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Processos de compreensão explicados com o estudo dos movimentos

CAPÍTULO I – FUNDAMENTOS TEÓRICOS: LEITURA E DIFICULDADES DE

5. NEUROPSICOFISIOLOGIA PERCEÇÃO VISUAL, CÉREBRO E LEITURA

5.2 P ERCEÇÃO VISUAL E LEITURA

5.2.3. Processos de compreensão explicados com o estudo dos movimentos

A quantidade de informação útil que os leitores obtêm durante uma fixação ocular está diretamente relacionada com o span percetual (ou área de visão efetiva durante uma fixação). Este tópico é importante porque os dados provenientes dos movimentos oculares são mais ou menos valiosos dependendo da quantidade de informação que pode ser processada numa única fixação ocular. Se os leitores processassem toda a informação numa única linha (ou em múltiplas linhas) numa única fixação, os dados provenientes dos movimentos oculares não seriam muito informativos porque o investigador não saberia especificamente que palavras estariam a ser processadas num determinado período no tempo. Como já foi referido anteriormente, os leitores movem normalmente os seus olhos 7 a 9 espaços de letra pelo que este facto torna improvável que a informação possa ser obtida de todas as palavras numa linha. Uma possibilidade mais plausível é a de que os leitores podem processar o significado simultâneo de um número de palavras (por exemplo, três ou quatro) dentro de uma única fixação. Esta possibilidade tornaria os dados provenientes dos movimentos oculares pouco informativa porque uma vez mais não seria óbvio que palavras estariam a ser processadas durante a leitura. No outro extremo, se os leitores apenas conseguirem extrair informação da palavra presentemente fixada e processar apenas o significado

72 dessa palavra, então as fixações oculares tornar-se-ão especialmente informativas acerca do processamento momento-a-momento. Interessantemente, o paradigma de leitura auto-passada de palavra-por-palavra força este acontecimento no leitor. No entanto, o principal problema da self-paced reading é a redução significativa da velocidade de leitura, reduzida a metade do débito normal. Acresce ainda que com a

self-paced reading, o leitor perde a capacidade de retroceder no texto quando

necessário para a compreensão. Afortunadamente, uma vasta quantidade de investigação realizada sobre a janela percetual em língua inglesa demonstrou, conclusivamente, que os leitores extraem informação de apenas uma região limitada em cada fixação. Na grande maioria das vezes, os leitores processam apenas o significado da palavra fixada, no entanto, quando as palavras são de alta frequência ou quando palavras curtas aparecem em sucessão, o significado de mais do que uma palavra pode ser processado numa fixação (Rayner & Slattery, 2009).

Apesar de termos a impressão de que podemos ver uma linha completa de texto ou mesmo uma página inteira, isto não passa de uma ilusão, demonstrada claramente por estudos que utilizaram o paradigma da janela em movimento dependente do olhar, introduzido por McConkie & Rayner (1975; Rayner & Bertera, 1979). A lógica por detrás deste paradigma da janela em movimento dependente do olhar é o de que se pode determinar a quantidade de texto que está a ser processada através da variação do tamanho da janela na qual o texto aparece normal. Deste modo, a quantidade de informação disponível para um leitor é determinada pelo quão ampla a janela (que mostra o texto normal) tem de ser para que os leitores possam ler normalmente ou, inversamente, quão pequena tem de ser antes que haja uma disrupção da leitura (Rayner & Slattery, 2009). Os estudos que utilizaram este paradigma demonstraram que os leitores de língua Inglesa adquirem informação útil proveniente de uma região assimétrica em redor do ponto de fixação (estendendo-se três a quatro espaços de caractere à esquerda da fixação e cerca de 14 a 15 espaços de caractere à direita). Outros estudos também revelaram que os leitores não utilizam informação de palavras localizadas na linha abaixo da linha presentemente fixada (Rayner, 1998). Por último, o paradigma da janela em movimento pode ser revertido por forma a produzir-se o paradigma da máscara em movimento (Rayner & Bertera, 1979; Rayner, Inhoff, Morrison, Sloiaczek, & Bertera, 1981). Neste caso, uma máscara move-se com os olhos em cada fixação, cobrindo as palavras no centro do campo visual. Os resultados decorrentes deste paradigma demonstram que ler enquanto a região central está

73 mascarada (quando apenas as palavras na visão parafoveal são apresentadas normalmente) é praticamente impossível (Rayner & Slattery, 2009).

Outro paradigma contingente do olhar utilizado para investigar o grau de informação processada fora da região fixada é o paradigma de fronteira8 (Rayner, 1975). Neste

paradigma, a palavra alvo localizada imediatamente à direita da palavra presentemente fixada é substituída por outra palavra, por uma pseudopalavra ou por uma sequência aleatória de letras (criando uma pré-visualização inválida). Quando os olhos dos leitores cruzam a fronteira invisível localizada entre as duas palavras, a pré-visualização inválida muda para a palavra-alvo. Os leitores não se apercebem desta alteração porque a visão é suprimida durante o movimento ocular. Esta condição de pré-visualização inválida é então comparada com uma condição de pré-visualização válida na qual a palavra alvo é apresentada normalmente. Quando os leitores têm uma pré-visualização inválida da palavra à direita da fixação, estes demoram aproximadamente mais 30 a 50 ms a fixarem essa palavra (seguida de uma sacada para ela) do que quando têm uma pré- visualização válida (Rayner & Slattery, 2009). Segundo McConkie & Zola (1979) e Rayner, McConkie, & Zola (1980) também é importante realçar que os estudos que utilizaram esta técnica revelaram que os leitores não combinam a representação literal da informação visual ao longo das sacadas, mas ao invés a informação abstrata (e fonológica) é integrada no decurso das fixações oculares.

Os diversos tipos de alterações de exibição dependentes do olhar utilizados em inúmeras experiências permitiram concluir que os leitores obtêm informação útil proveniente de não mais do que 14 a 15 espaços de letra à direita da fixação. No entanto, a informação acerca do significado da palavra está limitada a uma região que se estende cerca de 3 a 4 espaços de letra à esquerda da fixação até, na maioria das fixações, não mais do que 5 a 8 espaços de letra à direita. A região à direita é um tanto ou quanto variável dependendo do comprimento das palavras. Deste modo, se duas ou três palavras curtas surgem em sucessão, estas podem ser identificadas numa única fixação (Rayner & Slattery, 2009). Acresce que se a palavra sucedânea for altamente previsível a partir do contexto precedente, os leitores são mais propensos a ignorarem- na (Altarriba, Kroll, Sholl, & Rayner, 1996; Balota, Pollatsek, & Rayner, 1985; Ehrlich & Rayner, 1981; Rayner & Well, 1996). Este achado não significa, no entanto, que a palavra não é processada. Em vez disso, é processada durante a fixação antes do salto9

8 The boundary paradigm. 9 Skip.

74 (Rayner & Slattery, 2009). Deste modo, a duração da fixação antes do salto7 é

inflacionada, assim como por vezes a duração da fixação depois do salto7 (Drieghe,

Rayner, & Pollatsek, 2005; Hogaboam, 1983; Pollatsek, Rayner, & Balota, 1986).

6. PROCESSOS DE COMPREENSÃO NA LEITURA EXPLICADOS COM O