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A ROBUSTEZ DA COISA JULGADA VERSUS A FUMAÇA DO BOM DIREITO OU A

CAPÍTULO II: A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA COMO MEDIDA EXCEPCIONAL

2.1 A ROBUSTEZ DA COISA JULGADA VERSUS A FUMAÇA DO BOM DIREITO OU A

exemplo de excepcionalidade, que justifica a antecipação parcial da tutela, para suspender a execução da coisa julgada.

2.1 A robustez da coisa julgada versus a fumaça do bom direito ou a verossimilhança do direito alegado

O problema de se suspender a execução não se limita à disposição da lei de que a rescisória não suspende a execução, superada pela garantia constitucional de inafastabilidade da jurisdição para situações de urgência, mas fundamentalmente na dificuldade de se encontrar fumaça do bom direito ou verossimilhança do direito invocado, quando se ataca exatamente a coisa julgada, fruto do debate e da prestação jurisdicional com suas seguidas revisões.

Inequivocamente essa dificuldade extrema leva à exceção, a situação em que se mostra justificável a concessão de medida de caráter liminar que contrapõe-se à coisa julgada, o que quer dizer em outras palavras, raras serão as hipóteses, mas elas existem.

A coisa julgada, em tese, não oferece somente a segurança jurídica que tanto se comenta, mas especialmente a distribuição da justiça, a definição precisa de quem possui o direito e em que medida.

Na esfera penal, apenas para reforçar o raciocínio, é de se ver que a condenação com trânsito em julgado deixa para trás a presunção de inocência, outra garantia constitucional, para dar lugar à certeza da culpa.

E por isso se diz, no âmbito da Revisão Criminal, cujo propósito é a rescisão da coisa julgada penal, via a serviço apenas do condenado, que em seu julgamento havendo dúvida se resolverá em favor da coisa julgada, in dubio pro societat, diferentemente do que vigora na cognição precedente à coisa julgada, em que a dúvida da existência do crime, autoria ou culpabilidade do réu, sinaliza a direção da absolvição com esteio no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.

A coisa julgada, portanto, oferece certeza, e assim o autor da ação rescisória enfrenta a presunção de estar errado, de estar colidindo com o que o Judiciário já decidiu, definitivamente, com o selo da coisa julgada.

Aliás, nem se pode olvidar a importância da coisa julgada também como garantia constitucional consagrada no inciso XXXVI do artigo 5o, de que a lei não prejudicará a coisa julgada. Em sendo assim, que nem a lei pode afrontar a coisa julgada, então poder-se-ia indagar: como poderá a lei prever um mecanismo para afrontar a res

judicata?

Indiscutivelmente, se é a própria lei que prevê a Ação Rescisória, a indagação merece alguma reflexão, mas jamais para concordar com o simples silogismo de que a Ação Rescisória não teria lugar, porque para tal conclusão, necessário seria ignorar a aplicação efetiva da garantia constitucional, que claramente se destina à lei posterior à coisa julgada, que não retroagiria para afetá-la.

E também porque a lei ao prever a Ação Rescisória não está ferindo a coisa julgada, mas oportunizando o aperfeiçoamento da jurisdição, celebrando com mais intensidade o valor Justiça ao, efetivamente, permitir a correção de mazelas execráveis no serviço jurisdicional, como a fraude, a corrupção, o conluio e outros artifícios que influem maleficamente na adequada distribuição da Justiça, já tratados no presente estudo.

Nessa lógica, não seria a lei afrontando a coisa julgada, mas a coisa julgada dando lugar à nova prestação jurisdicional.

É nesse ponto portanto, que reside fundamentalmente a possibilidade de se admitir excepcionalmente um provimento de caráter liminar, eis que o próprio ordenamento acabou por admitir que aquela certeza oferecida pela coisa julgada, não é absoluta porque poderá ser modificada com o julgamento da Ação Rescisória, deixando margem, embora diminuta, para modificação da prestação jurisdicional anterior.

E isto nos leva ao início de nosso raciocínio, de que a coisa julgada oferece a presunção de estar errado o autor da Rescisória, mas adverte a lógica do ordenamento de que essa presunção pode ser vencida pela demonstração em contrário.

Leciona Galeno Lacerda que:

A coisa julgada gera presunção relativa, e não absoluta, nos sistemas que adotam a revisão, enquanto não expirado o prazo de decadência, e naqueles em que a rescisória tem largo espectro, como no processo brasileiro.262

Analisando o tema, Francisco Antonio de Oliveira argumenta:

Ainda que se considere relativa a força da coisa julgada, enquanto não decorrido o período decadencial, o seu valor é, intuitivamente, maior do que o da ação rescisória e a quem a lei expressamente veda o efeito suspensivo (artigo 489, CPC).263 O tema é realmente tormentoso, mormente no processo trabalhista, em que o empregado dificilmente terá condição econômica e/ou financeira para compor a execução em caso de sucesso do autor na rescisória.

Todavia, a exemplo do que ocorre com o mandado de segurança em sede de coisa julgada e das exceções que comporta a regra geral, haverá caso em que o sucesso da rescisória seja de tal forma flagrante, v.g., sentença proferida por juiz absolutamente incompetente, que a concessão de cautelar será o único meio de evitar- se mal maior. E pior do que violar o princípio da imutabilidade dos julgados, proferidos

262

LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Forense, 1981. v. VIII. t. I .p. 115.

263

OLIVEIRA, Francisco Antonio de. Ação rescisória: enfoques trabalhistas: doutrina, jurisprudência e súmulas. 2 ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996. p.35.

ao arrepio da lei, é implementar-se ilegalidade através da execução aparelhada, negando-se a cautelar na rescisória.”

É de se concordar com o comentário do ilustre magistrado, exceto quando aponta que o artigo 489 veda a suspensão da execução, o que já foi tratado em tópico anterior, eis que o referido dispositivo, na verdade, apenas assinala que a ação rescisória não suspende a execução, sem que esteja de nenhum modo inviabilizando essa possibilidade, que simplesmente não se realiza sintomaticamente com o ajuizamento da Rescisória, mas dependerá de provimento judicial específico para esse mister.

Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes, analisando a questão na esfera da Revisão Criminal, abordam com muita propriedade o problema, confira:

O ajuizamento da revisão criminal não tem efeito suspensivo, ou seja, não suspende a execução da sentença condenatória. Embora o Código não o diga expressamente, a negação de efeito suspensivo à revisão criminal decorre da necessidade de salvaguardar o instituto da coisa julgada, que só cederá quando o pedido revisional for julgado procedente. Normalmente, a credibilidade da coisa julgada superará os elementos argumentativos da impetração.

No entanto, em determinadas hipóteses, a seriedade dos argumentos trazidos pelo réu, e até mesmo um começo de prova, poderão ser, num juízo sumário e provisório, tão convincentes que afetem substancialmente a certeza do direito estabelecida pela coisa julgada.264

Portanto, se o juiz entender possível, desde logo, reconhecer que a presunção oferecida com a coisa julgada está equivocada, com assento no que fora demonstrado na Ação Rescisória, e ainda, vislumbrar o perigo na demora do provimento judicial, então estará inserido no estreito espaço onde terá lugar o provimento liminar que suspenda os atos de execução.

264

GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal: teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação, reclamação aos tribunais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 327-328.

2.2 Um exemplo de excepcionalidade que justifica a antecipação parcial da tutela para