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Os resultados alcançados com a realização dos projetos

Entre os 193 projetos por nós analisados, 98% deles foram considerados como bem sucedidos pelos respondentes. As justificativas do porque foram considerados bem sucedidos são relacionadas às mudanças no contexto escolar provocadas pela realização do projeto. Um total de 92% dos participantes, quando questionados sobre a ocorrência, ou não, de mudanças no ambiente escolar com a experiência, responderam afirmativamente. Assim, passaremos a descrever os principais resultados alcançados pelos projetos a partir da análise de duas questões: “Em sua opinião, o projeto relatado pode ser considerado como bem sucedido, por quê?”, e “Quais foram as mudanças ocorridas no ambiente escolar com a experiência?”.

Tabela 6 – Mudanças provocadas com a realização dos projetos

MUDANÇAS F %14

Melhora na convivência 86 25

Redução da violência e da indisciplina 69 20

Maior preservação do patrimônio escolar 37 11

Melhor desempenho escolar 37 11

Mudança de atitude das famílias 19 6

Mudança dos alunos (sem esclarecer quais) 16 5

Consolidação da Cidadania 14 4

Fortalecimento da autoestima 12 4

Maior participação dos alunos nas decisões escolares 8 2

Mudança de atitude dos professores 6 2

Resgate de valores 4 1

Valorização da vida 3 1

Mudanças graduais 8 2

Outras 14 4

Não justificou ou justificativa vaga 6 2

Total de respostas 339 100

Conforme podemos observar na Tabela 6, a mudança mais significativa apontada pelos respondentes foi a “Melhora na convivência”, citada em 86 (25%) respostas. Eles consideram os projetos como bem sucedidos por terem provocado melhora nas relações de convivência entre os membros escolares, tornando os alunos mais respeitosos com os professores e seus pares, mais solidários, tolerantes e amigos... Vejamos exemplos: “Os alunos passam a se relacionarem com mais respeito com os demais, melhorando a convivência e melhor rendimento integral, passado a gostar mais do ambiente escolar” (suj. 994); “As mudanças são visíveis no convívio com os colegas e professores” (suj. 628); “Mais integração, respeito ao próximo, união, formação de uma nova maneira de pensar sobre si e o próximo.” (suj. 577); “Respeito maior entre professor x aluno x funcionário.” (suj. 1066).

A segunda categoria mais presente nas respostas nomeou a “Redução da violência e da indisciplina”, presente em 69 (20%) respostas. De acordo com os respondentes, as experiências de educação em valores realizadas nas escolas provocaram a diminuição da violência, tendo reduzido o número de ocorrências de brigas e agressões físicas e da indisciplina dos alunos. Vejamos exemplos de respostas: “O índice de violência na escola baixou significativamente, e a relação de amizade entre os educandos e entre os educandos e

14 Esclarecemos que eventuais divergências nos totais apurados em relação ao total de respondentes deve-se ao fato de que, algumas vezes, um mesmo relato classificou-se em mais de uma categoria. O percentual foi calculado em relação à soma total de respostas classificadas.

educadores foi fortalecida.” (suj. 434); “[...] somos uma comunidade escolar com baixo índice de indisciplina e violência” (suj.338); “Melhorou a indisciplina. Diminuiu a violência” (suj. 748);

No início do projeto os alunos utilizavam de agressão física ou verbal para resolver os problemas, principalmente no momento do recreio; [...] No final do ano letivo os alunos já tentavam resolver os problemas pelo diálogo, davam ideias; apontavam onde não estava legal na escola. [...] os problemas passaram a ser discutidos com os alunos, consequentemente houve diminuição da indisciplina. (suj. 35)

Nessa categoria, surgem ainda cinco respostas que apontam uma redução no bullying escolar: “Os alunos aprenderam a identificar o bullying não só entre eles como em outros espaços e a se manifestar diante dele de maneira positiva.” (suj. 754).

Os respondentes também apontaram a “Maior preservação do patrimônio escolar”, presente em 37 (10%) respostas, indicando a valorização e responsabilização dos alunos pela escola. Estão presentes nesta categoria ações como redução da depredação e limpeza da escola, como podemos observar nos exemplos de resposta: “Tem se procurado a melhoria geral da escola em relação a cuidar dos murais, apagar a luz.” (suj. 320); “Redução significativa de depredação.” (suj. 639); “Logo após (a experiência) notamos os alunos se sentindo responsáveis pela escola” (1008);

Os alunos pichadores perceberam o quanto dá trabalho para manter a pintura e ao mesmo tempo não mais sujaram para não ter que limpar. Pichações novas foram fruto de alunos recém matriculados que não passaram pela experiência e, estas novas marcas foram criticadas pelos alunos, que cobraram promover a mesma atividades com os vândalos.(suj. 293).

