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PARTE II – ENQUADRAMENTO CONCETUAL

2.8 AJUDAS TÉCNICAS

2.8.1 Prótese Auditiva

Para um melhor enquadramento teórico, pareceu interessante efetuar uma resenha histórica até aos dias de hoje, obviamente não exaustiva sobre a evolução das próteses auditivas, também designadas por aparelhos auditivos.

Caminhando ao longo dos tempos está escrito na história que o Imperador Romano Adriano (117-135 d.C.) para ouvir melhor posicionava a mão em concha atrás do ouvido, o que permite uma pequena amplificação dos sons, por isso faz pensar que foi esta a primeira prótese auditiva. As cornetas acústicas (funis) surgiram no século XVII, e Graham Bell, professor de pessoas com deficiência

auditiva em Boston a partir da sua invenção do telefone em 1876 adaptou esta tecnologia à primeira prótese auditiva elétrica que viria a ser utilizada em 1896 em Inglaterra, e que era composta por um microfone de carbono e possuía um recetor e uma fonte de energia elétrica, o seu ganho era limitado. Pode considerar-se relativamente à tecnologia das Próteses Auditivas cinco épocas distintas:

A época acústica, quando se começaram a comercializar os primeiros aparelhos auditivos para a amplificação dos sons, e onde se enquadram as cornetas acústicas e os tubos de fala.

A época do carbono, quando surge o modelo de caixa que se usava no bolso e que possuía um fio que fazia a ligação a um molde introduzido no ouvido; estes equipamentos começaram a ser produzidos em série, aplicando e adaptando a tecnologia utilizada no telefone.

A época da válvula, quando os aparelhos auditivos começaram a utilizar o amplificador de válvula. Trouxe grandes progressos em termos de amplificação, com uma melhor resposta frequencial e diminuição do ruído interno (de alimentação).

A época do transístor, quando as válvulas foram substituídas pelos transístores, e surgiram as pilhas e os microfones; o tamanho do aparelho foi reduzido e colocado nas hastes dos óculos. Surge o primeiro aparelho retro auricular.

Entre 1960 e 1980 os aparelhos retro auriculares apresentavam o seu tamanho cada vez mais reduzido e a qualidade sonora melhorou. Começaram a utilizar-se os circuitos integrados na sua produção, e surgiram os primeiros aparelhos com microfones direcionais e também os primeiros aparelhos dentro do canal (cápsula e circuito eletroacústico dentro do canal auditivo externo).

O aparecimento da microeletrónica permitiu miniaturizar os componentes e a aplicação da tecnologia digital nas próteses auditivas.

Entre 1980 e 1990 surgem os aparelhos auditivos digitalmente programáveis cujo processamento dos sons de entrada deixou de ser linear (a quantidade de amplificação é a mesma para todas as intensidades sonoras de entrada), como até então, e passou a ser não linear, isto é, quando há alteração automática nos parâmetros de amplificação onde se inclui a compressão dinâmica que permite maior ganho para sons mais baixos e menos percetíveis e em simultâneo menor ganho para os sons moderados e mais intensos, tornando assim a escuta mais confortável, em particular a da fala. Os aparelhos podem apresentar diversos programas de conforto e surgem os de adaptação profunda completely-in-the-canal (CIC), mais estéticos e menos visíveis.

A época digital quando entre 1990 e 2000 surgiram os aparelhos auditivos cujo processamento de som é digital. São totalmente automáticos e podem ter vários programas de ajuste onde a programação e o seu controle é efetuado por computador. Em 1995 surgiu o primeiro aparelho intra canal 100% digital e, em 1997 o primeiro aparelho digital de adaptação profunda. Hoje esta é a tecnologia que permite maior facilidade de adaptação à performance da prótese auditiva relativamente aos ambientes de escuta e das necessidades específicas individuais.

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A figura 2.19 mostra o desenvolvimento das próteses auditivas desde 1800 onde se usavam as cornetas acústicas até à atualidade onde as próteses auditivas miniaturizadas digitais são a norma.

Desde os seus primeiros tempos e até à atualidade, e mais recentemente devido aos avanços tecnológicos dos circuitos e da deteção automática da fala, que os aparelhos auditivos têm sofrido grandes alterações, entre elas conta-se a enorme redução do tamanho dos aparelhos retro auriculares, onde o auscultador que se encontrava dentro da própria caixa passa a ser colocado na ponta do tubo do molde que se introduz no canal auditivo, beneficiando a estética e a funcionalidade.

Figura 2.19 - Evolução das Próteses Auditivas.

Precisando o conceito atual de prótese auditiva, podemos dizer que é uma ajuda técnica que auxilia o ouvido a perceber os sons, a amplificá-los e a transmiti-los. É constituída por três componentes fundamentais: o microfone, o amplificador e o auscultador. O primeiro destes três dispositivos eletrónicos capta o som de um sinal acústico e converte-o num sinal elétrico, o segundo amplifica o som modificado, criando um sinal mais forte, e o terceiro converte o sinal elétrico em sinal acústico. Atualmente as próteses auditivas digitais, possuem um circuito integrado cujo chip, com alta velocidade de processamento de som, permite ajustes automáticos, tais como a redução de ruído e o ênfase de sons importantes para a compreensão da fala, podendo comportar tecnologia Bluetooth que permite a ligação a equipamento de áudio. A sua estimulação é acústica.

