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CAPÍTULO 1 O USO DA FORÇA E SUA REGULAMENTAÇÃO

1.4 O REALISMO APÓS A GUERRA FRIA: O PAPEL DA OTAN

A reflexão teórica dos realistas, já comentada em seus aspectos mais gerais, esteve profundamente ligada à situação de bipolaridade da Guerra Fria. O término da disputa ideológica capitalismo versus comunismo e da corrida hegemônica entre a ex-União Soviética e os EUA, deu ensejo à multipolarização, com o surgimento de novas potências que já estavam fortemente estruturadas para disputarem novos mercados no comércio internacional.

Com a globalização, as novas tecnologias de informação, os avanços dos meios de comunicação e transportes impulsionaram sobremaneira o comércio internacional e os Estados, por sua vez, se empenharam em regulamentar, em nível internacional, os novos temas comerciais. Não obstante, o tema de direitos humanos tão propalados após a Segunda Guerra Mundial, bem como meio ambiente e desenvolvimento sustentável, foram igualmente alvo de inúmeras discussões e regulamentações.

Os avanços da revolução tecnológica e da internacionalização dos capitais proporcionados pela globalização retomaram gradativamente a importância da diplomacia, conforme se eliminavam os confrontos ideológicos da Guerra Fria. O conceito de segurança não se restringiu apenas em termos de guerra e paz, mas passou a abarcar outros valores, como o econômico, o social e o político. Essa mudança na ordem global foi o final de um período no qual:

Quarenta anos de medo e suspeita, de semear e colher obstáculos industrial militares, não podiam ser tão facilmente revertidos. [...] Foi o colapso do Império Soviético em 1989, a desintegração e dissolução da própria URSS em 1989-91 que tornaram impossível fingir, quanto mais acreditar, que nada tinha mudado.196

A ruptura da disputa hegemônica entre Estados Unidos e União Soviética foi tão grande que embora o mundo tenha permanecido como um sistema, do ponto de vista estratégico, o mundo também permaneceu formalmente como uma sociedade internacional, com uma estrutura de Direito Internacional, de representação diplomática. O desenvolvimento

196

acentuado da tecnologia, das comunicações, bem como o alcance dos armamentos continuou a tornar o mundo mais integrado, de modo que cada Estado se viu mais limitado e pressionado do que antes, surgindo novos padrões de pressão e de interesse197.

O período pós-guerra fria foi marcado pela reorganização do cenário mundial em uma nova estrutura. A bipolaridade cedeu espaço ao despontar de outras potências, ensejando uma nova ordem global. Deixou de existir a disputa em torno do capitalismo versus comunismo.

Várias mortes ocorreram em conflitos disputados por aqueles que acreditavam que a forma como o sistema era escolhido determinava o desenvolvimento da humanidade. A ascensão definitiva do capitalismo, sobrando apenas Cuba como reduto comunista, propiciou uma nova realidade, pela qual o poderio militar iria ganhar novos contornos e novas justificativas.

Nesse quadro, o realismo necessita ser repensado, de acordo com esse novo contexto. O debate logo após o fim da guerra fria referiu-se à expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em direção ao leste, visto envolver questões de estratégia militar e de política internacional.

O Tratado do Atlântico Norte que criou a Organização do Tratado do Atlântico Norte foi assinado, em Washington, em 4 de Abril de 1949. Constituída inicialmente por Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, França, Islândia, Itália, Luxemburgo, Holanda, Noruega, Portugal e Reino Unido, a OTAN, com o decorrer dos anos assistiu a entrada de novos Estados na aliança, como por exemplo, a Grécia e Turquia em 1952, a então República Federal da Alemanha (Alemanha Ocidental) em 1955 e a Espanha em 1982.

Constituiu uma organização de colaboração militar criada para conter a ameaça comunista, determinando que o ataque a um dos membros da aliança ensejaria a tomada de armas para a defesa do agredido, sendo um verdadeiro “instrumento para uma ação bélica dos países capitalistas.198

Não obstante a dissolução da URSS, a Rússia possuía armamentos bélicos superiores aos membros europeus da OTAN. Portanto, era estratégico para os Estados Unidos manter a liderança na OTAN para impedir eventualmente que algum outro Estado superasse sua capacidade militar.

As instabilidades políticas, econômicas e sociais causadas na região da antiga Iugoslávia e algumas regiões da antiga URSS ensejaram vários conflitos regionais, principalmente, de natureza étnica que acabaram “justificando” a necessidade de manutenção

197

WATSON, op. cit., p 409-417.

