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C) A aproximação com as informantes: entre “lá e cá”

3.2 Políticas Públicas e Empreendedorismo

Segundo Silva e Silva; Yazbek (2006), o desenvolvimento econômico condiciona o grau de estruturação do mercado de trabalho, determinando, assim, o nível de emprego e a remuneração na sociedade. Por esse viés, no Brasil, o papel do Estado tem sido imprescindível na formação do mercado de trabalho, na remuneração do trabalho e na determinação das relações. Além do Estado, as forças sociais organizadas vêm sendo igualmente fundamentais nesse processo.

A construção histórica do mercado de trabalho brasileiro passou por três significativos movimentos: inicialmente o período anterior à constituição do trabalho livre, da abolição da escravidão (1888) à Revolução de Trinta (caracterizado pela exportação de bens primários e mão-de-obra excedente nos mercados de trabalho regionais).

Posteriormente, no segundo movimento, tem-se o período de 1930 a 1980 (início do último governo da ditadura militar), destacado pelo desenvolvimento da industrialização (nacional), modernização da economia, regulação das relações de trabalho, excedente de força de trabalho e consequente inserção na informalidade, o Estado como promotor de políticas de proteção social. Foi na década de 1940 que se constituíram as primeiras escolas de formação profissional do sistema “S”7.

No terceiro movimento, mais recentemente - nos anos 1980 e 1990 - tem-se uma crise externa do capitalismo, descontrole da inflação, aumento das desigualdades sociais e de renda, desestruturação do trabalho urbano, limitação da capacidade estatal de proteção social, como consequência de sua crise geral, crescimento da informalidade e desocupação, além da expressiva precarização nas relações de trabalho. Para Pochmann (2006, p. 26), “o movimento de desestruturação do mercado de trabalho ganhou maior dimensão ainda com a implantação do programa neoliberal desde 1990, diante da inserção passiva e

7 O Sistema “S” abrange o conjunto de entidades que desenvolvem atividades voltadas para o treinamento profissional,

assistência social, consultoria e assistência técnica: SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), SESC (Serviço Social do Comércio), SESI (Serviço Social da Indústria), SENAC (Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio), SEBRAE, entre outros.

subordinada do país na economia mundial”.

Nesse contexto, foi constituído um Sistema Público de Emprego como ação de enfrentamento pelo Estado nos anos 1990 ao problema do desemprego, permitindo a criação do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Tal Sistema Público de Emprego é composto de políticas de transferência temporária de renda, prestação de serviços e concessão de créditos. No que concerne às ações do governo voltadas para os desempregados a partir dos anos 1990, tem-se o Programa de Geração de Emprego e Renda (PROGER), o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), o Programa Nacional de Formação Profissional (PLANFOR), as iniciativas de empréstimo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), como lembra bem Véras de Oliveira (2005):

Nos anos 90, em particular, as políticas públicas de emprego são o resultado (contraditório e em processo), de um lado, das possibilidades institucionais derivadas da Constituição de 1988 e, de outro, da adoção da orientação neoliberal na condução do país. (VÉRAS DE OLIVEIRA, 2005, p. 16).

De acordo com este autor (mimeo, 2010), as políticas de emprego podem ser divididas em ativas (são as que agem sobre a oferta e a demanda por trabalho, como o PLANFOR e o PROGER) ou passivas (as que agem através de assistência financeira temporária voltada para os que perderam o emprego, como o seguro- desemprego e a intermediação de mão-de-obra).

Para outros autores, como é o caso de Carneiro (2003), estas políticas voltadas para o mercado de trabalho no Brasil podem ser definidas não em duas, mas em três categorias, a saber: políticas compensatórias, distributivas e estruturais. As políticas compensatórias seriam aquelas que objetivam assegurar um nível de renda mínimo para os desempregados ou trabalhadores com baixa remuneração através de transferências, como é o caso do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e do seguro desemprego. Já as políticas distributivas buscam aumentar os salários dos trabalhadores menos qualificados, sendo um exemplo disso o salário mínimo. Por fim, as políticas estruturais, que visam reduzir o desemprego e elevar a produtividade do trabalho. Elas têm como objetivos imediatos a criação de novos empregos, a melhoria na qualidade dos empregos já criados, a melhora da

qualificação dos trabalhadores e a combinação ideal entre empregos e trabalhadores.

