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4 OS (DES)CAMINHOS DA DEMOCRACIA: O ESTADO GERENCIAL

4.4 Os (des)caminhos da democracia: o Estado Gerencial

A segunda metade do século XX foi marcada por constantes e crescentes crises no sistema capitalista: crise de produção, na esfera social, de infraestrutura dos Estados (estradas, hospitais etc.), energética, político-ideológica (ameaça do socialismo), dentre outras crises sócio metabólicas, ameaçando sua sobrevivência enquanto modelo de produção hegemônico do capital.

Para superar a crise do capitalismo, corrigindo os desequilíbrios do mercado, desenvolveu-se, a partir da Grã-Bretanha, em 1942, teorias político-econômicas e sociais que resultaram no Estado de Bem-estar social (Estado Providencia Europeu e/ou Welfare State americano): modelo de Estado fundado em políticas de intervenção social objetivando

eficiência econômica e tendo como princípios a teoria econômica de John Maynard Keynes (Cambridge/Reino Unido, 1883-1946).

Diante da crise do mercado de produção-consumo, Grande Depressão (1929- 1932), Keynes questionou a Lei de Say (Lei dos Mercados), sugerindo mecanismos de intervenção e controle do Estado. Sem romper com a ideologia liberal, Keynes propôs uma saída heterodoxa da crise econômica: reformas pontuais visando a preservação da ordem vigente e assegurar a manutenção do modo de produção e a ampliação do capital.

A teoria keynesiana propôs um Estado regulador da economia e provedor de políticas sociais, mas sem sociabilizar os meios de produção, ou seja, estabelece-se a união entre Estado e Mercado. A esse respeito, Behring e Boschetti (2011, p. 63) são esclarecedores:

[...] não existe polarização irreconciliável entre Estado liberal e Estado social, ou de outro modo, não houve ruptura radical entre o Estado liberal predominante no século XIX e o Estado social capitalista do século XX. Houve, sim, uma mudança profunda na perspectiva do Estado, que abrandou seus princípios liberais e incorporou orientações socialdemocratas num novo contexto socioeconômico e da luta de classes, assumindo um caráter mais social, com investimento em políticas sociais.

Como agente regulador, mantenedor da ordem e das relações de produção e reprodução – indispensáveis à acumulação sob a égide do capital – o Estado é indispensável para o sistema capitalista. Cabe, em grande medida, ao Estado à sua manutenção frente às crises.

[...] a crise não é um acidente de percurso, não é aleatória, não é algo independente do movimento do capital. Nem é uma enfermidade, uma anomalia ou uma excepcionalidade que pode ser suprimida no capitalismo. Expressão concentrada das contradições inerentes ao MPC [Modo de Produção Capitalista], a crise é constitutiva do capitalismo: não existiu, não existe e não existirá capitalismo sem crise. (NETTO; BRAZ, 2008, p. 157).

O Estado com base no keynesianismo foi fundamental para o reequilíbrio do mercado. Por meio de suas políticas intervencionistas, o Estado tornou-se o principal consumidor de bens (estradas, escolas, hospitais etc.), adquiridos da iniciativa privada. Além disto, criou empresas estatais (capitalismo de Estado), ocupando em grande medida o lugar de consumidor principal do Capital, no lugar do cidadão. E, também, tornou-se provedor de serviços, dinamizando a economia ao gerar empregos, garantindo uma renda mínima, promovendo políticas sociais para encobrir as desigualdades sociais, disseminando o poder de consumo e preservando a organicidade fordista:

[...] o keynesianismo e o fordismo, associados, constituem os pilares do processo de acumulação acelerada de capital no pós-1945, com forte expansão da demanda efetiva, altas taxas de lucros, elevação do padrão de vida das massas no capitalismo central, e um alto grau de internacionalização do capital, sob o comando da economia norte-americana, que sai da guerra sem grandes perdas físicas e com imensa capacidade de investimento e compra de matérias-primas, bem como de dominação militar. (BEHRING; BOSCHETTI, 2011, p.88).

A época marcada pela relação keynesianismo e fordismo-taylorismo, conhecida como Era de Ouro93, reflete a natureza do Estado, como assevera Weber (1999): “O Estado, como todas as associações políticas que o precederam historicamente, é uma relação de domínio de homens sobre homens, suportada por meio de violência legítima” (WEBER, 1999, p.50).

