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O PROCESSO DE REABILITAÇÃO DA SAÚDE

- Eu vou fazendo as fisioterapias

- O tratamento, eu acho que ele fez o que podia e o adequado - Tomei remédio e fiz fisioterapia, mas não senti nenhuma melhora

- Eu tinha que fazer cirurgia nas duas mãos

A seguir, serão apresentadas as definições das categorias acompanhadas dos temas, dos exemplos de verbalizações dos bancários sobre o processo de reabilitação da capacidade laboral e as respectivas análises.

Eu vou fazendo as fisioterapias

Com o afastamento médico para tratamento da saúde, começou a fazer fisioterapias; com esse tratamento sentia uma melhora, um alívio. Às vezes, chegava na clínica com dores ou com algumas limitações e após a sessão fisioterápica saía melhor, mais calmo. Por outro lado, indica os pontos negativos desse processo: primeiro, e mais importante, foi sentir-se ignorado e abandonado tanto pelo banco quanto pelo INSS. Em seguida, o afastamento lhe causou perdas financeiras, as quais influenciaram negativamente a parte psicológica.Com isso, passou a ter depressão, pânico e, juntando tudo, se viu com várias doenças. Ainda, considerou negativa a postura do médico do banco e do INSS que não dá esclarecimentos sobre a doença; diante das incertezas, procurou pelo menos abreviar as dores, os sintomas; por isso, foi fazendo as fisioterapias. Por fim, não acredita que tratamento algum vá lhe trazer melhora porque tudo é negativo: do lado do banco, se sente discriminado e jogado para escanteio, pois banco nunca procurou saber se ele estava bem; do lado do governo, do INSS, os técnicos não o orientam, não o encaminham para nada; eles ficam fazendo conta se afastam por um, dois ou cinco meses; acredita que esses profissionais são instruídos e pagos para mandar a pessoa trabalhar, eles não estão preocupados com a cura.

Temas: ajuda da fisioterapia; fatores que influenciam a reabilitação; afastamento provoca perdas; dúvidas quanto à eficácia do tratamento.

Exemplos de verbalização:

- Eu acho que o aspecto negativo que contribui essencialmente para que não tenha resultado nesse processo de doença é a situação de abandono.

- Você perde financeiramente, você perde porque sua saúde fica agravada e influencia psicologicamente.

- Você passa a ter depressão, você passa a ter pânico e você junta tudo e não é só uma doença.

- No tratamento, o que mais ajudou foi a fisioterapia, porque ela te acalma, ela tira dores, você sente uma melhora.

- Então, eu limito a procurar pelo menos abreviar essas dores, abreviar esses sintomas e procurar por uma qualidade de vida. Por isso, eu vou fazendo as fisioterapias.

- Se o tratamento melhora? Eu acho que tratamento nenhum vai me trazer melhora, porque tudo é negativo.

A categoria evidencia as dificuldades do processo de reabilitação da saúde. Após tratamento, a presença da dor leva a crer que nada será capaz de ajudar na recuperação da saúde. Entre os fatores que dificultam a reabilitação da capacidade laboral estão o abandono, a perda financeira e a falta do apoio do banco; esta revela a perda maior, representada pela falta de reconhecimento, fator que confere identidade e, por isso, importante na construção da

saúde. A dinâmica do reconhecimento ficou impedida porque o adoecimento provocou a desestabilização da estratégia de defesa e, sem ela, não há mais performance produtiva. Em decorrência desse quadro, o estado de saúde do bancário se agravou, levando-o à depressão e à síndrome do pânico. Outra questão importante evidenciada na análise foi que a cronicidade da dor dificultou o tratamento, pois gerou um círculo vicioso de incompreensões em relação à modalidade mais eficaz e levou ao fracasso. Todo tratamento exige paciência porque é necessário tempo para obtenção de resultado. Essa exigência nem sempre é fácil para o bancário, pois ele estava vinculado à temporalidade da máquina, marcada pela velocidade das respostas (Grisci, 1999; Uchida, 1998). A espera pela resposta lenta do corpo, em relação ao tratamento, gera impaciência e desistência. A esse estado, soma-se a demanda por uma nova postura corporal que, às vezes, vai contra os modos operatórios determinados pela organização do trabalho. Por isso, as contínuas mudanças de médicos e de modalidades de tratamento. Ainda, a burocracia da perícia médica do INSS submeteu o bancário a um processo que se arrastou por vários meses, sem contar os maus-tratos no atendimento da perícia.

