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Princípio da função social da propriedade mineira

3 O DIREITO MINERÁRIO BRASILEIRO

3.4 Princípios regedores do direito minerário

3.4.3 Princípio da função social da propriedade mineira

Toda propriedade, particular ou não, tem de atender aos interesses sociais. Vincula-se, portanto, desde seu nascimento, à vontade da coletividade. Isto decorre do princípio da preponderância do interesse público sobre o particular e do princípio da destinação do bem mineral ao uso geral, como já demonstramos.

A idéia jurídica de função assim é definida na doutrina especializada:

É função toda atividade (como conjunto de atos finalisticamente orientados) exercida no interesse geral ou no interesse alheio. Compõe-se em síntese de uma missão. Pressupõe sempre a idéia de ofício, público ou privado, que é sua base concreta.

‘A chamada função ambiental depassa a órbita do Estado e chama o cidadão, individual ou coletivamente, para exercer algumas de suas missões. (BENJAMIM, 1993, p.28).

No plano jurídico, como analisa Grau (1990, p. 250), a admissão do princípio função social (e ambiental) da propriedade tem como conseqüência básica fazer com que a propriedade seja efetivamente exercida para beneficiar a coletividade e o meio ambiente (aspecto positivo), não bastando apenas que não seja exercida em prejuízo de terceiros ou da qualidade ambiental (aspecto negativo). (SUNDFELD, 1993).

Este princípio está devidamente complementado no capítulo do Direito do Ambiente, posto que não se restringe à propriedade urbana (art. 182, § 2º da CF), rural (art. 186 da CF), mas também à função social à propriedade com vocação mineral. Como vimos o legislador constituinte deixou expressamente na Carta Política as duas primeiras funções sociais da propriedade e com relação à última deixaram-a implícita em seu texto.

Hoje, o direito de propriedade do solo não inclui as riquezas minerais, como pode ser observado na leitura dos arts. 20 inc. IX e 176 da Constituição Federal e do art. 1.230 do Código Civil de 2002, que acolheu o princípio constitucional da separação jurídico-patrimonial entre a propriedade do solo e dos recursos minerais nele presentes, bem como no subsolo.

Assim, transposta para a atividade mineral, a função socioambiental tem seus prismas econômicos e sociológicos inseridos na própria idéia da sustentabilidade de uma região e de um

grupo ou grupos sociais (art.170, inc. VI e art. 225, § 1º, inc. V da CF) e ainda expressamente no art. 47 incisos I a XVI do Código de Mineração e suas posteriores alterações, senão vejamos.

O titular da concessão [empreendedor-minerador] estará sujeito além do cumprimento das condições gerais constantes do Código de Mineração seguir à risca o rol das condições específicas previstas no art. 47 do Código de Mineração sob pena das sanções legais cabíveis. Assim, “não dificultar ou impossibilitar, por lavra ambiciosa, o aproveitamento ulterior da jazida” (art. 47, inc. VII do CM), implica diretamente no aproveitamento racional do recurso mineral, bem como na destinação do bem mineral ao uso geral da coletividade. Portanto, ao cumprir esses ditames legais estará o minerador cumprindo a função social da propriedade com vocação mineral.

A função ambiental da mineração traz responsabilidades evidentes ao minerador, mas não descarta, não despreza e não prescinde da mesma responsabilidade pelo Estado e pela sociedade. (LOTT, 2000, p.97).

É oportuno, destacar jurisprudência neste sentido:

Ação Civil Pública – Atividade garimpeira – Dano ao Meio Ambiente – Zonas declaradas de proteção ambiental definitiva – Restrições – Função Social.

Ementa Acórdão: Ação Civil Pública. Atividade garimpeira no Rio Vermelho e afluentes. Dano ao meio ambiente e ao patrimônio histórico, cultural e paisagístico. Proibição de não fazer;

1. Cabe apenas ao interessado, prejudicado pela sentença, argüir vício da citação. Quem não foi citado, não é alcançado pela coisa julgada, cujos efeitos se produzem entre as partes na ação. 2. Conceitua-se o meio ambiente como “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciam o desenvolvimento equilibrado da vida humana”. Por via da ação civil pública, promove-se a defesa de bens culturais e patrimoniais coletivos, cuja proteção hoje é tratada como de ordem pública, segundo dispõe a lei maior do país (art. 255). 3. As propriedades circunscritas na zona declarada de proteção ambiental definitiva continuam garantidas como propriedades privadas, porém seu uso sofre as restrições determinadas pela sua função social (CF, art. 5º, XXII e XXIII). Apelo improvido.

