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Foto 4 Sintese dos desafios apresentados pelos professores oficina 2

1.3 O problema e os pressupostos da pesquisa

A maioria dos estudantes que ingressam hoje no ensino superior, são naturais das denominadas geração Y ou geração Z8 – também conhecidos como ‘nativos digitais’ – e crescem sob a égide da inteligência coletiva, princípio máximo dos precursores da emergente sociedade de colaboração em massa (LEVY, 1993); (CASTELLS, 1996); (ETZKOWITZ e LEYDERSDORFF, 1996) que denominaram Sociedade da Informação ou Sociedade em Rede. Em tais contextos, os comportamentos e atitudes dos indivíduos, grupos ou comunidades são diferenciados em vários aspectos, sobretudo na predisposição às interações sociais mediadas pela Internet, no âmbito de comunidades ou “tribos”.

Neste sentido, pergunta-se: quais são as condições em que estes estudantes têm sido formados? Ou, em outras palavras, os nativos digitais ao ingressarem nas instituições de ensino superior em busca de sua formação acadêmica encontram as condições ideais em

8 Segundo conceituado pela Wikipédia, a Geração Y – também chamada geração do milênio ou geração da Internet – designa aqueles que nasceram na década de 1980, até meados da década de 1990, quando foi sucedida

pela geração Z. Essas informações encontram-se disponíveis em:

termos de práticas pedagógicas, capazes de lhes proporcionar a necessária motivação à aprendizagem? Que tipo de competências lhes serão exigidas quando de seu ingresso no mercado de trabalho, seja na condição de empregado ou de empregador?

O contexto societário ao qual se vinculam os referidos nativos digitais é constituído por padrões de comportamento que associam o poder e a liberdade de expressão individual, em rede global9, que trarão importantes impactos aos diferentes setores da sociedade, a partir dos princípios de abertura, colaboração, compartilhamento, transparência e interdependência, conforme caracterizado por Tapscott e Williams (2010, p. 7).

Tal contexto parece requerer a introdução de novas práticas pedagógicas por parte dos professores, devidamente respaldados por um arcabouço institucional, especificamente no que tange ao projeto pedagógico e à infraestrutura necessários. Neste sentido pergunta-se: como o uso de novas práticas pedagógicas contribui, favorece ou apoia o desenvolvimento das competências empreendedoras nos estudantes? Quais são os principais desafios para a implantação de um ambiente de sala de aula presencial ou à distância mediado pelas NTICE? Quais são os principais impactos observados no comportamento dos estudantes quando submetidos aos novos desafios, se ancorados por um novo processo de ensino mediado pelas NTICE?

Em que pesem as constatações acerca das diferentes possibilidades de que as NTICE permitem a agregação de valor à educação superior, no entanto elas ainda têm sido usadas em alguns casos, como meras ferramentas de transmissão de informação ou de instrução. Ou ainda, como simples repositórios virtuais de conteúdos instrucionais na linha tradicional de ensino.

Por outro lado, quando as NTICE são usadas a título de plataforma qualificada para que nela os estudantes representem seus próprios significados, estes passam a ser detentores ou proprietários de suas produções e de suas ideias, o que remete às teorias do construtivismo. E é este uso da tecnologia, como um meio e não um fim em si mesmo, que aqui interessa investigar, considerando revelações de pesquisas acadêmicas que estabelecem a relação entre o uso de NTICE para ensino a distancia (EAD) e a melhoria do processo de aprendizagem do estudante (PRETTO, 2011; HAREL E PAPERT, 1990; WILEY, 2000; GREENFILED, 1998; MOTA 2012).

9 As redes sociais têm sido usadas no mundo inteiro como veículo de comunicação e tem se mostrado ferramenta importante de mobilização. No Brasil, citam-se os chamados “caras pintadas” que ajudaram a desenhar o maior movimento da juventude brasileira dos últimos 20 anos.

Assim sendo, nesta pesquisa parte-se de dois pressupostos principais. O primeiro é o de que um novo tipo de educação empreendedora precisa ser amplamente discutido e implantado no país, cujos pilares básicos são dois:

1) Uma pedagogia empreendedora que permita ao estudante fazer suas próprias interpretações da realidade e dos fenômenos ao seu entorno e fortemente baseada em aprendizagens vivenciais, artísticas, contemplativas e criativas. Tal pedagogia deve ser baseada no uso intenso das NTICE como uma das principais estratégias de ensino e aprendizagem focada na autonomia e na liberdade de busca e de apropriação de conhecimentos e habilidades e na interdisciplinaridade;

2) O Professor – aqui denominado ‘Empreendedor da Educação’ – deve ter domínio no uso de determinadas tecnologias educacionais para vencer os desafios impostos pela sociedade de colaboração em massa, assumindo, em especial o seu papel de facilitador no processo de aprendizagem do estudante, cujo ensino deve ser mediado pelas NTICE.

