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Fluxograma 2 – Processo de Validação do Projeto de REDD+ da RDS do Juma

3.3 PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS E REDD+

É importante também abordar a questão de que, pela forma como está sendo construído, REDD+ é um mecanismo de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA).

A noção de pagamento por serviços ambientais ganhou força recentemente com a introdução da lógica econômica na proteção ambiental. Até então, os mecanismos de proteção

ao meio ambiente se concentravam nos denominados mecanismos de comando e controle, cujo objetivo era coibir, limitar ou condicionar o comportamento dos indivíduos, por meio de leis repressivas e de ações de fiscalização (RIVA, FONSECA, HASENCLEVER, 2007). Ocorre que esses instrumentos não se mostraram eficientes e suficientes para a proteção ambiental, em parte devido à falta de estrutura do poder estatal para coibir o comportamento predatório.

Como alternativa, foi introduzida a lógica econômica, que não visava à coerção, mas ao incentivo a condutas ambientalmente corretas. A lógica é tornar as condutas ambientalmente corretas mais atrativas economicamente do que as práticas comuns que degradam o meio ambiente, de forma que os indivíduos optem pela primeira, ao invés da segunda (RIVA, FONSECA, HASENCLEVER, 2007).

Foi dentro dessa lógica econômica que se inseriu o PSA. O argumento do PSA é que o meio ambiente fornece gratuitamente vários bens e serviços que são usufruídos de forma difusa, porém são mantidos por apenas algumas pessoas. Por isso, deveriam ser realizadas “transferências financeiras de beneficiados de serviços ambientais para os que, devido a práticas que conservam a natureza, fornecem esses serviços” (RIVA, FONSECA, HASENCLEVER, 2007, p. 31).

Os serviços ambientais, aos quais se refere o PSA, incluem, segundo a Avaliação do Milênio dos Ecossistemas (Millennium Ecosystem Assessment):

a) serviços de aprovisionamento – alimentação, combustível, recursos genéticos, etc.;

b) serviços de regulação – regulação da qualidade do ar, do clima, de doenças, etc.;

c) serviços de suporte – ciclo de nutrientes, formação do solo, fotossíntese e outros que mantêm as condições para a vida na Terra; e

d) serviços culturais – espirituais, recreativos e benefícios culturais (IRIGARAY, 2010; SANTOS, 2011).

No caso de REDD+ é reconhecida a necessidade de recompensar financeiramente aqueles que conservam as florestas e que, consequentemente, mantêm serviços ambientais, notadamente, os serviços de regulação do clima, por meio do sequestro e manutenção de estoques de carbono. Portanto, não há dúvidas de que REDD+ consiste em um mecanismo de PSA.

Cumpre frisar que, apesar de “Pagamento por Serviços Ambientais” ser a expressão mais difundida, existem divergências quanto à nomenclatura do mecanismo. Carlos

Teodoro José Hugueney Irigaray, por exemplo, opta pela expressão “Pagamento por Serviços Ecológicos”, por entender que a expressão “serviços ecológicos” é mais específica quanto à natureza dos serviços que se pretende recompensar, enquanto que “serviços ambientais”, segundo ele, é expressão de conteúdo demasiadamente amplo, que acaba por abranger serviços que não possuem uma dimensão ecológica:

O equívoco que se pretende corrigir decorre da tradução convencionada, na América Latina, para a expressão inglesa Payments for ecosystem services, convertida em pagamento por serviços ambientais, o que amplia demasiadamente seu conteúdo, afastando-se da dimensão ecológica implícita na expressão “serviços ecossistêmicos”. Assim, por exemplo, tecnicamente uma floresta plantada com espécies exóticas, como o eucalipto, presta serviços ambientais, que incluem desde o seqüestro de carbono, como a própria utilização econômica da madeira, todavia, esse serviço não pode ser considerado como um serviço ecológico, ou mesmo ecossistêmico que mereça ser compensado financeiramente (IRIGARAY, 2010, p. 15-16).40

Tampouco existe consenso sobre a natureza jurídica do mecanismo de PSA, que já foi apontado como pagamento, remuneração, recompensa, compensação e até como investimento (SÁ, 2009; SANTOS, 2011). Na verdade, a divergência reside no fato de que nenhuma dessas categorias comporta perfeitamente o PSA. No entanto, como o próprio nome do mecanismo induz, é mais difundida a noção de pagamento.