Weber (1999), entendia o Estado como figura central da estrutura societal capitalista e a constituição de seu aparato administrativo (organização burocrática) como necessária e inevitável para o funcionamento da máquina com atribuições especificadas e regulamentadas, vinculadas à consecução de objetivos determinados, caracterizando o paradigma burocrático weberiano ou como destaca Antunes (2009, p.40):

Pode-se dizer que junto com o processo de trabalho taylorista/fordista erigiu-se particularmente durante o pós-guerra, um sistema de “compromisso” e de “regulação” que, limitado a uma parcela dos países capitalistas avançados, ofereceu a ilusão de que o sistema de metabolismo social do capital pudesse ser efetiva, duradoura e definitivamente controlado, regulado e fundado num compromisso entre capital e trabalho mediado pelo Estado.

O Estado, portanto, afirma-se como amortecedor dos conflitos entre as classes antagônicas, um preservador da ordem e que cria condições para a expansão do modelo econômico-social hegemônico, na ordem do capital, representando os interesses da classe dominante, operando a divisão da sociedade em classes. (ENGELS, 1984 [1884]). Nesse sentido,

Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentos dominantes; em outras palavras, a classe que é o poder material dominante numa determinada sociedade é também o poder espiritual dominante. A classe que dispõe dos meios da produção material dispõe também dos meios da produção intelectual, de tal modo que o pensamento daqueles aos quais são negados os meios de produção intelectual está submetido também à classe dominante. Os pensamentos dominantes nada mais são do que a expressão ideal das relações materiais dominantes. (MARX; ENGELS, 2007 [1845 / 1932], p. 48).

93 Expressão cunhada por Hobsbawm, que expressa o crescimento econômico, do período pós-guerra (mais precisamente, 1950 a 1973), e pela democratização do mercado. “Na prática, a Era de Ouro foi a era do livre comércio, livre movimentos de capital e moedas estáveis que os planejadores do tempo da guerra tinham em mente. Sem dúvida isso se deveu basicamente à esmagadora dominação econômica dos EUA e do dólar, que funcionou como estabilizador por estar ligado a uma quantidade específica de ouro, até a quebra do sistema em fins da década de 1960 e princípios da de 1970.” (HOBSBAWM, 2011, p. 270).

Mas, a relação Estado, classe dominante e Capital, ergue-se sob alicerces contraditórios, como por exemplo: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. A igualdade é meramente formal; a fraternidade é corporativista/seletiva, em uma sociedade egoísta; e, a liberdade retrata a contradição inexorável do sistema capitalista. A tríade, centrada na propriedade privada, na livre iniciativa, não pode gerar a igualdade de todos; quando aspira-se socializar os meios de produção e findar com a venda da força de trabalho, esta liberdade é cerceada (essa situação conduz a mecanismos de controle – coerção, normatização, etc. – para conter a instabilidade social).

Com o fim da Guerra Fria, evidenciou-se que o keynesianismo e o fordismo- taylorismo não contiveram as pressões advindas das contradições próprias do capitalismo. As políticas keynesianas mergulharam o sistema em uma crise inflacionária, decretando o término da Era de Ouro. Na década de 1970 iniciou-se um novo ciclo de crise do capitalismo, marcados pela: queda nas taxas de lucro, crise fiscal dos Estados, esgotamento do padrão de acumulação, redução de investimentos públicos em políticas sociais e a inauguração de uma era de privatizações.

O ciclo depressivo, iniciado nos anos 1970, vinculado à transformação no mundo do trabalho e da produção, da circulação e da regulação (HARVEY, 2004, 2008, 2011, 2013), pressionou por uma refuncionalização do Estado. A identificação dos responsáveis pela crise que se abateu sobre o mundo do capital, cujos algozes investigadores eram os representantes do Mercado, identificou como bode expiatório o Estado – e mais especificamente o Estado do Bem-estar Social.94

O neoliberalismo, teorizado por pensadores como Friedrich Hayek (Escola de Frankfurt) e Milton Friedman (Escola de Chicago) alicerçaram essa concepção. A partir da disseminação dos princípios econômicos-sociais e políticos definidos pelos pensadores neoliberais, operou-se uma definição de novos arranjos do liberalismo clássico, conforme expressão Carcanholo e Baruco (2011, p. 15):

[...] dados pela filosofia dos direitos naturais, o que significa que o ser humano, com base em sua natureza, possui determinados tipos de comportamento moral. O chamado homem econômico seria uma consequência da natureza humana. Já no neoliberalismo as esferas políticas e sociais são reflexos da economia. O comportamento econômico maximizador do indivíduo, que em sua escolha racional otimizadora aplica análises de custo-benefício, é que determina o comportamento do

