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CAPÍTULO IV – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3. Procedimentos adotados para a análise dos dados

Depois que os alunos leram e analisaram os textos “A fugitiva” e “Capa de Junco” (alunos do sexto ano) e “A história de Luciana Scotti” e “O caso do espelho”

(alunos do nono ano), solicitei a eles que escrevessem um texto do gênero narrativa de experiência pessoal, relatando um ou mais fatos que se passaram em certo tempo e lugar, envolvendo a si mesmo e a outros indivíduos. Na aula seguinte, os mesmos alunos escreveram um texto do gênero conto, isto é, uma narrativa ficcional pouco extensa, com personagens criados pelos próprios alunos, bem como um ou mais fatos que envolveram esses personagens.

Alguns alunos tiveram grande dificuldade em produzir um texto do gênero conto de autoria própria, e, por essa razão, pedi a eles que fizessem um texto recontando um conto que haviam lido no passado. Na elaboração de narrativas de experiência pessoal, os alunos tiveram maior facilidade, e todos conseguiram fazer seu texto.

Após o recolhimento dos textos, procedi à leitura de todos eles e selecionei 64 narrativas de experiência pessoal e 64 contos escritos pelos mesmos indivíduos, conforme distribuição já apresentada nos quadros 1 e 2, constituindo, assim, um corpus de 128 textos. Todos os textos selecionados possuíam conectores sequenciadores e eram relativamente legíveis, de modo que a análise dos conectores fosse possível.

Nesses textos, coletei todos os dados dos conectores E e AÍ na indicação de sequenciação retroativo-propulsora de informações. A seguir, codifiquei esses dados de acordo com três grupos de fatores sociais, dois grupos de fatores linguísticos e um grupo de fatores textual-estilístico, que estão abaixo listados:

GRUPO DE FATORES

SOCIAIS:

 Gênero – feminino, masculino;  Escolaridade – 6º ano do EF,

20

9º ano do EF;

Idade – de 10 a 13 anos, de 14 a 17 anos.

LINGUÍSTICOS:21

 Relação semântico-pragmática – sequenciação textual, sequenciação temporal,

consequência;

 Nível de articulação – entre orações, entre partes mais amplas do parágrafo, entre

parágrafos.

TEXTUAL-ESTILÍSTICO:

 Gênero textual – narrativa de experiência pessoal (narrativa não ficcional), conto

(narrativa ficcional).

Os dados assim codificados sofreram análise estatística, sendo utilizado, para tanto, o Pacote Estatístico GOLDVARB 2001 (ROBINSON; LAWRENCE; TAGLIAMONTE, 2001). Esse programa estatístico fornece frequências e pesos relativos indicadores da influência exercida sobre o uso de cada uma das variantes pelos grupos de fatores linguísticos e sociais controlados. Além disso, o programa identifica a ordem de significância, para o fenômeno variável estudado, de cada um dos grupos de fatores testados. Foram realizadas rodadas binárias do programa, considerando uma forma variante versus a outra.

Os resultados quantitativos foram analisados à luz do referencial teórico sociofuncionalista, considerando-se, para a explicação das tendências de distribuição social e linguística dos conectores sequenciadores E e AÍ, motivações de ordem funcionalista, como o princípio da persistência; e motivações de ordem sociolinguística, como o princípio da marcação estilística.

Depois da coleta dos textos, realizei, com os alunos participantes desta pesquisa, bem como com dois professores de língua portuguesa, um de cada escola colaboradora, um teste de atitude linguística envolvendo o uso dos conectores sequenciadores E e AÍ. Organizei e apliquei esse teste com o intuito de verificar a opinião dos alunos e seus

21 Foi controlado também um grupo de fatores relativo às sequências textuais, que não se mostrou

significativo para o estudo. Nas sequências descritivas, houve uso categórico do conector E e, em razão disso, os dados referentes a esse tipo de sequência foram excluídos. Os dados que integram a análise apareceram todos em sequências narrativas.

professores a respeito da adequação ou não do emprego dos conectores em questão em contextos de fala e de escrita de diferentes graus de formalidade.

