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proclamação da república

No documento 1996 Limonad Os Lugares da Urbanizacao[1] (páginas 116-126)

4. ORIGENS, OCUPAÇÃO E URBANIZAÇÃO NO RIO DE

4.3 de fortificação defensiva à Capital da República

4.3.6 proclamação da república

A Proclamação da República modificou de imediato o estatuto jurídico da cidade do Rio de Janeiro. Um Ato do Governo Provisório de 15/11/1889, menciona pela primeira vez, a expressão "Município Neutro" e dispõe que o "território do Município Neutro fica provisoriamente sob a administração imediata do governo provisório da República e a cidade do Rio de Janeiro constituída também provisoriamente sede do Governo Federal" (BRASILEIRO, 1979 :39).

Com a Constituição de 1891, o antigo município foi elevado a Distrito Federal1. Parece- nos ser esse o momento quando a cidade do Rio de Janeiro é efetivamente separada da antiga Província do Rio de Janeiro, que passou a ser o antigo estado do Rio de

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"Cada uma das antigas províncias formará um Estado e o antigo ‘Município Neutro’ constituirá O Distrito

Federal, continuando a ser Capital da União" Brasil - Constituição de 1891, art. 2., apud BRASILEIRO,

E ste r Limon a d - O s Lu g a re s d a Urb a n iza çã o 1 0 1 Janeiro. Esta Constituição previa a mudança da sede do Governo Federal para o planalto central1 e a formação de um novo estado na sede anterior do Distrito Federal2. Desde o início o sistema político-administrativo brasileiro entravou a estruturação de uma rede urbana articulada com a concentração do poder político na capital nacional. O fortalecimento do poder local pelo Ato Adicional, de 12/08/1834, foi aparente dada a subordinação das Câmaras, responsáveis pela administração local, às Províncias (CIDE, 1989 :9). Porém, em 1840, foi aprovada a Lei de Interpretação, por correntes contrárias a descentralização, que impedia as Províncias de legislar sobre os municípios e facultava-lhes a criação de novos municípios. “Muitos se utilizaram deste meio para atenderem a interesses políticos diversos, criando-se municípios sem renda suficiente para desempenharem suas funções. Assim surgiram, no século XIX, inúmeros municípios fluminenses, ao lado dos que se emanciparam com o progresso decorrente da economia cafeeira” (CIDE, 1989 :9) (vide mapas 4.3.6 a, b, c e d).

Se durante o Império a autonomia política dos municípios não se consolidou, com a República eles permaneceram subordinados aos interesses políticos dos coronéis3 em disputa pelo governo estadual até 1930. Durante os governos do Mal. Deodoro da Fonseca e de Floriano Peixoto em decorrência de acirradas lutas políticas realizaram-se várias emancipações, muitas anuladas em seguida (CIDE, 1989 :9 ,vide Tabela 4.3). Entre os municípios fundados entre 1890 e 1892, para compor interesses políticos dos coronéis após a decadência da economia local com o fim da cafeicultura (CIDE, 1989 :9), e extintos de uma só penada pelo Decreto Estadual n° 1 de 08/05/1892, à exceção de Conceição de Macabu, Sumidouro e Rio Claro, extintos por outros decretos no mesmo ano, temos os municípios de:

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"Fica pertencendo à União no planalto central da República, uma zona de 14.400 quilometros quadrados, que será oportunamente demarcada para nela estabelecer-se a futura Capital federal". Brasil -

Constituição de 1891, caput art. 3. apud BRASILEIRO, 1979 :40. 2

"efetuada a mudança da capital, o atual Distrito Federal passará a constituir um Estado" Brasil - Constituição de 1891, parágrafo único do art. 3, apud BRASILEIRO, 1979 :40.

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grandes proprietários rurais monarquistas que durante o Império integravam a Guarda Nacional, chefe político de um ou mais municípios.

E ste r Limon a d - O s Lu g a re s d a Urb a n iza çã o 1 0 5 • São Sebastião do Paraíso, Macuco1, Sapaetiba2 e Boa Esperança3 que sequer

voltaram a se emancipar; • Cordeiro4

, Conceição de Macabu, Bom Jesus de Itabapoana e Natividade (CIDE, 1989 :9) que voltaram a se emancipar apenas em meados do século XX;

• Cambuci, São Pedro D’Aldeia, São Gonçalo, Rio Claro, Mangaratiba, Sumidouro, São Sebastião do Alto, Bom Jardim5, recriados ainda no mesmo ano.

