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Problematizando a execução das políticas públicas sobre o crack e

2.4. AS POLÍTICAS DE ENFRENTAMENTO AO CRACK E OUTRAS

2.4.2. Problematizando a execução das políticas públicas sobre o crack e

Em se tratando de políticas públicas a atenção a mulheres usuárias de crack e outras drogas, era realizada unicamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), instituído pela Constituição de 1988 e regulamentado pela Lei 8080/90 (BRASIL, 2004).

A política de saúde mental no Brasil, antes mesmo da mudança na mentalidade na política de atenção saúde, buscou estratégias para atender as demandas da população com transtorno mental e/ou usuária de álcool e outras drogas. Inicialmente esse atendimento era realizado exclusivamente em hospitais regulares ou psiquiátricos. (AMARANTE, 1998) Entretanto, com a Portaria MS/GM nº 336, de 19 de fevereiro de 2002, definiu-se parâmetros populacionais e as modalidades de instalação das unidades de CAPS, apoiada sob as fundamentações da Lei 10.216/2001 e da Norma Operacional de Assistência à Saúde – NOAS-SUS 01/2001. Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) de atenção a saúde mental e usuários de álcool e outras drogas, constituem uma rede extra-hospitalar nas seguintes modalidades de serviços: CAPS I; CAPS II; CAPS III; CAPSad II e CAPSi II (BRASIL, 2002).

É função dos CAPS prestar atendimento clínico em regime de atenção diária em saúde mental ou uso de álcool e outras drogas, evitando assim as internações em hospitais psiquiátricos visando principalmente promover a inserção social de pessoas com tais problemáticas através de ações intersetoriais. Além disso, é a porta de entrada na rede de assistência em saúde mental na sua área de atuação e dá suporte à atenção à saúde mental na rede básica de saúde. É função, portanto, e por excelência dos CAPS, organizar a rede de atenção às pessoas com transtornos mentais e usuários de álcool e outras drogas. Os CAPS por lei devem ser os articuladores estratégicos da rede e da política de saúde mental de seu território. Esses serviços devem ser substitutivos e não complementares ao hospital psiquiátrico (BRASIL, 2002).

A Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011, instituiu a rede de atenção psicossocial e com a Portaria MS nº 130, de 26 de janeiro de 2012 redefiniu-se o Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e outras Drogas 24 h (CAPS AD III), cujo objetivo foi proporcionar atenção integral e contínua a pessoas com transtornos decorrentes do uso

abusivo e da dependência de álcool e outras drogas, com funcionamento durante as 24 horas do dia, inclusive aos finais de semana e feriados (BRASIL, 2012).

Porém, com a implementação do Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas a entrada na rede de atendimento pelos usuários de crack passa a ser realizada também pelo Sistema Único da Assistência Social (SUAS), tendo seus principais serviços disponibilizados nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS) e nos Centros de Referências Especializados para Atendimento da População em Situação de Rua (Centro POP). A partir de atendimentos nestes serviços o usuário pode ser encaminhado, caso necessário, para a rede especializada, descentralizando assim o serviço e ampliando a rede de atendimento. No Distrito Federal, existem apenas duas unidades do CAPS ad III uma em Brasília e outra em Taguatinga. Entretanto, apesar de especializado, este serviço não proporciona um atendimento diferenciado para população feminina o que faz com que muitas mulheres não adiram ao tratamento.

Em tese, a assistência à mulher gestante usuária de crack deve ser feita pelo sistema de saúde, articulado com o Sistema único de Assistência Social. Porém, apesar do SUS em sua essência buscar garantir acesso à assistência integral à saúde de forma igualitária, esta não é a realidade vigente. Em levantamento de Morbidade (CID 10) Hospitalar do SUS por local de residência no Brasil em 2001, dividido por faixas etárias e sexo, temos no topo da lista do sexo feminino, internações por gravidez, parto e puerpério que totalizam 1.658.203 (77%) da população de 10 a 25 anos (BRASIL, 2004). Infelizmente não se tem ao certo a estimativa de quantas dessas mulheres usuárias do SUS estavam envolvidas com o crack e/ou outras drogas. No Distrito Federal, é somente em abril de 2012 que a secretaria de estado do Distrito Federal publica no Diário Oficial do Distrito Federal a portaria nº 62, onde prevê a “Criação de 10 leitos de Atenção Integral em Saúde Mental no Hospital Materno-Infantil (HMIB), sendo 05 à gestantes/puérperas e 05 destinadas a crianças” esse cinco leitos são voltados ao atendimento da gestante usuária de droga (DISTRITO FEDERAL, 2012, Seção 02. P. 10). Isto demonstra de forma objetiva o quanto ainda é necessário avançar dentro da política para de fato atender às reais demandas desta parcela da população.

Em resumo, apesar da política sobre álcool e outras drogas ter avançado muito nos últimos anos ainda há uma lacuna na preconização da atenção voltada à mulher dependente

química e gestante, de maneira que seja capaz de considerar todas as particularidades que envolvem esse cenário de exclusão social e de gênero, esteja essa mulher em situação de rua ou consumindo a droga no seio do seu lar.

Para Hochgraf, Zilberman e Brasiliano (1999) as mulheres usuárias de drogas só foram receber atenção das pesquisas na segunda metade do século XIX. Segundo as autoras, esse fato se deve muito pelo estigma social vivenciado pelas mulheres, principalmente no campo da medicina, que faz com que muitas mulheres busquem por serviços de saúde verbalizando outros problemas. As mulheres são mais criticadas pelo uso de drogas e acusadas de serem promíscuas e apresentarem comportamentos desviantes e agressivos, o que faz com que a mulher dependente química seja subdiagnosticada e não tratada.

Entretanto é popularmente conhecido que essas mulheres existem! E encontram várias barreiras no diversos sistemas de atendimento tanto na saúde como na assistência social. Barreiras essas transcritas muitas vezes no olhar preconceituoso, barreiras de acesso pela dificuldade de locomoção, muitas vezes pelo medo do que pode ter causado a seu feto. Esses como muitos outros problemas são colocados como pedras no caminho destas mulheres que mais do que nunca precisam ter seus direitos garantidos assim como seus futuros filhos.

A discussão em torno da construção do papel materno e o uso de crack e outras drogas pelo público feminino constitui-se como um fenômeno psicossocial complexo, onde suas especificidades relacionadas ao debate sobre identidade, família, gênero e constituição dos papéis sociais, são permeadas por questões relacionadas a vulnerabilidade social assim como a invisibilidade social sofrida por essa mulher triplamente excluída, sendo, portanto, importante objeto de estudo, o qual será contemplado à luz da teoria Sistêmica e da Psicossociologia.