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OS DIFERENTES TIPOS DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO I. APRENDIZAGEM AO LONGO DA VIDA

1.2. OS DIFERENTES TIPOS DE APRENDIZAGEM

Quando abordamos o conceito de aprendizagem ao longo da vida devemos atentar nos diferentes contextos em que esta pode ocorrer. Por conseguinte, importa definir, claramente, os conceitos de aprendizagem formal, aprendizagem não formal e aprendizagem informal. Assim, a aprendizagem formal é intencional, quer da parte de quem aprende, quer da parte do responsável pelo processo de aprendizagem. Em consequência, encontra-se devidamente estruturada no que aos seus objetivos e duração concerne, sendo conducente a uma certificação final. Já a aprendizagem não formal assume uma classificação mais ampla, no sentido em que poderemos estar perante uma forma de aprendizagem que pressuponha fontes de aprendizagem não intencionais ou programas de aprendizagem acreditados que incluam alguma forma de certificação final, como é o caso das obtidas através das escolas de condução ou de línguas. A aprendizagem informal inclui todas as influências inconscientes proporcionadas pela família, pelos grupos e pela sociedade em geral, bem como pelos acidentes que ocorrem no decurso das nossas vidas. Todavia, é incorreto entender a aprendizagem informal como um processo único, dado que esta comporta, em si, diferentes tipos de aprendizagem. Assim, a aprendizagem informal autodirigida implica que adotemos intencionalmente a identidade de aprendentes, planeando e controlando as atividades de aprendizagem e medindo o nosso sucesso em termos de quanto aprendemos. Com efeito, qualquer adulto pode adotar uma postura

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autodidata, envolvendo-se num projeto de aprendizagem de forma deliberada. A aprendizagem informal incidental compreende o nosso envolvimento numa atividade importante. Embora vagamente conscientes de que estamos a aprender, o nosso foco reside na tarefa. Por conseguinte, não nos percecionamos como aprendentes, mas como “trabalhadores” e, como tal, também não concebemos o que estamos a fazer como aprendizagem, mas como a tentativa de levar a cabo uma tarefa. O nosso sucesso depende, portanto, do domínio manifestado na consecução da tarefa. Todavia, durante este processo, aprendemos bastante. A aprendizagem informal não intencional processa-se, quase sempre, de forma inconsciente e não planeada (Duvekot, 2014a; Rogers, 2014).

As definições atribuídas a cada um dos tipos de aprendizagem não deverão, contudo, guiar-nos no sentido de considerarmos cada um dos conceitos como dicotómicos. Na verdade, estes deverão ser perspetivados de forma holística, ou seja, durante a aprendizagem ao longo da vida estabelece-se, entre todos, uma clara interseção (Soares, 2013). Rogers (2014) sugere que os analisemos como um continuum (Figura 1). As

fronteiras entre os diferentes tipos de aprendizagem tendem a diluir-se e, necessariamente, sofrem alterações consoante o contexto e a comunidade discursiva. Além disso, devemos também considerar a hibridez das variedades de aprendizagem, dado que, num mesmo momento, poderão coexistir elementos formais e informais de aprendizagem. Com efeito,

Nota. Transcrita de “The classroom and the everyday: The importance of informal learning for formal learning” de A. Rogers, 2014, Investigar em Educação, 1, p. 10.

Figura 1

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ninguém é um “não-aprendente”, pelo que ao serem inseridos em programas formais e não formais, os indivíduos transportam consigo o seu próprio conhecimento tácito, bem como os seus conjuntos de competências, quadros de referência (perspetivas e esquemas de significado) e imaginários sociais. Estão, portanto, envolvidos num processo de aprendizagem contínuo, do qual poderão ter maior ou menor consciência. Em consequência, é essencial que não tomemos como sinónimos os conceitos de escolarização e aprendizagem, uma vez que “participants in formal learning, even if unschooled, are not ‘new learners’”2 (Rogers, 2014, p. 23). Tendencialmente, é conferida maior proeminência à aprendizagem formal, desconsiderando-se, em larga medida, a aprendizagem informal. Urge, pois, analisar a possibilidade de se assumirem como complementares, repensando- se a aprendizagem formal à luz da aprendizagem informal.