O tratamento, eu acho que ele fez o que podia e o adequado

Inicialmente, procurou ajuda de um médico ortopedista; passou por quatro deles para confirmar diagnósticos e para a adaptação ao melhor tipo de tratamento. Enfrentou várias modalidades de tratamento, dentre elas estão as sessões de infiltrações, de fisioterapia, seguidas de remédios e também de repouso. O tratamento fisioterapêutico causou complicações porque alterou o quadro geral da bursite; teve que parar com esse tratamento porque doía demais. Por causa disso, o médico prescreveu um tratamento medicamentoso acompanhado de alguns exercícios para serem feitos em casa, mais as sessões de infiltrações. Porém, como não houve melhora dos movimentos, porque o braço não levantava mais, não recuperava, não progredia, resolveu parar também com as infiltrações porque achou que estava piorando. O que mais a ajudou no tratamento foi o repouso. Durante o período em que estava de licença, em repouso, sentia o braço mais solto, mais leve e parecia que não havia um peso que o puxava, que o travava e segurava. Contudo, acredita que o tratamento realizado não contribuiu para melhora da saúde, pois nunca recuperou tudo, não evoluiu o tanto que o médico achava que fosse possível. Os movimentos do braço voltaram a travar e não adianta porque não evolui. Por isso, acha que o tratamento fez o que podia e o adequado; a musculatura e o tendão já foram exigidos demais, ficaram comprometidos. E, agora, até para trocar de roupa está difícil.

Temas: as limitações do tratamento; as interrupções; o repouso ajuda; descrença na recuperação.

Exemplos de verbalização:

- Eu entrei de licença e continuei com as infiltrações, fisioterapia, remédio e, inclusive, repouso.

- Aí, a fisioterapia estava alterando a bursite e eu tive que parar.

- No início, o meu primeiro socorro, eu procurei foi no ortopedista. Aí, eu fui em quatro ortopedistas porque você tem que confirmar diagnósticos.

- Eu acho assim, o tratamento, eu acho que ele fez o que podia e o adequado.

- Aí, parei com as infiltrações porque só estava piorando; mesmo tomando o medicamento e tudo, não progredia mais.

- O que mais ajudou foi o repouso. - Mas eu nunca recuperei não.

A categoria indica as diferentes tentativas de tratamento para a busca da reabilitação da saúde. A atitude de consultar vários ortopedistas para confirmar diagnóstico revela a dificuldade da bancária em aceitar o fato de ter adoecido e também as incompreensões médicas no estabelecimento do diagnóstico e na adoção de um tratamento eficaz para as LER/DORT. Para a bancária, as dificuldades no tratamento são decorrentes da fragilização da musculatura e do tendão que foram muito exigidos e que agora não respondem mais às tentativas do tratamento fisioterapêutico. Acredita que o repouso foi o que mais a ajudou no alívio das dores. No processo de busca por reabilitação da saúde, as contínuas interrupções do tratamento fisioterapêutico podem indicar as dificuldades para suportar o tratamento e também porque ele exigia uma nova disciplina corporal, às vezes, contrárias àquelas determinadas pela organização do trabalho. A demanda de tempo para obtenção de resultado era diferente daquele vinculado à instantaneidade do trabalho automatizado. Nesse caso, a mudança de um estado para outro não é instantânea, quando se considera o estado de cronicidade da patologia; por isso, a impaciência e a contínua desistência do tratamento. Ainda, a dificuldade de recuperação da dor pode estar ligada à desestabilização das estratégias de defesas, pois, após o adoecimento, elas não podiam mais ser endossadas pela bancária. Com o fracasso das estratégias defensivas, a bancária se vê incapacitada de retornar ao trabalho, pois ela não podia mais evitar a percepção de dor. Assim, sem as estratégias, o medo produzia sintomas que são somáticos, a dor persistia.