Outra mudança apontada é o “Melhor desempenho escolar” dos alunos, encontrada em 37 (10%) respostas. Aqui eles destacaram o envolvimento mais efetivo dos alunos nas atividades escolares, resultando em uma aprendizagem de mais qualidade: “Os alunos passaram a se envolver mais nas aulas, ficaram mais calmos e passaram a se dedicar as práticas esportivas, ao teatro e a dança. As notas melhoraram consideravelmente.” (suj. 441); “Melhor índice de aprendizagem e participação dos alunos” (suj. 794); “Maior participação dos alunos em atividades ministradas em salas de aulas e palestras.” (suj. 15)

Em “Mudança de atitude das famílias”, citada em 19 (6%) respostas, os participantes indicaram mais participação e apoio das famílias nas atividades escolares, assim como, uma mudança de atitude relacionada à violência, à preservação e à valorização da escola e à educação dos filhos. Seguem exemplos dessa categoria: “Gradativamente foi aumentando as adesões e a participação de pais e alunos no projeto que quase não

participavam mais das reuniões e encontros da escola.” (suj. 447); “Essa experiência provocou um engajamento de todos no tema e certamente sensibilizou a comunidade e as famílias para práticas voltadas à cultura de paz.” (suj. 569).

Alguns outros respondentes nomearam “Mudanças dos alunos, sem esclarecer quais”. São respostas mais genéricas encontradas em 16 (5%) respostas.

Mais relacionado à Educação em valores, temos 14 (4%) respostas indicando a “Consolidação da Cidadania”, contribuindo para uma conscientização dos alunos quanto a seus direitos e deveres na sociedade: “Esses projetos deram ânimo aos alunos, assim como a conscientização sobre seu papel como cidadão em sua comunidade.” (suj. 647);

Acredito que sim porque gradativamente percebemos uma melhoria em relação ao comportamento dos educandos porque eles absorvem os vários aspectos de cidadania e empregam tanto dentro da escola quanto em sua vida social. (suj. 550).

Ainda relacionado a valores temos o “Fortalecimento da autoestima”, presente em 12 (4%) respostas, e o “Resgate de Valores”, mencionado em quatro (1%). Vejamos exemplos dessas duas categorias: “Com a autoestima elevada, os alunos se tornaram mais participativos, pois se sentiram valorizados e consequentemente melhorou a aprendizagem.” (suj. 794); “O estímulo das potencialidades e o crescimento pessoal dos educadores e educandos, o fortalecimento da autoestima, [...],. Por fim, o resgate de valores e sentimentos.” (suj. 704); “Foram momentos muito gratificantes, o PDE também teve um papel imprescindível no resgate a estes valores.” (suj. 158).

Em número reduzido, aparece a categoria “Maior participação dos alunos nas decisões escolares”, presente em oito (2%) respostas, as quais propuseram como mudanças positivas maior interesse e participação dos alunos em Conselhos, Grêmios estudantis e assembleias, além de uma mudança na gestão escolar, possibilitando espaços mais amplos de manifestação e decisão para os alunos. Vejamos ilustrações dessas respostas: “Maior participação dos alunos, identificação e aparecimento de lideranças, maior aceitação das normas da escola discutidas pelos alunos.” (suj. 809); “Através da participação dos alunos nos conselhos de classe que influenciou em algumas práticas tanto nos alunos quanto nos professores.”(suj. 111); “um espaço mais democrático, onde os alunos se apropriam de canais de participação na vida escolar e são incentivados pelos educadores a fazê-lo, pois são respeitados princípios como respeito mútuo, solidariedade, justiça e diálogo.” (suj. 450).

Sintetizando as respostas categorizadas, fica claro que as mudanças mais destacadas pelos respondentes para julgarem a experiência como bem sucedida foram a melhora nas relações de convivência e a redução da violência e da indisciplina. Essas mudanças parecem

se justificar, principalmente, pelo fortalecimento do respeito nas relações interpessoais na escola. Igualmente foi valorizado o respeito ao patrimônio, representando uma preocupação com a depredação escolar, outra modalidade de violência. Esteve presente, ainda, a melhora no desempenho escolar, como um efeito indireto, mas importante, de se trabalharem valores.

Vejamos duas respostas que ilustram a forte relação entre todas essas categorias: “Como já citei anteriormente, houve melhorias no rendimento escolar, na disciplina, respeito ao outro, na manutenção da limpeza e conservação do espaço escolar.” (suj. 553);

Podemos perceber a diminuição da violência, uma crescente participação dos pais e amigos dos alunos, uma melhor preservação do prédio escolar. Os alunos passam a se relacionarem com mais respeito com os demais, melhorando a convivência e melhor rendimento integral, passado a gostar mais do ambiente escolar. (suj. 994).