A partir da observação destes objetivos fica constatada a necessidade de políticas específicas para o acesso dos mais necessitados a três meios que são fundamentais para a geração de renda: o crédito, a capacitação dos trabalhadores e a intermediação de empregos. Nesta categoria encontram-se programas criados pelo Ministério do Trabalho, como é o caso tanto do PLANFOR como do PROGER, já mencionados anteriormente. Estes programas de geração de emprego e renda tomaram impulso a partir de 1994, quando receberam “status” de programa nacional de formação profissional, sob coordenação do FAT, porém, com execução descentralizada pelos Estados. Além destes, em 2003 foi criado o Plano Nacional de Qualificação (em lugar do PLANFOR), e em 2004 o Programa do Primeiro Emprego. Para Véras de Oliveira (2010), o CODEFAT (Conselho Deliberativo do FAT) teve dificuldades de se afirmar como um espaço de controle social, e as políticas públicas de emprego e renda não superaram sua natureza de programa e nem sua condição histórica fragmentada.

Através dos estudos econômicos, nos dias atuais é notório o tema do empreendedorismo como fundamental para o desenvolvimento econômico do Brasil, e relevante, para alguns autores, pelo seu grande potencial de geração de emprego e renda, e ainda pelo critério de inovação na criação de produtos e mercados. No entanto, como já mencionado, existem críticas a essa visão “salvadora” do empreendedorismo.

Segundo Gomes, Fernandes e Alves (2013, p. 9), “do ponto de vista de políticas públicas, o empreendedorismo é um catalisador primário do crescimento econômico e do desenvolvimento regional”. Assim, observam uma estreita relação entre a TEA (Taxa de Empreendedores em Estágio Inicial)8 e o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto); quanto maior a TEA também maior o crescimento do PIB. Por esse viés, conforme apontam os referidos autores, uma das tarefas mais difíceis do poder público consiste justamente na forma de promover e estimular as atividades empreendedoras. As políticas existentes trazem ações desarticuladas,

8 Empreendedores iniciais são aqueles cujos empreendimentos têm até 42 meses de vida. Subdividem-se em: nascentes

(aqueles à frente de negócios em implantação) e novos (negócios que já estão em funcionamento e geraram remuneração por pelo menos 3 meses). Diferenciam-se dos empreendedores estabelecidos, aqueles à frente de empreendimentos com mais de 42 meses.

com um plano de ação de fomento ao empreendedorismo, mas visando apenas um desafio particular para impulsionar a capacidade empreendedora.

Parece ainda não haver no Brasil um conhecimento explícito e ações coordenadas sobre o estímulo ao empreendedorismo, nos encontramos em um momento de experimentação, como se tentando descobrir o que é mais adequado para a realidade brasileira. Entretanto, há sim um conhecimento, mas este ainda se encontra em um nível tácito (GOMES; FERNANDES; ALVES, 2013, p. 11).

Destarte, pode-se questionar a necessidade da criação de políticas públicas de fomento ao empreendedorismo. Nesse sentido, Sarfati (2013) considera que dois aspectos são essenciais: o papel do empreendedorismo no desenvolvimento econômico (função das MPMEs - micro, pequenas e médias empresas - na geração de empregos, diminuição das desigualdades sociais, inovação e crescimento econômico); e a necessidade de políticas públicas (em que é preciso diferenciar políticas públicas de empreendedorismo de políticas públicas para as MPMEs).