Tomei remédio e fiz fisioterapia, mas não senti nenhuma melhora

Afirma que ainda não está recuperado, porque as dores no braço continuam e sabe que está doendo. Ele tem dificuldades até para respirar e expirar, porque dói o peito e, às vezes, não agüenta andar, mas precisa fazer as coisas e tem que andar. Tomou remédio e fez fisioterapia, mas não sentiu nenhuma melhora; parece que está agravando mais porque agora sente dores na coluna e na perna. Por ter voltado a trabalhar, o último exame também indicou hérnia de disco. Teve época em que, além dos remédios que tomava, inclusive remédio controlado, estava com dois, três e até cinco médicos; passou por ortopedista, neurologista, o próprio médico do trabalho e um reumatologista. Há momento em que a dor é tão grande que não suporta, ela só pára quando dorme. Acredita que isso não tem jeito, não tem melhora.

Temas: as dores continuam; ineficácia do tratamento; a patologia não tem cura.

Exemplos de verbalização:

- Na verdade, eu não estou recuperado.

- Na época, eu tomei remédio, fiz fisioterapia, mas eu não senti nenhuma melhora. Eu tomei remédio controlado forte, mas não senti melhora.

- Eu estou sentindo dor e tem hora que é tão grande que eu não suporto; ela só pára quando eu durmo.

- Então, isso não tem jeito. Eu já fiz fisioterapia e tomei remédio.

- Eu passei por ortopedista, neurologista, reumatologista e o próprio médico do trabalho.

A categoria indica a tentativa de recuperação da capacidade laboral. Nesse processo, por não ter conseguido o resultado esperado, em virtude da cronicidade da patologia, o bancário tem uma atitude de descrença em relação às possibilidades de melhora. A passagem por vários especialistas da área de saúde revela a complexidade dessa patologia e, por conseguinte, a incompreensão em relação ao tratamento que, na maioria dos casos, fracassa. Segundo o bancário, a patologia agravou porque agora sente dor na coluna, na perna e está com problema de hérnia de disco, ou seja, ele passou a ter outros problemas. Nesse caso, também a dificuldade de recuperação da saúde pode estar ligada ao processo de cronicidade da dor, decorrente do excesso de medicação ao longo dos anos, e também à desestabilização das estratégias de defesas após o adoecimento. O tratamento fisioterapêutico exige uma nova postura corporal no trabalho e o bancário sabe que não poderá se manter no mesmo ritmo acelerado, com as mesmas performances produtivas. O medo de não conseguir retornar para o trabalho desenvolve mais sintomas sobre o corpo; o bancário sabe que deve voltar ao trabalho,

mas é um fracasso porque que ainda tem dor no braço, na coluna e na perna.

Eu tinha que fazer cirurgia nas duas mãos

O ortopedista recomendou cirurgia; entrou de licença e fez cirurgia na mão direita, onde sentia mais dores e ficou sessenta dias de licença. Depois, fez cirurgia na mão esquerda, como já estava determinado pelo ortopedista. Embora não sentisse tanta dor nessa mão, os exames mostravam maior comprometimento dela e se não fizesse a cirurgia o problema agravaria. Então, após sessenta dias da primeira cirurgia foi realizada a segunda. O pós-operatório dessa mão foi mais complicado, exigiu mais repouso porque a cirurgia foi diferente: essa mão estava mais comprometida e a cicatrização não foi boa. Durante os sessenta dias após a primeira cirurgia fez fisioterapia na mão direita e continuou na mão esquerda porque perdeu a força muscular. Nesta mão, além da fisioterapia teve de fazer infiltrações porque deu problema; por isso, o cuidado foi diferenciado. Após a cirurgia, não sentia a mão, só aos poucos é que a sensibilidade foi voltando. Com nove meses de licença, estava se sentindo bem, não tinha problema, era como se tivesse ganhado outras mãos. Contudo, ainda tem algumas coisinhas.Três meses antes de completar o período de licença voltou ao médico do trabalho e à perícia médica do INSS. Após exames, o perito concedeu mais três meses de licença. O médico-assistente achava que com mais esse período seria possível recuperar mais alguma coisa; inclusive, recomendou terapia ocupacional. Nesse período, não recebeu acompanhamento nem da gerência nem do RH do banco, por isso, sentia-se como um objeto no ambiente de trabalho.

Temas: tratamento cirúrgico; dificuldades na recuperação; sentimento de abandono.

Exemplos de verbalização:

- Eu entrei de licença e fiquei durante uns nove meses.

