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CAPÍTULO I: ASPECTOS FUNDAMENTAIS DA AÇÃO RESCISÓRIA

1.5 PRAZO EXTINTIVO

O Código Civil de 1916, no inciso VII, do § 10, do art. 178, sem dispositivo correspondente no Novo Código Civil, fixou o prazo para a propositura da ação rescisória em cinco anos, porém não fez a divisão entre prescrição e decadência, deixando essa tarefa para a doutrina e a jurisprudência. Restava saber se o prazo era de prescrição e, nesse caso, suscetível de interrupção e suspensão, ou preclusivo e contínuo.

O Código Civil não observou o caráter processual da matéria, ao fixar o prazo para a propositura da ação rescisória, sendo incluído equivocadamente no direito

material, o que concerne essencialmente a instituto de direito processual27. O incidente persistiu, dada a omissão do Código de Processo Civil de 1939, que deixou de incluir em seu texto referido prazo, pois dele é que deveria constar.

Com o Código de Processo Civil de 1973, enfim, findou o problema, e já não existe a questão quanto a ser prescricional ou preclusivo o prazo para a propositura da ação rescisória. O artigo 495 da nova lei processual civil fixou o prazo em dois anos e fala de direito de extinção, portanto, de preclusão. O prazo é preclusivo, extintivo ou de decadência. Nem se suspende, nem se interrompe. Tem início no dia seguinte ao trânsito em julgado da sentença.

Esse é o entendimento de Barbosa Moreira, ao prelecionar que o direito de propor a ação rescisória não se extingue, mas, o direito de rescindir a decisão:

A rigor, o que se extingue não é, aliás, o ‘direito de propor a ação rescisória’: esse existirá sempre, como simples manifestação particular do direito de ação. Extingue-se, sim, o direito mesmo à rescisão da sentença viciada. Escoado in albis o biênio, não é a ação rescisória que se torna inadmissível: é o direito à rescisão da sentença, o direito que se deduziria em juízo, que cessa de existir.

28

Portanto, a natureza do prazo é decadencial, não sendo passível de suspensão ou de interrupção. Mas, cabe observar que o artigo 220 do Código de Processo Civil estabelece que o disposto no artigo anterior se aplica a todos os prazos extintivos previstos em lei. Embora a decadência não se preste a interrupção ou suspensão, em razão de seu conceito diverso da prescrição, o dispositivo ora citado empresta essa qualidade também à decadência. Tal preceito, em relação à decadência, é uma exceção, e toda regra geral tem ínsita a exceção, pois a exceção confirma a existência da regra geral.

27

PONTES DE MIRANDA, Francisco C. Tratado da ação rescisória. Campinas: Bookseller, 1998. p. 366.

28

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 8 ed. Rio de Janeiro, 1999. v. V, p. 217-218.

Quanto à contagem do prazo, embora parte da doutrina entenda que ela se faz da última decisão de mérito29, a divergência já foi superada, sendo uniforme a jurisprudência em dispor que a contagem do prazo se inicia no dia seguinte ao trânsito em julgado. O prazo decadencial só começa a fluir quando esgotadas todas as possibilidades de via recursal ou no momento em que finda, in albis, o prazo recursal, para impugnar a última decisão proferida no processo, ainda que não seja de mérito.30.

A respeito da matéria, posiciona-se unanimemente a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: “O biênio para a propositura da ação rescisória corre da

passagem in albis do prazo para recorrer de decisão proferida no último recurso

interposto no processo, ainda que dele não se tenha conhecido”31, merecendo igual

destaque o Enunciado de Súmula nºº 100 do Tribunal Superior do Trabalho: “O prazo

de decadência, na ação rescisória, conta-se do trânsito em julgado da última decisão proferida na causa, seja de mérito ou não”.

Portanto, determinado precisamente quando ocorreu o trânsito em julgado da decisão, estabelece-se de forma exata o início do prazo decadencial para a rescisão, pois se a decisão ainda puder ser modificada por meio de recurso, não transitou em julgado. Por isso, não se inicia a contagem do prazo de dois anos, até que o último órgão jurisdicional se manifeste sobre o último recurso. Na hipótese de cabimento de recurso que, entretanto, não foi interposto, o trânsito em julgado ocorre ao expirar o prazo para referida interposição.

