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Plano da Vila de Mirandela

No documento Mirandela Setecentista. (páginas 124-129)

CAPÍTULO III – A PAISAGEM URBANA

1. Morfologia Urbana

1.3. Plano da Vila de Mirandela

Existiram em tempos imemoriais na câmara dois exemplares da planta topográfica de Mirandela, um deles encaixilhado e resguardado em vidro, actualmente desaparecidos. Eram da autoria de Miguel Francisco de Mendonça, benemérito da vila480. Posteriormente, foi efectuada a sua reconstituição:

1.3.1. Ruas

O modo como espacialmente se produz a circulação de pessoas e produtos e as relações da estrutura viária com os diversos elementos urbanos determinam, em larga medida, a estruturação básica da textura urbana. A rua, concebida para a movimentação pedestre, animal e de viaturas, é o elemento básico da estrutura urbana. Assente num suporte geográfico preexistente, garante contactos com o exterior, determina o ordenamento com os quarteirões e edifícios e a relação destes com o espaço urbano, enunciado pelas fachadas.481

A geografia condiciona o traçado da rua, a sua sinuosidade, o pendor e a orientação da mesma. Porém, numa perspectiva funcional, as conexões no interior do espaço urbano e as articulações e as vias de acesso ao exterior mantêm-se estáticas ao longo dos séculos. O sistema viário é dinâmico e adapta-se às mudanças estruturais ao longo de séculos.

Vejamos então o sistema viário de Mirandela, mas para isso, sentimos necessidade de recuarmos até ao período medieval. Aí verificamos que as ruas de Mirandela eram apertadas e sinuosas devido à falta de espaço no interior da muralha e disposição por vezes acidentado do terreno. A maior parte das ruas, travessas e largos possuíam nome de Santo, revelando o grande sentido de religiosidade do povo482.

480 SALES, Ernesto Augusto Pereira de – ob. cit., p. 62.

481 LAMAS, José Garcia – Morfologia urbana e desenho da cidade, Lisboa: Fundação Calouste

Gulbenkian, 1993, pp. 99-100, 152-154.

482 Todos os dados que apresentamos relativos às ruas, praças e largos de Mirandela surgiram

A toponímia das ruas medievais manteve-se até ao século XIX483 , sendo feita a sua nomenclatura e numeração dos prédios pela edilidade em 1839484. No século XX foram rasgadas novas vias, mas agora para além dos nomes de santos, surgiram nomes laicos485.

1.3.1.1 Estado Geral e Limpeza das Ruas

Devido ao facto de uma grande parte das Actas de Vereações da Câmara de Mirandela do século XVIII terem desaparecido e as existentes compreendidas entre 3 de Abril de 1742 e 2 de Setembro de 1744 não fazerem qualquer referência a esta temática, fomos obrigadas a socorrer-nos uma vez mais da obra de Ernesto Sales. Segundo o autor, até finais do século XVIII todas as ruas de Mirandela eram consideradas de mau piso, devido à sua posição em declive e serem calcetadas com seixos rolados vindos do leito do rio Tua. Mais tarde, os vereadores concelhios decidiram que o pavimento fosse melhorado e mandaram calcetá-las. Paulatinamente, a área da vila foi-se alargando, construíram-se mais casas e ruas ao longo de centúrias. A limpeza Mirandela Apontamentos Históricos, Bragança: Junta Distrital de Bragança, 1970, vol. I, pp. 54- 62; Mapa Topográfico que nos foi cedida pela CMM.

