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35 In Lopes F & Correia, B 2004, p 292.

O PROCESSO DE REGENERAÇÃO URBANA

Como a gestão e o planeamento tradicionais fossem insuficientes para responder à crescente complexidade dos problemas urbanos em áreas degradadas, houve que procurar estratégias de conjunto apoiadas na concertação e na abordagem integrada dos problemas, remetendo para os métodos do planeamento estratégico, e levando a importar soluções relacionadas com o planeamento urbano e regional experimentado na Europa a partir de 198639. O estudo do decaimento de zonas antigas ligado a fenómenos de exclusão social remeteu para situações de multi- casualidade, envolvendo várias disciplinas que interagem. Na Grã-Bretanha, os problemas das áreas degradadas ou em declínio permitiram acumular sucessivas experiências, desde os anos 50 à actualidade, através da reconstrução, revitalização, renovação, e desenvolvimento imobiliário sobre áreas construídas.

O evoluir destas experiências, conforme se apresenta na tabela nº. 2, conduziu a partir dos anos 90 a iniciativas de Urban Regeneration, designação que deu lugar em versões traduzidas à expressão Regeneração Urbana. Estas iniciativas relacionam-se com a procura de soluções integradas para os problemas urbanos40 de áreas urbanas degradadas, com actuações nos campos económico, físico social e ambiental, visando a sustentabilidade urbana41. Na sua versão inicial, a regeneração urbana esteve relacionada com a queda da economia inglesa baseada na manufactura. O abandono de áreas industriais e a decadência dos centros das cidades devido ao desemprego levou à concentração de excluídos e de habitações deficientes.

As bases da regeneração urbana surgiram do encadeamento entre problemas e soluções. A relação entre problemas urbanos e resposta social levou a reconhecer a importância do sucesso económico para a prosperidade e para a qualidade de vida. Pretendendo inverter o processo destas zonas através de melhoramentos no suporte físico e de incentivos públicos à estrutura económica para revalorizar a cidade, a regeneração urbana recorreu a políticas e práticas mais abrangentes no âmbito do desenvolvimento sustentável e do planeamento estratégico, donde resultou um acréscimo de saber teórico-prático.

As interacções entre factores e temas englobados no processo de regeneração encontram-se representadas na Figura nº. 4. Um dos elementos fundamentais da teoria da regeneração urbana “relaciona-se com o funcionamento do sistema urbano como um todo e com a operacionalização dos processos económico, social, físico e ambiental que determinam o conteúdo da regeneração urbana” (Roberts, 2006, p. 22)42. A regeneração urbana apresenta-se como uma actividade que assenta num consenso entre público e privado quanto à oportunidade de intervir para corrigir falhas de mercado.

39. Reflexão estratégica sobre a cidade de Birmingham.

40.“No processo de planeamento, entende-se por questão ou problema uma situação de conflito que é necessário resolver e ultrapassar (problema existente) ou prevenir (problema latente ou potencial) através da intervenção planeada e programada dos poderes públicos (…). Em qualquer caso a identificação de problemas é uma tarefa constante e progressiva que acompanha a realidade em permanente mudança, pelo que deve ter por base a experiência acumulada do passado”. (Correia, 1993, p. 211).

41. “comprehensive and integrated vision and action which leads to the resolution of urban problems and which seeks to bring about a lasting improvement in the economic, physical, social and environmental condition of an area that as been subject to change” (Roberts, 2006, p.17).

Utilizando a definição do UK’s Royal Institution of Chartered Surveyors, a regeneração é o processo de reverter o decaimento físico, social e económico nas nossas cidades sempre que tenha sido atingida a fase em que as forças de mercado por si só não bastam43.

A regeneração urbana evidenciou-se como uma política e uma prática para organizar e dinamizar iniciativas institucionais na gestão das mudanças urbanas, recorrendo a um processo estratégico de tomadas de decisão que verte em parcerias a cooperação e a co-responsabilização dos diversos actores. O processo implica a criação de estruturas que abarcam os sectores público, privado e comunitário para gerir a mudança urbana.

Fundamentalmente, a regeneração urbana está associada a um conjunto de actividades que procuram inverter o declínio económico, social e físico de áreas degradadas, atendendo aos princípios do desenvolvimento sustentável. Obedece a um processo liderado pelo poder público, com participação do sector privado em parcerias, e tem por objectivo melhorar as condições do suporte físico e a qualidade de vida da população utilizando o potencial local. Enquanto actividade intervencionista, a regeneração urbana implica a criação de estruturas institucionais, a definição de objectivos centrais e de meios para mobilização colectiva, a fim de gerir a mudança de forma ordenada (Roberts, 2006). A integração é um dos recursos centrais que leva a procurar soluções integradas e abrangentes, por oposição a intervenções sectoriais isoladas.