O segundo pressuposto é o de que as NTICE agregam valor à educação superior

facilitando a implantação de estratégias de aprendizagem focadas na autonomia e na coautoria de conteúdos e conhecimentos por parte do estudante. Entretanto, estas ainda têm sido em muitos casos, projetadas para a instrução dos estudantes e não para o aprendizado e desenvolvimento das competências cognitivas e sociais requeridas no contexto atual.

O campo de domínio desta pesquisa está circunscrito à Ciência da Educação, ancorado nas teorias do construtivismo e do sociointeracionismo, as quais incitam um novo papel e uma ação pedagógica diferenciada do professor em sua práxis educacional.

Em tais teorias tem sido dada ênfase na colaboração de estudantes entre si e entre eles e os professores, usando a mediação das NTICE (sociointeracionismo e interações educativas horizontalizadas), em detrimento das relações tradicionais de ensino marcadas pelo recebimento de instruções do professor numa relação de um para um ou de um para muitos. O que se espera da mediação qualificada das NTICE, é que haja, também, maior possibilidade de surgimento de um processo de colaboração de muitos para muitos, atemporal, assimétrica e aberta, que resulte na construção de conhecimentos coletivos, complexos e múltiplos, processo este aqui caracterizado como educação empreendedora.

Neste tipo de educação empreendedora o conhecimento como objetivo enfoca o processo educacional diferentemente do conhecimento informação, assim como o professor transmissor de conhecimento (PERKINS, 1986, p.25). Passa a predominar uma relação de

colaboração entre o professor e os estudantes no processo de construção do conhecimento coletivo. E nesse contexto o uso adequado das NTICE integradas ao projeto pedagógico pode contribuir para a superação do gap de formação no ensino superior.

Inicialmente a proposta de pesquisa desta tese previa identificar em que medida a prática pedagógica utilizada em sala de aula estaria desenvolvendo no estudante as competências empreendedoras também conhecidas como conhecimento, habilidades e atitudes empreendedoras (CHA). Isto seria averiguado por intermédio da perspectiva dos chefes dos egressos, pressupondo-se seu ingresso no mercado de trabalho. Em outras palavras, a avaliação das CHA nos egressos seria feita a partir do ponto de vista dos seus eventuais empregadores. Contudo, naquela ocasião, devido às dificuldades encontradas – sobretudo para a identificação e a localização dos indivíduos10 que delimitariam e constituiriam a amostra – optou-se por centrar a análise nos professores, investigando o tema descrito a partir da perspectiva do empreendedor da educação. Esta proposta foi a que prevaleceu e que se constitui no atual objeto de análise desta tese.

Porém, antes disso, já havia sido realizada a pesquisa exploratória nas bases anteriormente previstas, com vistas à confirmação da existência de um problema de pesquisa. Para tanto, foram construídos os pilares de uma avaliação exploratória preliminar cujas informações foram coletadas por intermédio de entrevistas parcialmente estruturadas, realizadas entre dezembro de 2009 e maio do ano de 2010, junto aos gestores de duas empresas de base tecnológica; dois de universidades corporativas; dois selecionadores de talentos para o governo e para empresas e um professor universitário, todos localizados em Brasília. O ponto comum entre eles é o fato de que todos – exceto o professor universitário – recebiam egressos oriundos da educação superior em suas organizações, razão pela qual estariam em condições para avaliar se eles detinham ou não as competências, habilidades e atitudes necessárias ao atual ‘mundo do trabalho’.

A principal constatação averiguada na fala dos entrevistados durante a pesquisa exploratória preliminar foi a de que quando os egressos da educação superior ingressaram no mercado de trabalho ainda não eram detentores das desejáveis competências atitudinais, razão pela qual eram necessários investimentos com vistas à formação complementar para os egressos, com duração média entre seis meses a um ano.

10 A maior dificuldade encontrada à época dizia respeito à localização dos egressos após o encerramento do curso de graduação. Como empecilho secundário, mas não menos importante, relata-se a dificuldade em se obter entrevistas a respeito desse egresso em seus respectivos locais de trabalho.

