• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II SUPERVISÃO PEDAGÓGICA: CONCEITOS E PERSPETIVAS

II.1. Para um enquadramento do conceito de supervisão pedagógica

enquadram-se os conceitos de supervisão pedagógica na sua relação com a educação escolar e com a formação inicial de professores. Os modelos de supervisão são, seguidamente, explicitados, paralelamente aos cenários e perspetivas concetuais, de acordo com a visão de diversos autores.

Abordam-se, depois, alguns requisitos e competências para a prática supervisiva potenciadora da relação entre a teoria e a prática e da construção de conhecimento.

Destaca-se, no ponto seguinte, o papel do supervisor, com atenção às suas funções e responsabilidades em contexto de formação inicial de professores e salientam-se as competências específicas que facilitam a melhoria das práticas pedagógicas e articulam o processo supervisivo.

O último item refere-se às questões da avaliação inerente à prática supervisiva, entendidas com um caráter de melhoria do ensino.

II.1. Para um enquadramento do conceito de supervisão

pedagógica

O conceito de supervisão, como sustenta Roldão (2012:7), é “atravessado por um conjunto de leituras teóricas e perspetivas práxicas que o podem remeter (…) para significados e usos muito diversos”. Deste ponto de vista, importa, então, convocar algumas perspetivas teóricas, e respetivas caraterísticas das práticas educativas de supervisão.

A supervisão pedagógica pode, então, ser entendida como um processo de trabalho com, e entre, professores, para melhorar a sua prática e para promover o seu crescimento profissional (Duffy, 1998), representando, assim, um contributo para a construção de profissionalidades reflexivas e

inovadoras (Day, 2001). Esta perspetiva aproxima-se do pensamento de Alarcão (2001:24), quando sustenta que ser professor-investigador implica “desenvolver competências para investigar na, sobre e para a acção educativa”. Em concordância com o pensamento desta autora, Azevedo (2012:5) argumenta que a supervisão, quando realizada na base de um “reforço da capacidade reflexiva e colaborativa, pode representar (…) uma importante estratégia de afirmação da autonomia profissional dos/as professores/as, de construção de conhecimento profissional e de melhoria da qualidade do ensino”. Ao dar ênfase ao desenvolvimento e autonomia, Vieira e Marques (2002) preconizam também uma conceção de supervisão de orientação reflexiva e potenciadora de transformação. Referem a propósito:

“na nossa visão da supervisão das práticas docentes assumimos que uma orientação reflexiva deve estar de mãos dadas com a defesa da visão de educação escolar como um espaço para a transformação individual e social,” (ibidem:4).

Sublinham ainda que qualquer discussão “sobre a autonomia docente não fará (…) sentido sem uma conceção de ensino que englobe o desenvolvimento da autonomia do aluno” (ibidem).

É nesta linha argumentativa que se situa a visão de Vieira e Moreira (2011), ao defenderem uma orientação transformadora da supervisão pedagógica, assente em valores de liberdade e de responsabilidade social. As autoras definem os papéis do aluno e do professor na sala de aula e descrevem os fatores que condicionam a operacionalização destes papéis em contexto pedagógico. Sublinham, assim, que “uma das funções principais da supervisão (…) será identificar os constrangimentos a uma educação transformadora, bem como os espaços de manobra que tornem possível colmatá-los” (ibidem:13).

A supervisão pode, nesta perspetiva, ajudar a identificar a intencionalidade do ato educativo, apoiando-se na reflexão com e entre todos os atores envolvidos nesse ato educativo e contribuir para uma melhoria

partilha, assumindo-se o supervisor como o principal elo entre todos os agentes educativos. Assim entendida, a supervisão traduz-se num trabalho colaborativo desenvolvido numa relação de ajuda e de colegialidade.

Integra-se nesta conceção o pensamento de Coimbra (2013), ao considerar a supervisão como um processo baseado em atividades de partilha e de cooperação, desenvolvido no interior de um sistema ecológico e sócio construtivista, que alia a teoria e prática. Esta perspetiva foi já sustentada por Máximo-Esteves (2008), ao advogar a importância da articulação da teoria com a prática considerando que esta articulação “permite não só a produção de conhecimento útil (aos sujeitos) mas também o aumento de poder, através da dupla capacidade de produzir conhecimento e ser capaz de o aplicar” (ibidem:66). Da aplicação refletida e aperfeiçoada da prática resulta a adequação da ação educativa, tendo em conta a singularidade e as caraterísticas individuais de cada aluno. Este pressuposto assenta na crença de que “de nada adianta darmos aulas e conteúdos de forma admirável se depois não chegam aos alunos, se eles não os entendem ou não os conseguem interiorizar” (Machado, 2011:111).