Vicente Greco Filho ressalta situações a serem consideradas, com relação à interposição de recurso, nas hipóteses de intempestividade manifesta e intempestividade questionável.

29

PONTES DE MIRANDA, Francisco C. Tratado da ação rescisória. Campinas: Bookseller, 1998. p. 374; . 8 ed. Rio de Janeiro, 1999. v. V, p. 115-116.

30

SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. Brasília: Brasília Jurídica, 2000. p. 389-390. No mesmo sentido: COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 6 ed. São Paulo: LTr, 1993. p. 166; e GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 1997. v. 2. p. 391.

Se a parte interpôs o recurso fora do prazo, há que distinguir duas situações: ou a intempestividade é manifesta e nesse caso o trânsito em julgado se dá no fim do prazo que deveria ter sido obedecido ou a intempestividade é questionável, de interpretação duvidosa, devendo, então, ser considerado o início do prazo da rescisória a data do julgamento que, dirimindo a dúvida, resolveu pela intempestividade. Não seria razoável que a parte fosse punida com uma verdadeira diminuição do prazo quando ainda pende recurso que, razoavelmente, ainda pode ser conhecido. Se nesse tempo a parte ainda não pode entrar com a rescisória, exatamente porque pende o recurso, não pode estar correndo o prazo decadencial. 32

Outra situação a ser considerada é a coexistência de duas decisões contraditórias sobre os mesmos pontos, entendendo-se mesmos pontos como identidade de sujeitos, de causa e de coisa. Referidas decisões fazem coisa julgada, escoam-se os dois anos do prazo decadencial dentro do qual teria sido possível o ajuizamento da ação rescisória e subsistem ambas. Indaga-se qual das decisões deve prevalecer.

Para Teresa Arruda Alvim, ainda que decorrido o prazo decadencial do artigo 495 do Código de Processo Civil, é possível o ajuizamento da ação rescisória. A primeira decisão, por força do texto constitucional, artigo 103, § 3º, ,deverá subsistir com relação à segunda, não tendo efeito prático o prazo da lei ordinária. Para fundamentar seu entendimento, assim se expressa:

Além do argumento constitucional citado, ainda se pode dizer que o vencedor da demanda tem a seu favor o direito adquirido, resguardado até a retroatividade da lei e de sua aplicação imediata: a fortiori, da atividade do próprio juiz. Tem-se, então, a favor da corrente que sustenta valer sempre a primeira coisa julgada, outro argumento a nível constitucional. Isso sem se falar nos diversos argumentos de que se pode lançar mão a nível processual. Como resguardar a decisão proferida no segundo processo, em detrimento daquela proferida no primeiro, se naquele as partes deveriam ter alegado coisa julgada; como não o

31

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Segunda Turma, RESP. 11.106/SC, Rel. Minº Adhemar Maciel, DJ 10.11.97.

32

GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 12 ed. São Paulo: Saraiva,1997 .p. 391- 392.

fizeram, o juiz deveria tê-la decretado de ofício, e, assim, ter extinto o processo sem julgamento do mérito? Além do mais, tendo este chegado ao fim, ter-se-á, no mínimo, infringido o art. 471, caput”. 33

Pontes de Miranda entende que a segunda decisão deve prevalecer, na hipótese de duas sentenças passadas em julgado, proferida uma após a outra, caso o direito à rescisão não tenha sido exercido no biênio legal.

Há duas sentenças, ambas passadas em julgado, e uma proferida após a outra, com infração da coisa julgada. Se há o direito e a pretensão à rescisão da segunda sentença, só exercível a ação no biênio, e não foi exercida, direito, pretensão à rescisão extinguiram-se. A segunda sentença lá está, suplantando a anterior. 34

Entretanto, o autor admite que poderá prevalecer a primeira decisão, na hipótese de já ter sido executada e ambas terem passado em julgado.

