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Como ensina JÓNATAS E. M. MACHADO E PAULO NOGUEIRA DA COSTA “Em termos gerais pode dizer-se que se trata aqui de Estados ou territórios que, em maior ou menor medida, se apresentam dotados de uma tributação reduzida ou nula e de autoridades tributárias autónomas, subordinados a padrões estritos de confidencialidade, equipados com infra-estrutura de comunicações de elevada qualidade, possuidores de profissionais competentes, especialmente receptivos ao capital internacional, cujas receitas assentam, essencialmente, nos preços cobrados por serviços prestados (v.g. serviços jurídicos, comerciais e financeiros) e taxas de natureza administrativa e burocrática (v.g. notariado e registos) ” (itálico nosso) 401.

Deste modo, os países, regiões ou territórios sujeitos a um regime claramente mais favorável constituem importantes plataformas política, jurídica, económica e financeiramente eficazes, estáveis e seguras. Por conseguinte, são criadores de um ambiente business friendly.

No que respeita aos pressupostos da cláusula específica em análise, os mesmos estão previstos no artigo 65.º, n.º1 do CIRC. Segundo o n.º 1 deste artigo “1 - Não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado” (itálico nosso). Assim, os pressupostos são:

1. Determinado pagamento que é efetuado por uma entidade residente, a favor de uma entidade não residente;

400 Nesse sentido, cfr. acórdãos do TCAS de 9 de abril de 2002, de 17 de fevereiro de 2004, processo n.º 73/03, processo n.º 1573/98, de 4 de

outubro de 2005, processo n.º 278/04, de 5 de dezembro de 2006, processo n.º 35058/00 e de 18 de dezembro de 2008, processo n.º 2515/08. Além disso, cfr. acórdãos do STA de 1 de junho de 2005, processo n.º 228/05 e de 29 de novembro de 2006, processo n.º 401/06, disponíveis em http://www.dgsi.pt.

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2. Essa entidade não residente está sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável. Por hipótese, o sujeito passivo A do ordenamento português que efetua pagamentos, ou assume compromissos com o sujeito passivo B, tanto uma pessoa singular como uma pessoa coletiva, que está sediada no ordenamento estrangeiro. Além disso, a entidade B está sujeita a um regime mais favorável. Ora, o artigo 65.º, n.º 2 do CIRC prevê as situações de regime fiscal claramente mais favorável. Assim, considera-se que uma pessoa singular ou coletiva está submetida a um regime claramente mais favorável quando:

a) O território de residência para pessoa singular ou coletiva deve constar da lista aprovada por portaria do Ministério das Finanças (v.g. Andorra, Antilhas Holandesas, Bahamas, Bolívia, etc) 402;

b) Não haja o imposto análogo ao nosso CIRS ou CIRC, mesmo que não conste daquela listagem;

c) Ou mesmo que haja um imposto análogo ao nosso CIRS ou CIRC, o imposto pago seja menor 60% daquele que pagaria no ordenamento português. Vamos falar em ordenamento embora este abranja o país, território ou uma região 403.

402 Cfr. Portaria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro, retificada pela declaração de retificação n.º 31/2004 de 23 de março.

403 Na pureza dos conceitos, a identificação feita pela portaria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro entre países, regiões ou territórios sujeitos a um