Sobre o conceito de PSA, Sven Wunder elaborou um que é bastante aceito doutrinariamente. Para o autor (apud WUNDER, 2008, p. 29), Pagamento por Serviços Ambientais é:

Uma transação voluntária na qual um serviço ambiental bem definido ou uma forma de uso da terra que possa segurar este serviço é comprado por pelo menos um comprador de pelo menos um provedor sob a condição de que o provedor garanta a provisão deste serviço.

Assim, pela conceituação acima de Wunder, um esquema de PSA deve conter: a) serviço ambiental bem definido ou atividade que o assegure;

b) pelo menos um comprador do serviço; c) pelo menos um provedor do serviço; d) realização de transação voluntária; e

e) garantia de provisão do serviço pelo provedor.

40 Apesar das críticas, neste trabalho optamos por utilizar a expressão “Pagamento por Serviços Ambientais”, por ser a mais difundida na doutrina.

Em relação ao objeto do esquema de PSA, há que se destacar que os benefícios gerados pelos ecossistemas, em si, fazem parte da noção de meio ambiente ecologicamente equilibrado previsto no caput do artigo 225, da atual Constituição Federal, sendo, portanto, macrobens, de uso difuso, imprescritíveis, impenhoráveis e indisponíveis. Logo, não podem ser objeto de contrato de PSA. Por sua vez, as iniciativas humanas, individuais ou coletivas, que mantêm, recuperam ou melhoram o provimento dos benefícios gerados pelos ecossistemas, podem ser objeto de transação voluntária em esquemas de PSA (SANTOS, 2011).

Assim, em um esquema de REDD+, não se deve remunerar pelo sequestro ou pelo estoque de carbono – visto que esses são benefícios gerados pelo ecossistema e, portanto, inalienáveis –, mas sim remunerar as ações humanas que os promovem.

Portanto, os esquemas de PSA, ao indicar o seu objeto, não devem definir somente os serviços ambientais que se pretende produzir, mas também, e principalmente, estabelecer quais atividades o provedor se obriga a realizar para obter tais serviços ambientais.

Com base na noção acima, pode-se definir o provedor nos esquemas de PSA como aquele que mostra domínio sobre o serviço ambiental, ou seja, aquele que é responsável por garantir a provisão do serviço ambiental, por meio da realização de determinadas atividades, e que percebe compensação financeira por isso (SÁ, 2009; WUNDER, 2008).

Em esquemas de REDD+, será considerado provedor, portanto, aquele que demonstrar ser o responsável pelas ações que mantêm, recuperam ou melhoram o sequestro ou o estoque de carbono.

Por sua vez, o comprador em esquemas de PSA é a pessoa física ou jurídica que se disponha a pagar pelo serviço do provedor. A identificação do comprador no esquema de PSA define se o PSA é privado ou público. Será considerado privado, quando é financiado diretamente pelos usuários do serviço, e considerado público, quando o PSA é financiado pelo Estado, representando os usuários do serviço. (WUNDER, 2008).

Porém, em caso de PSA público, há a necessidade de uma base legal que respalde a ação estatal (WUNDER, 2008). No caso de REDD+, a base legal brasileira está sendo construída, e, à medida que ela se consolidar, maior será o financiamento estatal de iniciativas de REDD+.

Já a garantia de provisão do serviço ambiental é, segundo Wunder (2008, p. 37 e 43-44), um importante fator para a credibilidade de um esquema de PSA, e está diretamente

ligada à condicionalidade do pagamento e à aplicação de sanções ao provedor que não cumprir com suas obrigações do contrato.

Finalmente, o esquema de PSA deve, ainda, ser uma transação voluntária, o que significa que deve ser celebrado por meio de contrato (WUNDER, 2008).

Entretanto, no caso de REDD+, em razão de serem iniciativas bastante recentes, não há ainda uma padronização sobre como devem se materializar esses contratos, de modo que eles vêm sendo firmados de diferentes formas em cada iniciativa de REDD+. Porém, é cediço que, ao menos, esses contratos estão sujeitos aos requisitos estabelecidos na Teoria Geral dos Contratos, quais sejam: a) capacidade dos agentes, b) objeto lícito, possível e determinado (ou determinável); c) forma prescrita ou não defesa em lei; e d) consentimento dos interessados (SÁ, 2009).