Observações adicionais
Apesar da relativa estabilidade clínica dos doentes no HD, foi possível observar a necessidade de intervenções psiquiátricas mais individualizadas por manifestações secundárias à medicação ou por agudização da doença, nomeadamente a descompensação de um doente com esquizofrenia por uso de haxixe, condicionando a avaliação de critérios para um internamento a tempo total.
Salienta-‐se a importância das dinâmicas do HD e a reavaliação dos factores de prognóstico nestes doentes crónicos, com vista a condicionar uma adequada e bem-‐sucedida estabilização e reabilitação psicossocial. Verificou-‐se que a existência de antecedentes familiares com doença psiquiátrica, a idade precoce de aparecimento da doença, a má adesão terapêutica, a ausência de suporte familiar e o uso de drogas, condicionam negativamente o prognóstico destes doentes, sendo alvo de avaliação e intervenção no plano terapêutico dos doentes.
Atendendo à predisposição dos doentes psiquiátricos para desenvolver determinadas comorbilidades com um risco superior à população em geral (obesidade, doença cardiovascular, por exemplo) é importante atender a outros factores de risco e determinar a necessidade de um rastreio oportunista de determinadas doenças.
Vinheta Clínica
Foi possível realizar uma entrevista, segundo um modelo de avaliação disponibilizado, tendo sido um momento de treino da entrevista psiquiátrica, aplicação da semiologia específica em psiquiatria e treino das competências comunicacionais. Esta foi, ainda, uma oportunidade de exercício no estabelecimento de um diagnóstico provisório em psiquiatria e na avaliação de diversos factores envolvidos no prognóstico em psiquiatria. A vinheta clínica foi realizada a um doente com perturbação afectiva bipolar do tipo I e encontra-‐ se disponível em anexo (vide Anexo II).
Serviço de Urgência (SU)
Frequentou-‐se o SU no dia 19 de Janeiro de 2015, sob orientação do Dr. João Carlos Melo, tendo sido observados casos de manifestações psiquiátricas agudas em doentes com psicopatologia descompensada e em doentes sem doença psiquiátrica conhecida.
Foi possível observar a abordagem dos seguintes casos:
-‐ Doente bipolar com alterações de comportamento (MR♂, 43 anos); -‐ Delírio persecutório em doente com esquizofrenia (MC♀, 30 anos); -‐ Crise de ansiedade (SG♀, 40 anos);
-‐ Crise de ansiedade em doente com perturbação de adaptação (MI♀, 70 anos); -‐ Ideação suicida em doente com depressão major (NF♀, 40 anos).
necessidade de internamento ou de referenciação para consulta de psiquiatria ou de outra especialidade aquando do estabelecimento de um diagnóstico diferencial entre causas orgânicas e psiquiátricas.
Refere-‐se, ainda, a importância da aquisição de informação complementar de relevo junto dos familiares ou acompanhantes do doente em determinadas situações, permitindo a confirmação de dados anamnésicos, sendo também estes um elemento fundamental no estabelecimento de uma aliança terapêutica com vista à optimização do prognóstico do doente.
Internamento
Visitou-‐se o internamento de psiquiatria no HFF no dia 10 de Dezembro de 2014, sob orientação da Dr.ª. Teresa Maia, sendo referido que neste estavam internados doentes adultos com patologia psiquiátrica major descompensada ou de novo da área de residência abrangida pelo HFF.
Houve ainda oportunidade de visitar o internamento por uma segunda vez, no dia 13 de Janeiro de 2015, sob orientação do Dr. João Carlos Melo, para discussão da eventual necessidade de internamento de um doente do hospital de dia com esquizofrenia que descompensou após fumar haxixe associado a má adesão terapêutica, com reaparecimento de manifestações psicóticas.
Apesar de uma limitada presença neste serviço, foi possível observar a dinâmica do internamento e algumas particularidades deste em relação ao internamento de outras especialidades.
Reuniões Clínicas
Nestas reuniões, realizadas todas as 4ªfeiras, abordavam-‐se questões de ordem organizacional, temáticas e estudos actuais em psiquiatria, sendo fomentada a possibilidade de discussão multidisciplinar.