É ainda interessante constatar que, não raras vezes, a aprendizagem não formal é entendida como um sistema de escolarização alternativo, constituindo-se como uma possível resposta para necessidades educativas que a escola não parece conseguir cumprir (Rogers, 2014; Soares, 2013). O Programa Escolhas, estabelecido em 2001, representa um projeto em que a aprendizagem não formal se articula complementarmente com a aprendizagem formal e informal, procurando-se colmatar as deficiências e dificuldades do sistema formal de ensino, bem como apelar aos contextos singulares das vivências dos jovens, em risco de exclusão social, para estimular experiências significativas de aprendizagem (Calado, 2014). Procura-se desenvolver jovens resilientes, tolerantes, possuidores de elevada autoestima e capazes de compreender o Outro. Simultaneamente, melhora-se o seu nível de qualificação e capital social e relacional de forma a capacitá-los para a transição para a vida ativa. Objetivos desafiantes para o Programa que parece ter encontrado na aprendizagem não formal as características ideais para consecução do projeto e concomitante articulação com a aprendizagem informal e a aprendizagem formal.

2 “participantes em aprendizagem formal, ainda que não escolarizados, não são ‘aprendentes novos’”

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Este projeto baseia-se, pois, em onze princípios que, de seguida, explicitamos (Calado, 2014):

1. A intencionalidade, dada a ênfase que se atribui à componente instrucional e

programática e que se encontra ausente da educação informal;

2. A estratégia educativa que se consubstancia num conjunto de atividades

pedagógicas pré-estabelecidas e que é orientada para o desenvolvimento de competências e valores;

3. O papel do aprendente no processo educativo, sendo que a estratégia de

aprendizagem é pensada a partir das necessidades, interesses, expetativas e motivações dos jovens e, portanto, assume-se como uma prática educativa flexível e adaptativa;

4. A importância das experiências e vivências pessoais dos aprendentes na

construção da sua aprendizagem;

5. A centralidade das atividades lúdico-pedagógicas que se assumem como fator

de motivação para o desenvolvimento de novas aprendizagens e competências;

6. A importância da relação afetiva e de proximidade, uma vez que a inexistência

de hierarquia e o caráter voluntário em que se insere a abordagem pedagógica permite potenciar todo o processo de aprendizagem;

7. As dinâmicas de participação que procuram promover a participação ativa de

todos, livre e espontânea, num contexto preferencialmente não hierárquico, em que as atividades educativas espelham o contexto de cidadania democrática e participativa;

8. A necessidade de uma avaliação participada, contínua e dinâmica orientada para

o processo de desenvolvimento do aprendente;

9. A relevância de princípios-chave, como a promoção da inclusão social e de uma

cidadania democrática, de modo a proporcionar o desenvolvimento de características sociais assertivas e de cidadãos qualificados e autónomos que possam contribuir para uma sociedade próspera e igualitária;

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10. O processo de transformação pessoal e social que a prática educativa procura

induzir;

11. A aprendizagem não formal que surge na interseção da aprendizagem formal e

informal, ou seja, as estratégias de aprendizagem utilizadas no projeto, em contexto de aprendizagem não formal, respondem às dificuldades sentidas pela escola ao não conseguir proporcionar um contexto educativo adequado ao desenvolvimento de determinadas aprendizagens necessárias à integração e participação social destes aprendentes. Em simultâneo, o trabalho desenvolvido a nível da aprendizagem não formal vem reforçar as oportunidades de aprendizagem informal, visto que as atividades lúdico-pedagógicas vão muito além da ocupação de tempos livres, visando o desenvolvimento de aprendizagens não formais complementares às da aprendizagem formal e fortalecendo a própria aprendizagem informal.

Reside, portanto, neste tipo de aprendizagem um potencial de enriquecimento para todas as formas de aprendizagem não formal e formal, uma vez que é aquela que determina o que aprendemos e como aprendemos conscientemente, os valores, as premissas e expetativas que trazemos, bem como as nossas aspirações e motivações (Rogers, 2014; Soares, 2013).