• Nenhum resultado encontrado

3 METODOLOGIA

3.1 Pesquisa qualitativa

A relevância da pesquisa qualitativa nos estudos das relações sociais reside particularmente na “pluralização das esferas da vida” (FLICK, 2009), cuja consequência é a configuração de novos ambientes sociais, reforçados pela conjuntura da modernidade, os quais exigem novas leituras para os estudos empíricos de questões correlatas. Nesse contexto, à narrativa social associa-se a interpretação do contexto, considerando a prática social uma dialética relevante a ser analisada.

O perfil qualitativo explora uma ampla dimensão do mundo social, como: processos sociais, instituições, discursos ou significados gerados dessas relações. Isso evidencia a importância desse viés de pesquisa em traçar argumentos relacionados a como as questões funcionam em contextos particulares (MASON, 2002). Resende (2008, p. 82) destaca o perfil potencialmente crítico da pesquisa qualitativa para as ciências sociais em identificar “[...] estruturas de poder naturalizadas em um contexto sócio-histórico definido”.

Nesta tese, o perfil qualitativo revela-se na própria escolha do objeto a ser analisado, o qual objetiva a interpretação de elementos da realidade social, incluindo texturas, tramas do cotidiano, experiências, formações de sentido, instituições, discursos, entre outras semioses. Assim, o objeto da pesquisa e o interesse em desenvolver uma leitura crítica da realidade social do turismo foram

determinantes na escolha da metodologia, assumindo o autor as possíveis críticas inerentes às seleções, mecanismos de análise e ângulos a serem investigados.

Na tese, um dos parâmetros para a escolha metodológica foi selecionar métodos de análise capazes de sistematizar leituras críticas a partir da triangulação entre discurso, prática social e turismo, que possibilitassem reflexões e interpretações críticas com base na percepção do autor em relação à disparidade existente entre os discursos e a prática social no contexto do turismo regional.

Dessa forma, alinha-se o estudo à pesquisa qualitativa, cujos elementos são captados levando em conta o contexto social, objetivando apreender tramas forjadas no cotidiano, das quais emergem elementos importantes de interpretação e explanação do mundo social (MASON, 2002). Assim, a escolha da estrutura epistemológica e metodológica para a pesquisa encontrou na análise qualitativa coerência e escopo adequados para traçar as análises entre objeto e método.

No estudo, a estruturação da hipótese só foi delineada a partir da escolha do arcabouço teórico-metodológico da ADC, haja vista que essa teoria possibilitou integrar quatro intenções do autor para a pesquisa: 1) Focar a análise do turismo numa plataforma qualitativa; 2) Analisar o turismo em relação à sua base estrutural ideológico-discursiva; 3) Identificar mais claramente as contradições entre o binômio discurso e prática social; e 4) Colaborar para a formulação de ações emancipatórias e interpretativas às realidades observadas como forma de direcionamentos sustentáveis para o turismo no Ceará.

Uma questão intencional subjacente às escolhas metodológicas da pesquisa foi a de clarear interpretações pertinentes aos contextos socioeconômico e político do turismo, julgando necessária a promoção de processos emancipatórios. Explica-se que a pretensa emancipação mediante a leitura crítica dos fenômenos notadamente não dará conta da intrincada e normatizada relação de poder, hierarquias, perdas e ganhos forjados no âmbito do turismo, contudo concorda-se com Costa (2009, p. 94) quando afirma que, “[...] não obstante, a exposição das contradições das aparências dominantes colabora inegavelmente para uma ação emancipatória”.

Na pesquisa qualitativa, as subjetividades do entrevistado e entrevistador são partes relevantes do processo de investigação. Riley e Love (2000, p. 168) defendem que na pesquisa qualitativa o contexto e a interconexão com o meio circundante é crucial, assim como a interpretação do investigador:

“Igualmente crucial é o investigador como instrumento, porque só o instrumento [percepção] humano pode apreender as interações de contexto e as múltiplas realidades que são reveladas através do entendimento tácito”.

Nessa mesma direção, Morin (2005, p. 235) expõe que “[...] uma teoria não é o conhecimento”, não é a chegada, mas proporciona partida; não é a solução, mas possibilita tratar um problema. No entendimento do autor, a teoria ganha vigor por intermédio do “[...] pleno emprego da atividade mental do sujeito. É essa intervenção do sujeito que dá ao termo método seu papel indispensável” (MORIN, 2005, p. 235).

Mason (2002, p. 5) explica que a pesquisa qualitativa exige engajamento dos pesquisadores, inclusive para resolver questões que podem emergir ao longo do estudo, incluindo a análise do contexto específico (particularidades) do objeto. Assim, para a autora, o perfil qualitativo é ao mesmo tempo excitante e desafiador; ela coloca como questão central nesse tipo de pesquisa “os atos reflexivos do pesquisador”.

Reflexividade nesse sentido significa pensar criticamente sobre o que você está fazendo e por que, confrontando e muitas vezes desafiando suas próprias suposições, e reconhecendo que seus pensamentos, ações e decisões moldam como você pesquisa e o que você vê. (MASON, 2002, p. 5).

Outro desafio a ser considerado na estruturação da pesquisa qualitativa é “[...] o fato de que há uma interdependência mútua das etapas isoladas durante o desenvolvimento da pesquisa” (FLICK, 2009, p. 95). Neste estudo, o delineamento dos pontos a serem pesquisados, os parâmetros de análise e as chaves interpretativas demandaram uma ampla pesquisa acadêmica e reflexões do autor, sobretudo para que as etapas do trabalho tivessem conectividade e coerência entre as análises e o objeto pesquisado.

Nessa trajetória, a inter-relação entre o conhecimento empírico17 do autor acerca do turismo, somada à formação crítica e acadêmica adquirida ao longo dos anos, foi importante para o delineamento do esboço da pesquisa, principalmente no que concerne ao raciocínio de construção do objeto e à intencionalidade em

17 Os significados subjetivos apreendidos pelo autor em suas atividades e ambientes. “De maneira

geral, essa abordagem desempenha um papel central na pesquisa qualitativa tanto recente quanto historicamente” (FLICK, 2009, p. 69).

contribuir para o desvelamento de poderes e marcas ideológicas clivadas nas práticas do turismo regional.

Nesta tese, a relação entre pesquisa qualitativa e turismo não se foca no estudo do fenômeno em si, ainda que seu contexto tenha sido explanado como forma de situar a conjuntura social da análise; busca investigar a construção de alguns elementos subjetivos nucleados no turismo, como os discursos, que acabam por interferir na vida das pessoas. Entende-se que pesquisar os significados e o direcionamento dado às questões em contextos específicos corresponde a uma tarefa importante, pois: “[...] o significado tem função estruturante: em torno do que as coisas significam, as pessoas organizarão de certo modo suas vidas, incluindo as suas próprias percepções sobre a realidade em que vivem” (ALVES, 2011, p. 608).

Embora a pesquisa qualitativa revele-se potencialmente eficaz para os estudos do turismo, com ênfase aos que abrangem as reflexões e interpretações do fenômeno no contexto social e da relação com outros setores, esse tipo de pesquisa ainda continua subutilizado na área do turismo. Para Phillmore e Goodson (2004), esse perfil de pesquisa ainda não foi sistematizado em ferramenta de pesquisa e conhecimento no turismo. E acrescentam que no turismo o perfil qualitativo ajuda “[...] a compreender as dimensões humanas da sociedade, que no turismo incluem suas implicações sociais e culturais” (PHILLMORE; GOODSON, 2004, p. 4).