Em todo caso, se a primeira foi executada – como as duas sentenças passaram, ex hipothesi, em julgado – prevalece, ainda teoricamente, a primeira. Isso quer dizer que, tratando-se de sentença não cumprida, a segunda se põe à frente. 35

A matéria ainda não está pacificada, tanto no âmbito doutrinário, quanto no âmbito dos tribunais. Decidiu em sentido contrário a tese esposada por Teresa Arruda Alvim, o Tribunal de Justiça do antigo Estado da Guanabara, que: “Havendo duas

sentenças, ambas passadas em julgado, que se contradizem, prevalece a proferida a

final, não podendo o juiz negar-lhe cumprimento”.36

Com relação ao direito intertemporal na rescisória, se o prazo preclusivo para a propositura da ação rescisória era de cinco anos, nos termos do Código Civil de 1916 e, passou a ser de dois anos, de acordo com o Código de Processo Civil de 1973, para

33

ALVIM, Tereza Arruda. 1988 .p. 14.

34

PONTES DE MIRANDA, Francisco C. Comentários à Constituição de 1967. Rio de Janeiro: Forense, 1987 .p. 259-260.

35

PONTES DE MIIRANDA, Francisco C. Comentários à Constituição de 1967. Rio de Janeiro: Forense, 1987 .p. 262.

36

decisões transitadas em julgado antes de 1º de janeiro de 1974, aplica-se o prazo para a propositura de cinco anos. Quanto às decisões que só passaram em julgado a partir de 1º de janeiro de 1974, são regidas pelo artigo 495 do Código de Processo Civil. Nesse sentido, o STF tem decidido que o direito intertemporal deve ser aplicado em função do restante do prazo ainda vincendo à época da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil:

Se o restante do prazo de decadência fixado na lei anterior for superior ao prazo estabelecido pela lei nova, despreza-se o período já transcorrido para levar-se em conta, exclusivamente, o prazo da lei nova, a partir de sua vigência.37

Em se tratando da Fazenda Pública, até 10 de junho de 1997, era seguido o prazo decadencial de dois anos previsto no artigo 495 do Código de 1973. A partir de 11 de junho de 1997, a Medida Provisória nº 1.577 duplicou o referido prazo, para a propositura da ação rescisória pela Fazenda Pública, sendo o prazo alterado para cinco anos, em outubro do mesmo ano, com a reedição da Medida Provisória nº 1.577-5/97. Insurgiu-se a Ordem dos Advogados do Brasil, por meio da ADInMC que, apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, suspendeu a eficácia do artigo 4º da Medida Provisória nº 1.632-11, de 09 de abril de 1998.38. Em maio de 1998, o prazo para a propositura da ação rescisória pela Fazenda Pública foi reduzido para quatro anos.39

Vale destacar a determinação da Súmula nº. 264 do Supremo Tribunal Federal no sentido de que se verifique a prescrição intercorrente pela paralisação da ação rescisória por mais de cinco anos:

(...)é a que ocorre no intervalo entre dois momentos interruptivos. Ex.: prescrição que correu entre a citação e a sentença, entre o último ato do processo e o pedido de

37

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AR. 905. Rel. Minº Moreira Alves. RTJ. 87/205.

38

Informativo STF nºº 106, Brasília. DF. 17 abr. 1998 Disponível em: http://www.stf.gov.br/noticias/informativos/anteriores/info106.asp.

Acesso em: 14 jun 2002.

39

BORDIN, Denise Meiler. Ação Rescisória da Fazenda Pública. Revista Jurídica Consulex [CD-ROM],, Brasília, nº 4. 2000.

prosseguimento do mesmo, etc. Prescrição interrompida que recomeçou a correr e sofreu nova interrupção.

No curso da ação rescisória é admitido o reconhecimento da prescrição intercorrente, embora o Código de Processo Civil de 1973 tenha especificado que o prazo é de decadência e não de prescrição, o que não torna superada a Súmula nº 264 do Supremo Tribunal Federal, apenas faz com que o prazo previsto na Súmula, cinco anos, seja reduzido para dois anos 40. Nesse sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

Prescrição. A prescrição intercorrente resultante da inação do autor não ocorre pela simples paralisação do processo. Imprescindível o ato depender da iniciativa da parte. Esta não pode ser prejudicada pela omissão dos serventuários ou do magistrado. A ação rescisória, porém, não corrige eventual má interpretação da prova. Na espécie, o Tribunal, examinando o fato, expressamente, conclui configurando o animus do autor de não dar continuidade ao feito.41