Apenas alguns dentre eles ganharam alguma preeminência a partir de meados do século XX, por razões diversas. São Gonçalo, graças à indústria pesqueira em Niterói; São Pedro d’Aldeia enquanto núcleo dormitório de Cabo Frio e área de lazer de fim-de- semana e Bom Jardim enquanto núcleo dormitório de Nova Friburgo. Além destes muitos permanecem estagnados até hoje, voltados para atividades de subsistência e dependentes de verbas externas para sua manutenção.

a) perda da hegemonia cafeeira

O café cultivado extensivamente no Vale do Paraíba, sem cuidados no trato esgotava a fertilidade do solo e exigia a constante incorporação de solos virgens. A estrutura produtiva (STEIN, 1990 :223) cafeeira fluminense continha em si os elementos de sua desagregação, que se manifestavam com a flutuação dos preços do café, escassez dos escravos, perda da fertilidade dos solos associadas à ausência de uma capitalização que mantivesse a produtividade elevada.

Na última década do século XIX a queda do preço do café acelerou o fim da agricultura nesta região. A maioria das plantações fluminenses no Vale do Paraíba estavam hipotecadas ou sob o controle das seções hipotecárias dos bancos. Em Resende entre 1865 e 1868 o número de hipotecas triplicou (WHATELY, 1987 :44). Com a crise do mercado de capitais (encilhamento) e abolição da escravatura, sem indenização, os fazendeiros fluminenses tiveram dificuldades em obter novos empréstimos e saldar suas dívidas. Foram obrigados, assim, a transferir suas propriedades a seus credores (FERNANDES Fº, 1983 :18-19). Apesar dos fazendeiros haverem resistido diante da carência de mão de obra, a pecuária substituiu as grandes lavouras (WHATELY, 1987 :69).

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São Sebastião do Paraíso e Macuco desmembrados de Cantagalo em 1890, reincorporados em 1892. 2

Emancipado de Cabo Frio em 1890, reincorporado em 1891. 3

Emancipado de Araruama em 1891, extinto e anexado a Rio Bonito em 1892. 4

Emancipado de Cantagalo em 1891, reanexado em 1892, voltou a se emancipar em 1943. 5

São José do Ribeirão desmembrado de Nova Friburgo em 1891, foi reintegrado em 1892 e emancipado em 1893 com o nome de Bom Jardim.

E ste r Limon a d - O s Lu g a re s d a Urb a n iza çã o 1 0 6 O café continuou a ser em sua maior parte comercializado no Porto do Rio de Janeiro (SINGER, 1968 :28 e BRASILEIRO, 1979 :19), mesmo após haver conquistado a zona central do interior paulista, até o fim do século XIX quando o porto de Santos começou a se destacar. "Em 1902-3 Santos já exportava o dobro do volume de café exportado pelo porto do Rio de Janeiro” (FERNANDES Fº, 1983 :15). São Paulo, em 1873, ainda desempenhava um papel modesto na comercialização do café com apenas 13 casas comissárias enquanto o Rio de Janeiro possuía quase 2.000 (SINGER, 1968 :32 e BRASILEIRO, 1979 :19).

Ao final do século XIX, com a decadência da produção de café na região fluminense e expansão da fronteira cafeeira no estado de São Paulo, o porto do Rio de Janeiro passou a escoar o café produzido nas áreas a ele ligadas por ferrovias (CARDOSO, 1968 e BRASILEIRO, 1979 :16) (Minas Gerais, Sul do Espírito Santo e parte do Vale do Paraíba). Exceto pelo sudoeste de Minas e Médio Paraíba Paulista, a área povoada pela cafeicultura manteve-se na órbita do Rio de Janeiro. A rápida expansão da rede ferroviária, impulsionada pela riqueza agrícola da região, reforçou a função exportadora- importadora do porto do Riode Janeiro (BERNARDES, 1964 :65) ligado por cabotagem a outros portos do país.

A perda de hegemonia na produção cafeeira do Rio de Janeiro para São Paulo pode ser explicada por um lado pelo fator geográfico: nem a qualidade do solo, nem o relevo mostravam-se favoráveis a um desenvolvimento como o paulista (IDEG, 1975 e BRASILEIRO, 1979 :20). Por outro lado, a importância do rápido crescimento da produção e de seu deslocamento geográfico é explicável pelas mudanças ocorridas nas relações de produção, através da substituição da mão de obra escrava por trabalho assalariado e uma mecanização parcial.

b) novas funções da cidade do Rio de Janeiro

Na passagem do século apesar da decadência da cafeicultura fluminense a cidade do Rio de Janeiro continuou a crescer e ampliar sua área de influência. Não necessitava mais ser propulsionada por um único produto de exportação, possuía funções urbanas variadas capazes de atrair não só grandes contingentes populacionais, como também de impulsionar o crescimento da cidade (BRASILEIRO, 1979 :18). Através de Belo Horizonte, criada na última década do século, sua influência atingiu as mais remotas áreas (BERNARDES, 1964 :65). Pelos ramais da Central do Brasil a Pirapora, Montes Claros e Diamantina, alcançou o norte e nordeste de Minas, o vale médio do São Francisco e sudoeste da Bahia. E, com o prolongamento da Estrada de Ferro Oeste de

E ste r Limon a d - O s Lu g a re s d a Urb a n iza çã o 1 0 7 Minas até o Triângulo Mineiro, a cidade do Rio de Janeiro superpôs sua influência à de São Paulo no alto Paranaíba.