regime claramente mais favorável e paraísos fiscais (tax havens) não é mais correta pois não são necessariamente expressões coincidentes. Além disso, também devemos distinguir estas duas realidades dos offshores. Na verdade, os territórios sujeitos a um regime claramente mais favorável não são uma coisa, nem outra. Ora, uma região ou território offshore é um território fora, sem tributação. No fundo, corresponderá ao segundo requisito do território sujeito a um regime claramente mais favorável que enunciamos supra. É um território ou região onde, apesar de haver impostos, determinados setores da atividade económica não estão sujeitos a tributação (v.g. seguradoras, etc). Por outras palavras, estamos perante territórios de tributação leve ou ausência de tributação. Por outro lado, também não existem países absolutamente offshores, pois nenhum país consegue existir sem impostos, o que existe é países que selecionam setores de atividade, em que por exemplo para o setor bolsista estabelecem uma taxa reduzida de IVA, IRC, etc., para o setor bancário uma taxa reduzida de IRC, para o setor segurador tem uma redução da taxa de IRC. Se consultarmos os Estatutos dos Benefícios Fiscais (EBF), nos artigos 33.º e ss fala em Zona Franca da Madeira, além de outros regimes fiscais mais favoráveis. Sucede que tem que se ver o setor de atividade em causa, pois pode em certos casos um local ser mais interessante, por exemplo ao nível da derrama e já outro não o ser a esse nível, mas a outros. Por outro lado, temos um terceiro conceito, que é o de paraíso fiscal. Este além de englobar a ideia de offshore, da tributação leve ou inexistente, agrega outras caraterísticas: (i) estabilidade política; (ii) acessibilidade e (iii) clima. A propósito desta matéria cfr. Laurent Leservoisier, Os paraísos fiscais, Publicações Europa-América, 1990, Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, com a colaboração de Clotilde Celorico Palma e Leonor Xavier, 2.ª Edição Actualizada, Coimbra, Almedina, 2007, pp. 357 e ss, Caroline Doggart, Paraísos Fiscais, 3.ª Edição, Porto, Vida Económica, 2003, pp. 13 e ss. A autora CAROLINE DOGGART aponta os seguintes elementos essenciais de um paraíso fiscal: (i) impostos baixos ou não existentes; (ii) estabilidade política; (iii) especialização em termos empresariais; (iv) existência ou não de acordo de dupla taxação ou da sua ausência; (v) direitos de residência; e (vi) custo de vida. Além disso, cfr. Jose Manuel Braz da Silva, Os Paraísos Fiscais: Casos Práticos com Empresas Portuguesas, 3.ª Reimpressão de Março de 2000, Coimbra, Almedina, 2007, pp. 21 e ss.

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Se tivermos um dos três critérios analisados supra, o artigo 65.º, n.º 1 do CIRC prevê uma limitação da dedutibilidade e tributação autónoma de pagamentos realizados a entidades não residentes submetidas a um regime claramente mais favorável. Deste modo, estes pagamentos que figurariam como custos, no sujeito passivo A, não são dedutíveis para efeitos fiscais, a não ser que o sujeito passivo prove que se trata de custos efetivos e reais da sua atividade corrente e ordinária, isto é, que esses encargos correspondem a operações efetivamente realizadas, e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado, nos termos do artigo 65.º, n.º 1, in fine do CIRC. Neste sentido, tem que haver contraprova do sujeito passivo. Ora, o abuso será aqui utilizar os custos fictícios e não custos reais.

Pensemos, por exemplo, no caso de uma empresa portuguesa contratar com uma empresa estabelecida no Luxemburgo. Contudo, a sociedade portuguesa endivida-se à sociedade luxemburguesa, com o objetivo de aumentar os seus custos. Deste modo, a sociedade luxemburguesa vai ver a sua matéria coletável aumentar, mas como essa sociedade preenche um dos três critérios supra vertidos, entende a lei que temos aqui uma causa de evasão fiscal. Por conseguinte, não estamos a falar de fraude fiscal, porque não há nenhuma simulação, não há nenhum pagamento ou atividade ilícita. Neste sentido, são negócios jurídicos privatisticamente, perfeitamente válidos, mas há o abuso da forma jurídica. Isto acontece se o contribuinte não provar que aqueles custos correspondem à sua atividade efetiva do ponto de vista comercial, mercantil, etc. Por outro lado, apesar do sujeito passivo entender que a sua operação cumpre todos os pressupostos para os seus custos serem dedutíveis, poderá ver o seu lucro tributável aumentar em resultado de um risco fiscal associado á interpretação normativa da cláusula específica anti-abuso em análise. Pensemos, num possível ato de planeamento fiscal, uma empresa paga determinados serviços a uma entidade não residente e sujeita a um regime privilegiado entende que os custos derivados do pagamento do respetivo serviço pode ser deduzida porque foi uma operação efetivamente realizada (v.g. o sujeito passivo possui os comprovativos de pagamento, as notas de encomenta e as faturas), o montante tendo em conta o praticável no mercado nacional, não é exagerado. Todavia, a AT pode vir depois considerar, que o montante pago pelo serviço foi exagerado e caso vença a sua tese, o sujeito passivo verá o seu lucro tributável aumentado.

D) IMPUTAÇÃO DE LUCROS DE SOCIEDADES NÃO RESIDENTES SUJEITAS A UM REGIME