198

SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva. Manual das organizações internacionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000, p. 243.

da aliança como meio de cooperação entre seus membros para a preservação da segurança na região.

Aprofundaram-se os assuntos de segurança e de medidas de confiança, bem como a organização passou a atuar em operações de manutenção de paz, em geral, em coordenação com outras organizações internacionais. Já o Pacto de Varsóvia criado em 1955 em resposta à OTAN formado pelos países socialistas do Leste Europeu e pela União Soviética foi extinto em 1991.

Com o fim da Guerra Fria, bem como o desaparecimento da União Soviética e do Pacto de Varsóvia, três outros países outrora integrantes da aliança militar socialista ingressaram na OTAN em 1999: a República Tcheca, a Hungria e a Polônia. Assim, não existindo mais o perigo comunista à Europa Ocidental, a OTAN passou por um processo de reestruturação, uma vez que o motivo de sua existência perdera sentido.

Para adaptar-se a essa nova realidade, outras funções foram sendo realizadas, como a organização de tarefas e operações de manutenção e preservação da paz, combate ao terrorismo e à proliferação de armas de destruição em massa. O número de guerras civis, envolvendo questões de nacionalidade ou minorias aumentou nesse período progressivamente, tornando o mundo, efetivamente em uma aldeia global.

Os novos papéis da OTAN de gestão de crises e de apoio da paz assumiram crescente importância a partir de meados dos anos 90. Entre 1992 e 1995, as forças da OTAN envolveram-se na guerra da Bósnia em apoio das Nações Unidas. A NATO Implementation

Forces (NATO IFOR) era composta por forças multilaterais para atuar no território da Bósnia

Herzegovina por um ano. A IFOR foi composta com o efetivo de 53 mil militares, dentre eles 20 mil eram dos Estados Unidos, 13 mil da Inglaterra, 8 mil da França, 4 mil da Alemanha e o restante de outros países não filiados à OTAN.

Em 1993, a OTAN, constrangida em virtude dos massacres ocorridos nas “zonas de segurança” da ONU na antiga Iugoslávia, bem como pela incapacidade dos europeus de impedi-los, bombardeou armas e linhas de abastecimento da Sérvia na Bósnia. Referido bombardeio se deu de acordo com um mandato, conferido pela Resolução n. 836 do Conselho de Segurança da ONU, de 4 de junho de 1993, que estabelecia estreita cooperação a respeito dos alvos a serem visados entre a OTAN e o secretário-geral da ONU, Boutros-Ghali. Todavia, o acordo restou ineficaz.199

199

Em 1994, a OTAN lançou um plano denominado Partnership for Peace. Trata-se de um programa concebido para auxiliar os países participantes a reestruturar as suas forças armadas de modo que estas tenham condições de desempenhar o papel que lhes compete em uma sociedade democrática e participar nas operações de manutenção da paz dirigidas pela OTAN.

Em julho de 1995, mais de sete mil homens e meninos muçulmanos foram massacrados na “zona de segurança” de Srebrenica pelo Exército Sérvio da Bósnia, enquanto quatrocentos militares holandeses das forças de manutenção de paz observavam, sem terem conseguido o solicitado apoio aéreo da OTAN200. Esse episódio ficou conhecido como o “Massacre de Srebrenica”. Em 2001, o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia confirmou que o massacre constituía genocídio ao condenar o general iugoslavo Radislav Krstić a uma pena de quarenta e seis anos de prisão201.

Em 1997, foi criado o Euro-Atlantic Cooperation Council, agregando todos os países do Partnership for Peace com os membros da OTAN; e o Founding Act on Mutual Relations,

Cooperation and Security between NATO and a Russian Federation. Na mesma ocasião foi

assinado o Charter on a Distintive Partnership between the North Atlantic Treaty

Organization and Ukraine. Esses acordos visavam facilitar as consultas e debates regulares

sobre assuntos de segurança. Os temas debatidos nas reuniões destes órgãos têm abrangido questões como a manutenção da paz nos Bálcãs, a gestão de crises, a não proliferação de armas de destruição em massa, a conversão das indústrias de defesa, a proteção ambiental e o planejamento de emergências civis202.

Em 1998, ganhou intensidade o conflito separatista no Kosovo, província de maioria albanesa (mais de oitenta por cento) controlada pela Iugoslávia. A grande violência do Exército de Libertação do Kosovo - KLA (movimento guerrilheiro de etnia albanesa) e o exército iugoslavo possibilitaram a intervenção da OTAN, em 1999.