A mais avançada tecnologia permite, sem necessidade de recorrer a cirurgia e a anestesia, e demorando a adaptação protética aproximadamente uma hora, uma adaptação profunda a 4 milímetros do tímpano, com considerável redução de feedback e de output e cujos movimentos não implicam a deslocação da prótese. Após 120 dias, ou se a prótese deixar de atuar, o utilizador irá ao Centro de Reabilitação para readaptação que pode demorar cerca de 10 minutos. Esta prótese não precisa de ser retirada para tomar banho.

Apesar da utilização das próteses auditivas eletroacústicas convencionais não ser invasiva, e dos avanços tecnológicos e estéticos com que têm contado ao longo dos tempos, não substituem o próprio ouvido. A sua aceitação não é de todo universal, sendo somente utilizadas por uma pequena percentagem de indivíduos com hipoacusia. Em média só começam a ser utilizadas sete anos após a perceção do défice auditivo. Entre os utilizadores 30 a 50% não estão satisfeitos com a sua utilização, indicando como principais razões a má qualidade sonora, feedback, oclusão, irritação, humidade, estigma social e estética.

É preciso fazer algo. O cérebro para ouvir armazena sons e ruídos até três anos após o início de uma perda auditiva, mas depois de cerca de sete anos de privação sensorial, a memória torna-se cada vez mais fraca e então, nem mesmo uma prótese auditiva será capaz de transformar os sinais sonoros de entrada em informações compreensíveis. Isso significa que o cérebro não reconhece os sons nem os ruídos familiares, por ex. o ruído do frigorífico, do micro-ondas ou do computador. O cérebro vai ter de aprender a ouvir tudo de novo.

Mais um passo foi dado por um grupo de pesquisadores da Universidade do Colorado quando no seu estudo muito recente (maio de 2015) aplicaram os princípios essenciais da plasticidade (capacidade do cérebro para alcançar novas conexões) para satisfazer a questão – Como responde o cérebro à perda auditiva?

No estudo os investigadores utilizaram o EEG em adultos e crianças com surdez e perda auditiva menos acentuada com o objetivo de perceber como os seus cérebros respondem quando comparados com a resposta de indivíduos norma ouvintes quando submetidos a um mesmo estímulo sonoro através de alto-falantes, com a pretensão de evocar uma resposta sob a forma de ondas cerebrais originadas no córtex auditivo. Descobriram que as áreas do cérebro responsáveis pelo

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processamento da visão ou tato podem recrutar ou assumir as áreas onde a audição é normalmente processada, mas que recebem muito pouca ou nenhuma estimulação em caso de défice auditivo. A isto chama-se “cross modal”, reorganização cortical, e reflete a propriedade essencial do cérebro para compensar em resposta ao seu ambiente.

Os investigadores concluíram ainda que este recrutamento cross modal da função auditiva do cérebro pelos sentidos da visão e do tato, não ocorrem só em pessoas com surdez, mas também em indivíduos adultos com perda de audição moderada. Os resultados do seu estudo sugerem que: mesmo em fase inicial de perda de audição relacionada com a idade as partes do cérebro utilizadas na audição podem reorganizar-se; “as mudanças compensatórias aumentam a carga global sobre os cérebros dos adultos mais velhos”, implicações clínicas importantes para o desenvolvimento de programas de rastreio precoce da perda auditiva em adultos (Sharma, 2015).

Prevê-se que na próxima década a tecnologia digital em primeiro plano na linha de pesquisa irá sofrer grandes desenvolvimentos na qualidade de som e na facilidade de utilização das próteses auditivas. Estas serão tão fáceis de usar como o fone do Bluetooth, prevendo-se que os consumidores mais jovens comecem a usá-las muito mais cedo do que os seus avós fizeram. Poderão funcionar em simultâneo como um telemóvel permitindo a comunicação por voz e por dados.

O envelhecimento da geração Baby Boomer e da população em geral irá fazer com que mais pessoas usem próteses auditivas. Irão aparecer aplicações tão sofisticadas que tornarão possível efetuar testes às próteses auditivas através do telemóvel, e fazer download de aplicações através das mesmas, aumentando o sucesso entre os clientes mais jovens e os mais velhos. Tornar-se-ão mais agradáveis esteticamente, serão menores e mais hábeis na captação dos sons. O modelo dentro do ouvido pode dar lugar a um modelo fora do ouvido disfarçado para que se pareça com brincos ou outros acessórios. Pensa-se que a tendência dos avanços da tecnologia das próteses auditivas com a respetiva competição entre empresas para impor a sua versão no mercado fará à semelhança do que aconteceu com outras tecnologias com que estas se tornem mais baratas.

Há, no entanto, diversas situações, como nos casos de oclusão ou de supuração, hipoacusia profunda, fraca inteligibilidade e patologias específicas, onde a utilização de prótese auditiva eletroacústica convencional é desaconselhada. Nestes casos os implantes auditivos, nomeadamente os Implantes Auditivos Osteointegrados (Bone Anchored Hearing Aid – BAHA), os Implantes do Ouvido Médio, Implantes Cocleares, a estimulação Eletroacústica e os Implantes do Tronco Cerebral, poderão ser uma alternativa ao tratamento da hipoacusia. Não obstante carecem de intervenção cirúrgica, e o custo do equipamento e da adaptação é comparativamente muito mais elevado,