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2. AS TRANSFORMAÇÕES NO SETOR BANCÁRIO

2.4 Os impactos da reestruturação produtiva no setor bancário

Como resultado do processo de reestruturação e da consequente modernização das práticas de organização do trabalho, temos, em primeiro lugar, uma forte redução no número de trabalhadores do setor bancário durante a década de 1990. Nesse sentido, o quadro 3 mostra-nos que houve um declínio no número de empregos no setor durante o período de 1986 a 1988, seguido de um leve aumento durante os anos de 1988 e 1989; por fim, de 1989 a 1996, observamos uma tendência de queda acentuada, levando o número de empregados de pouco mais de 800 mil para, aproximadamente, 500 mil.

Quadro 3: Evolução do emprego no setor financeiro.

Fonte: Segnini, 1999, p. 190

É interessante notar também a diminuição no número de trabalhadores por posto de atendimento, indicando uma menor necessidade de mão-de-obra e comprovando, em certo sentido, a eficiência organizacional das mudanças realizadas. Assim, o quadro 4 revela que a média de empregados por ponto de atendimento caiu de 28,2 em 1990 para 17,4 em 1999, representando uma queda de, aproximadamente, 38%.

Quadro 4: Bancos no Brasil: rede de atendimento e estoque de emprego.

Fonte: Antunes, 2001, p. 45

Somado ao enxugamento no número de postos de trabalho, verificamos uma tendência de diminuição na remuneração média, como aponta Faria (2005, p. 75) ao analisar o período de 1994 a 2002 a partir da base de dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS):

a concentração na faixa salarial inferior, de 0 a 5 salários mínimos, passou de 9% dos funcionários em 1994 para 17,5% em 2002. Nas faixas salariais intermediárias, a mudança foi pouco expressiva. Na categoria de 20,01 salários mínimos ou mais, pode-se perceber a redução do número de bancários de 29% em 1994 para 18,5% em 2002.

É interessante notar que dados recentes apresentados pela Contraf-CUT (BANCOS..., 2010) parecem sugerir um movimento ainda alinhado, em alguma medida, à tendência identificada por Faria (2005). Embora referentes a um período de tempo bastante curto, 1º trimestre de 2010, os dados revelam que a remuneração média dos 11.053 trabalhadores admitidos no setor nesse período (R$ 2.197,79) foi 37,85% menor do que a remuneração média dos 8.213 desligados (R$ 3.536,38).

Acompanhando o cenário de redução de postos de trabalho e de tendência de queda na remuneração média da categoria que caracterizou a década de 1990, temos, por fim, a privatização, liquidação ou federalização (visando à futura privatização) de vinte bancos estatais (JINKINGS, 2002).

Em síntese, três fenômenos caracterizam o processo de reestruturação no setor bancário: 1) desemprego; 2) terceirização e precarização do trabalho e 3) intensificação do trabalho (SEGNINI, 1999).

Segundo Jinkings (2002), além da terceirização, os bancos laçam mão de uma série de outros mecanismos para reduzir os custos relativos à força de trabalho, tais como a contratação temporária de trabalhadores vinculados a empresas prestadoras de serviços; transferência do funcionário do banco para empresas participantes de seu conglomerado; contratação de

estagiários, entre outros. Para essa autora, a queda dos níveis de empregos

nesse setor está diretamente relacionada ao aumento do trabalho temporário ou subcontratado. Em sua análise, a subcontratação da força de trabalho se trata de mais um mecanismo de reestruturação do setor e que “significa precariedade do emprego e do salário, desregulamentação das condições de trabalho e perda de direitos sociais para a grande maioria dos trabalhadores” (JINKINGS, 2002, p. 132).

A fim de ilustrarmos a diferença nas condições de contração e trabalho entre os trabalhadores terceirizados e não terceirizados do setor bancário, apresentamos abaixo a tabela elaborada por Sanches (2006). A partir de dados coletados com os próprios trabalhadores terceirizados, da Convenção Coletiva de Trabalho dos bancários de 2003-2004 e de outras informações procedentes do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região19, a autora apresenta-nos uma tabela na qual compara as condições de trabalho e assalariamento de três categorias de trabalhadores terceirizados com as condições de bancários efetivados, evidenciando tanto diferenças em termos salariais e de benefícios, quanto de fatores como duração da jornada de trabalho, treinamento, etc.20

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Embora a utilização de fontes diversas de dados possa trazer algumas limitações para as análises, o quadro elaborado por Sanches (2006) nos fornece uma primeira aproximação em relação ao fenômeno de criação de categorias de trabalhadores dentro do ambiente bancário.