Além disso, foi identificada a existência de relativo descompasso entre as inovações tecnológicas introduzidas pelas empresas e/ou organizações no cotidiano do egresso, comparativamente à infraestrutura disponível nas salas de aula das universidades, como também na prática pedagógica e nas habilidades dos professores com as NTICE. Excluindo as limitações decorrentes de infraestrutura, uma das possíveis razões que teoricamente vem sendo discutidas por diferentes pesquisadores desta temática, diz respeito ao fato de que os jovens – ou nativos digitais, segundo Prenski (2001a) – detêm maior destreza ou habilidades com as NTICE em relação a alguns professores.

A confirmação da existência desta lacuna de formação dos estudantes, bem como dos demais problemas sucintamente relatados acima, podem ser constatados nos gráficos e análises que se seguem. Os dados retratam a autoavaliação11

de uma aluna do 4º semestre do curso de Administração da Universidade de Brasília. Eles retratam, ainda, a sua percepção sobre os impactos do uso de NTICE no ensino superior, bem como os desafios para se promover a inovação nas práticas pedagógicas das universidades.

O primeiro gráfico refere-se à autoavaliação sobre seu perfil de competências, habilidades e atitudes empreendedoras, segundo definições estabelecidas nesta tese.

Gráfico 1 – Perfil de competências empreendedoras da estudante EPA1

Fonte: primária. A escala utilizada foi: zero (para nenhum conhecimento e habilidade), 1 (pouco), 2 (razoável), 3 ( médio), 4 (bom) e 5(excelente).

11Realizou-se esta entrevista em meados de 2012, na UnB, com o objetivo de teste do instrumento de pesquisa que seria aplicado aos estudantes para avaliar se o perfil deles seria compatível às características de comportamento empreendedor. A inserção dos resultados nesta seção da tese apresenta caráter puramente ilustrativo e visa demonstrar tão somente o perfil de um nativo digital. Assim, está aqui apresentada sem nenhuma pretensão de generalização, considerando ter sido esta a única coleta de dados para o perfil ‘estudante’. Foi utilizada a escala Likert com pontuação de zero a cinco para cada variável que compõe a competência, habilidade e atitude. A partir do valor atribuído por ela para cada variável foi calculada a média aritmética para cada uma das CHA. Nesta pesquisa ela será referenciada como EPA1.

Os conhecimentos e as habilidades apresentados guardam maior relação com os atributos de personalidade, que desencadeiam o desenvolvimento das demais competências, o que é positivo. Contudo, ressalta-se que o impacto das práticas e estratégias pedagógicas foi menor para: habilidades na tomada de decisões, capacidade para aprender a aprender e fazer associação de ideias, cujo rendimento foi (3,0). O gráfico que se segue demonstra as NTICE conhecidas pela estudante e seu grau de habilidade.

Gráfico 2 – NTICE conhecidas pela estudante EPA1 e o grau de habilidade

Fonte: primária. A escala utilizada foi: zero (nenhum conhecimento e habilidade), 1(pouco), 2 (razoável), 3 (médio), 4 (bom) e 5 (excelente).

Assim, por intermédio das informações contidas no gráfico acima, pode-se concluir que a referida estudante possui habilidade entre boa e excelente para as NTICE que normalmente são mais utilizadas e dominadas pelos nativos digitais, como correio eletrônico, Google, Facebook. Mas também adquiriu, por iniciativa própria, bom nível de conhecimento para outras NTICE cujo uso mais comum se dá em situações de trabalho, como editor de texto e planilha e o Dropbox.

A mencionada estudante afirmou que a fonte de incentivo para o aprendizado das NTICE provém dela própria, com objetivos de entretenimento e lazer. Aquelas aprendidas em atividades de estudos e pesquisas acadêmicas provêm de estímulos de professores, para o envio de trabalhos e para a comunicação com os alunos, tais como o Google, o Dropbox e o

Moodle. Em atividades no trabalho ela aprendeu o Dotproject e o Conect12, e por fim, em atividades comunitárias aprendeu o Google Docs.

