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PACTO DE CLASSES NO CAPITALISMO ORGANIZADO

No documento Direito do trabalho em perspectiva : (páginas 44-47)

P rincipais atores envolvidos e seus papéis

Capital - renuncia parte da sua autonomia e de seus lucros

Trabalho - renuncia parte das suas reivindicações (as que respeitam à

subversão da sociedade capitalista e à sua substituição pela sociedade socialista), integrando-se definitivamente ao sistema capitalista

Estado - gerencia o grande pacto social, transform ando o excedente

libertado por parte dos capitalistas, ou seja, os recursos financeiros que lhe advêm da tributação do capital privado e dos rendimentos salariais, em capital social

O grande pacto social firmado no capitalismo organizado representou, por parte dos trabalhadores, a aceitação da lógica do lucro e do mercado como princípios orientadores de desenvolvimento. Em troca, seriam defendidos padrões mínimos de vida, direitos sindicais e direitos democráticos liberais. Ainda, seria combatido o desemprego em massa e a renda real dos trabalhadores subiria aproximadamente de acordo com a produtividade do trabalho, tudo isto através da intervenção do Estado. Já para os capitalistas, representou uma renúncia a ser gerida pelo Estado de parte de seus lucros, com vistas a um efetivo reconhecimento e desenvolvimento do sistema através da elevação dos padrões de vida e de consumo de massa. Baseia-se, segundo OFFE, em uma concepção de economia política de “soma zero”,

uma vez que cada classe figurante no pacto deveria levar em conta os interesses da outra no momento de suas reivindicações e atuações sociais.74

Com o pacto de classes, observou-se o surgimento do Estado de Bem Estar Social, ao qual coube o papel de gerenciamento. Nestes termos, portanto, o Estado de Bem Estar Social pode ser definido como a estrutura pública resultante de um compromisso entre o poder público institucionalizado, o Capital e o Trabalho, nos termos do qual os capitalistas renunciaram parte da sua autonomia e de seus lucros em curto prazo e os trabalhadores a parte das suas reivindicações, principalmente aquelas que dizem respeito à subversão da sociedade capitalista e à sua substituição pela sociedade socialista. O Estado, ao gerenciar esta dupla renúncia, transformava o excedente libertado, ou seja, os recursos financeiros que lhe advêm da tributação do capital privado e dos rendimentos salariais, em capital social. 75

Tem-se, dessa forma, que a concepção de Estado típica do período denominado capitalismo organizado apresenta uma variável nova, qual seja, o capital social. Este, por sua vez, assume duas formas fundamentais: a do investimento social e a do consumo social. Investimento social é “(...) o conjunto das despesas em bens e serviços que aumentam a produtividade do trabalho e, portanto, a rentabilidade do capital investido (...)”76. Como exemplo, pode-se referir a promoção de parques industriais subsidiados publicamente, de auto-estradas, de eletricidade, de telecomunicações, de institutos voltados para a formação profissional e de incentivo à atividade científica.

Já consumo social é “(...) o conjunto das despesas em bens e serviços a preços subsidiados pelos trabalhadores (...) que (...) fazem baixar o custo da reprodução da mão-de- obra (...); inclui também as despesas com grupos sociais não detentores de uma relação salarial e, portanto, fora da população activa efectiva (...).”77 Como exemplo, pode-se

74 “(• • •) jogar num jogo de soma zero seria jogar contra os próprios interesses. Isto quer dizer que cada classe tem que levar em consideração os interesses da outra classe: os operários, a lucratividade, porque somente um nível de lucro e de investimento razoável garantirá o emprego futuro e o aumento da renda, e os capitalistas, os salários e as despesas do Welfare State, porque são eles que garantirão uma demanda efetiva e uma classe operária saudável, bem treinada, sem problemas de moradia e feliz.”. OFFE, Claus. A Democracia Partidária C om petitiva e o W elfare State Keynesiano: fatores de estabilidade e desorganização. Dados -

Revista de Ciências Sociais, p. 41-42.

75 Vide SANTOS, B. de Souza. O Estado e a Sociedade em Portugal, p. 194. 76 SANTOS, B. de Souza. Idem, ibidem.

referir a educação, a saúde e a habitação públicas, bem como sistemas de previdência social. O capital social, tanto na parte do investimento como do consumo social, ao mesmo tempo que permitiria ao Estado criar as condições gerais de acumulação (aumento de produtividade, diminuição dos custos de reprodução da força de trabalho), propiciaria o aumento da procura interna por bens e serviços (crescimento econômico) e a realização da harmonia social via institucionalização dos conflitos entre Capital e Trabalho78.

A partir desta estrutura básica de gestão estatal, o capitalismo passou a estruturar-se na perspectiva de que crescimento econômico geraria capital social. Este, por sua vez, geraria aumento de consumo, que geraria aumento da produção e, finalmente, mais crescimento econômico. Daí o papel atuante do Estado, que se estrutura de modo a buscar crescimento econômico via intervenção direta e complementação de renda via capital social.

A aceitação da lógica do lucro típica do mercado por parte do movimento dos trabalhadores e a concordância das políticas redistributivas por parte dos capitaíistas estabeleceu as condições mínimas para o grande pacto social em torno do qual passou a gerar o grande debate político. Em condições de expansão econômica, o consenso interclasses possibilitou a emergência e a consolidação de políticas sociais que caracterizam o Estado providência e possibilitaram a sustentação de um Direito do Trabalho tutelar, voltados para harmonizar os riscos aos quais estavam expostos os trabalhadores com o estímulo à atividade econômica. Nessa perspectiva, o capitalismo organizou suas estruturas produtivas de forma a garantir o pleno emprego e a melhoria das condições de vida da classe trabalhador, idéias que fundamentarão toda a lógica de estruturação tutelar do mercado de trabalho.

Deste contexto, apreende-se a importância do paradigma de organização produtiva fordista como base estrutural do grande compromisso social firmado: estruturado em padrões rígidos de produção em massa, este paradigma de organização da produção possibilitou não apenas o crescimento da produtividade e

78 Nessa perspectiva, o Estado de bem estar social “(...) assenta (...) na idéia de compatibilidade (e até complementaridade) entre crescimento econômico e políticas sociais, entre acumulação e legitimação, ou mais amplamente, entre capitalismo e democracia.” SANTOS, B. de Souza. O Estado e a Sociedade em

da produção e acumulação de capital, mas também a inserção contínua e estável dos trabalhadores no mercado de trabalho, condição fundamental para o sucesso do pacto firmado. Possibilitou, ainda, a sustentação da perspectiva de gerenciamento estatal com base na noção de capital social, uma vez que o modo de produção fordista identifica produtividade com crescimento econômico e, conseqüentemente, incremento da arrecadação fiscal do Estado. O quadro a seguir expõe esta situação:

BASE P R O D U TIV A NO PACTO DE

No documento Direito do trabalho em perspectiva : (páginas 44-47)