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Capítulo V Análise e discussão dos resultados

5.2. Categorização das entrevistas

5.2.1. Percurso Escolar

No que diz respeito, a análise dos resultados provenientes da categoria Percurso

Escolar, e atendendo às respostas dadas pelos utentes, familiares e técnicos foram criadas

três subcategorias: Adaptação na escola, Relação com os colegas e relação com os professores.

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5.2.1.1. Adaptação na escola

Para caracterizar a inclusão das pessoas com deficiência no interior algarvio importa entender o seu percurso a nível escolar quer, na aquisição de competências quer na integração e relação com os colegas e professores, em geral. As declarações dos entrevistados revelam perspetivas e experiências diversas, em termos de percurso escolar.

Relativamente ao ano de escolaridade, apenas dois entrevistados (U1 e U3) afirmaram não saber ler nem escrever, pois começaram desde cedo a enfrentar tarefas diárias, não tendo ido à escola. Os outros utentes (U2, U6 e U7) tiveram a oportunidade de frequentar a escola até ao ensino básico (9ºano de escolaridade). Apenas os utentes U4 e U5 começaram a estudar e desistiram a meio do percurso, por falta de interesse e pelo início de tarefas profissionais. Depois foram transferidos para um colégio interno e para uma casa de crianças até aos 20 anos de idade. Os entrevistados que não continuaram a estudar realizaram cursos no âmbito profissional com o objetivo de ter uma maior abertura e integração no mercado de trabalho.

As declarações das famílias por sua vez, revelam experiência e conhecimento nesse âmbito, descrevendo de forma profunda o percurso dos seus filhos. As famílias F2 e F3 afirmam que os seus educandos não adquiriram muitos conhecimentos enquanto frequentaram o ensino obrigatório, devido à falta de esforço e empenho da parte do educando ou do acompanhamento inadequado dos professores: “É assim…ele não fez

nada, também não houve assim muito esforço para isso (…) se ele tivesse empenhado um pouco mais ele aprendia (…) a ler e a escrever …” (F2).

Na opinião dos técnicos, a escola não apoia as pessoas com necessidades especificas, nem sabe que respostas existem para os informar, na opinião do T1 “E depois

as pessoas também não têm essa sensibilidade nem os conhecimentos necessários para saber que tipo de respostas é que pode acontecer depois de saírem da escola.” A opinião

do T2 é semelhante, pois este refere que “Há falta de apoio…. Não há métodos e

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5.2.1.2. Relação com os colegas

A relação dos entrevistados com seus colegas ao longo do percurso escolar foi positiva. Os utentes U2, U4 e U5 afirmaram que era boa e havia respeito por parte dos outros.

- “Normal, dava-me bem com todos” (U2) -“Dava bem (…)” (U4)

-“Ham...dava...dava, pois dava bem” (U5)

Apenas os utentes U6 e U7, devidos às suas dificuldades na área da interação social vivenciaram momentos de maus tratos a nível verbal e psicológico, por parte de alguns colegas. A U6 relatou que “Nos primeiros tempos sim depois já não…alguns

tratavam-me muito mal (…) mandavam-me com coisas todas ao ar…”. O U7 também

relatou que os colegas sempre “gozaram” com ele, ofendendo-o verbalmente. A relação com os professores foi considerada pela maioria dos entrevistados muito boa, afirmando que eles sempre acompanharam e ajudaram muito durante esse percurso. Em relação à continuação dos estudos, os utentes U1, U2, U4 e U7 relataram com incerteza e dúvida essa questão demonstrando falta de interesse e desmotivação, devido às suas dificuldades no dia-a-dia. Porém, os utentes U3, U5 e U6 pretendiam continuar com os estudos, no sentido de desenvolver novas competências e adquirir novas oportunidades no mercado de trabalho.

As famílias F1 e F2 descrevem a relação dos seus filhos com os colegas da escola como sendo boa, pois nunca tiveram nenhuma queixa por parte dos educandos sobre alguma situação de exclusão: “Que eu tenha conhecimento não, porque isso foi sempre

uma coisa que eu lhe ensinei…não deixar ninguém fazer pouco de ti …” (F1). Já as

famílias F2, F3 e F4 presenciaram muitas dificuldades nos filhos em relacionar com os outros colegas na escola: “Ele teve assim…um problema, mas não era dele, era a outra

pessoa que embirrava com ele e implicava …”

5.2.1.3. Relação com os professores

A relação com os professores foi considerada pela maioria dos entrevistados muito boa, afirmando que eles sempre acompanharam e ajudaram muito durante o seu percurso.