94 Com a crise do modelo Welfare State (EUA) / Estado do Bem-estar (Estado Provedor - Europa), fez-se necessário uma reificação do Estado moderno, tendo em vista sua relação simbiotica com a economia e a sociedade de mercado. Neste aspecto é intrigante uma indagação de Bobbio, na obra O futuro da democracia: “Como então se pode definir uma situação em que a mesma forma de estado é condenada como capitalista pelos marxistas velhos e novos, e como socialista pelos velhos e novos liberais?” (BOBBIO, 2000, p. 148).

ser humano nas outras esferas, social, política etc. Por outro lado, se antes, no liberalismo clássico, os valores fundamentais do homem eram a razão e a liberdade, além do que, com maior clareza em autores como Rousseau, liberdade e igualdade, ao menos no plano mais formal, jurídico, fossem quase que inseparáveis, no neoliberalismo a liberdade passa a se subordinar aos ditames da economia. Mais precisamente, no neoliberalismo a desigualdade passa a ser um valor, algo desejável, no sentido de que, do ponto de vista econômico, a desigualdade como meta é o que dá sentido à busca por produtividade e eficiência, enquanto que, do ponto de vista moral, o incentivo ao esforço pessoal só teria sentido com a desigualdade, ou melhor, a diferenciação social seria o prêmio por aquele primeiro.

Consoante Harvey, o neoliberalismo é uma política com forte viés ideológico que altera a própria subjetividade dos indivíduos, concomitante à instauração de uma nova sociabilidade: a hegemonia neoliberal afeta “tão amplamente os modos de pensamento que se incorporou às maneiras cotidianas de muitas pessoas, interpretarem, viverem e compreenderem o mundo.” (HARVEY, 2011, p.13). Harvey ainda acrescenta que esse sistema foi amplamente legitimado e disseminado:

Fortes influências ideológicas circularam na corporação, nos meios de comunicação e nas numerosas instituições que constituem a sociedade civil – universidades, escolas, Igrejas e associações profissionais. A “longa marcha” das ideias neoliberais nessas instituições, que Hayek concebera já em 1947, a organização de bancos de ideias (apoiados e financiados por corporações), a cooptação de certos setores dos meios de comunicação e a conversão de muitos intelectuais a maneiras neoliberais de pensar – tudo isso criou um clima de opinião favorável ao neoliberalismo como o garante exclusivo da liberdade. Esses movimentos, mais tarde, se consolidaram com o domínio dos partidos políticos e, em última análise, o poder do Estado. (HARVEY, 2011, p. 50).

O neoliberalismo dissemina-se “[...] como ideologia e prática, modo de compreender e agir, forma de gestão do mercado e poder político, concepção do público e privado, ordenação da sociedade e visão do mundo” (IANNI, 2008, p. 58), configurando uma espécie de sociedade mediada pelo mercado, desenvolvendo a ideologia do Fim da História.

Tanto a crise do capitalismo como a do Estado keynesiano originam-se da profunda crise do capital: “De fato, a denominada crise do fordismo e do keynesianismo era a expressão fenomênica de um quadro crítico mais complexo. Ela exprimia, em seu significado mais profundo, uma crise estrutural do capital.” (ANTUNES, 2009, p.33).

Era chegado o momento de uma nova reestruturação do Estado, objetivando superar a crise estrutural do capital, por meio da substituição do modelo da administração racional burocrática (taylorista-fordista) e adoção de um novo paradigma, com vista a implementar a modernização do Estado alicerçado na descentralização, na flexibilização, no controle de resultados: é o modelo público gerencial – o que constitui a Reforma Gerencial, com a superação do padrão burocrático de administração e a montagem do Estado Gerencial.

Com os desdobramentos da reestruturação produtiva, do neoliberalismo e o avanço da globalização o mercado tornou-se mais competitivo, impondo ao Estado uma política de redução de seus custos operacionais e investimentos (políticas públicas e insumos), a fim de financiar a dívida pública, a mundialização financeira e a onda especulativa nas bolsas de valores – passou-se a se estabelecer novas práticas e paradigmas para a gestão da coisa pública, a lógica concorrencialista colocou-se como mola mestra do Estado.

O tamanho do Estado passou a ser um obstáculo para os projetos neoliberais. O Estado foi taxado de excessivamente lento, burocrático e cuja dimensão intervencionista dificultava o avanço da economia. Além disto, a elevada autonomia, ligada a estabilidade funcional, gerava cada vez mais despesas e dificuldades de controlar ou gerir a máquina pública, ampliando as possibilidades do exercício das práticas clientelistas e patrimonialistas na esfera pública.