ACÓRDÃO – Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível 28.606, da Comarca de Goiás, em que é apelante João Maria Berquó, e apelado Ministério Público.

Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pelos componentes da 1ª Câmara Cível e 2ª. Turma Julgadora, à unanimidade de votos conhecer do apelo e lhe negar provimento, nos termos do voto do relator.

Participaram do julgamento, além do relator, os e. Des. Antonio Nery da Silva e Juarez Távora de Siqueira.

Goiânia, 09 de fevereiro de 1993 – S. O. CASTRO FILHO, Pres. – JOSÉ SOARES DE CASTRO, relator. RELATÓRIO – O Dr. 2º Promotor de Justiça da Comarca de Goiás intentou ação civil pública contra Valson Vasconcelos e outros, responsabilizando-os por causarem dano ao meio ambiente, nos termos da Lei 7.347/85, ao permitirem, em propriedades particulares, a exploração garimpeira no Vale do Rio Vermelho, auferindo a comissão de 20% sobre o minério extraído.

Demanda contestada pela Cooperativa Bandeirante de Garimpo Ltda., e por João Maria Berquó, a sentença de fls., deu-a por procedente, proibindo, com efeito erga omnes, toda atividade garimpeira em toda a extensão do Rio Vermelho, tornando definitiva a liminar concedida e condenando os requeridos em custas e verba honorária. (Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, grifo acrescentado).

A função patrimonial ou financeira dos recursos minerais deve ser entendida como função secundária, conseqüência da posse deles, inerente ao aproveitamento, que exige uma contraprestação pecuniária. A função imediata deve ser sua destinação ao uso geral por meio do aproveitamento dele. Esta constitui a função social do bem mineral. Quanto ao “domínio eminente” do Estado resultante da “faculdade decorrente da soberania estatal sobre as pessoas e seus bens”, entende que não se presta para explicar a relação jurídica do Estado com seus bens minerais, já que expressa idéia que não corresponde mais aos ditames do Estado de Direito, submetido que está aos princípios de competência e legalidade. Quanto ao “poder fiscalizador”, trata-se de competência atribuída à Administração em decorrência dos condicionamentos dos direitos (limites, encargos e sujeições), e não o fundamento da relação jurídica do Estado com os recursos minerais (SERRA, 2000, p.20, grifo acrescentado).

As competências da Administração para impor os condicionamentos dos direitos, para reprimir sua inobservância, para fiscalizá-los, ou para executar materialmente seus atos, são decorrências dos condicionamentos dos direitos (limites, encargos e sujeições). (SUNDFELD, 1993, p.73).

Para concluir, Milaré (2005, p. 695, grifo acrescentado) ensina que “[...] a função social da propriedade urbana altera essencialmente o direito do proprietário de dispor livremente dela, condicionando seu uso e fruição ao interesse social. Trata-se de um interesse não apenas econômico, mas também ambiental, a justificar o apotegma de que: toda propriedade privada é

gravada por uma hipoteca social”.

Para o cumprimento efetivo da função social da propriedade com vocação mineral o empreendedor deverá como vimos respeitar o princípio da destinação do bem mineral ao uso

geral e ainda cumprir com outro princípio fundamental do direito mineral, muitas vezes até

confundido como um princípio de direito ambiental, que é a recuperação ou reabilitação da área

minerada. Seguindo estes dois princípios o minerador, terá cumprido a função social da

propriedade mineira, pois estará devolvendo à sociedade a área reabilitada para usos futuros, após a exaustão do depósito mineral, que serviu para o uso geral da sociedade.

Neste sentido, exemplo típico da função social da propriedade mineira se encontra notadamente na capital do Estado do Paraná, onde o município com planejamento adequado de uso e ocupação do solo urbano cumpriu à risca o seu papel. As antigas áreas de mineração, após a exaustão de seus recursos minerais, foram devidamente reabilitadas, possibilitando assim seu uso futuro. As mesmas foram devolvidas à cidade em forma de: parques, áreas de lazer, recreação, turismo e culturais como teatros, etc. Assim, houve o cumprimento eficaz da função social da propriedade, seguindo a Política Urbana − Estatuto da Cidade, que objetiva uma urbe sustentável e saudável, consoante o disposto na Lei n. 10.257, de 10.07.2001.