Estas reuniões destacaram a importância do trabalho em equipa e a abordagem integradora do doente nesta instituição, havendo particular zelo pela formação contínua de todos os elementos das equipas do serviço de psiquiatria.
Durante o estágio houve possibilidade de assistir a duas destas reuniões, destacando-‐se a apresentação do estudo do Dr. João sobre A complexidade e a regulação do humor, realizada a 7 de Janeiro de 2015 e sobre o
Impacto da depressão materna na percepção de sintomatologia comportamental dos seus filhos, tese
apresentada pela Dra. Teresa Maia realizada a 14 de Janeiro de 2015.
Reuniões de Equipas Comunitárias de Saúde Mental
Foi possível assistir à reunião da equipa multidisciplinar do hospital de dia com a equipa comunitária de saúde mental da Amadora, no dia 14 de Janeiro de 2015. Nesta reunião foram discutidos casos de doentes internados no hospital de dia de psiquiatria, abordando a sua evolução, intercorrências, actividades particulares a implementar com vista à aquisição de competências pessoais, adequação terapêutica e avaliadas as condições no sentido de prever a alta dos doentes.
Assistiu-‐se, assim, à discussão de doentes com depressão e ideação suicida (JB♂, 63 anos), com depressão
major (MA♀, 54 anos), com esquizofrenia (DV♂, 41 anos e HF♀, com 38 anos) e doente bipolar tipo II (PA♀,
53 anos).
Destaca-‐se a acção multidisciplinar no processo terapêutico destes doentes, bem como a importância do conhecimento do seu meio familiar, social e económico na decisão e definição consciente e realista de objectivos terapêuticos a alcançar.
Seminários
O seminário realizado no dia 9 de Dezembro de 2014, na Faculdade de Ciências Médicas, sob orientação do Professor Doutor Miguel Xavier, estruturou-‐se em três momentos:
1) Esclarecimento dos objectivos e organização do estágio;
2) Apresentação e discussão de alguns casos clínicos relativos à abordagem do doente em ambiente de urgência, nomeadamente:
-‐ Abordagem a um doente toxicodependente com síndrome de abstinência de heroína; -‐ Abordagem ao doente com ataque de pânico;
-‐ Abordagem ao doente após tentativa de suicídio com avaliação do risco; -‐ Abordagem ao doente com agitação psico-‐motora hétero-‐agressivo. 3) Visualização de um vídeo sobre a realização prática do exame neurológico.
Foram também disponibilizadas ferramentas de avaliação em psiquiatria, tais como o Mini Mental State
Examination (MMSE) e Mini International Neuropsychiatric Interview (MINI).
No dia 13 de Janeiro de 2015 decorreu a apresentação do seminário relativo à temática Psicoimunologia, realizado em grupo com os colegas do 6ºano a estagiar nesta instituição, sob moderação do Dr. João Carlos Melo e da directora do serviço Dra. Teresa Maia Correia, contando com a presença de internos da especialidade de psiquiatria.
A realização deste trabalho permitiu aprofundar a relação entre o sistema imunitário e o sistema nervoso, abordar aspectos neuropsiquiátricos de algumas doenças auto-‐imunes mais comuns, tais como a artrite reumatóide, a doença de Crohn e o lúpus eritematoso sistémico, bem como alguns efeitos psiquiátricos secundários à terapêutica farmacológica utilizada no tratamento de doenças auto-‐imunes.
Os slides da apresentação encontram-‐se em anexo (vide Anexo III).
Actividades Não Programadas
No dia 10 de Dezembro de 2014, assistiu-‐se à conferência Primary care in mental health, pelo Prof. Sir David Goldberg do Institute of Psychiatry of King College (Londres), onde foi abordada a sua experiência de um modelo comunitário de saúde mental. Esta foi seguida da apresentação do Prof. Doutor Luís Pisco sobre a experiência nacional da implementação do programa nacional em saúde mental.