483 Mantiveram-se até finais do século XIX as ruas de S. José, do Postigo de S. José, Rua de

Santo António, Travessa de Santo António, Rua dos Ferreiros, Rua de Santiago, Rua do Arco de Santiago, Rua do Arco de Santiago, Rua de S. Cosme, Rua Atrás dos Frades, Rua do Rosário, Rua do Encontro, Rua de S. Mateus, Rua Cabo da Vila, Rua de S. Francisco, Rua das Amoreiras, Rua de Santa Luzia, Rua dos Távoras, Rua da Cadeia Velha, Rua do Toural, Rua da Estrada, Rua Montevideu, Rua de S. Miguel, Rua da Igreja, Rua da Portela ou dos Açougues e Rua do Quebra Costas; Largos: de S. Francisco, do Cardal, do Toural, da Portela, do Rossio de S. Cosme, da Ponte, do Tanque; Praças: Praça Velha ou do Município e Praça Nova. (SALES, Ernesto Augusto Pereira de – ob. cit., pp. 54-62; Mapa Topográfico (CMM). )

484 Os editais de 27 de Outubro de 1807 e de 2 de Abril de 1811 ordenaram que todas as portas

dos edifícios fossem numerados. Em 1876, o Código Administrativo encarregou as câmaras de procederem à denominação das ruas e numeração dos edifícios. (SALES, Ernesto Augusto Pereira de – ob. cit., pp. 54-62)

485 No século XX foram rasgadas as ruas do Pinheiro, de Clemente Meneres, da Capoeira, Dr.

José Bacelar, Rua dos Combatentes da Grande Guerra, Rua Alexandre Herculano, Rua da República, Rua Luciano Cordeiro, Rua D. Afonso III, Rua do Mercado, Rua D. Manuel I, Rua do Cruzeiro e Travessa 5 de Outubro; Largos: de S. Miguel, do Terreiro, da Igreja, 1.º de Janeiro e Largo Dr. Álvaro Soares; Praça 5 de Outubro; Avenida das Amoreiras. (SALES, Ernesto Augusto Pereira de – ob. cit., pp. 54-62; Mapa Topográfico (CMM). )

pública das ruas estava a cargo dos almotacés que superintendiam e dirigiam o serviço. Os habitantes da vila de Mirandela e freguesias do concelho eram obrigadas ao cumprimento do Código de Posturas da Câmara referente ao título Limpeza Pública.

Em sessão de vereações da câmara de Mirandela de 1 de Janeiro de 1720, foi tratada a limpeza pública das ruas. Todos os moradores eram obrigados a manter limpo o espaço de estrada ou rua situado em frente da sua casa, sob pena de duzentos e quarenta réis. Em sessão de vereadores da câmara em 12 de Janeiro de 1723 foi deliberado que todos os habitantes que residissem a uma légua de distância da vila de Mirandela eram obrigados a participar na limpeza das suas praças e ruas com uma pessoa de cada casa. Se o indivíduo fosse de jorna e não comparecesse pagava de coima doze vinténs. Aquele que possuísse gado bovino e carro de bois era também obrigado a ajudar no asseio da referida vila e, se faltasse pagava de multa seis tostões. Do total recebido pelo concelho, a terça parte destinava-se ao meirinho, e restante era para ser aplicado na limpeza das praças e ruas da vila. Como não havia rede de esgotos no povoado, e a edilidade para resolver este problema, mandou construir um carro com um depósito, onde diariamente os dejectos e águas sujas eram despejadas, evitando assim que os despejos se fizessem para as ruas. E não obstante as Posturas Municipais de Mirandela do século XVIII impedirem que os suínos vagueassem pelas ruas da vila, continuaram a deixá-los andar livremente ao longo de décadas486.

1.3.2. Praças

Uma das singularidades da morfologia urbana portuguesa é, na opinião de Orlando Ribeiro, a pluralidade de praças. Na opinião do geógrafo, estas distinguiam-se pela função, e de acordo com esta, caber-lhe-ia uma designação específica: o nome de largo, muito vulgarizado, dizia respeito tanto à praça ampla como ao alagamento de uma rua ou cruzamento viário; praça, correspondia ao espaço aberto onde se realizavam mercados; adro, ao de

praça fronteiriça à igreja; terreiro, seria o largo de terra batida487. Em Mirandela

esta tendência é igualmente observável.