O teste de atitude, composto por duas questões envolvendo os conectores E, AÍ e ENTÃO, pode ser conferido a seguir:

QUESTIONÁRIO

1. Escola: 2. Série:

3. Idade: 4. Sexo:

5. Cidade natal:

6. Quanto tempo mora em Natal:

* Observe as duas frases a seguir, ambas em três versões diferentes. Elas exemplificam possibilidades de uso dos conectores22 E, AÍ e ENTÃO na língua

portuguesa:

(I)

A. Os clientes pagaram muito caro por nossos serviços, E eles têm direito a um bom atendimento.

B. Os clientes pagaram muito caro por nossos serviços, AÍ eles têm direito a um bom atendimento.

C. Os clientes pagaram muito caro por nossos serviços, ENTÃO eles têm direito a um bom atendimento.

(II)

A. Nós saímos do apartamento na Cidade Verde, E fomos morar em uma casa em Parnamirim.

B. Nós saímos do apartamento na Cidade Verde, AÍ fomos morar em uma casa em Parnamirim.

C. Nós saímos do apartamento na Cidade Verde, ENTÃO fomos morar em uma casa em Parnamirim.

22Utilizamos o termo “conectores” em referência a palavras que interligam orações ou partes maiores do

1ª QUESTÃO: Em sua opinião, um ou mais dentre os conectores E, AÍ e ENTÃO não pertence(m) à língua portuguesa culta? Em caso afirmativo, qual ou quais?

2ª QUESTÃO: Em que tipo de situações de fala ou escrita conectores não pertencentes à língua culta deveriam ser evitados? Por quê?

Além dos conectores alvo deste estudo, E e AÍ, foi incluído no teste de atitude linguística o conector ENTÃO porque, caso houvesse dados suficientes desse conector nos textos escritos pelos alunos, ele também seria incluído na análise. Todavia, devido à baixa frequência, o conector sob enfoque teve de ser excluído (cf. capítulo V).

Optei por analisar apenas as respostas dadas ao teste de atitude pelos 64 alunos cujos textos integram o corpus utilizado neste estudo, desconsiderando as respostas dadas pelos demais alunos contatados inicialmente. Examinei também os testes respondidos pelos dois professores das turmas que produziram os textos.

O teste de atitude a respeito do emprego dos conectores E e AÍ feito pelos alunos e pelos professores forneceu subsídios para a proposição de explicações melhor fundamentadas para os resultados quantitativos obtidos para vários dos grupos de fatores controlados. Esse teste permitiu traçar um diagnóstico sobre como membros da comunidade natalense avaliam a utilização dos conectores E e AÍ na fala e na escrita, em gêneros textuais mais e menos formais, o que foi de grande importância para a

análise dos dados no que diz respeito ao princípio da marcação estilística. Os resultados referentes ao teste de atitude linguística podem ser conferidos no capítulo V.

Tendo visto, neste capítulo, o detalhamento dos procedimentos metodológicos adotados na pesquisa, passaremos, no próximo capítulo, à análise das respostas dadas por alunos e professores ao teste de atitude linguística, assim como à análise dos resultados obtidos para os diferentes grupos de fatores linguísticos, estilísticos e sociais controlados.

CAPÍTULO V - ANÁLISE DOS DADOS EM UMA PERSPECTIVA SOCIOFUNCIONALISTA

Neste capítulo, avalio, inicialmente, as respostas fornecidas pelos alunos participantes da pesquisa e por seus professores de língua portuguesa ao teste de atitude linguística descrito no capítulo IV.

Na sequência, analiso, a partir de tratamento estatístico, o fenômeno de variação linguística entre os conectores sequenciadores E e AÍ, que são as formas codificadoras da função de sequenciação retroativo-propulsora de informações mais frequentes no

corpus organizado para esta pesquisa. Caracterizo e discuto os contextos de emprego

preferenciais dos conectores E e AÍ no corpus, procurando explicar os resultados quantitativos obtidos para os grupos de fatores condicionadores de natureza linguística, estilística e social que foram identificados pelo pacote estatístico GOLDVARB 2001 como exercendo influência sobre o emprego variável desses conectores.