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De acordo com Lüdke e André (1986), a análise de dados pode começar assim que o material informativo já foi acumulado, pois será sobre ele que as categorias descritivas poderão ser construídas. A seleção de registros mais relevantes já é parte do processo analítico, uma vez que não há revelações sobre a realidade aos olhos do pesquisador (DUARTE, 1998; LÜDKE; ANDRÉ, 1986), mas a construção de uma operação lógica em torno de registros que se tornam dados de pesquisa. Esta etapa sobre a qual se edificará o estudo envolve atos de leitura repetitiva, interpretação e seleção de informações que sejam mais significativas para a elaboração de explicações (mesmo que provisórias) às questões propostas no início de cada investigação.

O modelo de análise de dados proposto neste estudo pauta-se no paradigma indiciário de Carlo Ginzburg (1989), o qual critica que, na escritura da história tradicional, muitos fatos e eventos foram ocultados ou ignorados por serem considerados de menor valor. O autor sugere que detalhes negligenciados podem ser novas e importantes fontes para a reconstrução de fatos históricos.

O paradigma indiciário se funda na noção de que a realidade é opaca, não transparente, mas que é preciso interpretá-la utilizando também indícios residuais ou singulares. Nesse sentido, Ginzburg (1989) exemplifica como, por meio de relatos de “sintomas”, a medicina hipocrática foi capaz de estabelecer uma relação entre doenças possivelmente referidas com o quadro descritivo dos pacientes. Assim, são narradas histórias sobre as doenças, aproximações que se materializam em diagnósticos e prognósticos, mas sem de fato atingir ou tocar as enfermidades. Com essa metáfora, sugere-se que outros contadores de histórias científicas (humanas e sociais) realizam procedimento semelhante ao do médico, que utiliza quadros nosográficos, que classificam e descrevem doenças, para analisar cada paciente (GINZBURG, 1989) numa tentativa de se acercar ao objeto investigado.

O paradigma indiciário remonta a práticas cotidianas bastante antigas. Como exemplo,

Avaliação Data da aplicação

1ª avaliação 02/04/2012 2ª avaliação 20/04/2012

pode-se citar a conduta e os procedimentos praticados por caçadores que, por meio de pistas e rastros, buscavam construir uma série coerente de eventos.

“Por milênios o homem foi caçador. Durante inúmeras perseguições, ele aprendeu a reconstruir as formas e movimentos das presas invisíveis pelas pegadas na lama, ramos quebrados, bolotas de esterco, tufos de pelos, plumas emaranhadas, odores estagnados. Aprendeu a farejar, registrar, interpretar e classificar pistas infinitesimais como fios de barba. Aprendeu a fazer operações mentais complexas com rapidez fulminante, no interior de um denso bosque ou numa clareira cheia de ciladas” (GINZBURG, 1989, p. 151).

Segundo Yin (2005), o estudo de caso se encaixa bem nas modalidades de estudos sobre a complexidade da vida real, nas quais fenômeno e contexto não estão claramente definidos. Essa característica exige atenção para o maior número de acontecimentos e elementos significativos presentes no caso estudado (LÜDKE; ANDRÉ,1986). De modo semelhante, para Ginzburg (1989), é necessário buscar diferenças nas semelhanças assim como um papiloscopista busca diferenças nas marcas provocadas pelos desenhos papilares presentes nos dedos. A princípio, todas as digitais parecem iguais, mas, com olhar atento para o seu interior, podem-se encontrar grandes e importantes traços distintivos entre os sujeitos e suas histórias. É nesse sentido que os traços marginais, as singularidades, as dissonâncias se tornam fontes ricas tanto quanto os padrões, as regularidades e as consonâncias.

É importante ressaltar que “a tendência a apagar os traços individuais de um objeto é diretamente proporcional à distância emocional do observador” (GINZBURG, 1989, p. 163). Para explicar essa relação, retomo a analogia feita entre o trabalho científico e o de um detetive, como Sherlock Holmes.

