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Principais Características do Distrito Industrial

No documento UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR (páginas 56-61)

PARTE I FUNDAMENTOS TEÓRICOS SOBRE INOVAÇÃO EMPRESARIAL

4. ABORDAGENS ACTUAIS DE REFERÊNCIA SOBRE INOVAÇÃO EMPRESARIAL

4.2. ABORDAGEM DE REDES E DAS RELAÇÕES INTER-ORGANIZACIONAIS

4.2.2. Abordagem de Distrito Industrial

4.2.2.2. Principais Características do Distrito Industrial

A experiência italiana impulsionou a investigação dos distritos industriais em várias regiões de países avançados durante a última década (Sengenberger, Loveman and Piore, 1990; Pyke e Sengenberger, 1992 e Piore, 1992). Do debate internacional sobre distritos industriais emergiram determinadas características chave, de entre as quais se salientam as seguintes:

A – Sistema de pequenas e médias empresas relacionadas

A caracterização do distrito industrial como um aglomerado de empresas predominantemente de pequena dimensão destaca-se quase em todas as definições já apresentadas. Os autores referem esta característica como definidora do distrito industrial. Capecchi (1992), no estudo dos distritos industriais da região italiana de Emilia-Romaña, verificou que nestes distritos existe um grande número de empresas pequenas e muito pequenas. O predomínio de empresas de pequena dimensão nos distritos industriais é constatado por vários autores no estudo de diversas regiões, em diferentes países, designadamente por Schmitz (1992) no estudo de região alemã de Baden-Württemberg, por Kristensen (1992) no estudo da região dinamarquesa de West Jutland, por Julien (1992) em três regiões do Canadá, entre outros estudos.

Para além do predomínio de pequenas e médias empresas ser considerado um elemento definidor do distrito industrial, os autores acrescentam o facto de não existir uma empresa que domine de forma permanente as restantes. Pyke e Sengenberger (1992:22) afirmam que “uma característica do distrito industrial é que há muitas empresas independentes, geralmente pequenas, e nenhuma delas é um centro estratégico ou “cabeça” na tomada de decisões”. Também Brusco (1990) diz expressamente que o conglomerado de empresas que formam um distrito não tem um centro de decisão estratégico.

Mas, mais importante do que a mera concentração de empresas, é a actuação conjunta que estas mesmas empresas desenvolvem entre si. Como assinalam Pyke e Sengenberger (1992:16), a “população de pequenas empresas do distrito industrial não é simplesmente um conjunto de unidades produtivas. O que faz com que sejam mais do que isso é o sistema especial como se organizam e se relacionam entre si e com o ambiente”.

B – Componente territorial da relação e proximidade geográfica

Em todas as definições sobre distritos industriais está presente a componente territorial. Para Becattini (1979, 1989, 1990) e Sforzi (1992), o distrito industrial é uma entidade socioterritorial. Capecchi (1992) ao referir-se a esta componente diz que é um meio envolvente geográfico muito limitado. Também Goodman (1989:21) esclarece que os “distritos industriais são essencialmente um sistema territorial de pequenas e médias empresas”. Schmitz (1992) afirma que o modelo de distrito se baseia na proximidade geográfica. Esta proximidade permite a realização de numerosas transacções baseadas em relações recíprocas de conhecimento e de confiança entre os contraentes (Gaffard, 1990). Sengenberger e Pyke (1992) salientam que a proximidade geográfica entre empresas e indivíduos e entre empresas e instituições locais, melhora a eficácia: facilita a difusão de ideias e inovações técnicas, e de diversas formas de colaboração entre empresas no âmbito político; melhora a coesão social; fomenta um sentimento de consciência colectiva e facilita e acelera as operações entre as empresas.

C – Especialização sectorial das empresas

Trata-se de uma característica destacada por diversos autores que consideram que a maioria das empresas de um distrito industrial pertence a um sector de actividade específico. Esta componente é primeiramente referida por Marshall (1947), ao considerar que existe uma especialização sectorial num determinado produto e que os fenómenos económicos relacionados com a localização geográfica estão ligados à concentração de empresas têxteis e metalúrgicas. Também Brusco (1990) e Pyke e Sengenberger (1992) consideram esta característica ao referir que as empresas de um distrito fabricam um determinado produto homogéneo. Por sua vez, Schmitz (1992) diz explicitamente que existe uma especialização sectorial no distrito industrial.

