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Os “12 Princípios da Produção”

2 A EMERGÊNCIA DO NACIONAL SINDICALISMO

2.2 A Ideologia e o Programa Político N/S

2.2.2 Os “12 Princípios da Produção”

O N/S nasceu, “como todos os movimentos europeus congéneres, fascismo e nazismo, sem um programa rigorosamente definido ao modo dos antigos partidos. Definir é limitar, disse Mussolini”.53 A

sua declaração programática fica-se pelos “12 princípios da produção”, definidos por Preto em 1920, como “princípios basilares da doutrina N/S”54. Em diversas ocasiões, Preto e outros dirigentes teriam a opor-

tunidade de desenvolver, em termos programáticos, cada um destes “mandamentos”. O esboço de um programa político mais concreto foi também incluído nos estatutos, que os aderentes deveriam ler e aceitar no acto de filiação.

O nacionalismo do N/S, como se viu atrás, recolhia a contribuição decisiva do IL e dele não se diferenciava. O primeiro princípio dos estatutos definia a nação como uma realidade “eterna” e a pátria como “uma realidade imposta pela Terra, pelo Clima, pela Língua, pela Raça

e pela História”.55

Mais do que os integralistas, no entanto, preocupados com a legi- timação histórica do seu ultranacionalismo, Preto orientava-se para o futuro e considerava que o nacionalismo deveria ser uma peça-chave

53 Cf. Rolão Preto, “El Movimiento…”, Acción Española, nº 45, Madrid, 16 Enero 1934, p. 886-887. 54 Cf. Rolão Preto, op. cit., p. 139-142.

do ressurgimento nacional e “imperial”. Chegou a fazer ironia sob os “saudosistas” da história, afirmando que “a dor e paixão de Portugal nos passos da sua história imperial vêm-lhe sempre desta fatalidade do seu destino: nunca ter coincidido o esforço do país com o pensamento do

Chefe nacional do momento”.56

No Portugal do início dos anos 30, o importante era dar a Portugal uma consciência imperial, substituindo “os prantos inúteis em frente

ao Muro das Lamentações da Raça”.57 “Um povo só marcha nas vias

imperiais quando o clima da sua exaltação realiza milagres duma fé sem limites dando-lhe uma confiança em si própria e uma disposição heroica para todos os sacrifícios”.58

Vítimas do liberalismo e da dependência externa, os portugueses tinham um império, mas não tinham um sistema político que o enrai- zasse na consciência nacional. Os fascistas portugueses comungaram da nova mística imperial, típica do ultranacionalismo português, mas a sua preocupação de fundo era a sua “sacralização” enquanto mito indissociável da identidade nacional.

“Como “ideia”, – escrevia Preto – “o império é a interpretação da vocação popular de um chefe, e supõe, pois, uma irmandade absoluta entre os anseios do povo e a vontade decididamente iluminada do seu condutor”.59 A preocupação fundamental dos fascistas a nível interno

era a de reconstruir a “Nação” em “bases comunitárias”, a ela tudo submetendo como realidade transcendente.

O ideal-tipo “organicista” era para estes a solução: “negamos a dissolução dos elementos de Produção nacional, isto é, negamos a existência isolada de classes, artifício que põe em litígio os compo-

56 Cf. José Plácido Machado Barbosa, op. cit., p. 48. 57 Idem, p. 47.

58 Idem, p. 60. 59 Idem, p. 60.

nentes necessários do mesmo todo”. Como consequência imediata, negava-se também “a solidariedade do proletariado universal por cima e contra as fronteiras sagradas da nação”.60 Os restantes “princípios

da produção” concretizavam em termos de uma nova estruturação de Estado este modelo “orgânico”, baseado no corporativismo integral do IL, agora sem rei.

Este corporativismo modelou a organização política proposta para o regime N/S, baseado na negação do indivíduo e considerando a “família primeira célula social” e base, com o município, os sin- dicatos e outros “corpos naturais” da Nação, da nova organização da representação nacional. Uma representação “não política” mas “orgânica”, com uma Assembleia Nacional “unicamente constituída

pelos representantes” destes corpos.61

O grande destaque dos textos programáticos ia naturalmente para “o mundo do trabalho” e para a economia, a ser dirigida pelo sistema corporativo, já que este era “o conjunto orgânico de todos os elementos que para ele concorrem”.

As propostas do N/S nesta área foram muito variadas e alteraram-se de acordo com a conjuntura política. Nos textos oficiais, reconhecia- -se que a propriedade “era um direito natural, mas é necessário que a extensão da propriedade seja definida em função da utilidade social”. Previa-se “que a economia nacional pública e privada tem de ser dis- ciplinada e orientada pelo Estado que deve dirigi-la e intervir nela sempre que essa necessidade se imponha ao bem comum ou colectivo, ao equilíbrio ou à justiça social”.62

O Estado, assim organizado “como chefe da produção nacional”, não iria estabelecer “uma nova tirania”, pelo contrário, “inspirando-

60 Cf. Rolão Preto, A Monarquia… op. cit., p. 139. 61 Cf. Rolão Preto, Orgânica… op. cit., p. 3. 62 Idem, p. 2.

-se no bem geral”, no regime Nacional Sindicalista, o Estado “é toda a nação económico-social organizada conforme os interesses morais e materiais e representando através das suas hierarquias o trabalho e a vida cívica da nação”.63

O anticapitalismo do N/S continuava apegado ao imaginário de uma sociedade de pequenos produtores ameaçados pela concentração industrial. O cartel e o trust, o capital financeiro, que não conhece fronteiras, que “conduz à morte das pequenas empresas à proletari- zação das massas trabalhadoras”, eram a fonte de todos os males e injustiças “de onde nasce a rebeldia dos escravos modernos”.64 Este

tema clássico de algumas variantes do fascismo é aqui particular- mente importante, já que Rolão Preto, particularmente, será sempre o porta-voz destas classes médias rurais e urbanas ameaçadas por aquilo que se previa vir a ser o futuro do capitalismo liberal: um mundo dirigido por um capital anónimo que esvaziaria os campos e transformaria a sociedade portuguesa em um gigantesco corpo de proletários e empregados dos serviços.

A refutação do capitalismo coincidia aqui com a da democracia, visto esta assegurar ao primeiro o domínio absoluto “sobre a nação”. Capitalismo, parlamentarismo e centralização eram três faces da mesma moeda. “Dominar a política liberal-democrática era centralizar, reunir em poucas mãos os lucros da governação do país.”65