200

BYERS, op. cit. p., 36. 201

Em dezembro de 2004, a promotora do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia Carla Del Ponte criticou os governos dos países membros da OTAN por terem feito pouco para levar ao banco dos réus os dois acusados pelas atrocidades cometidas na Bósnia-Herzegovina, pelos já indiciados, Radovan karadzic e Ratko Mladic. Em, 21 de julho de 2008, Radovan Karadzic foi detido, acusado pelo Tribunal Penal Internacional para a Antiga Iugoslávia (TPII) de genocídio em Srebrenica e de 11 crimes e do bombardeamento de Sarajevo durante o cerco à capital bósnia. Todavia, em 2009, a defesa de Karadzic está alegando um acordo de imunidade celebrado entre o líder sérvio-bósnio e o diplomata norte-americano, Richard Holbrooke e pedindo o fim do julgamento. Para averiguar a veracidade de tal acordo, a justiça irá ouvir Holbrooke e outras alegadas testemunhas norte-americanas e ex-iugoslavas.

202

A OTAN no século XXI. NATO Public Diplomacy. Disponível em:<www.nato.int>. Acesso em: 20 de ago. 2009.

Muitos mercenários mujaidins entre 1998 e 1999 foram recrutados do Oriente Médio e da Ásia para enfrentar o Exército de Libertação do Kosovo. Segundo fontes militares britânicas, a tarefa de armar e treinar o KLA foi confiada em 1998 à US Defense Intelligence

Agency (DIA), aos serviços de inteligência Britânicos (MI6), assim como a “membros antigos

e em serviço do 22 SAS (22º Regimento da Força Aérea da Grã-Bretanha) e a três companhias inglesas e estadunidenses de segurança privada”203.

Diante de ataques constantes do Exército de Libertação de Kosovo contra alvos sérvios, o presidente da Sérvia, Slobodan Milosevic, iniciou uma brutal repressão. Em duas ocasiões o Conselho de Segurança da ONU considerou que a situação caracterizava ameaça “à paz e a segurança internacionais” até que Milosevic, que estava sob guerra por parte da OTAN entrou em negociações com o KLA. Todavia, embora quase se tenha conseguido chegar a um acordo de paz, Milosevic acabou opondo resistência a uma cláusula pela qual as forças da OTAN teriam acesso irrestrito a todo o território iugoslavo, e não apenas ao Kosovo, algo que é totalmente contrário ao princípio da soberania.

Na ocasião a organização fez mais de 25 mil incursões aéreas, bombardeando a Iugoslávia e pressionando o presidente Slobodan Milosevic, a aceitar o acordo para a pacificação na região. A rendição incondicional da Iugoslávia foi obtida em mais uma guerra com características devastadoras e sem nenhum registro de morte de militar a serviço da OTAN. Nas palavras de Perry Anderson:

A agressão militar contra a Iugoslávia, lançada pela OTAN, foi abertamente justificada como uma superação histórica do fetiche da soberania nacional em nome de valores mais altos, ou seja, em nome do valor dos direitos humanos. Desde então, um exército de juristas, filósofos e ideólogos vem construindo uma nova doutrina de ‘humanismo militar’, buscando demonstrar que a soberania nacional é um anacronismo perigoso nesta época de globalização, e que pode e deve ser pisoteada para a universalização dos direitos humanos, tal como estes são entendidos pelos países mais avançados e, logicamente, ilustrados. Hoje, no Iraque, vemos o fruto dessa ‘apoteose’ dos direitos humanos204.

A intervenção foi realizada sem a tentativa de discutir nos meses anteriores ao ataque a questão no Conselho de Segurança da ONU. Diante disso, a Rússia apresentou no Conselho de Segurança uma resolução condenando o ataque, a qual foi derrotada devido ao voto

203

The Scotsman, Edimburgo, 29 de agosto de 1999. Apud. CHOSSUDOVSKY, Michel. op. cit, p. 64.

204

ANDERSON, Perry. “A Batalha das Idéias na Construção de Alternativas” in: Nova Hegemonia Mundial - Alternativas de mudança e movimentos sociais. São Paulo – Buenos Aires: Clacso, 2005, p. 39.

contrário dos cinco países da OTAN que então participavam do Conselho. Apenas a Bélgica e o Reino Unido tentaram justificar a guerra no Kosovo, invocando um direito legal de intervenção humanitária unilateral.