Diante disto, o Estado é tomado por ineficiente e oneroso dificultando, segundo os ditames neoliberais, o dinamismo do mercado. A burocracia e ineficiência pública impediam o correto controle ou fiscalização do Estado, o que é expresso por Przeworski (1998, p. 57):

Os cidadãos só podem exercer um controle indireto sobre a burocracia, uma vez que as instituições democráticas não contam com mecanismos que permitam aos cidadãos sancionar diretamente as ações legais dos burocratas. No máximo, os cidadãos consideram o desempenho da burocracia ao sancionarem, pelo voto, os políticos eleitos. (...) Embora esperemos que a burocracia estatal preste serviços aos cidadãos, impomos a ela o dever de prestar contas aos políticos (ou a entidades cujos membros são nomeados pelos políticos, como os tribunais ou algumas agências administrativas de acompanhamento ou supervisão.

O Estado burocrático estaria envolto em uma política autocentrada, apartada do cidadão, no que Przeworski (1998) denomina relação principal vs agent95 e que se estabelece

por meio de um pacto existente entre políticos (principal) e burocratas (agents): os burocratas por disporem de expressiva autonomia – ampliada pela dificuldade de fiscalização – e influência – por acesso a informações privilegiadas – exercem maior influência que o cidadão comum, que não usufrui de estabilidade, aspectos presentes na prática denominada rent

95 “Suponha que seu carro comece a fazer barulhos estranhos. Você vai a um mecânico, explica o problema, deixa o carro e aguarda o resultado. No dia seguinte, o carro está pronto, o mecânico lhe diz que teve de trocar os amortecedores e que isso lhe tomou cinco horas. Você paga e sai com o carro da oficina. O barulho cessou. Você escolhe o mecânico e pode recompensá-lo voltando a usar seus serviços - se ficou satisfeito com o trabalho — ou puni-lo, procurando outra oficina, se não gostou do serviço. Mas o mecânico sabe de muitas coisas que você não sabe: se ele se empenhou para fazer o melhor trabalho possível, ou se fez o mínimo necessário; se o carro precisava de um pequeno ajuste ou de um conserto maior; se ele executou mesmo o trabalho em cinco horas, ou se bastou uma hora. Você é o principal, o mecânico é o agent. Você o contrata para que ele atue em defesa dos seus interesses, mas você sabe que e tem também seus próprios interesses. Cabe a você premiá-lo ou puni-lo. Mas você dispõe de informação imperfeita para decidir o que fazer, porque o mecânico sabe de coisas que você não sabe e faz coisas que você não vê. O que você pode fazer para induzi-lo a prestar a você o melhor serviço de que ele é capaz?” (PRZEWORSKI (1998, p. 45).

seeking, ou oportunismo na administração pública. Era, para o pensamento neoliberal,

fundamental uma reforma do Estado que o torna-se ágil e eficiente, segundo à lógica gerencialista e neoliberal.96

Dentre as estratégias para a superação da crise, adota-se a redefinição do papel do Estado com a adoção de um novo paradigma de administração pública: o modelo gerencial ou

New Public Management (NPM)97, cujos princípios foram disseminados pelos governos conservadores de Margareth Thatcher (1979), na Inglaterra, e Ronald Reagan (1980), nos Estados Unidos. Governos que, segundo Costa (2010, p. 149-151), “centraram seu trabalho na crítica ao modelo de intervenção social democrata e na formulação de um programa baseado nas premissas do livre mercado e do neoliberalismo”. Foi um programa não apenas econômico-político; mas, também, ideológico uma vez que “o governo americano alcançou vitórias sucessivas, conseguindo utilizar sua influência para impor o ideário liberal e o programa de reformas, nele inspirado, a todos os organismos internacionais.”98

A “NPM [...] foi tributária de todas as inovações introduzidas no campo da gestão empresarial, a partir da reestruturação produtiva caracterizada pelo pós-fordismo” (COSTA, 2010, p. 152). Dentre seus principais teóricos, destacam-se Davi Osborne e Ted Gaebler, com a obra “Reinventando o governo”, a qual

[...] compreendia a adoção de uma série de princípios capazes de torná-lo catalisador, pertencente à comunidade, responsável, competitivo, orientado por missões, avaliado por resultados, voltado para as necessidades dos clientes, empreendedor, preventivo, descentralizado e orientado para o mercado. Todos esses princípios se identificam com o programa da NPM, que buscava fazer o governo funcionar melhor, custar menos e obter resultados. (COSTA, 2010, p. 152).

