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3 O PAPEL DO ESTADO BRASILEIRO FRENTE ÀS INOVAÇÕES DISRUPTIVAS

3.2 A REGULAÇÃO ESTATAL DAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS

3.2.1 Por que regular?

Sobre a regulação, cumpre esclarecer que existem várias justificativas para a intervenção regulatória. Nesse sentido, Cass Sustein (2011)50 indica como justificativas para a intervenção estatal: i) o saneamento de falhas de mercado (a concepção de que o livre mercado, por si só, não seria capaz de atingir as finalidades públicas); ii) redistribuição de recursos; iii) promoção de algum pleito coletivo; iv) combate à discriminação social de determinados grupos, iv) necessidade de interferência no processo de interferência endógena e; v) o resguardo de direitos de gerações futuras. Assim, a regulação se revela primacial para o alcance e fomento de valores sociais e direitos fundamentais.

Dessarte, não mais se admite a obsoleta ideia de que a regulação sirva apenas para “consertar” o mau funcionamento do mercado, com intento puramente mercadológico.

No que concerne ao atual contexto de avanços tecnológicos, emergem discussões acaloradas sobre práticas anticoncorrenciais, direito à liberdade de expressão, direito à privacidade, por exemplo. A regulação, porquanto, ganha novas justificativas.

Ainda no que diz respeito às novas tecnologias, ganha relevo a necessidade de proteção e fomento da inovação na atividade regulatória. Não apenas isso. O surgimento e desenvolvimento de uma inovação depende, muitas vezes, do estímulo e da proteção por parte do Estado51.

Imperativo destacar que a inovação é para vários autores52 uma mola propulsora para o

50 SUSTEINS, Cass R. After the rights revolution: reconceiving the regulation: theory, strategy, and pratice. Oxford: Oxford University Press, 2011, p. 141.

51 Insta frisar que inovação aqui se refere a utilização de novos processos, produtos ou serviços, objetivando determinados resultados. (BAPTISTA, Patrícia; KELLER, Clara Iglesias. Por que, quando e como regular as novas tecnologias? Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, v. 273, p. 123-163. set./dez. 2016, p. 141.) 52 Nessa linha: SCHUMPETER, Joseph. Capitalism, socialism and democracy. ePub, Edição Kobo, cap. 1,

desenvolvimento econômico. Sobre a temática, insta trazer à lume as considerações de Diogo Pignataro, Fabiano Mendonça e Yanko Alencar (2008)53:

(...) a regulação econômica se alia fortemente ao espírito da proteção e efetivação dos direitos fundamentais, dentre os quais se destaca, por fins de objeto de estudo, o direito ao desenvolvimento. É assim que a função reguladora, desenhada pelas instituições jurídicas criadas para exercê-la, relacionando uma gama de atribuições de variadas naturezas (informativas, planejadoras, fiscalizadoras, negociadoras, normativas, ordinatórias, gerenciais, arbitradoras e sancionadoras), pretende congregar as vantagens da flexibilidade negocial privada com o rigor da coercitividade estatal, de modo a atuar com um foco diferenciado na economia, de uma forma que, inclusive, propicia maiores condições ao Estado de dar uma relevância superior ao direito fundamental ao desenvolvimento.

Essa é mais uma razão para a intervenção do Estado frente às inovações tecnológicas. Contudo, em que pese as vantagens da implementação da inovação, se observa muitas vezes a atitude letárgica ou arcaica do Estado para promover e proteger a inovação. Dentre os motivos para essa atuação tardia e ultrapassada, se pode mencionar: i) a falta de políticas públicas para tal fim; ii) a resistência ao ingresso de novo ator econômico no mercado (e.g. startup) por empresas já consolidadas; iii) a regulação excessiva de instrumentos fomentadores da inovação, que obstam ou mesmo impedem a inovação; iv) o problema do momento adequado para a intervenção do Estado, podendo redundar no dilema de Collingridge, ou seja, a dúvida sobre o momento em que se deve fazer a intervenção regulatória, para que não seja prematura nem tardia 54.

No que tange a ausência ou insuficiência de políticas públicas, se pode enumerar como causas: problemas de restrições orçamentárias, falta de estímulo à pesquisa científica nos centros de ensino para criar ou desenvolver ferramentas inovadoras, ausência de planejamento e brevidade nos programas de governo que dificultam seu desenvolvimento.

A respeito da resistência ao ingresso de novo ator econômico no mercado (e.g. startup) por empresas já consolidadas, interessante trazer as considerações do professor norte-americano

posições 11-12/24. ISBN: 9781617208683. EUA, 2015. p. 11; BRODLEY, Joseph F. The economic goals of antitrust: efficiency, consumer welfare, and technological progress. New York University Law Review, n. 62, p. 1020-1026, 1987.

53 OLIVEIRA, Diogo Pignataro; MENDONÇA, Fabiano André de Souza; XAVIER, Yanko Marcius de Alencar. A governança pública e o estado regulador brasileiro na efetivação do direito fundamental ao desenvolvimento. In: MENDONÇA, Fabiano André de Souza; FRANÇA, Vladimir da Rocha; XAVIER, Yanko Marcius de Alencar (Org.). Regulação econômica e proteção dos direitos humanos: um enfoque sob a óptica do direito econômico. Fortaleza: Fundação Konrad Adenauer, 2008, p. 55.

54 Esse dilema pode ser traduzido na expressão “paradoxo de incerteza”54, uma vez que o ente regulador se vê obrigado a decidir em que momento deve intervir em um cenário de pouca ou nenhuma informação confiável. (BAPTISTA, Patrícia; KELLER, Clara Iglesias. Por que, quando e como regular as novas tecnologias? Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, v. 273, p. 123-163, set./dez. 2016, p. 144 e 147).

Tim Wu (2012)55 sobre inovação interna e inovação externa. Segundo o autor, inovação interna se refere a situação em que a empresa já existente no mercado promove algum aperfeiçoamento em um determinado produto ou serviço, caracterizando a sua evolução. Já a inovação externa consiste no ingresso de novo produto ou serviço por novo ator econômico. Desse modo, a inovação externa seria até mais importante do que a inovação interna, uma vez que o ingresso de novo agente econômico tende a promover uma ruptura maior com o status quo ante, com o desenvolvimento de novo produto ou serviço. Ao revés, a inovação promovida pelos agentes econômicos existentes é mais contida, normalmente só aperfeiçoa o que já existe, até por exigência do seu mercado consumidor.

No que concerne a regulação excessiva dos instrumentos fomentadores da inovação, se percebe que a legislação, muitas vezes, ao invés de promover a inovação, acaba por dificultá- la ou inibi-la. Inclusive, não protege as inovações contra a captura dos agentes com poder de mercado.

Por fim, tem também o problema do momento adequado para a intervenção do Estado. Isso porque uma intervenção regulatória precipitada pode dificultar ou impedir o desenvolvimento daquela inovação, e uma intervenção tardia defronta com a forte resistência dos regulados, já detentores daquele nicho de mercado.

Nessa senda, falar sobre a relevância da inovação é primacial, trazendo implicações para o momento e as forma de intervenção estatal.