- Na verdade, eu fiz a cirurgia de uma mão e fiquei 60 dias de licença; depois eu fiz na outra mão, estava previsto.

- Assim, já estava claro que eu tinha que fazer cirurgia nas duas mãos. - A cirurgia foi diferente, a cicatrização não foi boa, não foi a mesma. - Eu perdi a força muscular e eu estou com dificuldades com essa mão ainda. - E durante todo esse período eu fiquei fazendo fisioterapia.

- Aí, eu tive que fazer algumas infiltrações porque deu problema.

- Eu me sentia, assim, literalmente, um objeto no ambiente de trabalho; não houve acompanhamento da agência, do RH e nem de ninguém.

Essa categoria apresenta a bilateralidade das LER/DORT mediante o comprometimento das duas mãos, órgãos do reconhecimento no mundo do trabalho, que se

tornaram um lugar para expressão do conflito vivido. A luta para conseguir reabilitar a saúde foi árdua, por conta das complicações do pós-operatório, que geraram sofrimento físico pela dificuldade de cicatrização, pela perda muscular e de tato. Ao mesmo tempo, diz que ganhou outras mãos , mas ainda tem algumas coisinhas que não melhoraram. Esse paradoxo revela o fracasso da intervenção cirúrgica, que só visou a intervenção físico-anatômica e não considerou as questões psíquicas engendradas no processo de recuperação da saúde. A bancária se queixa do abandono, da falta de apoio do banco no período em que ficou afastada para tratamento. O adoecimento gerou perdas materiais e simbólicas, porque rompeu com a estratégia de defesa; sem ela, não se poderá evitar o medo da incapacidade de retomar as performances produtivas para a obtenção de reconhecimento. Desse modo, a recuperação se torna difícil, pela persistência dos sintomas somáticos engendrado pelo medo.

De acordo com a análise do processo de reabilitação da saúde, os bancários envolvidos no presente estudo só procuraram por tratamento especializado quando os sintomas das LER/DORT estavam em processo avançado, quando a dor tinha se tornado crônica. Ao sentirem os primeiros sinais de adoecimento, eles fizeram uso de medicamentos como uma medida paliativa para atenuar as dores e prosseguir no trabalho.

O medo das conseqüências que a patologia acarreta levou os bancários a procurarem ajuda médica só quando as dores passaram a ser intensas e persistentes e a interferirem na realização das tarefas. Eles procuraram, então, os médicos ortopedistas, reumatologistas ou neurologistas e tratamento fisioterapêutico, além da ajuda medicamentosa.

Todas as modalidades de tratamento utilizadas fracassaram porque não removeram os sintomas; quando muito, eles foram aliviados temporariamente, pois, após algum tempo, estavam de volta. A persistência da dor fez os bancários duvidarem da eficácia do tratamento; para eles as LER/DORT são uma patologia que não tem recuperação; por isso, têm de aprender a administrar os sintomas.

Segundo os bancários, existem alguns fatores que dificultam a reabilitação da capacidade laboral e que podem até mesmo agravar o quadro clínico. Entre os principais fatores estão: os sentimentos de abandono e de exclusão; a perda financeira; a falta do apoio do banco e a perda das relações sociais de trabalho; a fragilização do aparelho musculoesquelético, que foi muito exigido e agora não responde mais às tentativas do tratamento fisioterapêutico e medicamentoso; a dificuldade de recuperação da saúde também está ligada ao processo de cronicidade da dor, decorrente do excesso de medicação ao longo dos anos. A reabilitação é dificultada também pela perda simbólica, porque a desestabilização

das estratégias de defesas após o adoecimento representa a perda maior, que é a oportunidade de obtenção de reconhecimento pela produtividade atingida, que confere identidade e condição para manutenção da saúde.

De acordo com as análises, é consenso entre os bancários participantes deste estudo que o repouso é o fator que mais ajuda no alívio das dores, seguido do tratamento fisioterapêutico e medicamentoso, porque trazem alívio imediato das dores e das inflamações na região comprometida. Até certo ponto, durante o período em que os bancários permanecem em repouso, eles ficam livres do ambiente de pressão da chefia por produtividade e da pressão dos clientes por qualidade e rapidez nos serviços prestados. Assim, o afastamento favorece o distanciamento dos fatores que geraram o adoecimento, e uma vez sob a permanência deles, os sintomas tendem a se agravar.

