada em duas transformações fundamentais em relação ao discurso dominante durante a Guerra Fria: a) a auto-afirmação do capitalismo declarado como tal e não simplesmente como um mero sistema socioeconômico preferível ao socialismo mas como o ‘único’ modo de organizar a vida moderna concebível para a humanidade de hoje e para todo o sempre; b) a explícita anulação da soberania nacional como chave das relações internacionais entre os Estados, em favor dos direitos humanos”276.