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1. INTRODUÇÃO

2.3. Políticas para o desenvolvimento sustentável na Amazônia

A Amazônia é reconhecida como a maior extensão contínua de floresta tropical do planeta. No Brasil, o bioma totaliza 4,2 milhões de km2. A região possui a maior rede hidrográfica do mundo, com 15 % da água doce não congelada, e seus ecossistemas abrigam uma estimativa de 20% da biodiversidade do planeta. A Amazônia apresenta, portanto, grande potencialidade para produtos in natura, farmacêuticos, tecnológicos, essências, entre outros (AZEVEDO-RAMOS, 2009). Dessa forma, por ser considerada uma região rica em biodiversidade, ganha importância nas discussões sobre desenvolvimento sustentável. Segundo Schneider et al. (2000), é necessário que o governo assuma a responsabilidade de garantir o desenvolvimento sustentável na Amazônia, estabilizando a economia local através de instrumentos econômicos, estratégicos e de comando e controle. Para os autores a política governamental deve conciliar os interesses sociais de curto e longo prazo; e os interesses dos diversos atores na sociedade, o que envolve os níveis local, estadual, nacional e global.

As políticas públicas voltadas para o desenvolvimento da Amazônia brasileira sempre priorizaram a integração da região ao território nacional e o desenvolvimento econômico com base na exploração dos recursos naturais e da mão de obra. O resultado desse esforço ao longo das décadas foi a destruição de grandes áreas de floresta e o aumento populacional urbano desordenado (BECKER, 2001). O desenvolvimento da Amazônia foi, portanto, fortemente determinado por um intenso processo de colonização, com grandes projetos de infraestrutura e exploração financiados pelo Estado.

Oficialmente, a preocupação do governo era ocupar um espaço considerado como ―vazio demográfico‖. Para isso, ferramenta fundamental foi o Programa de Integração Nacional (PIN), de 1970. Utilizando-se do slogan ―integrar para não entregar‖, que tinha como principal objetivo estender a rede rodoviária e implantar projetos de colonização oficial nas áreas de atuação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). As rodovias, por si só, já seriam suficientes para fomentar a ocupação na Amazônia. Entretanto, as políticas públicas do governo militar potencializaram o poder de ordenamento espacial ao longo das mesmas (MARGARIT, 2013).

Como parte dessa dinâmica, no início da década de 1970 foi estabelecido o I Plano de Desenvolvimento da Amazônia (I PDA, 1972-1974). A partir de políticas estabelecidas no II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND, 1975-1979) foram posteriormente criados o II PDA (1975-1979) e o Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia

(Polamazônia). Segundo o governo, estes seriam bases de um ―modelo amazônico de desenvolvimento‖ (BRASIL, 1976).

A partir de meados dos anos 1980, esse modelo de desenvolvimento começa a ser questionado, e se iniciam discussões incluindo o meio ambiente como novo elemento a ser considerado nas políticas públicas de desenvolvimento, já que se tornam visíveis as consequências deixadas pelo modelo de desenvolvimento capitalista, como a escassez dos recursos naturais, o efeito estufa e o aquecimento global (LIMA; POZZOBON, 2005). Essas questões ganham visibilidade política, e passam a demandar a intervenção do Estado na busca de um novo modo de garantir o desenvolvimento sem deixar de lado a proteção da natureza.

O conceito de ―desenvolvimento sustentável‖ passa a ganhar espaço no âmbito das organizações internacionais, principalmente após o Relatório Brundtland, que ficou conhecido como ―Nosso Futuro Comum‖ e a Conferência das Nações Unidas, também chamada de ―Rio 92‖, onde foram apresentados estudos sobre as mudanças climáticas como resposta à crise social e ambiental pela qual o mundo passava a partir da segunda metade do século XX (BARBOSA, 2008).

Veiga (2005) analisa que o conceito desenvolvimento sustentável é apresentado à sociedade como o maior desafio da humanidade no século XXI. Quando caracterizada como conceito político, a sustentabilidade se torna uma meta que demanda planejamento, decisões e ações, que só podem ser realizadas a partir de um debate político que resulte na implementação de políticas públicas.

A ideia de desenvolvimento sustentável está focada na necessidade de promover o desenvolvimento econômico satisfazendo os interesses da geração presente, sem, contudo, comprometer a geração futura. Isto é, o respeito à natureza passa pelo comprometimento com os direitos humanos fundamentais, visto que são inalienáveis (COMISSÃO BRUNDTLAND, 1991, p.46). Para que haja um desenvolvimento sustentável, é preciso que todos tenham atendidas as suas necessidades básicas e lhes sejam proporcionadas oportunidades de concretizar suas aspirações de uma vida melhor (COMISSÃO BRUNDTLAND, 1991, p.46- 47).

Ao contrario dos processos tradicionais de exploração da Amazônia, o governo inicia um esforço considerável para consolidar políticas de desenvolvimento sustentável. Dentre essas iniciativas, o Plano Amazônia Sustentável-PAS, apresentado em 2008, era a iniciativa mais importante de articulação de políticas públicas para o desenvolvimento sustentável da região, como principal referência de um novo modelo de desenvolvimento econômico para a Amazônia, propondo um conjunto de diretrizes para orientar o desenvolvimento sustentável,

com valorização da diversidade sociocultural e ecológica e redução das desigualdades regionais, capaz de favorecer o crescimento da economia, atender as principais demandas da população local e romper com modelos anteriores. O PAS se propõe a evitar que as estratégias de desenvolvimento sejam simplesmente transferidas para a Amazônia sem a adequação necessária à realidade regional (BRASIL, 2008), e tem como objetivo principal:

(...) a promoção do desenvolvimento sustentável da Amazônia brasileira, mediante a implantação de um novo modelo pautado na valorização de seu enorme patrimônio natural e no aporte de investimentos em tecnologia e infraestrutura, voltado para a viabilização de atividades econômicas dinâmicas e inovadoras com a geração de emprego e renda, compatível com o uso sustentável dos recursos naturais e a preservação dos biomas, e visando a elevação do nível de vida da população (BRASIL, 2008, p. 55).

