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Fonte: Milani et al. (2014).

A maior distribuição das empresas brasileiras nesse período estava na América do Sul e na África. Essas duas regiões eram prioritárias na política externa brasileira naquele período (AMORIM, 2010). A PDP dividiu suas ações por grupos, como o de destaques estratégicos, o qual incluía programas para “Regionalização”, “Integração com a África”, “Integração Produtiva da América Latina e Caribe” (ROCHA, 2015; DIEESE, 2008). Nesse sentido, observa-se a vinculação entre o projeto de desenvolvimento produtivo e o de inserção internacional. Essa meta foi renovada no “Plano Brasil Maior”, desenhado no governo Rousseff. Dentre os casos de internacionalização para América do Sul e África com apoio do BNDES no governo Lula, destacam-se os casos das empresas Camargo Corrêa, Odebrecht, Perdigão, Gerdau, JBS-Friboi, Marfrig, Vale e Votorantim (ROCHA, 2012). Além disso, empresas como Petrobras, Andrade e Gutierrez e Queiroz Galvão também tiveram destaque nesse processo de internacionalização que ocorreu nesse período.

Dentre os setores internacionalizados, o setor da construção pesada tem uma atuação crucial para esse projeto brasileiro. Afinal, a construção de infraestrutura é um dos elementos estruturantes para a consolidação de um programa de integração regional e configura-se como recurso de poder efetivo. A internacionalização dessas empresas (as principais: Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Odebrecht, Queiroz Galvão), além de acompanhar um movimento de busca por dinamização da economia brasileira, permite a materialização de um projeto de liderança brasileira na região. Cabe destacar que, no entanto, essa aliança entre essas empresas e o projeto de política externa é frágil, pois as empresas apoiam-se em interesses corporativos nesse processo, conforme evidencia sua história de aproximação com o poder político brasileiro

e com o capital monopolista transnacional (CAMPOS; BRANDÃO, 2017). Portanto, a associação é de ocasião, o que não implica em afirmar que invalida a importância da sua atuação para política externa brasileira naquele momento.

A Tabela 4 abaixo apresenta algumas das maiores obras de integração de infraestrutura regional do período que contam com participação de empreiteiras brasileiras. A participação se dá, principalmente, em obras no setor de transporte e energia e está em diversos países da região, com destaque para Argentina e Bolívia, pelo número de projetos.

Tabela 4 – Grandes obras de infraestrutura firmadas por empresas brasileiras na América do Sul

Nem todos os projetos de infraestrutura que contavam com a participação de empresas brasileiras estavam conectados à carteira de projetos da IIRSA. No entanto, faziam parte de uma estratégia confluente entre os objetivos da política externa do período Lula com a formação de consensos regionais sob orientações políticas convergentes. A partir da consolidação da América do Sul enquanto espaço prioritário da política externa brasileira, há um entendimento de que a infraestrutura seria o elemento que (i) dotaria a liderança regional brasileira de condições materiais, (ii) concretizaria o projeto de integração de forma tangível e (iii) contribuiria de forma direta para a formação do espaço sul-americano enquanto polo de poder na transição do sistema internacional para a multipolaridade.

Devido às contestações e temores dos vizinhos acerca da atuação do Brasil na América do Sul, a orientação da PEB na busca por articular consensos, solucionar controvérsias e atuar como paymaster regional eram os elementos que dariam base à construção da liderança brasileira. A infraestrutura é o elemento que amarra todos esses aspectos, conforme os casos apresentados de Bolívia e Paraguai. No entanto, esse processo não deixou de ser acompanhado de contradições, tendo em vista a aliança tática entre os interesses da PEB com grandes empresas nacionais, sob o paradigma logístico. Nesse sentido, ainda que o Estado tenha mantido, em parte, o controle sobre a orientação dos projetos, foi priorizado o frágil elo com um empresariado historicamente contraditório. Historicamente contraditório, porque não foi formado sob interesses (e responsabilidades) sobre o desenvolvimento nacional e regional.