Importante salientar que a Guerra no Kosovo foi considerada controversa, visto que os Estados Unidos foram os únicos membros da OTAN que não ratificaram o I Protocolo às Convenções de Genebra de 1977, que estabelece proteções maiores para os civis do que as referidas Convenções, o que será analisado pormenorizadamente mais adiante. Assim sendo, embora a Iugoslávia tivesse ratificado o Protocolo, os EUA não estavam obrigados a cumpri- lo, permitindo que certas missões fossem efetuadas apenas por pilotos americanos.

Ainda restou a questão sobre se os outros países poderiam ser coletivamente responsabilizados pelas ações de pilotos americanos em operações empreendidas segundo as táticas da OTAN. A promotora do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia Carla del Ponte decidiu não investigar os alegados crimes de guerra cometidos pela OTAN.

A intervenção da OTAN no Kosovo foi justificada como “ação de interesse da comunidade internacional”, como apontam os discursos do Secretário Geral da organização Javier Solana, à época da ação militar. Segundo ele: “Devemos pôr fim à violência e acabar com a catástrofe humanitária que vem ocorrendo” 205.

A guerra do Kosovo não ocorreu conforme o Direito Internacional nem foi capaz de modificá-lo em favor da adoção de um direito de intervenção humanitária internacional. Tony Blair ao mencionar a intervenção unilateral justificou-a com o seguinte argumento: “Trata-se, no Kosovo, de uma guerra de um novo tipo, que se reporta mais a valores que a um território”

206

.

O episódio deixa claro que não se tratou de uma ajuda humanitária e sim de uma questão de estratégia geopolítica, buscando legitimar a invasão por meio de argumentos humanitários, muito embora em outros locais alvos de atrocidades como em Serra Leoa, Libéria e Angola a sua presença não foi “necessária”.

A retórica dos direitos humanos vem sendo utilizada há tempos para justificar atos encabeçados pelas potências centrais, cujos fins não se revelam nada nobres. A OTAN não poderia intervir militarmente fora do território da aliança sem o mandato de autorização da ONU, o que contribuiu para a incredibilidade da ONU de impor as suas resoluções, os seus princípios e objetivos expostos na Carta. Deduz-se, assim, que o bombardeio da Iugoslávia

205

BYERS, op. cit., p. 127.

206

VIRILIO, Paul. Estratégia da decepção, trad. Luciano Vieira Machado, São Paulo: Estação Liberdade, 2000, p. 11.

não pode ser enquadrado em nenhuma das exceções ao princípio que proíbe a ameaça ou uso da força (art. 2º, § 4º, da Carta) 207.

No seu 50º aniversário, a OTAN aprovou um novo conceito estratégico, ampliando seu mandato original, visto ter recebido mandato para atuar em operações humanitárias, anti- terroristas, anti-drogas e quando existirem ameaças indefinidas ao meio ambiente, à paz e à democracia. Adotou-se as denominadas forças-tarefas conjuntas combinadas (Combined Joint Task Forces, CJTFs) que podem ser deslocadas em função de objetivos especificamente

europeus no quadro da aliança liderada pelos Estados Unidos.

Nessa ocasião, os chefes de Estado da Geórgia, Ucrânia, Uzbequistão, Azerbaijão e Moldávia compareceram em Washington para assinar a GUUAM (Geórgia, Ucrânia, Uzbequistão, Azerbaijão e Moldávia), uma aliança militar regional estrategicamente localizada em uma região de riqueza em petróleo e de gás do mar Cáspio, visto que a “Moldávia e a Ucrânia ofereciam rotas de exportação (dutos) para o Ocidente”. Logo após, a Geórgia, o Azerbaijão e o Uzbequistão anunciaram que abandonariam a Comunidade de Estados Independentes (CEI), “a união de segurança” que define o quadro da cooperação militar entre as antigas repúblicas soviéticas. A GUUAM pretende, em última análise, excluir a Rússia das reservas de petróleo e gás da região do Cáspio, isolando-a politicamente208.

No início de 2000, o então presidente da Rússia, Vladimir Putin, transformou em lei, uma nova “doutrina de segurança nacional”. Essa lei representou uma mudança nas relações entre Oriente e Ocidente, reafirmando a construção de um Estado russo forte, o crescimento do exército e a reintrodução de controles estatais sobre o capital estrangeiro. O documento qualificava o que considerava “ameaças fundamentais” à segurança nacional e à soberania da Rússia. Em especial, referia-se ao “fortalecimento dos blocos políticos e militares e das alianças (principalmente a GUUAM), bem como a “expansão da OTAN para leste”, destacando o possível surgimento de bases militares estrangeiras e presenças militares importantes nas imediações das fronteiras russas “209.

Todavia, notadamente a partir de 11 de setembro de 2001, Putin assinala uma mudança na política externa da Rússia, no sentido de uma aproximação com Washington, tendo como conseqüência a aceitação da “ampliação da OTAN” para os países bálticos, Letônia, Lituânia e Estônia e do estabelecimento de bases aéreas da OTAN na fronteira

207

FRANÇA, Paulo Roberto Caminha de Castilhos. A Guerra do Kosovo, a OTAN e o conceito de “Intervenção Humanitária”. Porto Alegre, Editora da UFRGS, 2004, p. 137.

208

CHOSSUDOVSKY, Michel. Guerra e globalização: Antes e depois de 11 de setembro de 2001. São Paulo: Expressão Popular, 2004, p. 93.

209

Federation of American Scientists - FAS (fas.org/nuke/guide/rússia/doctrine/gazeta012400.htm). Apud. CHOSSUDOVSKY, Op. cit., p.158.

ocidental da Rússia. Essa postura com vistas a uma “integração à comunidade mundial”, na prática teve como objetivo integrar a Rússia ao sistema econômico, político e militar ocidental, ainda que na qualidade de sócio menor, ou ao preço de sacrificar sua independência no que se refere à política externa210.

Houve um estreitamento também das relações entre a aliança e a União Européia. A UE gradativamente absorveu as funções e responsabilidades da União da Europa Ocidental (UEO). Esta transferência de responsabilidades propiciou o aprofundamento da relação entre a OTAN e a União Européia, sendo que em março de 2003 o Alto Representante da UE e o Secretário-Geral da OTAN concluíram uma parceria para assegurar uma eficiente gestão de crises. Para tanto aprovaram os dispositivos mútuos de consulta, que envolvem o Comitê Político e de Segurança da UE e o Conselho Norte-Atlântico, o Comitê Militar da UE e da OTAN e o Alto Representante da UE e o Secretário-Geral da OTAN211.

Em um encontro da OTAN ocorrido em outubro de 2005, o comandante-em-chefe da organização, o general norte americano James Jones, frisou que a aliança deixou de ser, com o fim da guerra fria, uma “pura maquinaria militar” para acomodar “as novas exigências de manutenção da paz e de operações preventivas e humanitárias.” Segundo ele, as futuras atividades de segurança precisariam ser realizadas conjuntamente com a iniciativa privada, sendo três campos de atividades prioritários212:

- a segurança contra ataques terroristas aos dutos de petróleo e de gás que vão da Rússia para a Europa Ocidental;

- a segurança dos portos nos países da aliança e do tráfego marítimo internacional; - segurança do Golfo da Guiné, rico em petróleo. Essa região responsável pelo gasto de bilhões de dólares com segurança pelas companhias petrolíferas representa segundo Jones, por causa da pirataria, do roubo, da instabilidade política e das tensões entre cristãos e muçulmanos, um sério problema de segurança para os países da OTAN.

No dia do 60º aniversário da OTAN, em uma entrevista ao Russia Today, sobre

“Kosovo, Afeganistão e OTAN” o professor Chomsky teceu os seguintes comentários sobre o Kosovo:

210

V. Tetekin, “Putin’s ten blows”, CRG, (globalresearch.ca/articles/TET112A.html), 27 de dezembro de 2001. CHOSSUDOVSKY, op. cit., p.163-4.

211

PEREIRA, Sandra. Segurança e defesa europeia: qual a articulação entre as organizações internacionais no pós guerra- fria? Disponível em: www.ciari.org/investigacao/seguranca_e_defesa_ europeia.pdf . Acesso em: 20.08.09.

212

Nato Means Business to Protect Pipelines. In: United Press International, 26 out. 2005. Apud. UESSELER, Rolf. Guerra como Prestação de Serviços. São Paulo: Estação Liberdade, 2009, p. 161.

Há enormes quantidades de registros do Departamento de Estado, da OTAN, de monitores, e todos dizem a mesma coisa. Foi baixo o nível de violência dos ataques do Exército de Libertação do Kosovo (Kosovo Liberation Army, KLA), da Albânia e das forças sérvias, as disputas não eram pesadas e sabiam que, se respondessem, só fariam aumentar muito o nível de atrocidade, como, de fato, se viu acontecer213.

No Afeganistão, cerca de metade dos ministros são estrangeiros membros de partidos políticos dos países ocupantes. O Exército afegão serve mais efetivamente para dar a impressão de que a OTAN não está sozinha nas suas missões de morte e na perpetração dos