D – Divisão do trabalho entre as empresas e flexibilidade

No distrito industrial, a divisão de trabalho entre as pequenas e médias empresas é elevada, com produção flexível e adaptável às mudanças da procura de mercado. A maioria das empresas especializa-se numa única fase do processo de produção; somente um pequeno número de empresas possui mais do que uma fase do processo de produção (Brusco, 1982; Becattini, 1990, 1991 e Trigilia, 1992).

A especialização das empresas nas diferentes fases do processo produtivo origina uma abundância de mão de obra qualificada e um elevado nível de profissionalismo e conhecimento do ofício (Becattini, 1990; Pyke e Sengenberger, 1992 e Trigilia, 1992). As empresas do distrito industrial detêm grande flexibilidade e grandes capacidades de absorção, adaptação e melhoramentos das novas tecnologias para satisfazerem as necessidades específicas do mercado. A flexibilidade é frequentemente considerada como uma vantagem face às grandes empresas centralizadas (Sengenberger e Pyke, 1992).

E – Presença de economias externas

As relações que ocorrem dentro do distrito industrial resultam em economias externas, de entre as quais se destacam as economias de especialização, de transacção e de formação. As economias de especialização provêm da forma de organização particular dos distritos industriais, na qual as empresas dividem e subcontratam o trabalho entre si, o que faz com que no conjunto das empresas se possa aceder a economias de escala (Becattini, 1990; Trigilia, 1992 e Sengenberger e Pyke, 1992). As economias de transacção são aquelas que advêm dos fluxos intangíveis, especialmente fluxos de informação, de conhecimentos e do saber-fazer colectivo (Becattini, 1990; Piore, 1992; Sengenberger e Pyke, 1992 e Becattini e Rullani, 1996). Também se verificam economias de formação resultantes da difusão dos conhecimentos relacionados com o saber-fazer, e das técnicas de produção entre a oferta local de mão de obra (Becattini, 1990; Trigilia, 1992 e Bellandi, 1996;).

As economias externas resultantes das relações que se estabelecem dentro do distrito industrial evidenciam-se tanto sobre a forma de redução de custos, como também sob o incremento de resultados.

F – Distrito industrial como uma entidade social e económica

Nos distritos industriais, as relações económicas são tão importantes como as relações sociais, as quais incluem não só relações do tipo puramente social como também político, religioso, histórico, cultural ou comunitário.

Marshall (1947) foi o autor que em primeiro lugar abordou esta característica, que denominou “atmosfera industrial”, e que diz respeito a todas as implicações sociais, comunitárias e locais

que se desenvolvem na esfera do distrito industrial e que se traduzem na circulação de ideias, valores, inovação e mão-de-obra especializada. Becattini (1990) retomou esta concepção ao definir o distrito industrial como uma entidade socioeconómica. Reforçou esta ideia ao afirmar que o “distrito industrial é um “cúmulo” de interdependências sociais e industriais num determinado lugar” (Becattini, 1992:204). Também, Capecchi (1992:42) salienta que “existe uma forte inter-conexão entre o distrito como realidade de produção e a zona como mistura de vida familiar, política e social”. Igualmente Pyke e Sengenberger (1992:15) referem que “uma das características do distrito industrial é ter sido concebido como um todo social e económico. Isto quer dizer que existe uma estreita inter-relação entre as esferas social, política e económica, e que o funcionamento de uma delas, por exemplo, a económica, está determinado pelo funcionamento e a organização das outras. Portanto, o êxito dos distritos não depende só do campo económico. São igualmente importantes os aspectos sociais e institucionais mais amplos”.

Esta atmosfera industrial, em que existe uma forma peculiar de entrelaçamento entre as empresas e a comunidade local, possibilita o fomento da iniciativa empresarial endógena (Becattini, 1990) e a mobilidade socioprofissional vertical (Trigilia, 1992), mediante a qual os trabalhadores se convertem em empresários, o que se traduz num dinamismo superior ao de outras zonas, com um espírito e uma capacidade empresarial generalizados (Kristensen, 1992; Pyke e Sengenberger, 1992).