Todos os bancários se queixaram das dificuldades de ter de se ausentar do trabalho para ir ao médico, quando começaram a perceber os primeiros sintomas. Isso se deve não somente às questões relativas à negação da patologia, mas também por causa do medo das conseqüências, caso a chefia imediata viesse a saber do problema de saúde.

A despeito do sofrimento decorrente das pressões e dos conflitos, para os bancários o afastamento do ambiente de trabalho, por longo tempo, também é um fator que contribui para o agravamento da patologia e dificulta as tentativas de reabilitação da capacidade laboral, pois o trabalho estrutura a vida psíquica, social e temporal das pessoas. O distanciamento do ambiente de trabalho leva os bancários a se sentirem abandonados e desamparados, pois como a interação com os colegas é rompida, ficam alheios às inovações e modificações ocorridas no trabalho, perdem as estratégias de defesas e a identidade de trabalhador fica abalada. Esse quadro conflui para a persistência dos sintomas das LER/DORT, enquanto que a presença das dores ajuda a tornar qualquer modalidade de tratamento ineficaz.

A complexidade dos fatores envolvidos no processo, a fragilização física decorrente das dores e das dificuldades impostas pelo adoecimento, a fragilização psíquica proveniente do sentimento de abando, no estado de cronização da dor e a falta de escuta atenta dos problemas que vêm do trabalho levam a equívocos no estabelecimento do diagnóstico e na adoção de um tratamento adequado.

Diante desse quadro, os bancários também procuram por tratamento psicoterapêutico. Nesse caso, Araújo (1998) chama a atenção para o propósito do tratamento psicoterapêutico com trabalhadores portadores de LER/DORT. Ao se tentar essa modalidade de tratamento,

corre-se o risco de o trabalhador ser tomado isoladamente de sua situação de trabalho e de se considerar a dor como um sintoma histérico, relevando a sua concretude. Para o autor, cabe à psicoterapia tratar o sofrimento psíquico do trabalhador quando a ele estiver ligado um fenômeno de somatização.

Essa modalidade de tratamento deverá estar voltado para a escuta do sofrimento e para a busca de aprendizado que ajudem o trabalhador a conviver com as limitações impostas pela patologia e a reestruturar sua vida profissional e afetiva. Portanto, não se deve confundir o papel do tratamento médico e fisioterapêutico com o psicoterapêutico na cura das lesões orgânicas provocadas pela patologia.

Nessa mesma direção, Sato et al. (1993) alertam para os cuidados, especificamente com trabalhadores acometidos por LER/DORT, quanto à atribuição do envolvimento de fatores de ordem psicológica na origem e no tratamento dessa patologia. Freqüentemente, ou eles estão revestidos por valores morais, como fraqueza e preguiça, ou por uma estrutura de personalidade mais propensa à doença ou são decorrentes de conflitos infantis inconscientes. Essas concepções vêem o trabalhador isolado de sua situação de trabalho, descolado das dificuldades geradas pelo confronto com a organização real do trabalho e dos conflitos presentes nas relações hierárquicas desiguais, que levam à penosidade e à sobrecarga de trabalho.

O trabalho terapêutico com grupos de portadores de LER/DORT desenvolvido por Sato et al. (1993), Araújo (1998) e Merlo et al. (2001) evidenciou que é possível, mediante a ajuda de uma equipe multidisciplinar, criar possibilidade para reflexão, discussão e expressão do sofrimento proveniente da relação entre trabalhador-trabalho e adoecimento. A partir de metodologias específicas, cada um desses trabalhos viabilizou condições para a construção de um conhecimento e de estratégias partilhadas coletivamente para ajudar os trabalhadores a enfrentarem o sofrimento, as limitações impostas pela doença e tornar possível uma nova realidade de vida, apesar da presença das LER/DORT.

A eficácia desse tratamento não está na remoção dos sintomas ou da dor física; ela remete ao plano simbólico, visto que a construção de um espaço de fala permite a ressignificação do sofrimento engendrado no trabalho, mediante a escuta atenta dos colegas e dos profissionais, do compartilhamento de sentimentos, dificuldades e experiências em