Em relação à infraestrutura da universidade, as práticas e estratégias pedagógicas utilizadas pelos professores parecem ter contribuído pouco para o desenvolvimento das competências, habilidades, e atitudes para o uso das NTICE, conforme avaliado e mencionado por ela:

Pouco. A infraestrutura é escassa. O ADM é um dos maiores departamentos da UnB e possui apenas um laboratório de informática. Nem todos os professores conhecem o Moodle, Power Point e outros aplicativos. Os aplicativos que aprendi foram com um professor que não é muito acadêmico. Ele é funcionário de uma multinacional. A maioria não sabe usar o computador. (Informação Verbal – entrevista EPA1)

Buscou-se averiguar, ainda, se ela teria vivenciado situações e atividades durante a graduação que favoreceram ao desenvolvimento de competências, habilidades e atitudes empreendedoras em relação ao seu perfil anterior ao ingresso na universidade. Em sua opinião,

Algumas matérias específicas favorecem mais, exemplo de metodologia científica aplicada. O professor observava todos os comportamentos e atividades dos alunos. Mas a realidade dos professores está muito distante da realidade das organizações (visão mais teórica). Os professores que fazem projetos de consultoria e têm relação direta com o mercado formam melhor os alunos e usam mais NTICE no processo de ensino-aprendizagem. (informação verbal – entrevista EPA1)

Em síntese estas são algumas das reflexões sobre a problemática envolvida nesta pesquisa e que induz a busca pela compreensão desse fenômeno social de inserção das NTICE na educação superior que se depara com a incontornável situação paradoxal entre as aulas tradicionais na sala de aula e o mundo externo dos jovens mediado pelas novas tecnologias. O que é preciso mudar?

A resposta a esta pergunta e às questões discutidas e analisadas nesta tese que se encontra estruturada em sete capítulos. No primeiro capítulo foram apresentados o tema da pesquisa, os objetivos, a delimitação do problema e os pressupostos da pesquisa.

O segundo capítulo foi dedicado à apresentação do conceito e da contextualização da sociedade de colaboração em massa, em que as NTICE fazem parte de um conjunto de fatores essenciais para a inovação das práticas pedagógicas utilizadas pelos professores e para o desenvolvimento das competências empreendedoras requeridas aos estudantes e ao trabalhador, enquanto ser social, organizacional e individual. Neste capítulo são descritos e conceituados os cinco princípios que caracterizam um emergente contexto rico em

12

A estudante relatou que aprendeu a trabalhar com os dois softwares mencionados durante a realização de estágio na UnB.

colaborações múltiplas, mediadas pelas novas tecnologias, que reposicionam e reconfiguram o papel da educação superior e do professor.

Na sequência, o capitulo três foi dedicado à discussão sobre os conceitos de empreendedorismo, intraempreendedorismo, educação empreendedora a qual se caracterizou pelo uso intenso e colaborativo das NTICE integradas ao projeto pedagógico, o professor como um empreendedor da educação e sua prática de pedagogia do empreendedorismo. Nesse capitulo foi discutido também o modelo de competência na perspectiva dos autores das correntes francesa e inglesa, a partir das quais se definiu as competências sociais necessárias aos professores em sala de aula, bem como as teorias e respectivas estratégias de ensino e aprendizagem possíveis e aplicáveis considerando os pressupostos do construtivismo e do sociointeracionismo.

No quarto capítulo se contextualizou as principais perspectivas metodológicas de pesquisas inerentes ao Campo da Educação. Foram também apresentados os princípios e as características do World Café e do Pitch Elevator, técnicas estas utilizadas para a coleta de dados desta pesquisa, de caráter qualitativa, concluindo-se por sua viabilidade. Estão descritos, assim, todos os procedimentos metodológicos adotados, as etapas, as atividades, e por fim, a tabulação e a análise prevista dos dados coletados.

O capítulo cinco é constituído pela apresentação e pela análise do discurso e do conhecimento gerado sobre o contexto atual da educação superior no Brasil, isto é, seus desafios, dilemas e possibilidades, a partir da pesquisa empírica e teórica realizada. Neste capítulo se fez uma discussão histórico-cultural sobre o papel da educação no processo de criação da identidade do sujeito, das organizações e do país. O intuito foi o de se buscar a compreensão dos atuais dilemas e desafios que são perceptíveis, e têm despertado o interesse de pesquisadores no mundo todo, como também se encontram expressos no cotidiano dos professores, estudantes e gestores acadêmicos na educação superior. E, como esperado, são apresentadas possíveis soluções para os conflitos identificados, decorrentes da necessidade de inovação das práticas pedagógicas permeadas pelo uso das NTICE na educação superior, visando ao desenvolvimento das competências empreendedoras aqui discutidas.

No sexto e último capítulo são apresentadas as conclusões finais e se evidencia pela validação da metodologia e dos procedimentos metodológicos, pelo cumprimento dos objetivos, da demonstração dos principais achados. E, finalmente são apresentadas as contribuições e as limitações da pesquisa.

2 REALIDADES E TENDÊNCIAS DO ATUAL CONTEXTO SOCIETÁRIO