A urbe tinha duas praças e diversos largos488:

A Praça do Município tinha forma poligonal construída em rectângulo. Nela terminavam as ruas de Santiago, da Igreja e uma outra vinda da Rua de S. Cosme. Estavam aqui erguidos os Paços do Concelho, o Pelourinho e a Santa Casa da Misericórdia que tinha anexo o hospital. Era nesta praça que se efectuavam mensalmente as feiras de cereais e de outros produtos, se realizavam os mercados às quartas e domingos. Era portanto a praça mais importante. Era o centro único da urbe, o local onde se parava, se faziam encontros e negócios.

Por sua vez a Praça Nova foi construída entre 1884-1885 na antiga Quinta dos Pastores e numa outra do domínio privado, adquirida pela câmara municipal para uma excelente praça de mercado, abertura de ruas e venda a particulares para construção de habitações. Tem forma rectangular e aqui se realizavam as feiras em 3 e 15 de cada mês. O mercado efectuava-se às quartas feiras e domingos com a venda e compra de cereais, frutas, hortaliças, criação miúda, etc.. Paralelamente foram aqui instalados dois açougues.

O Largo do Cardal situava-se em frente à ponte românica e estrada para Vila Flor e Bragança. Antes da construção da ponte em meados do século XVI e um pouco a montante situava-se a Barca de passagem entre Mirandela e Golfeiras. Após a sua construção este local perdeu a importância que antes tinha o que veio a resultar que aí começaram a crescer espontaneamente cardos, surgindo daí a designação de Cardal. Este ponto de desembarque, está possivelmente no reforço de fortificação da porta que dava acesso aos passageiros vindos do outro lado rio Tua. A construção da estrada real e caminho antigo trouxeram novamente movimento a este largo.

A junção das estradas de Bragança e de Vila Flor deu origem a um pequeno lago que passou a denominar-se por Largo da Ponte, que inutilizou e acabou por obstruir um dos dezassete arcos que constituíam a primitiva ponte. A Rua da Ponte e Rua do Rosário terminam neste largo.

487 RIBEIRO, Orlando – “Las cindades ibéricas tradicionales y su expansion por el mundo”.

Opúsculos Geográficos ..., vol. V, pp. 546-547.

Quanto ao Largo de S. Miguel situava-se em frente à casa mandada construir no século XVIII por Miguel Teixeira Homem. Este largo foi assim designado por esta habitação ter anexa uma capela de invocação ao Santo. Terminam neste largo a Rua de S. Miguel, Rua da Capoeira, Rua da Formiga e Rua do Arco da Vila que dá para a do Cabo da Vila.

No entroncamento da Rua do Cabo da Vila e a Estrada Real de Bragança surgiu o Largo do Tanque, que é assim designado por haver no centro um chafariz. Era também conhecido por Tanque dos Ciprestes, por neste local estarem erguidas duas destas árvores.

No que diz respeito ao Largo de S. Francisco é assim chamado por aqui ter havido uma capela, orago deste santo. Na sua proximidade localizava-se a entrada toda arborizada para a encosta do cemitério da vila.

O Largo do Toural encontra-se fora da antiga muralha da vila. A sua toponímia deve-se ao facto de aqui se realizarem as feiras de bois (touros), daí o topónimo de toural. Ao centro havia um poço que fornecia água aos moradores para cozinhar e lavagens. Neste largo desembocavam as ruas da Portela, Rua das Amoreiras, Rua do Encontro, Rua do Cruzeiro mais conhecida por Rua do Cemitério e a Canelha do Outeiro que ligava às Alminhas do Outeiro.

Cremos que, em parte, por ser uma cidade muito ligada ao passado, onde a tradição se mantém, algumas praças e largos como a praça do Município (que outrora albergou a câmara municipal), os largos do Toural, de S. Miguel, da Igreja e da Ponte, mantiveram a sua toponímia489.

No documento Mirandela Setecentista. (páginas 124-129)