Reflexão Crítica do Estágio
O Estágio Clínico em Saúde Mental do 6º Ano, que surge na actual programação do MIM, foi um estágio muito enriquecedor e que colmatou muitas das lacunas deixadas pelo estágio em psiquiatria, realizado no 5º ano.
Este estágio permitiu contactar com a prática e filosofia da saúde mental abordando um diversificado número de doenças psiquiátricas, sua abordagem e, em particular a observação de um trabalho multidisciplinar no processo terapêutico do doente com psicopatologia.
Sentiu-‐se um adequado acolhimento e integração na dinâmica e na diversidade de actividades do serviço desta instituição, destacando-‐se o contacto directo com doentes com patologia diferente e em diversas fases de recuperação que frequentam o hospital de dia de psiquiatria. Foi especialmente enriquecedor a possibilidade de observar particularidades da sua dinâmica interpessoal aquando das sessões de terapia de grupo e das actividades ocupacionais.
A presença no SU permitiu observar alguns casos que caracterizam a abordagem de situações psiquiátricas agudas mais frequentes, salientando-‐se a importância da confiança, da empatia e de uma adequada relação médico-‐doente-‐família na abordagem inicial destes doentes e na sua orientação terapêutica.
Destaca-‐se a importância de uma adequada referenciação e a pertinência da acção das equipas comunitárias de saúde mental, sendo igualmente de relevo a responsabilidade social de inclusão e de recuperação destes doentes enquanto membros integrantes da sociedade.
A participação em sessões clínicas e nos seminários permitiu a consolidação e a aquisição de novos conhecimentos, tendo sido considerados de grande interesse na prática futura. A abordagem teórico-‐prática dos casos clínicos discutidos nos seminários que iniciaram este estágio, estruturou, de forma pertinente e sistematizada, a abordagem ao doente em ambiente de urgência.
Foram adquiridas competências relativas à realização de uma história psiquiátrica, à avaliação do estado mental, ao conhecimento de algumas das ferramentas de avaliação em psiquiatria e sua semiologia característica, bem como à sensibilização da importância do contexto socioeconómico dos doentes atendendo a um modelo bio-‐psico-‐social.
Refere-‐se a consolidação de alguns critérios de diagnóstico provisório de psicopatologia mais comum (depressão, ansiedade, perturbações de adaptação e insónia) e, também, daquelas mais particulares a esta especialidade (doença bipolar, esquizofrenia, por exemplo), não deixando estas últimas de ser transversais a outras especialidades, atendendo às comorbilidades médicas apresentadas pelos doentes.
Além da aquisição de competências relacionais no caso particular do doente com psicopatologia, destaca-‐se a diversidade de questões éticas inerentes à prática desta especialidade, a consciência contínua da vulnerabilidade do ser humano, sendo ténue a linha entre uma efectiva saúde mental e a psicopatologia, revelando-‐se fundamental a abordagem multidisciplinar e integradora na reabilitação destes doentes. De um modo geral, considera-‐se muito positivo o grau de cumprimento dos objectivos pessoais inicialmente propostos (vide Anexo IV), embora a diversidade de temas e especificidades da especialidade tenha suscitado a necessidade de adquirir um maior aprofundamento de determinadas temáticas e patologias com
Como aspecto negativo refere-‐se a impossibilidade de assistir a uma maior diversidade de consultas, dado o local principal de frequência ser o hospital de dia. Porém, tal foi colmatado com a discussão de alguns casos clínicos e a presença nas actividades do SU.
Finalmente fica o agradecimento a todos os profissionais de saúde do hospital de dia e equipas que me acolheram e orientaram durante este estágio, em particular e em especial ao Dr. João Carlos Melo e seus internos, Dra. Natasha Correia e técnicos ocupacionais, cuja disponibilidade e orientações foram fundamentais para a aquisição de competências e cumprimento dos objectivos iniciais delineados. O testemunho de profissionalismo e de zelo de todos estes profissionais pelos doentes observados serão para mim uma referência pessoal futura a interiorizar e a alcançar.
Lisboa, 14 de Janeiro de 2015 Ana de Carmo Santana Campos