Capretini (1991), que também destaca a importância de pistas expressivas e do contexto para a solução de problemas, analisa a construção da literatura e da lógica operatória de Conan Doyle quando este tece as histórias de Sherlock Holmes. Como uma câmera de cinema, em seu texto, Doyle apresenta primeiro uma visão “panorâmica” e, depois, passa ao

“close”, trazendo, ao centro da narrativa, elementos que antes tinham pouca visibilidade. Essa

operação é parte dos procedimentos adotados pelo detetive ou pesquisador. Como se sugere nas falas de Sherlock Holmes a Watson, é necessário estar atento e consciente nas investigações, caso contrário, veremos sem de fato observar: “Você não observou. E, no entanto, você viu” e “Você não sabia para onde olhar e, assim, você perdeu o que havia de mais importante” (CAPRETINI, 1991, p. 151).

quais sejam: 1) conhecimento prévio, 2) observação e 3) capacidade de pensar retrospectivamente. A primeira característica diz respeito ao preparo do pesquisador na área estudada, que lhe garante movimentar-se com fluidez além de dar respaldo na formulação de hipóteses. A outra característica está relacionada com a própria capacidade de observação, que é o olhar atento, consciente e dirigido para os elementos considerados como relevantes em um caso. Por último, o investigador social deve ser capaz de “refletir retrospectivamente”50

, formulando hipóteses a partir dos fatos e buscando validá-los externamente (TRUZZI, 1991, p. 73).

Escolhido como método de análise de dados mais apropriado para o estudo, o paradigma indiciário possibilita o tratamento de informações relativas às relações entre os estudantes e o PL2 com a mesma presunção de cientificidade de outros métodos.

Neste capítulo, foram apresentados argumentos que levaram à escolha da abordagem qualitativa e do estudo de caso para a execução da pesquisa. Foram descritos também o contexto bem como os colaboradores da pesquisa. Em seguida, foram apresentados os instrumentos, os procedimentos da coleta de registros bem como o procedimento de análise de dados.

Feita a apresentação metodológica deste trabalho, no próximo capítulo, passarei à análise de dados.

50

C

APÍTULO

IV–A

NÁLISE DE DADOS

“Caminhante, não há caminho, somente sulcos no mar”. (MACHADO, 1973, p. 158)

Este capítulo representa a síntese dos elementos teóricos e metodológicos utilizados e desenvolvidos durante a investigação. Por isso, ele se dedica à apresentação, discussão e análise de dados gerados por meio dos instrumentos relatados no Capítulo III, quais sejam: as provas, a redação bem como o questionário e as entrevistas realizadas com os estudantes e as professoras.

No início da pesquisa, eu acreditava que o mais importante, em uma investigação, seria construir e organizar “o palco” para que os “protagonistas” ganhassem vida dentro da história de aprender PL2. Nessa primeira perspectiva, tinha a pretensão de me colocar como narradora onisciente e neutra. Com o passar do tempo e amadurecimento sobre o fazer científico, percebi que, no caminho percorrido ao longo da investigação, não só se lançava luz sobre os processos de EALin como também sobre as minhas concepções enquanto investigadora.

Com o desenvolvimento do estudo, percebi que as vozes dos estudantes eram muito importantes. Entretanto, outras vozes deveriam ser igualmente consideradas. Assim, este capítulo não está dedicado apenas ao entrecruzamento das percepções de Dora e Marc. Ele se ocupa também das vozes das professoras, das/os pesquisadoras/es que fundamentaram teoricamente a investigação e da minha própria voz. Todas essas vozes se atravessaram para tecer histórias sobre os caminhos percorridos na aprendizagem PL2 em busca do PEC-G.

Ao longo da análise de dados, dividirei o capítulo em quatro seções principais para a melhor organização do texto. Primeiramente, abordarei as experiências em PL2 dos estudantes. Em seguida, passarei às crenças sobre ensino e aprendizagem da L-A. Logo, apresentarei seção sobre as questões relativas às identidades. Por fim, buscarei explorar as possibilidades interpretativas existentes na relação entre experiências, crenças e identidades.