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As propostas são avaliadas em função da integração em objectivos do PDM: regeneração urbana, salvaguarda e

3. Reabilitação Urbana em Loures

3.1. Visão Sobre o Concelho

13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21

Figura 19 – O Município de Loures na Área Metropolitana de Lisboa Fonte: Adaptado de PROT-AML, 2002. I volume, p. 11 (ilustração sem escala)

O município de Loures localizado na periferia da Área Metropolitana de Lisboa caracteriza-se como um território estruturado segundo uma matriz rural, sobre a qual se desenvolveram iniciativas de “urbanização”. Destas dinâmicas resultaram espaços não planeados, com ocupações dispersas ou concentradas segundo diversas densidades.

O conjunto é entrecortado pela rede viária arterial, dando suporte a um sistema viário sucessivamente robustecido com novas ligações à região. O território que acolheu a localização do aeroporto internacional de Lisboa, beneficia de fáceis acessos à linha do Norte, à auto-estrada do Norte, e ao Sul do país pela ponte Vasco da Gama.

A zona Oriental do Município é marcada por extensas áreas de construções clandestina, relativamente às quais não foram acauteladas questões de hierarquia urbana e ambiental. A posição confinante com Lisboa induziu a expansão

descontrolada de áreas urbanizáveis, o que se traduz actualmente num cordão urbano até Vila Franca, englobando vestígios de cadastros rústicos anteriores com o que resta de antigas quintas.

Na zona Norte, apesar do decaimento das actividades relacionadas com o sector primário, e da tendência para a fragmentação e dispersão urbana, existem ainda significativas áreas agrícolas e florestais que integram paisagens de valor cultural mantendo-se ligadas à actividade económica, embora muito ameaçadas pela pressão urbana.

Ao reduzirem-se as diferenças culturais significativas entre contextos rurais e urbanos, tenderam também a esbater-se as diferenças do edificado, confirmando a propensão para generalizar a sociedade urbana. A articulação da defesa da paisagem com a defesa do património ainda não é prática corrente, verificando-se desequilíbrios, especialmente nos aglomerados localizados em contexto rural ou rural de transição.

As estruturas urbanas pré-existentes, envelhecidas, comportam-se como áreas vulneráveis conotadas com situações de obsolescência. Os tecidos antigos tendem a desaparecer segundo processos impulsionados pelas dinâmicas do mercado imobiliário, para dar lugar à libertação de lotes bem localizados, onde se implantam novas construções adaptadas aos requisitos contemporâneos. A reprodução dos modelos legitimados nos bairros clandestinos é uma constante. Todos estes factores contribuem para que os aglomerados percam os seus factores distintivos e tendam para a homogeneização.

3.1.1. Evolução do processo de transformação do território

As migrações do campo para a cidade nos anos 60 arrastaram problemas sócio-económicos expressos em vastas manchas de construção clandestina na periferia de Lisboa, designadas áreas de subúrbio, com extensão apreciável na zona oriental do concelho de Loures, onde os recém-chegados à cidade encontravam (e encontram) abrigo.

Nos anos 70, a transformação de solo rústico em solo urbano intensificou-se por meio de destaques de parcelas para loteamentos e do fraccionamento em avos de cadastros rústicos, para construção. Foram introduzidos de modo aleatório novos usos, tipologias arquitectónicas e formas urbanas. A ocupação ao longo do eixo ferroviário (linha do Norte) foi densificada.

O desenvolvimento, assente no aproveitamento dos recursos naturais e nas actividades de exploração primária, deu lugar à terciarização. Os usos industriais e armazenais disseminaram-se no território, ou concentraram-se estrategicamente, como acontece junto ao aeroporto e à estrada Lisboa – Vila Franca - de-Xira, ou no eixo dos Tojais132, tirando partido da proximidade de Lisboa, do aeroporto, e do mercado abastecedor da região de Lisboa (MARL). Paralelamente à diversificação das referências, desapareciam os padrões estéticos tradicionais.

A sub-urbanização da metrópole de Lisboa e a inexistência de uma gestão urbanística à escala regional, ou mesmo municipal, conduziram a uma ocupação por vezes anárquica, profundamente delapidadora do património natural e consumidora de território e de recursos (CCDRLVT, 2007, p. 21).

Figura 20 – Território do Município de Loures. Contextos: rural, rural de transição e urbano. Fonte: Google Earth acedido em 07/11/2009.

Aglomerado em contexto rural (Bucelas)

Aglomerados em zona urbana (Prior Velho e Sacavém) Aglomerados em contexto rural de transição

A rede concelhia de aglomerados tradicionais (urbanos e rurais), formada por pequenas centralidades que há séculos interagiam com um território de identidade marcadamente rural, foi fortemente abalada pelas rápidas mudanças operadas. O quadro de vida das populações de muitos destes aglomerados alterou-se133.

Nos anos 80, foram-se extinguindo as empresas industriais de maior dimensão (metalo-mecânica, química, cerâmica). Nos anos 90, a construção do Mercado Abastecedor da Região de Lisboa no eixo dos Tojais e a Expo 98, na Zona Oriental, foram interpretados como factores potenciais de desenvolvimento. Apesar das dinâmicas criadas, que não devem ser negligenciadas, os impactos destas iniciativas ainda estão longe de atingir as expectativas criadas.

3.1.2. Problemas Urbanos e a Salvaguarda do Património

A atenuação da complementaridade de Loures relativamente à capital, enquanto reserva de produção agrícola para abastecimento de Lisboa, facilitou a substituição destas ligações por relações complementares de outro tipo: a criação de um contínuo urbano metropolitano heterogéneo na faixa Cacém/Amadora/Odivelas/Loures/Vila Franca de Xira, devido à expansão da cidade de Lisboa e dos municípios vizinhos até aos seus limites. Loures torna-se dormitório e zona industrial de periferia, acolhendo funções que a cidade-capital rejeita, mas das quais precisa para garantir o seu funcionamento.

