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Princípios conceituais do Programa

CAPÍTULO III – Caracterização Geral do Programa Saúde da Família

1. Princípios conceituais do Programa

Sob a égide da Promoção da Saúde, o Programa Saúde da Família torna-se, no discurso governamental, o elemento essencial da Política de Atenção Básica no Brasil2, tendo como eixos transversais das suas ações: a universalidade, a integralidade e a equidade, num contexto de tentativas de descentralização e participação comunitária. E é colocado nos documentos oficiais como uma estratégia. Sendo o foco deste trabalho a universalidade, representada pelo acesso à atenção básica, a integralidade e a participação comunitária, retomaremos a discussão sobre estes princípios nos tópicos seguintes.

Um dos pressupostos deste Programa é que a atenção à saúde esteja centrada na família, entendida e percebida a partir do seu ambiente físico e social, permitindo aos profissionais uma compreensão ampliada do processo saúde-doença. De acordo com Veras et.al. (2000, p.27), o PSF

tem como elemento primordial de atuação o desenvolvimento de ações de saúde voltadas para o núcleo familiar. Valoriza o vínculo entre os profissionais da saúde e a população de sua área de abrangência, e apresenta uma proposta de transformação das práticas de saúde e da organização dos serviços, pois integra e promove a reorganização dessas atividades, adotando como eixo condutor de suas ações a ‘vigilância à saúde’, em determinado território, objetivando enfrentar os problemas identificados, contribuindo assim, para a consolidação dos sistemas municipais de saúde.

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Atenção básica tem sido uma denominação adotada no país, especialmente no âmbito do SUS, para designar uma abordagem, que corresponderia ao que se tem chamado, na literatura internacional, de atenção primária de saúde. Esta elaboração conceitual, no nosso país, no âmbito do Sistema Único de Saúde, está relacionada à necessidade de construção de uma identidade institucional própria, capaz de estabelecer uma ruptura com uma concepção redutora desse nível de atenção, concepção esta que compreende a atenção primária como a prestação de cuidados de saúde a parcelas excluídas da população,

apoiadas num padrão de assistência médica (primária) de limitado alcance, baixa densidade tecnológica e pouca efetividade na resolução dos problemas de saúde das populações. (BRASIL, 2003, p.7).

A concepção de saúde escrita no Programa supera a antiga proposição de caráter exclusivamente centrado na doença, considerando o seu desenvolvimento por meio de práticas gerenciais e sanitárias, democráticas e participativas, tendo a saúde como um processo social diretamente relacionado aos contextos sociais, econômicos, políticos e familiares aos quais os indivíduos estão inseridos. Seu processo de trabalho, deve pautar-se no trabalho em equipe multiprofissional sob a égide da Promoção da Saúde, dirigidos à populações delimitadas através da adscrição (princípio operacional do PSF) de clientela e da delimitação territorial, pelos quais a equipe assume as responsabilidades do cuidado e da assistência de saúde. Às equipes compete ainda, a articulação e vinculação com a comunidade a fim de estabelecerem laços de co- responsabilidade entre usuários e equipe pela saúde da população.

1.1. A universalização da atenção no PSF.

A universalização, enquanto princípio do Programa, tem sido representado pela ampliação do acesso à atenção básica, a partir do PSF. Como um dos principais objetivos da reforma sanitária e que está inscrito não apenas na constituição federal brasileira, mas também no Sistema Único de Saúde, a universalização da atenção representa um esforço para combater as iniquidades no acesso a estes serviços por grandes parcelas da população.

O crescimento do Programa, com o aumento da adesão e da cobertura nos municípios é evidente. Para se ter uma ideia, em 2010 o PSF encontrava-se implantado em 5.250 municípios, cobrindo uma população de 96.388.303 pessoas. (BRASIL, 2010). Esses números, por si, já demonstram o potencial do Programa para garantir um maior acesso da população aos serviços de atenção básica. No entanto, para avaliarmos a universalidade da atenção e uma melhoria nesse acesso, utilizamos dois conceitos que são próximos, mas não coincidentes que é o acesso e a acessibilidade. (Ver capítulo anterior no tópico conceitos centrais da pesquisa). Esses aspectos, foram avaliados através do PSF enquanto porta de entrada dos sistemas municipais e das barreiras que dificultam a utilização dos serviços (barreiras para a acessibilidade).