O Plano, coordenado pelo Ministério da Integração Nacional, organiza-se em cinco eixos temáticos: (1) produção sustentável com inovação e competitividade; (2) inclusão social e cidadania; (3) gestão ambiental e ordenamento do território; (4) infraestrutura para o desenvolvimento; e (5) novo padrão de financiamento. Sua principal diferença com relação aos antigos planos é o reconhecimento da importância do crescimento dos investimentos e do PIB regional, porém baseado num processo de construção de instituições adequadas, geração de capital social e mobilização de sinergias entre Estado e sociedade, descentralização de políticas públicas e participação da sociedade (BRASIL, 2008).

As diretrizes do PAS se inserem plenamente na Política Nacional de Desenvolvimento Regional que, partindo de uma visão nacional, baseia-se na identificação de mesorregiões, para as quais deve ser formulado um planejamento específico, no contexto de princípios gerais de desenvolvimento sustentável. Tal ótica é fundamental, sobretudo, para a Amazônia, onde condições históricas, geográficas, econômicas e culturais geram demandas e possibilidades de parcerias diversas, visando reduzir a pulverização de recursos, favorecendo a tão almejada presença do Estado, demanda de todos os atores regionais (BRASIL, 2008).

Ao pensar o desenvolvimento de uma região com as dimensões Amazônicas, é importante considerar, além da biodiversidade, também a sociodiversidade e suas complexidades. Esse é um dos grandes desafios apresentado pelo PAS.

Um dos principais desafios do planejamento do desenvolvimento regional sustentável é lidar com esta diversidade sub-regional e local, nas diversas escalas e segundo múltiplos critérios. Tratar a Amazônia como uma grande região homogênea não é mais uma abordagem adequada. Algumas questões relativas ao planejamento regional podem ser tratadas em grandes agregados, mas outras, especialmente quando exigem a participação dos atores locais, demandam recortes específicos em espaços menores (BRASIL, 2008,p.27).

Bertha Becker (1930-2013) aponta que a maior falha dessa política de desenvolvimento da Amazônia foi o caráter homogeneizador, que trata a região como

uniforme em caráter, ignorando a diversidade socioambiental. Reforça que uma solução tanto para a questão social, como ambiental, seria a implementação de uma política regional de desenvolvimento, consolidando os povoamentos existentes, elevando-se a produtividade dos pequenos produtores e promovendo a proteção ambiental, por meio da utilização de instrumentos econômicos de incentivo (BECKER, 2005).

A participação da sociedade é uma das inovações metodológicas do PAS, que prioriza a integração, necessária e indispensável, de diretrizes, políticas e ações do governo federal com os governos estaduais. Assim, a busca de sustentabilidade por meio de alternativas políticas que considerem a importância da participação local se transforma em uma meta com crescente legitimidade (BRASIL, 2004).

Em uma análise do PAS, Madeira (2012) argumenta que embora o governo brasileiro afirme apresentar um novo modelo de desenvolvimento, a sustentabilidade no PAS é garantida principalmente para grandes grupos econômicos. Como nos planos anteriores, nos projetos vinculados ao PAS, as grandes empresas podem ter seus custos reduzidos com base na infraestrutura garantida pelo governo. Além disso, até certo ponto como um diferencial, também são estimuladas a encontrar novas alternativas para obtenção de lucro por meio da exploração de recursos e serviços ambientais. Para o autor, existem mais sinais de continuidade do que de ruptura com os modelos anteriores:

O referenciamento do PAS na noção de desenvolvimento sustentável não implica em mudanças, por algumas razões básicas. A principal delas é que desde a sua origem, esta noção vincula-se essencialmente às oportunidades de valorização do capital a partir de novas formas de exploração da natureza e dos ditos serviços ambientais. Entretanto, as populações da maior parte da Amazônia continuam a se defrontar com incontornáveis barreiras para explorar de forma autônoma os recursos minerais e da floresta (MADEIRA, 2014, p.28).

Neste sentido, constata-se que a questão do desenvolvimento sustentável sugere ao modelo tradicional de desenvolvimento a responsabilização dos impactos ambientais, o que demanda a promoção de políticas que articulem o desenvolvimento econômico e social, concomitante ao desenvolvimento e a sustentação ambiental. O modelo de desenvolvimento buscado deve se constituir como um modelo que apresente uma riqueza de alternativas frente à diversidade cultural, social e econômica de cada região, que tenha como prioridade as necessidades sociais da população, que seja capaz de enfrentar a crise social e ambiental, transformando, via participação política, excluídos e marginalizados em cidadãos com efetivo acesso aos direitos sociais, políticos, econômicos e ambientais (SILVA; CAVALCANTI, 2012). Segundo os autores, esse processo não consiste apenas em listar regras para se alcançar a sustentabilidade, mas buscar alternativas e estratégias de gerir os recursos naturais de forma

a promover o bem estar social, sem que isso venha a comprometer o capital natural. As políticas públicas necessitam ser ―desenhadas no contexto de princípios éticos relativos ao bem estar das gerações atuais e futuras‖ (SILVA; CAVALCANTI, 2012, p. 384).

É importante considerar uma possível incoerência conceitual entre alguns dos autores referenciados na pesquisa, dada a diversidade de linhas de pesquisa ao se tratar do tema proposto.