Os investimentos em infraestrutura regional dotariam o Brasil de resultados materiais que dariam suporte à sua liderança na região e ao seu desenvolvimento. Por outro lado, as novas bases de atuação externa que estavam sendo construídas não superaram os históricos problemas estruturais que formaram o país e a América do Sul, nos quais a própria infraestrutura foi conduzida enquanto recurso de poder extrarregional. O empresariado nacional ligado à integração de infraestrutura regional, dessa forma, não conferiu estabilidade, confiança e a cooperação que eram necessárias ao fortalecimento do processo, apesar dos esforços da diplomacia brasileira do período. A IIRSA, nesse contexto, atendia a esses objetivos. Foi um período de intensos avanços, mas ainda marcado por falhas e assimetrias na condução dos projetos, conforme será analisado a seguir.

3.1.4 Dez anos de IIRSA: uma análise dos resultados do período de vigência da Iniciativa

Essa seção tem como objetivo fazer um balanço dos dez anos da IIRSA e sua relação com o regionalismo sul-americano no período. Em termos de integração física, ainda que com limitações, foi o período de maiores avanços da IIRSA. A ascensão se deu como resultado de uma intensa coordenação política regional, acelerada institucionalização da integração e favorável conjuntura econômica internacional. O relatório “IIRSA: 10 anos depois” (2011), elaborado pela própria instituição, indica que o balanço do período pode ser analisado através de ganhos tangíveis e intangíveis.

Em termos tangíveis, entre 2003 e 2010, a quantidade de projetos na Carteira da IIRSA aumentou mais de 50% e os investimentos estimados aumentaram em torno de 150% (IIRSA, 2011). Ainda em termos tangíveis, destaca-se também a evolução da Carteira de Projetos de 2010 em relação à de 2004. A última Carteira da IIRSA passou a contar com 524 projetos, com investimento estimado em torno de 96,1 bilhões de dólares distribuídos em 47 grupos pertencentes a nove EIDs. A partir de 2007, o eixo Hidrovia Paraná-Paraguai passa a integrar a planificação da Carteira, por si só adicionando 95 novos projetos à planificação. Já o eixo Andino do Sul se mantém sem planejamento.

Tabela 5 – Composição da Carteira IIRSA (2010)89

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da IIRSA (2010b).

Em 2010, prestes a culminar a primeira fase de trabalho da Iniciativa, foram novamente realizadas reuniões dos GTEs de todos os EIDs, exceto do Escudo das Guianas. O objetivo era

89 A soma aritmética das colunas “Transporte” e “Total”, tanto em “Nº de projetos” quanto em “Investimentos”,

não corresponde à soma aritmética dos totais por EID devido à existência de dois projetos conjuntos: (i) Passo de Fronteira Pircas Negras pertencente aos Eixos Capricórnio e MERCOSUL-Chile; e (ii) Construção da Estrada de Ferro Cascavel-Foz do Iguaçu pertencente aos Eixos Capricórnio e Hidrovia Paraguai-Paraná.

permitir o intercâmbio entre os países de cada EID sobre o estado da situação dos projetos de cada grupo e a eventual incorporação de novos projetos à Carteira, bem como a análise da situação da AIC (IIRSA, 2010b). A carteira resultante do trabalho de 2010 é composta por 524 projetos com um investimento estimado em torno de 96,1 bilhões de dólares, conforme a publicação “Planejamento Territorial Indicativo: Portfólio de Projetos 2010” (IIRSA, 2010b). Em comparação com os dados de 2004, depreende-se um aumento significativo no escopo da planificação da IIRSA em todos os âmbitos. O número de projetos elevou-se em mais de 56%, enquanto os investimentos estimados aumentaram cerca de 157%. Em termos setoriais, os projetos de transportes tiveram uma elevação 56% entre 2004 e 2010; de energia, 60%; e de telecomunicações, 50% (IIRSA, 2004; 2010b). Dos nove eixos planificados, o Brasil integra sete deles, com exceção do Andino e do Sul. Em relação à delimitação geográfica dos EIDs, em 2010, consolidou-se da seguinte forma: