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5. O EMPREGO NO BANCO PÚBLICO FEDERAL NA PERCEPÇÃO DOS

5.5 Reestruturação: lembranças de um passado não tão longínquo

Ao longo das entrevistas, os Técnicos Bancários foram indagados acerca de seus conhecimentos sobre a reestruturação ocorrida na década de 1990. É interessante destacar que a maior parte deles mostrou-se

hesitante ao tratar desse assunto, afirmando, muitas vezes, não ter conhecimento a respeito por não ter vivenciado aquele período. No entanto, após alguma insistência, revelaram possuir percepções que são baseadas em relatos de colegas de trabalho, em depoimentos de familiares que trabalhavam no banco ou mesmo baseados em suas experiências pessoais.

Aparecida, por exemplo, na qualidade de filha de ex-bancário, afirma ter acompanhado “bem de perto” aquele processo. Assim, relata que:

Naquela época, meu pai teve uma dificuldade de conseguir se manter aqui em Bauru. No final, deu certo. Ele acabou ficando, com duas crianças pequenas. Ele trabalhava de madrugada na compensação. Alguns setores são fechados, outros são reabertos; os funcionários todos sem saber para onde ir; muitos deles [funcionários] não conseguiram ficar aqui e foram para longe das famílias; várias famílias se desestruturaram – com crianças da mesma idade que eu e minha irmã. Foi uma fase bem sofrida. Tem colegas do meu pai que estão conseguindo voltar a trabalhar agora, faltando pouco para aposentar. Então, você vê que o semblante da pessoa é diferente. Você vê que ele teve a dificuldade, que continua passando por dificuldade, mas não tinha como falar não. Afinal, tinha família, filhos e também, muitas vezes, não tinha como levar a família para acompanhá-los. Mas tudo é superável. A gente fala que de todas as dificuldades que a gente passa a gente sai mais forte.

Joana, por sua vez, na qualidade de cliente bancária e moradora de uma pequena cidade, lembra-se de “pessoas que trabalhavam em bancos privados e que, de repente, devido a essa reestruturação perderam o cargo. Às vezes, era um gerente e precisou voltar para o caixa. Às vezes era um caixa e foi mandado embora”.

Paulo relata ter ouvido que muita gente teve “que mudar de cidade” ou “ser transferido à força”. De outro lado, ressalta também que foi a época em que se iniciou o uso dos computadores e da informatização, processos esses avaliados como positivos para o banco, uma vez que esse “passou a economizar na folha de pagamento”, além de ter melhorado a qualidade dos serviços, fato este, ainda segundo esse entrevistado, necessário e ocorrido no mundo todo, não se limitando ao setor bancário nacional. Contudo, Paulo também considera que foi nessa fase que ocorreu o processo que chama de “nivelamento por baixo dos salários”, no qual o bancário deixou de ter “salários excelentes”, equiparáveis aos salários de “promotores e juízes”, concluindo que: “hoje, é como eu disse, eu ganho salário de operário, chão-de-

fábrica”. Entretanto, se, por um lado, a comparação do empregado bancário com o operariado seja relevante por revelar a degradação desse trabalho, por outro, vale destacar que não se trata de um fenômeno contemporâneo, haja vista a imagem “operário engravatado” destacado pelos depoentes de Romanelli (1978).

Caio, nesse sentido, defende que o governo FHC foi o grande ponto de virada, concluindo que, “pelo que eu entendi, durante esses oito anos, deu aquela sucateada que nos trouxe aqui. Eu acho que antes era muito bom.(...) pelo menos, é o que eu escuto falar”.

Teresa também menciona o arrocho salarial promovido durante o governo FHC. Ademais, compartilhando a percepção de Paulo, afirma que “parece que foi da água para o vinho, assim, que o pessoal nadava [em dinheiro] mesmo, assim. Então, essa é a visão que eu tenho dessa reestruturação. Eu não sei exatamente o que foi a reestruturação. Só sei que mudou”.

Para além da redução de salário (Paulo, Teresa, Caio), das transferências forçadas (Aparecida e Paulo) e das demissões (Joana), Tomé traz uma reflexão mais ampla sobre os reflexos desses processos para os bancários e para a categoria:

Mas, nos anos 90, com o Neoliberalismo, o pessoal perdeu emprego e, com o processo tecnológico, ao mesmo tempo, o bancário ficou mais focado na sua sobrevivência, sem importar muito com o aspecto político, se está certo ou se está errado, o que importa é mais ele

estar vivo e trabalhando do que o coletivo. Nos anos de 87 e 90, a

greve dos bancários era muito forte.(...) era bem diferente, cara. Você nem precisava chamar o pessoal para a greve. Eles iam espontâneo, assim.

André, por sua vez, chama a atenção para a mudança de foco do banco ocorrida ao longo da década de 1990. Assim, avalia que antes o banco possui um foco maior “na parte social”. Como prova disso, cita que, em 1998, quando iniciou sua carreira, existiam ainda três tipos de gerentes: o gerente de habitação, o gerente social e o gerente comercial. A partir de 2000, essa estrutura gerencial é substituída por uma estrutura baseada na faixa de renda dos clientes, a exemplo do que ocorre nos bancos comerciais. De acordo

com André, a nova estrutura é composta pelos seguintes gerentes: Gerente Básico, Gerente Essencial, Gerente Integral e Gerente Personalizado.

Já Simão menciona a questão da informatização ao ser questionado sobre a década de 1990. Embora pondere que no X esse processo tem ocorrido de maneira desigual entre as áreas e processos, parece apresentar uma visão positiva acerca dessas mudanças.

Também Abel destaca que “algumas coisas mudaram para melhor”. Nessa direção, afirma ter havido melhoras nas condições de trabalho e, como prova disso, destaca que hoje o ambiente de trabalho é climatizado. Acrescenta ainda que não enxerga grandes e desastrosos impactos para aqueles que vivenciaram aquele período. Dessa forma, cita o caso de uma supervisora sua que “sobreviveu” a quatro reestruturações e afirma que, “às vezes, se aumentava muito mais a ansiedade e muito mais o medo do que a coisa realmente aconteceu”. Contudo, é interessante notar que Abel, ao tratar do contexto no qual está inserido, relata estar vivendo certa tensão devido ao processo de reestruturação que estava em curso em sua área. Ocorre que, por determinação da matriz, sua área estava prestes a se extinguir por meio de um processo de fusão.

Por fim, Roberta, fonoaudióloga e Analista Júnior do X, relata nada saber sobre a reestruturação dos anos de 1990 e, indo além, afirma: “Nunca ouvi falar. [risos]. E nem me preocupo em saber. Não sei, não sei.”. Tal indiferença, somada ao seu desinteresse confesso acerca de questões políticas e sindicais ligadas à categoria, como veremos a seguir, parecem sugerir uma não identificação com a categoria bancária.