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Em relação aos professores, as famílias F1 e F3 sentiram a falta de acompanhamento e apoio por parte deles, pois afirmam que apenas ajudavam durante o horário escolar, e quando ajudavam não conseguiam dar respostas adequadas às dificuldades dos seus filhos, devido à falta de formação na área da Necessidades Especiais. Os entrevistados F1, F2 e F3 referiram que ao longo do percurso escolar sempre incentivaram muito os seus filhos a continuar a estudar e a superar as suas dificuldades, tal como se pode verificar:

- “(…) eu sempre lhe disse e ainda hoje lhe digo (…) que ele tem que ler e escrever

mais para não se esquecer do pouco que sabe” (F1)

- “(…) ele queria desistir do curso por causa dessa pessoa implicar com ele, e eu disse: não! Não vais desistir do curso, vais continuar até ao fim” (F2)

- “Sim, sim…ela tinha os trabalhos de casa e eu ajudava” (F3)

Os técnicos referiram também a questão da transição pós-escolar, onde os técnicos T1 e o T3 relataram com clareza e determinação que após o ensino obrigatório a escola não apoia estas pessoas na sua transição pós-escolar. A entrevistadora T1 afirma que, Portugal no geral, ainda não possui uma visão muito grande do apoio que tem de ser dado a estas pessoas. Na sua opinião, considera que após o ensino obrigatório já não existe nenhuma obrigatoriedade ou responsabilidade perante estas pessoas. A técnica T1 afirma que as próprias pessoas não têm a sensibilidade nem os conhecimentos necessários para entenderem que tipo de apoio têm direito, após terminarem o ensino, ou seja, muitas vezes tem que ser os pais a procurar esses recursos, pois por vezes até os professores não sabem aconselhar ou encaminhar para os apoios mais adequados. Na perspetiva da entrevistada considera que a principal causa é pela falta de interesse e formação das pessoas.

- “Não, todos eles saíram da escola e ficaram um pouco no vazio, alguns foram logo encaminhados (...) para alguns cursos de instituições, por exemplo na Cracep em Portimão. Temos também algumas pessoas que foram para a Existir em Loulé (…) mas outros saíram da escola e a partir daí tiveram que ser os pais a preocupar-se encontrar um sítio para eles (…) nem todos conseguiram” (T1)

O técnico T2 afirma que não tem um grande conhecimento sobre esta questão acerca da transição pós-escolar, mas na sua perspetiva sente que as escolas, de uma forma

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geral confrontam-se com sérias dificuldades e capacidade em dar respostas às pessoas com necessidades específicas. O entrevistado descreve que para essa grande falta de apoio ainda não têm métodos e resultados concretos, pois estão numa fase experimental onde integram as crianças com deficiência em turmas ditas “normais” para encontrarem respostas adequadas às suas necessidades.

Para a técnica T3, a questão da transição pós-escolar é subjetiva:

- “…na vida real a maioria não tem emprego…só nas instituições realmente por exemplo como a Casa do Povo onde isso é incluído e hoje em dia já algumas instituições que têm esse protocolo a nível de inclusão, aí sim é inserido agora de resto…muito dificilmente arranjam um emprego” (T3)

Os três técnicos concordam que estas pessoas com deficiência em idade adulta não foram preparados na escola para as atividades da vida diária, mas como os jovens da atualidade, já se tem tido alguma preocupação em ajudá-los a ser mais autónomos: “Hoje

com a nova lei que existe que ainda não está bem implementada, aí acredito que com o decorrer dos anos daqui a uns três/quatro anos haja mudanças” (T3).

A informação supramencionada na categoria percurso escolar, demonstra que a maioria destas pessoas não teve um acompanhamento adequado e persistente por parte da escola, pois de acordo Ainscow e Ferreira (2003), a inclusão defende uma educação que seja eficiência para todos. No entanto, através do testemunho dos entrevistados, o conceito de educação inclusiva continua a ser um novo paradigma de ensino que nem todas as escolas estão a implementar, o que impede que todos os alunos tenham as mesmas oportunidades de ensino. Os resultados obtidos demonstram, que de acordo com a implementação do Decreto-Lei nº54/2018, se os estabelecimentos de ensino apostassem realmente numa escola inclusiva, para todos os alunos poderia haver progressos a nível da sua autonomia e da sua plena inclusão. Contudo, continua a ser um percurso desafiante e questionável, pois os resultados obtidos demonstraram que as pessoas com deficiência não fizeram uma transição pós-escolar eficiente, nem foram preparadas para as atividades da vida diária.

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