Alarcão e Canha (2013), ampliam esse entendimento de supervisão a uma dimensão formativa, definindo-a, então, como uma ação

“de acompanhamento e monitorização das atividades (…) tendo uma intencionalidade orientadora, formativa (…) que acentua a sua orientação transformadora, de natureza reflexiva e autonomizante assente em interações que, concretizadas em dinâmicas de realização e sustentadas por atitudes de abertura e de corresponsabilização, se afirmam como instrumentos ao serviço do desenvolvimento” (ibidem: 83).

No âmbito do foco em estudo, estas perspetivas de reflexão e estratégias de supervisão ancoram-se na ideia de professor como intelectual transformativo (Giroux, 1990), isto é, na ideia de professor como um ator que intervém de forma crítica sobre o mundo e sobre as situações sociais e que trabalha com os seus alunos, situando-se, e situando-os, como agentes de mudança, agentes de transformação social. Nesta mesma direção se situa

também a conceção de professor como investigador (Stenhouse, 1985), que preconiza a ideia de que o ensino e a aprendizagem são mais eficazes se baseados na descoberta do mundo, na pesquisa dos problemas e das suas possibilidades de resposta.

Nestas conceções, a adoção de uma postura reflexiva é considerada central, não apenas porque “enriquece o eu (mas porque) melhora, efectivamente, a prática profissional que se configura exteriormente ao sujeito que reflecte” (Gonçalvez, 2006:105). Assim, é importante que o profissional de educação assuma um papel de investigador, não ficando estagnado ao nível do conhecimento. Tal como refere Alarcão (2001), “primeiro que tudo [o profissional de educação deve] ter uma atitude de estar na profissão como intelectual que criticamente questiona e se questiona” (ibidem: 6).

As perspetivas de supervisão pedagógica de matriz reflexiva, colaborativa e transformacional podem ser interpretadas a partir do que Korthagen (2010a) designa por ciclo reflexivo. Este ciclo começa com a ajuda do supervisor para encontrar experiências úteis para agir, passando pela criação de métodos alternativos de ação, até à ajuda na continuidade do processo de aprendizagem. Este ciclo reflexivo norteia a prática do professor/mediador, propondo diretrizes sobre a formação de professores que propõem perspetivas de reflexão e estratégias de supervisão para professores e formadores de professores. Neste caso, a natureza reflexiva da supervisão, tal como já em 1993 foi sustentado por Vieira, permitirá ao professor lidar com situações novas e imprevisíveis do seu contexto profissional, permitindo o desenvolvimento de pensamento crítico através da ação, dos discursos e das práticas, de forma emancipatória. Segundo esta autora, este caráter emancipatório, pressupõe que “as finalidades e a natureza das práticas supervisiva e pedagógica devem estar articuladas” (Vieira, 2009:198).

Assim, em contexto de formação inicial de professores, sustentamos, em consonância com os autores convocados, que a qualidade da supervisão se associa à promoção da capacidade de comunicar, e de refletir, de forma crítica, e fundamentada, sobre a ação profissional ou profissionalizante. Nesta posição, apoiados por Oliveira-Formosinho (2002), sustentamos também que a

ideia de que a partilha comunicacional pode ser suportada por um trabalho em equipa, promotor da partilha de experiências e da reflexão sobre as práticas e possibilitador da tomada de decisões coletivas geradoras de inovação (Hohmann e Weikart, 2009).

Em proximidade com a perspetiva de Korthagen (2010a), podem ser situadas as reflexões colaborativas que, segundo Alarcão e Roldão, (2008), constituem estratégias com grande potencial formativo.

Em síntese, os conceitos de supervisão pedagógica explicitados podem ser situados no que Alarcão (1999) designou de cenários e/ou enfoques supervisivos. Na perspetiva da autora, são quatros os possíveis cenários da supervisão: operativo, investigativo, consultivo e formativo5. O cenário

operativo está mais focado na instrução, o investigativo promove a reflexão e o consultivo orienta e aconselha. No caso do cenário formativo, como o do contexto em estudo, o sujeito participa do ato supervisivo. Trata-se, como sublinha Dubar (2006) de uma abordagem implicada do sujeito que se conhece e se obriga “a refletir, a mudar, a lutar para «superar» e a inventar-se a si próprio, com os outros” (ibidem:185). Esta identidade pessoal constrói-se na articulação entre si e os outros, entre a teoria e a prática. No âmbito de reflexão em foco neste ponto, tal perspetiva coaduna-se com uma orientação transformadora da supervisão pedagógica (Vieira e Moreira, 2011).