Como estratégias, portanto, para a retomada dos lucros, propagou-se o desmonte do Estado com as políticas de privatização e reformas pró-mercado, a desregulamentação e flexibilização no mercado (políticas de terceirização), o desenvolvimento da reestruturação

96 Diante da necessidade de reestruturar o Estado para que este atenda as novas demandas do capitalismo, iniciou-se o desmonte do modelo weberiano de Estado Tradicional (Burocrático), com sua concepção racional de dominação. Segundo Weber (1999) o poder se exerce graças ao saber – a meritocracia, e o governo deve ser exercido com precisão, disciplina, continuidade e rigor, possibilitando o cálculo (aferição, contagem) da efetividade e ponderação técnica do serviço público ofertados pelo Estado, tanto por parte do governante como pelos cidadãos.

97 Segundo Costa (2010), esse modelo de administração pública é resultado de longa maturação teórica iniciada nos anos de 1950 como herança das análises econômicas da política, que estudavam o setor público: a nova economia institucional ou neoinstitucionalismo econômico e a Teoria da Escolha Racional ou escolha Pública (Public Choice), esta última focada no comportamento individual dos agentes públicos.

98 Esse cenário gerou novas relações entre Estado-Mercado-Sociedade, muitas definidas a partir do Consenso de Washington, na década de 1990, que estabelecia a disciplina e reforma fiscal, liberalização de financiamento comercial, taxa de câmbio unificada, abertura das economias ao investimento externo, privatização de empresas estatais e defesa do direito de propriedade. Estas medidas visavam impulsionar a reestruturação do capital, a globalização e a mundialização financeira, todos conformadas ao neoliberalismo.

produtiva (adoção de modelos como o Toyotismo), a valorização financeira do capital e a expansão do sistema de mundialização financeira (avanço da economia especulativa). (CARCANHOLO; BARUCO, 2011).

A NPM, desta forma, ampara-se na racionalidade econômica, reduzindo o campo de ação do Estado: restringindo-se a funções regulatórias; serviços públicos avaliados por critérios de mercado; reprodução de métodos de gestão (management) da iniciativa privada no setor público; delegação de políticas sociais a terceiros99; cidadãos tratados como clientes; avaliação de funcionários públicos por critérios de desempenho. (COSTA, 2010).

Matias-Pereira afirma que "a NPM está totalmente ligada à melhoria do desempenho – fazer os governos mais conscientes em relação a custos, eficientes, eficazes, compreensivos, voltados à satisfação do cliente, flexíveis e transparentes", tendo como fundamentos "a adaptação e a transferência de conhecimentos gerenciais desenvolvidos no setor privado para o público." (MATIAS-PEREIRA, 2008, p. 98). Embora, a NPM tenha peculiaridades em cada país que a implementou, os autores a tipificam em torno de quatro eixos centrais:

Manter: conservar a máquina administrativa tal como ela é, mas ajustar e equilibrar sempre que possível; Modernizar: realizar as mudanças mais fundamentais nas estruturas e processos, por exemplo, mudando a orientação do processo orçamentário de insumo para produto; criando novos tipos de organização do setor público, como agências autônomas; modificando o contrato de trabalho dos servidores públicos etc.; Mercantilizar: introduzir mecanismos de mercado (market- type mechanisms–MTMs) no setor público, acreditando que eles vão gerar eficiência e melhor desempenho (OCDE, 1993); Minimizar: reduzir o setor estatal tanto quanto possível, fazendo o máximo uso da privatização e da contratação externa. Os ativos públicos são vendidos, e as atividades anteriormente desempenhadas por servidores públicos são oferecidas aos setores comerciais e voluntários. (MATIAS-PEREIRA, 2008, p. 101).

Segundo Castro (2007, p. 124), “a reforma gerencial caracteriza-se pela busca da eficiência, pela redução e pelo controle dos gastos e serviços públicos, bem como pela demanda de melhor qualidade e pela descentralização administrativa” associada à ideia de maior autonomia, habilidade e criatividade por parte dos indivíduos e práticas fincadas em

99 A Reforma do Aparelho do Estado propõe dois tipos de propriedade pública: a propriedade pública estatal – o conjunto de bens sob o controle do Estado; e, a propriedade pública não estatal – todos os bens que, embora não sejam de propriedades do Estado, servem ao interesse público (COSTA, 2010). Segundo Neves (2004, p. 3): “As políticas governamentais passam a ser definidas por um núcleo estratégico situado no Executivo central, executadas por parceiros na ‘nova’ sociedade civil e posteriormente avaliada por esse núcleo central, dinâmica da chamada administração gerencial. As políticas sociais em geral, começam a se constituir em serviços não- exclusivos do Estado, ou seja, que podem ser exercidos simultaneamente pelo Estado, pela iniciativa privada e pelas chamadas organizações públicas não-estatais. Passam a se constituir em serviços exclusivos do Estado somente o subsídio à educação básica, a previdência social básica, a compra de serviços de saúde e ao controle