O desequilíbrio provocado por estes fenómenos na rede dos aglomerados pré-existentes, interferiu no carácter de pequenas aldeias e vilas. Aglomerados antigos, quintas, palácios e outro património disperso sobreviveram rodeados de construção em altura e cercados por barreiras de infra-estruras viárias. Permanentemente ameaçados, entraram em declínio.

Os problemas urbanos gerados pelas mudanças sócio-económicas dos anos 60 e 70 ganharam protagonismo em dois cenários distintos: legalização de bairros clandestinos e protecção do património cultural construído.

a) Quando associados a bairros clandestinos134, conseguiram captar apoios institucionais, afectando recursos significativos. A coberto do respeito pela dignidade humana, que norteou as lutas por habitação digna nos anos 70, foi concedida prioridade à satisfação desta necessidade básica135 da população fixada em áreas ilegais. Recorreu-se a operações de loteamento para legalização da transformação do uso do solo,136 desenquadradas de acções de planeamento, com produção de lotes autónomos que a curto prazo passaram a alimentar o mercado imobiliário.

133. “Os naturais foram vendo o território ser invadido por construções que nada têm a ver com os seus valores culturais e construtivos e por força desta pseudo-cultura começaram a adquirir os hábitos dos recém-chegados”. (Câmara Municipal de Loures,1988, p. 9).

134. Problemática que seria enquadrada mais tarde pela Lei 91/95 de 2 de Setembro que estabelece o regime excepcional para reconversão urbanística das Áreas Urbanas de Génese Ilegal (AUGI).

135.Segundo a hierarquia de necessidades de Maslow (teoria formulada nos anos 40 do séc. XX) o nível mais baixo corresponde às necessidades que garantem a sobrevivência. O nível seguinte corresponde à necessidade de segurança e protecção.

136. Eram por vezes designados como planos de recuperação; visavam essencialmente legalizar a divisão da propriedade e dotar a área das infra-estruturas essenciais.

b) Nos anos 80, os problemas urbanos induziram a mobilização de esforços a nível municipal noutra perspectiva, com o intuito de salvaguardar o património ameaçado que sobreviveu à vaga de destruição provocada pela especulação imobiliária.

Numa época em que se defendia o reforço do poder local e o seu papel interventor na defesa do património, decidiu-se actuar no sentido de satisfazer necessidades de níveis superiores envolvendo a estética, a cultura, a socialização, e os valores de memória ligados à capacidade do património para criar sentimentos de pertença aos lugares. Tratava-se de contribuir de forma diferente para melhorar o quadro de vida das populações e a imagem do Concelho.

Na década de 80 a estrutura técnica municipal desenvolveu um extenso trabalho de identificação e registo do património construído, que deu origem a uma publicação em 1988.

A análise das dinâmicas territoriais nacionais entre 1991 e 2001, desenvolvida por João Ferrão137, revela que nesse período o país se tornou mais desequilibrado, embora socialmente menos diferenciado. As áreas metropolitanas e urbanas corresponderam nessa década ao “país sob alta pressão” – “territórios excessivos, tanto sob o ponto de vista das ameaças como das oportunidades”.

O declínio das áreas urbanas antigas, exemplificada no presente estudo pelo caso do município de Loures, foi abordado nos anos noventa por Paulo Correia como um problema latente entre as principais questões que se colocavam à execução de políticas de solos e à prática da gestão fundiária a nível municipal138. Hoje é um problema existente. Por outro lado, a década de noventa representou também “uma viragem importante da gestão urbana em Portugal”, designadamente tendo surgido preocupações alinhadas com tendências internacionais: “A importância dos planos estratégicos que devem preceder e enquadrar os planos e natureza mais normativa”; “A crescente incorporação das questões ambientais, sociais e culturais”, “A produção de uma nova geração de programas que se traduzem por intervenções espacialmente delimitadas na malha urbana” (Ferrão, 2003a, p. 224, 225).

Em 2002, o Plano Regional de Ordenamento da Área Metropolitana de Lisboa (PROT-AML) veio chamar a atenção para fenómenos de exclusão social e desqualificação ambiental em zonas antigas.

137. Ferrão J. (2003). Dinâmicas territoriais e trajectórias de desenvolvimento: Portugal 1991-2001. Revista de Estudos

Demográficos, 34, 17-25.

138 .“Uma outra questão que vai lentamente surgindo está na decadência das áreas urbanas antigas que por razões diversas sobreviveram à renovação urbana. Sejam centros históricos, de grande importância monumental e cultural ou bairros populares, trata-se normalmente de um património cultural e arquitectónico cuja viabilidade de conservação dificilmente se pode analisar apenas em termos financeiros”.

“Duas vias têm sido seguidas: na ausência da intervenção dos poderes públicos, a obsolescência funcional e o envelhecimento dos edifícios e infra-estruturas têm levado ao seu abandono e, posteriormente, à eventual renovação urbana; ou o seu baixo valor actual aliado a vantagens de localização e valor cultural vão motivando interessados em investir na sua reabilitação levando à progressiva substituição da população actual. Permanecendo apenas o património arquitectónico.” (Correia, P., 1993, p. 217)

Em 2003, o processo de revisão do P.D.M. de Loures recolocou na ordem do dia a reflexão sobre o estado do património construído e a reabilitação urbana dos aglomerados antigos, o que justificou a criação uma nova frente de trabalho no âmbito do planeamento municipal.