Além de contar com a penetração das estradas de ferro que dela se haviam irradiado, o Rio de Janeiro também se fazia presente através da navegação de cabotagem em áreas ligadas por ferrovia a alguns portos dele igualmente dependentes, como Caravelas e Vitória. As zonas de influência da Bahia-Minas e da Vitória a Minas, através destes portos estabeleciam suas ligações com o do Rio de Janeiro (BERNARDES, 1964 :85).

c) decadência das cidades cafeeiras e da agricultura fluminense

Desde meados do século XIX, as cidades cafeeiras da parte sul da zona da mata mineira dependiam do Rio de Janeiro1. Muitas estagnaram ou decaíram com a decadência do café, todavia as cidades favorecidas por vias de comunicação ou por mudanças econômicas regionais tornaram-se centros de atendimento às necessidades de pequenos núcleos próximos.

Se a articulação da cidade do Rio de Janeiro com áreas dinâmicas do território nacional tornara-o um grande centro intermediador, as cidades, núcleos e vilas surgidos no planalto fluminense não chegaram a acumular vantagens locacionais nem a se desenvolver autonomamente. Por servir de entrepostos e depósitos da produção destinada ao porto do Rio de Janeiro, estas cidades não contribuíram para a formação de uma rede urbana intradependente no estado e nenhuma galgou a posição de centro regional. "A metrópole do Rio de Janeiro, via de regra, não cresceu de forma articulada com o Estado do Rio de Janeiro, desenvolvendo relações de interdependência com cidades e áreas fora das fronteiras fluminenses. Ao contrário de São Paulo, não se desenvolveu no Estado do Rio de Janeiro uma rede urbana equilibrada, composta de número elevado de cidades intermediárias" (SOARES, 1987 :22; BERNARDES, 1964 :61 e ss. e COELHO, 1987 :44).

As razões da estagnação ou decadência das cidades cafeeiras fluminenses não se reduzem ao esgotamento dos solos da província e abolição da escravatura, entre elas temos três fatores. Primeiro, nenhuma outra atividade produtiva de porte desenvolveu- se nestas localidades, paralelamente ou após a decadência da cafeicultura. Segundo, o excedente econômico do café não foi aplicado nas cidades que originou, mas investido

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Pomba, São João Nepomuceno, Conceição do Rio Novo e outras, surgidos como pequenos e ricos aglomerados antes da metade do século, foram reconhecidas como vilas. Ubá, Leopoldina, Cataguases, Além Paraíba, próximas entre si, constituem-se em centros locais. BERNARDES, 1964 :62.

E ste r Limon a d - O s Lu g a re s d a Urb a n iza çã o 1 0 8 para sustentar a cafeicultura, o fausto dos fazendeiros1 e as casas comissárias da capital2. Somam-se a estes fatores as dificuldades de comunicação e escoamento da produção; muitas cidades serranas conectavam-se ao Rio de Janeiro por íngremes picadas na serra e pequenos portos litorâneos, o que dificultava a possibilidade de diversificarem sua produção para assumir o abastecimento da cidade do Rio de Janeiro - feito pela zona da Mata Mineira desde o século XVIII através do caminho aberto por Garcia Rodrigues. Isto se mantém até hoje, só que agora boa parte do abastecimento provém de São Paulo.

Apesar da riqueza do café, as cidades permaneciam e permanecem improdutivas, sua carência de serviços urbanos é secular (DUARTE, 1979 :94) e, ainda hoje, muitas são inexpressivas e dependem totalmente de subsídios externos. O município de Santo Antônio de Pádua é um exemplo ilustrativo, onde o esgotamento dos solos e a abolição da escravatura conjugados às crescentes dificuldades de comunicação contribuíram para o declínio de sua economia (CIDE, 1988k :12).

O ciclo do café fluminense contribuiu mais para consolidar a hegemonia e o desenvolvimento da cidade do Rio de Janeiro e para fortalecer sua burguesia mercantil e financeira (DUARTE, 1979 :93-94), do que para desenvolver as áreas onde se instalou. O afluxo de mão de obra escrava, a infra-estrutura de transporte, o desenvolvimento do setor financeiro dependeram diretamente da produção e comercialização de café. A abolição do tráfico liberou capitais para serem reinvestidos nos setores secundário e terciário. A partir de meados dos século o mercado de capitais desenvolveu-se e os excedentes gerados pelo café foram investidos em ferrovias, iluminação a gás, seguros, transportes urbanos e telégrafos, etc... na cidade do Rio de Janeiro.