As principais barreiras de acessibilidade que podem comprometer a qualidade do acesso aos serviços, são: as barreiras geográficas que se referem aos aspectos físicos impeditivos do acesso (rios, grandes avenidas, morros etc) e à distância entre a

população e o serviço; barreiras organizacionais que são barreiras decorrentes do modo de organização do serviço (demora na obtenção da consulta, turnos de funcionamento etc); barreiras sócio-culturais que se refere à apreciação dos fenômenos que determinam a busca do serviço de saúde (percepção do indivíduo sobre a gravidade da sua doença, etiologia, tipo de tratamento, medo do diagnóstico etc. E outros na perspectiva do sistema de saúde, tais como: formação dos profissionais desvinculada da realidade de vida da população, incipiência dos processos de participação dos usuários nas organizações dos serviços etc); barreiras econômicas, representada pelas despesas das famílias com serviços de saúde (consumo de tempo, energia e recursos financeiros para busca e obtenção da assistência; custo do tratamento etc). (AZEVEDO, 2007).

O PSF utiliza o conceito de porta de entrada, representado pelas UBSF, que expressa a ideia de que existe um ponto de entrada cada vez que há necessidade de um novo atendimento para algum problema de saúde que não seja caso de urgência e/ou emergência. Para estas situações, a porta de entrada são os prontos-socorros e/ou hospitais de urgência e emergência. Essa porta de entrada deve possuir fácil acesso, é inerente à organização de serviços de saúde por nível de atenção (primário, secundário e terciário) e deve representar o primeiro contato do usuário com os serviços de saúde. (STARFIELD, 2004).

O PSF prevê também sua integração em uma rede de serviços junto aos demais níveis do sistema, estabelecendo com eles um sistema de referência e contra-referência que garanta resolutividade e possibilite o acompanhamento dos pacientes. (BRASIL, 2002a). Nesse ponto, os conceitos de acesso e integralidade se cruzam. No que se refere à integralidade, esta representa o terceiro sentido descrito por Mattos (2006).

Quando nos referimos ao acesso aos outros níveis de atenção do sistema, estamos tratando do acesso aos níveis secundário e terciário, representados pelos atendimentos realizados por especialidades médicas ambulatoriais e hospitalares. (OLIVEIRA, 2010). O sistema funciona prevendo que o usuário, quando acometido por algum problema de saúde, procure, a princípio, a porta de entrada, no caso o PSF, para realizar atendimento com a equipe de saúde. De acordo com Starfield (2004), 85% dos problemas apresentados pelos usuários estão diretamente vinculados às suas condições de vida e trabalho e representam problemas que podem ser tratados ainda na atenção básica. Para os demais 15% exige-se uma atenção mais especializada, muitas vezes, para situações crônicas e que demandam intervenções com maiores recursos

tecnológicos e medicamentosos. Para estes casos a equipe do PSF conta com o sistema de referência, onde o usuário é encaminhado para realizar atendimento com especialistas e o sistema de contra-referência, onde, a partir deste encaminhamento, o médico especialista que o atendeu descreve, sintetiza e propõe medidas para a continuidade dos cuidados a serem oferecidos pela equipe do PSF. Por atenção contínua ou continuada, deve-se entender o conjunto de ações que perpassam os diferentes níveis de atenção sem que signifiquem a perda de contato com o primeiro nível, ou a porta de entrada. De acordo com Sá (2003, p.51-52),

o primeiro nível recebe e percebe o usuário em suas necessidades, estabelece o vínculo e passa a gerenciar a saúde do mesmo, referenciando para outros níveis quando necessário, no intuito de obter avaliações especializadas que melhor organizem a abordagem às necessidades do usuário. (...) A questão da articulação entre os diferentes níveis de assistência, ao que parece, não deve ser vista como uma mera organização do fluxo de usuários dentro do sistema, mas sim, como a capacidade do próprio sistema de estar articulado e integrado para resolver os problemas de saúde da população, através de ações interligadas, em crescente complexidade de acordo com o gerenciamento das necessidades verificadas pelo nível básico de atenção.

Na nossa pesquisa, referente a esta questão, avaliamos a universalidade e a integralidade no seu terceiro sentido considerando o acesso dos usuários a estes outros níveis do sistema de saúde.

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