Tais mudanças citadas pelos respondentes podem caracterizar essas experiências como uma prática positiva no enfrentamento da violência e da indisciplina escolar?

A análise dos relatos dessas experiências mostrou uma carência de projetos que poderiam ser considerados como experiências positivas. Como limites desses projetos temos algumas observações:

1. Como já mencionamos anteriormente, muitas vezes a realização dos projetos não está pautada em métodos democráticos e muitas escolas ainda se mostram pouco compromissadas com a participação dos alunos na construção de seus valores, prevalecendo uma educação em valores morais por transmissão e doutrinação. As respostas parecem indicar que o esforço das escolas investigadas está mais voltado para conseguir um “bom” comportamento dos alunos e relações supostamente mais harmoniosas na escola, o que pode ter como resultado o melhor rendimento escolar dos alunos. Os valores mais citados nas experiências, como o respeito e a cidadania, parecem ser trabalhados mais pela necessidade de um controle disciplinar do que pela sua importância na formação moral autônoma dos alunos.

Segundo Vinha (2009) não se pode ensinar os alunos a desenvolver estratégias eficazes de negociação cooperativas, respeitosas e justas através de mecanismos punitivos ou por transmissão direta, discursos, palestras ou manuais de regras; estratégias essas presentes em alguns dos projetos relatados pelos respondentes.

2. Também, como vimos, são reduzidas as respostas que indicaram ações democráticas na escola, garantindo uma maior participação dos alunos nas decisões escolares, incluindo a construção das regras. Nesse contexto, nos questionamos sobre o quanto a redução

da violência e da indisciplina nestas escolas não é permeada por práticas de domesticação e coação dos alunos.

A escola é local apropriado para que crianças e adolescentes estabeleçam experiências sociais para aprenderem a viver em grupo; lá eles “têm oportunidade de discutir seus problemas, de compreenderem a necessidade das regras para o bem estar de todos, como algo que organiza as relações e auxilia a convivência” (VINHA, 2009, p 03). Mais do que transmitir normas e princípios de conduta, a educação em valores nas escolas deveria suscitar a construção de personalidades éticas.

3. Há falta de continuidade de algumas iniciativas, mesmo que interessantes, em razão da baixa adesão dos vários professores. Muitas vezes, as propostas partem de uma pessoa e não de interesse geral da escola; também, as experiências nem sempre são inseridas no projeto pedagógico das escolas e tornam-se dependentes apenas de seus idealizadores.

4. Recorrendo a pesquisadores que estudam o tema da violência e também a estudiosos que abordam as questões da indisciplina podemos, por outro lado, sintetizar o que poderiam ser práticas positivas no enfrentamento dessas problemáticas e na melhora da convivência. Em primeiro lugar, a escola deve realizar um trabalho de prevenção da violência e indisciplina escolar (CHRISPINO; SANTOS, 2011; DEBARBIEUX, 2007; GARCIA, 2009; TOGNETTA; VINHA, 2012). Esse trabalho preventivo deve começar com uma mudança na gestão e nas práticas docentes (GARCIA, 2009; TOGNETTA, et. a., 2010). As escolas devem adotar práticas que envolvam ações de valorização dos alunos e professores; maior participação dos alunos nas práticas escolares, motivando um sentimento de pertencimento; a valorização do diálogo entre os diferentes atores, fomentando relações de respeito mútuo e confiança; uma gestão coerente da disciplina e das normas, pautada em princípios de justiça e respeito mútuo; a criação de vínculos com a comunidade externa; e a participação dos pais na comunidade escolar (ABRAMOVAY; RUA, 2002; BLAYA, 2003, GROSSI et. al., 2005). Ainda devem adotar práticas de mediação de conflitos (LEME, 2006; VINHA, 2013); a discussão de dilemas morais; realizar atividades em grupos cooperativos de modo a promover um ambiente sócio-moral cooperativo na escola, baseado no respeito mútuo, na justiça, no diálogo, na igualdade e na solidariedade (VINHA; ASSIS, 2007; ECCHELI, 2008); desenvolver com os alunos valores positivos em relação ao estudo (ECCHELI, 2008); trabalhar a construção de uma educação para a paz (GROSSI et. al., 2005), proporcionar ações que possibilite aos alunos vivenciar experiências de se colocar no lugar do outro (TOGNETTA; VINHA, 2012). Devem buscar o engajamento de toda a

comunidade escolar na elaboração e realização dos projetos. Além disso, é preciso realizar a formação dos agentes escolares para a realização dos projetos.

Tais ações, no entanto, foram pouco citadas nos projetos aqui analisados.