No estado do Rio de Janeiro o modelo agro-exportador contribuiu para modelar seu espaço, mormente no século XIX durante a ocupação do Vale do Médio Paraíba e do trecho serrano. O café constituiu-se na atividade agrícola mais relevante no território fluminense, responsável pelo crescimento econômico e multiplicação de cidades e vilas na Província do Rio de Janeiro no século XIX, após seu fim poucos povoados e

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Era na cidade do Rio de Janeiro onde os fazendeiros abastados vinham construir suas mansões, muitos para elas se transferindo, tão logo começaram a se manifestam os primeiros sinais de decadência do cultivo do café, ABREU, 1988 e SZMERECZANYI, 1994.

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"Era...ao seu comissário de café que o fazendeiro fazia as encomendas d(o) que precisava para a sua

exploração agrícola ou a construção e decoração de sua sede. Era...aos seus cuidados que o fazendeiro abastado, o médico ou o juiz das pequenas cidades cafeeiras, enviavam à corte um de se seus filhos varões, para aqui fazerem seus estudos ou se dedicarem a outra atividade". BERNARDES, 1964 :62.

E ste r Limon a d - O s Lu g a re s d a Urb a n iza çã o 1 0 9 aglomerações surgiram. Entre eles o único preeminente hoje é Volta Redonda, única cidade fundada exclusivamente por iniciativa estatal no século XX.

Petrópolis e Nova Friburgo, na região serrana, diretamente ligadas ao Rio de Janeiro desde suas origens no século XIX, desenvolveram-se à margem do café como núcleos de veraneio e cura, sede de educandários e pequenas indústrias. Mais tarde Nova Friburgo adquiriu uma preeminência regional (com uma forte ligação com a indústria de vestuário íntimo) e Petrópolis permaneceu em posição satélite (BERNARDES, 1964 :64). Após a decadência do café e da urbanização o médio Paraíba fluminense tornou-se área de pecuária leiteira com terras subutilizadas, tomadas pelo capim colonião, tal situação se mantém inalterada, apesar de recentes tentativas em contrário em Resende, Itatiaia1 e Nova Friburgo. “Na Baixada Fluminense a agricultura foi abandonada, desapareceram a limpeza de rios e canais e reapareceram os brejos e o impaludismo, focos de febre amarela e outras endemias. A Baixada tendo no saneamento um grande desafio, só se recuperou nas primeiras décadas do século XX, com a laranja” (BERNARDES, 1983 :30).

No norte fluminense, prosseguiu a atividade açucareira, após um breve surto de café em áreas localizadas, como em Macaé, nas freguesias de Neves e Macabu (hoje Conceição de Macabu) (CIDE, 1989d :14). A recuperação relativamente rápida da agroindústria nesta área talvez deva-se a “uma das particularidades da situação fundiária na planície campista era a existência, ao lado de grandes latifúndios, de um grande número de propriedades menores” (CIDE, 1990f :12).

O café ainda se manteve em Cantagalo, e expandiu-se após 1910 para o norte do estado, onde, na década de 20, teve um modesto surto. A partir de 1930 entrou em declínio e deixou de ter expressão econômica no estado do Rio de Janeiro. Posteriormente, a cafeicultura foi praticamente eliminada do Estado pela erradicação de cafezais improdutivos pelo IBC, na década de 70. Recuperando-se recentemente no município de Natividade no Noroeste fluminense.

No século XX o interior do estado do Rio de Janeiro, sem expressão e vida representativa, subordinava-se ao Distrito Federal. A pecuária leiteira semi-extensiva acentuou o despovoamento do meio rural, que por não haver se modernizado diminuiu sua participação financeira no setor primário estadual. Enquanto em São Paulo a agricultura se diversificou mais pela expansão do mercado urbano do que pelas crises

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Município recentemente criado a partir de um desmembramento de Resende, e que se desenvolve desde então com vocação turística e leiteira, além de contar com algumas indústrias de grande porte.

E ste r Limon a d - O s Lu g a re s d a Urb a n iza çã o 1 1 0 do café (CANO, 1975); no estado do Rio de Janeiro a estagnação e decadência das cidades após o fim do ciclo do café, pelas razões apontadas acima não estimularam a diversificação da agricultura (DUARTE, 1979 :95).

No documento 1996 Limonad Os Lugares da Urbanizacao[1] (páginas 116-126)