Considerando que as tomadas de decisão envolvem questões complexas relacionadas com os processos de mudança urbana, implicando o recurso a opções estratégicas, requerem a elaboração de uma agenda estratégica e a clarificação dos resultados a alcançar. Trata-se de processos que pedem uma preparação e uma gestão eficazes, apoiadas por uma equipa de trabalho multidisciplinar e por um gestor de projecto.

É essencial entender o processo de regeneração como um ciclo de actividade a longo prazo (Roberts & Sykes, 2006, p.6)44, como uma resposta às oportunidades e desafios apresentados pela degeneração urbana num determinado lugar e num momento específico (Roberts, 2006, p.9).

Segundo Roberts (2006), a regeneração urbana apoia-se nos seguintes princípios: Basear-se numa análise pormenorizada das condições da área urbana;

Ter por objectivo a adaptação simultânea das estrutura física e social, da base económica e das condições ambientais de uma área urbana;

Tentar realizar esta tarefa de adaptação simultânea através da criação e implementação de uma estratégia integrada que aborde a resolução dos problemas de uma maneira equilibrada, ordenada e positiva;

Procurar assegurar que a estratégia e os programas são desenvolvidos de acordo com os objectivos do desenvolvimento sustentável;

Definir claramente os objectivos a operacionalizar e quantificá-los sempre que possível;

Fazer a melhor utilização possível dos recursos, designadamente solo, ambiente construído, recursos sociais, económicos e naturais;

43. The process of reversing economic, social and physical decay in our towns and cities where it was reached the stage when market forces alone will not suffice. (European Commission, 1996, p. 207).

Procurar atingir consensos através da maior participação e cooperação possíveis de parceiros com interesses legítimos nas operações de regeneração da área urbana, através da participação ou de outras formas de funcionamento;

Reconhecer a importância de medir o progresso da estratégia para atingir os objectivos, e monitorizar a natureza da mudança e a influência das forças internas e externas que actuam sobre a área;

Aceitar a probabilidade de rever os programas iniciais em consonância com as mudanças que ocorrem; Reconhecer que os diversos elementos de uma estratégia fazem progredir a diferentes velocidades, o que pode implicar o redireccionar de recursos ou cativar recursos adicionais, para equilibrar os objectivos englobados no projecto de regeneração e atingir a concretização de todos os objectivos estratégicos.

No Reino Unido estas iniciativas têm enquadramento em políticas urbanas à escala nacional, dando lugar à criação de agências de desenvolvimento e de diversas organizações de apoio institucional a iniciativas locais. Em 1993 o governo britânico introduziu um orçamento único para a regeneração urbana: o Single Regeneration Budget (SRB) ligado a vinte programas distintos.

Para Pattinson (1998), o SRB teve por objectivo proporcionar um suporte financeiro à regeneração e ao desenvolvimento económico das regiões através da coerência entre os principais programas. Os fundos eram atribuídos mediante processo de selecção de candidaturas atendendo a critérios de optimização da relação qualidade-preço.

“Os projectos deveriam dar respostas a múltiplas questões: melhorar o emprego e a formação profissional de jovens e desfavorecidos e promover a igualdade de oportunidades; melhorar a competitividade da economia local e apoiar as empresas; proteger o ambiente e valorizar as infra-estruturas, favorecer uma arquitectura de qualidade e melhorar as condições de acesso à habitação, através da renovação, da conservação, de uma melhor gestão e de uma maior diversidade das habitações; ou ainda promover iniciativas em favor de minorias, lutar contra o crime e garantir a segurança pública, e melhorar a qualidade dos equipamentos sanitários, desportivos e culturais”45.

(Pattison, 1998, p. 75).

O recurso a fundos estruturais europeus tem apoiado políticas relevantes para a regeneração urbana. A sua gestão está a cargo de uma estrutura de partenariado com representação dos vários níveis de poder.

A partir dos anos 90, foram lançados sucessivamente diversos programas governamentais que evoluíram no sentido da maior ênfase à regeneração sócio-económica. Estas acções beneficiaram de financiamentos específicos para a regeneração, como o “Neighbourhood Renewal Fund” (NRF) uma subvenção atribuída às autoridades locais das zonas mais carenciadas, para que em colaboração com as parcerias locais estratégicas (Local Strategic Partnership) possam reduzir as diferenças entre as zonas mais desfavorecidas e o resto do país, e outros financiamentos destinados a intervenções específicas.

Embora frequentemente se associe a regeneração urbana a intervenções pesadas de demolição e construção sobre extensas áreas ocupadas por estruturas desactivadas e degradadas, como as Doklands de Londres, o Porto de Barcelona, ou a Expo 98 em Lisboa, a metodologia utilizada na Grã-Bretanha tem sido aplicada em diversos contextos nacionais e a diferentes tipologias de áreas urbanas.