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Tabela 4: Relações e condições de trabalho dos empregados terceirizados e efetivos que realizam as mesmas atividades bancárias relativas à Retaguarda e à Compensação (dados referentes ao ano de 2004)

Terceirizados Terceirizados efetivados nas empresas terceirizadas Terceirizados trabalhando como temporários Terceirizados trabalhando por produção Bancários efetivados nos bancos Local de trabalho Banco ou empresa

terceirizada

Banco ou empresa terceirizada

Empresa

terceirizada Banco

Salário Auxiliar Adm.:

mínimo R$ 300,00 e máximo R$ 500,00 Auxiliar Adm.: mínimo R$ 300,00 e máximo R$ 500,00 Free-lancer ou horista: ganho por

produção - Piso Escriturário: R$ 702,00; - Piso Caixa: R$ 992,00 Jornada de

trabalho 8h48 8h48 12h (em média) 6h

Média de autenticações por hora trabalhada (dia de pico) 250 250 250 108 Participação nos lucros e

resultados Não tem Não tem Não tem

80% salário recebido + valor fixo de R$ R$ 650,00 Ticket Restaurante Para as empresas que pagam, o valor médio é de R$ 5,00 por dia Para as empresas que pagam, o valor médio é de R$ 5,00 por dia

Não tem R$ 11.67 por dia

Ticket Alimentação

Para as empresas que pagam, o valor varia entre

R$ 30,00 a R$ 50,00 mensais

Não tem Não tem R$ 200,00

Auxílio Creche Não tem Não tem Não tem R$ 163,00

Convênio médico Tem Tem Não tem Tem

Treinamento

Não há Não há Não há Há programa de

treinamento Fonte: Sanches (2006, p. 80)

Para além da fragmentação entre terceirizados e bancários, Machado (2002, p. 100) nos lembra que:

(...) pode-se falar de um processo mais amplo de fragmentação do trabalho na empresa [Banco do Brasil], articulado à competitividade no espaço de trabalho. Esse processo envolve, por exemplo, as diferenças de classificação entre as agências e o deslocamento para diferentes postos de trabalho enquanto elementos que rompem com a homogeneidade de condições, situações e relações de trabalho no Banco. Pode-se falar, também, no decorrer das mudanças e dos programas implementados, da fragmentação entre os excedentes e não excedentes, qualificados e competitivos e desqualificados ociosos, pouco produtivos. Essa segmentação e fragmentação funcionais questionam a identidade coletiva anteriormente existente.

No tocante ao processo de fragmentação interna, isto é, entre os funcionários efetivados, dados do DIEESE (1997b) referentes ao período de 1986 e 1995 apontam para a diminuição do número proporcional de escriturários e auxiliares, bem como de cargos de chefia intermediária, e, ao mesmo tempo, revelam um aumento percentual para as seguintes funções comissionadas: direção/gerência; analistas e programadores; assessores econômicos e jurídicos; outros assessores; operadores de máquinas de processamento; caixas; secretárias, entre outros, conforme tabela 5:

Tabela 5- Distribuição da categoria bancária na Grande São Paulo 1986/1995 - (em %)

! " # $ % $ & ' ( ( ) * $ % ! + ) , ) % - * $ Fonte: DIEESE, 1997b

Acreditamos que esse processo de fragmentação dos trabalhadores, em última análise, faz com que um tradicional mecanismo de ação de luta e enfrentamento seja colocado em questão: os sindicatos. Desse modo, segundo Antunes (2002), esses se deparam, entre outros, com o desafio

de romper a enorme barreira social que separa os trabalhadores “estáveis”, em franco processo de redução, daqueles trabalhadores em tempo parcial, precarizados.

Nessa mesma direção, Jinkings (2002, p.18) afirma que:

de fato, a luta sindical bancária e as ações de resistência nos locais de trabalho enfrentam maiores obstáculos, diante das conseqüências da reestruturação produtiva do capital. Diferentemente dos anos 80, quando o sindicalismo bancário realizou movimentos grevistas, assembléias e passeatas que aglutinaram grande quantidade de trabalhadores em todas as regiões do país, na década de 90 os sindicatos têm-se defrontado com dificuldades crescentes para organizar e mobilizar os bancários nas lutas por melhores condições de trabalho e salariais.

De modo geral, analisando-se os impactos e efeitos de todo o processo de reestruturação do setor bancário que buscamos caracterizar ao longo desse capítulo, vemos que este processo se mostrou bastante positivo do ponto de vista dos bancos e banqueiros, considerando-se, em especial, a recuperação dos resultados negativos ocorridos durante os anos de 1995 e 1996 e a tendência de crescimento no lucro, que se concretiza, sobretudo, a partir do ano de 2002, conforme pode ser verificado nos quadros 5 e 6.

Quadro 5: Lucro líquido dos 11 maiores bancos entre 1994 e 2006 (em R$ bilhões).

Fonte: DIEESE, 2007, p. 7

Quadro 6: Lucro líquido anual dos Principais Bancos do País (em milhões de R$).

Fonte: DIEESE, 2005, p. 2.

Em contrapartida, o saldo para os trabalhadores do setor parece ter sido essencialmente negativo. Assim, conforme denunciava o jornal do Sindicato dos Bancários de Bauru e Região (SÓ..., 2008) o quadro das

perdas salariais da categoria no ano de 2008, devido, especialmente, à política de arrocho salarial iniciada em 1994, encontrava-se da seguinte maneira21:

• Perda salarial de 97,95 % para os bancários do Banco X;

• Perda salarial de 86,51% para os bancários do Banco do Brasil;

• Perda salarial de 27,36% para os bancários dos bancos privados e da Caixa Econômica Estadual (SP).

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Vale mencionar que, com o governo Lula, a CUT passou a usar o termo reposição salarial considerando apenas a perda inflacionária anual; portanto, não mais considerando as perdas salariais ocorridas durante o arrocho salarial da década de 1990.