G – Combinação de cooperação e competição entre empresas

A rede de empresas do distrito industrial é composta por um conjunto de pequenas e médias empresas que alternadamente competem e cooperam umas com as outras, interagindo intensamente a nível local (Brusco, 1982; Pyke e Sengenberger, 1992 e Staber, 1998). Também Schmitz (1992) evidencia que no distrito industrial existe uma estreita colaboração entre as empresas e, ao mesmo tempo, competição.

Nos distritos industriais verifica-se que não há uma separação rígida entre as empresas que cooperam e que competem. Capecchi (1992: 41) refere que “a separação entre empresas que vendem os seus produtos ao mercado e as que actuam como subcontratadas das outras não é rígida. Uma empresa pode, num dado momento, ser subcontratada e, em outro momento, ser vendedora”. O mesmo autor acrescenta que “as relações das empresas que vendem no

mercado é uma combinação de competição e cooperação: isto significa que as empresas não lutam entre si, mas tratam de encontrar mercados para a nova produção sem causar efeitos destrutivos no distrito industrial” (Capecchi, 1992: 41).

H – Sistema de valores locais

Vários autores salientam o sistema de valores da comunidade local como um elemento integrador, de coesão e que cria a disposição para que todos trabalhem juntos (Becattini, 1990; Trigilia, 1992 e Pyke e Sengenberger, 1992). Estes autores referem que o carácter tácito e localizado do conhecimento, a necessidade de compartilhar a linguagem, a confiança e o sentimento de pertencer à mesma comunidade, permite a comunicação entre empresas e a cooperação.

Becattini (1990:39) afirma que o “aspecto mais importante da comunidade local é o seu sistema relativamente homogéneo de valores e ideias, que são a expressão de uma ética de trabalho e da actividade, da família, da reciprocidade e da mudança”. Acrescenta que este sistema de valores difundido por todo o distrito será transmitido a gerações posteriores, através do sistema de instituições e regras que abarcam os âmbitos social e económico.

I – Existência de serviços reais

A existência de instituições (associações ou organizações públicas) que prestam serviços reais é um dos elementos evidenciado nos distritos industriais: “a prestação de serviços reais envolve o fornecimento de bens e serviços às empresas, tendo como contrapartida um pagamento” (Brusco, 1992:187). Este autor considera que a prestação desses serviços permite às empresas adaptar-se a ambientes turbulentos e dispor de uma competência cada vez mais dinâmica, tendo como ponto de referência a inovação.

Conforme apresenta Brusco (1992), em certas regiões italianas as associações empresariais e as administrações públicas efectuam uma série de serviços reais em vez de apoio financeiro. Esses serviços relacionam-se com a prestação de informações comerciais e técnicas, fornecimento de programas informáticos para o design e fabricação de produtos, investigação e assessoria, entre outros serviços. Também Julien (1992) foca a importância das instituições territoriais na transferência de tecnologia e de informação, para a difusão e introdução de novas tecnologias.

Posteriormente, Schmitz e Musyck (1994) procuram extrair ensinamentos de quatro experiências europeias, analisando que tipo de serviços as instituições públicas e privadas prestam às empresas, em cada um dos distritos industriais estudados. Esta análise incidiu não só sobre a prestação de serviços reais, mas também sobre três outras áreas: o fornecimento de crédito, a formação, e a negociação salarial e de condições de trabalho.

Schmitz e Musyck (1994) salientam a importância destas instituições na competitividade das empresas do distrito, ao conduzir essas empresas para a banda larga (high road) da competitividade. De acordo com estes autores e também com Sengenberger e Pyke (1992), as empresas que se encaminham para a banda larga da competitividade competem através da inovação, isto é, adoptam novas tecnologias, desenvolvem novos e melhores produtos e respondem com maior rapidez às mudanças do mercado. Consequentemente, estas empresas alcançam melhores resultados do que aquelas que competem pela via estreita (low road), com base em baixos salários e no desrespeito de normas laborais.

Assim, as instituições e associações locais desempenham um papel muito importante no processo de inovação das empresas e, consequentemente, na competitividade destas últimas.

No documento UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR (páginas 56-61)