As políticas públicas para as MPMEs trazem programas de apoio ao empreendedor que trabalha por conta própria ou o tradicional pequeno empresário, que desenvolve atividades que possam satisfazer minimamente suas necessidades, como cabeleireiros e padarias, por exemplo. Já as políticas públicas de empreendedorismo objetivam formar empreendedores de alto impacto, que desenvolvem atividades que geram empregos e valor econômico.

Sarfati (2013), igualmente, relaciona alguns condicionantes que atingem o desenvolvimento de políticas públicas, tanto de empreendedorismo como para as MPMEs. Entre estes condicionantes ele destaca: as mudanças demográficas, sociais, econômicas, regulatórias e tecnológicas. Dessa forma, tais políticas passam a ser classificadas como regulatórias ou de estímulo.

Quanto às políticas regulatórias que afetam as MPMEs e o empreendedorismo têm-se as regras de entrada e saída de negócios; regras trabalhistas e sociais; regras de propriedade; regras tributárias; regras de propriedade intelectual; regras de falência; regras que afetam a liquidez e disponibilidade de capital.

No que concerne às políticas de estímulo podem ser divididas em: promoção de cultura e educação empreendedora; desenvolvimento de indústria de

incubadoras; programas de promoção à inovação; programas de fomento à internacionalização.

Ainda estas políticas podem ser consideradas em dimensões verticais tomando como referências: política nacional ou regional, focadas em setores específicos, ou grupos de indivíduos, como mulheres, negros e jovens.

Borges Junior et al. (2013), com base em diferentes autores, apontam seis categorias de políticas de empreendedorismo: 1. Sobre a promoção da cultura empreendedora (na valorização e conscientização da sociedade); 2. Educação para o empreendedorismo (no aumento do conteúdo sobre empreendedorismo em diferentes níveis de ensino); 3. Sobre a redução de barreiras de entrada de novas empresas (como tempo e custo para iniciar um negócio); 4. Sobre as medidas de apoio e suporte às empresas novas (como consultorias, por exemplo); 5. Sobre o fornecimento de capital no apoio ao empreendedorismo; 6. as políticas com enfoque em grupos populacionais específicos (como jovens e mulheres).

Sarfati (2013) ainda aponta que as políticas públicas no Brasil, num contexto histórico, não priorizaram as MPMEs; o principal incentivador desde sua fundação em 1972 foi o SEBRAE, como entidade privada de interesse público. Este órgão realiza o apoio a essas empresas através de cursos, palestras, treinamentos, consultorias e publicações.

Borges Junior et al. (2013) trazem também uma questão imprescindível dentro da temática já abordada por Thurik (2008), que é exatamente a de procurar discutir de que forma o poder público pode criar ambientes que fomentem a geração, a viabilidade e o sucesso dos empreendedores. Assim, Borges Junior et al. (2013) enfatizam que

[...] o governo tem o papel de criar e disponibilizar políticas de estímulo ao desenvolvimento dos negócios, especialmente no nível local. Caberia a esse nível de governo elaborar e implementar políticas que capitalizem as vantagens locais e minimizem suas desvantagens. (BORGES JUNIOR et al., 2013, p. 3).

Para as políticas públicas de empreendedorismo voltadas para as mulheres, a justificativa se dá por vários motivos, no entanto Machado (2003) ressalta o estímulo a: programas de ‘apadrinhamento’ em que mulheres mais experientes orientem as que iniciam um negócio; destaque para os casos de empreendedoras de sucesso com a finalidade de motivação e de orientação; estímulo à empreendedora em

setores de difícil acesso como área agrícola e agroindustrial; formas de aconselhamento e suporte em negócios empreendidos por mulheres.

Embora nosso objetivo nesse trabalho não seja a discussão especificamente sobre gênero, faz-se necessário tratar dessa temática uma vez que a política pública de estudo é voltada unicamente para mulheres e, além disso, pelo fato do empreendedorismo feminino ser apresentado com características diferentes em relação ao masculino. Assim, na próxima seção trataremos disso.