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CAPÍTULO 5: A INVESTIGAÇÃO DO CURRÍCULO NA ESCOLA E NA SALA

5.5 Práticas de ensino dos conteúdos do currículo: o que nos informam os dados

5.5.1 Os professores e os conteúdos históricos: concepções e processos de

5.5.1.2 Professora Yasmin

A professora Yasmin geralmente costuma introduzir o tema de estudo mediante cópia de texto do livro didático no caderno. Como tal fato ocorreu várias vezes durante o período de observação, vou limitar-me a descrever e analisar a sequência de aulas ocorridas nos dias 09 e 11/10/2012, pois, de certo modo representam uma síntese do trabalho dessa professora em relação aos conteúdos.

Aula do dia 09/10/2022. Após a chamada a professora comunicou aos alunos:

- Criançada. Vou passar o texto na lousa. É para copiar, porque vou dar nota no caderno.

Passou a escrever o texto (do livro da Apolinário, op. cit.) na lousa, estendendo-se nessa tarefa até próximo do final da aula. Os alunos, por outro lado, aparentavam apatia. Em seguida, expôs oralmente o assunto. A aula foi encerrada com o final da exposição.

Na aula do dia 11/10/2012, após a chamada, a professora solicitou aos alunos que iniciassem a leitura do texto passado no caderno.

- Joel, Paula e Adriana. Cada um de vocês irá ler um parágrafo do texto do caderno.

Assim que a leitura foi finalizada, a professora passou a escrever as perguntas na lousa para os alunos transcreverem no caderno.

- Crianças, o que há de mais interessante no texto (p. 173)? - Como eram os deuses gregos?

- Qual a maior diferença entre a religião dos gregos e dos povos atuais?

Advertiu os alunos.

- Cuidado com as brincadeiras. Brincadeira tem hora e limite.

Apesar de todos os alunos tentarem responder ao mesmo tempo a professora retomou as questões (na lousa). Em seguida passou a percorrer as carteiras para verificar se os alunos estavam fazendo os exercícios. Vistou alguns cadernos. Fez observações a um aluno.

- Faltou você completar as respostas das questões. Na próxima aula vou vistar os cadernos que faltaram.

Como é possível observar, nas aulas ministradas dias 09 e 11/10/12, a professora lançou mão do livro didático, fazendo a transposição do seu conteúdo para o caderno dos alunos. As questões postas por ela para verificar a aprendizagem dos conteúdos, limitaram-se a tarefas de assimilação desse conteúdo por meio da transcrição de partes do texto do caderno como respostas.

Em outra unidade didática, que abordava os hebreus, a administração dos conteúdos de ensino foi parcelada em 13 aulas, ao longo das quais ela utilizou a seguinte sequência didática:

02/05/12:

- Conteúdo: Os hebreus e a terra prometida.

- Estratégias: Introdução oral ao conteúdo: A professora faz breve exposição sobre o tema. Papel da religião na vida dos hebreus, influência no cristianismo e no nosso dia-a- dia. Lição de casa: Leitura de texto do livro didático.

03/05/12:

- Conteúdo: Os hebreus e a história judaica.

- Estratégias: Leitura compartilhada, entremeada por comentários da professora sobre o assunto (p. 139-141 do livro Projeto Araribá, 6º ano). Elaboração na lousa de um quadro com o vocabulário das palavras desconhecidas pelos alunos, procuradas por eles no dicionário.

05/05/12:

- Estratégias: Texto na lousa, seguido da correção do vocabulário com as palavras do texto; Exposição oral, seguida da formulação de duas questões sobre o texto para resolução na sala de aula.

12/05/12:

- Conteúdo: Um rei para Israel.

- Estratégias: Exposição oral apresentando o texto do livro didático. Leitura compartilhada, comentada pela professora. Correção dos exercícios realizados na aula anterior e vistoria dos cadernos dos alunos. Atribuição de conceitos por participação na aula.

16/05/12:

- Conteúdo: A vida em Israel.

- Estratégias: Exposição oral do texto. Formação de grupos para leitura e resumo do texto; verificação e avaliação da produção dos grupos.

17/05/12:

- Conteúdo: Jerusalém: a cidade sagrada.

- Estratégias: Exposição oral apresentando o texto e as imagens às p. 146-147 do livro didático.

19/05/12:

- Conteúdo: Exercícios do livro didático (p. 148-149). - Estratégias: Organização dos alunos em duplas. 20/05/12:

- Conteúdo: Continuação das atividades da aula anterior. - Estratégias: Idem à aula anterior.

21/05/12:

- Conteúdo: A bíblia dos judeus e dos cristãos (p. 150-151). - Estratégia: Leitura compartilhada.

24/05/12:

- Conteúdo: Atividades/exercícios (transcritos do livro didático para o caderno, conforme proposto, p. 151).

- Estratégia: Leitura compartilhada. 26/05/12:

- Conteúdo: Continuação das atividades/resolução dos exercícios. - Estratégia: Atividade individual monitorada pela professora. 27/05/12:

- Conteúdo: Continuação das atividades/resolução dos exercícios. - Estratégia: Atividade individual monitorada pela professora. 28/05/12:

- Estratégia: Correção dos exercícios na lousa.

Nas outras classes, o total de aulas utilizado nessa unidade de conteúdo oscilou entre 12 e 13 aulas, variando de acordo com diferentes circunstâncias: ritmo de trabalho imprimido pela professora em cada classe, disposição da aula no horário, maior ou menor assimilação do conteúdo pelos alunos, etc.

A administração dos conteúdos pela professora Yasmin, corresponde em geral à seqüência temporal tradicional: Conceito de História, Tábua cronológica, Pré-História, História do Egito antigo, Hebreus, conteúdos dados no primeiro semestre de 2012, e História de vida, Civilização grega, Civilização romana, conteúdos dados no segundo semestre de 2012, durante o período em que se realizou a coleta de dados deste estudo74.

A professora Yasmin também costuma conduzir a aula por meio de orientações orais aos alunos, cujo objetivo é “traduzir” os termos e conceitos históricos sobre o assunto abordado durante a aula, bem como aspectos específicos como a localização e acidentes geográficos referentes ao tema/assunto abordado. Outro procedimento utilizado é o de enfatizar que em algumas partes do texto, havia palavras destacadas na cor azul, e que toda vez que eles notassem isso, era para ler o “glossário”, um pequeno box na lateral superior da página que fazia a função de “dicionário”.

5.5.1.3 Professora Rosa

Para trabalhar com os conteúdos a professora se preocupou em apresentar uma variedade de procedimentos, tendo como principal coordenada o livro didático “Projeto Araribá” (op. cit.: 2007).

As aulas ministradas dia 23/10/12, no 6º ano D, são um exemplo dessa diversidade.

6º Ano D:

O início da aula ocorreu às 09:15.

74

- Pessoal. Vou ditar a matéria.

Aos poucos os alunos fazem silêncio e se põem a copiar o ditado no caderno. De quando em quando, os alunos se perdem, e pedem à professora para interromper o ditado e repetir a frase.

Às 09:40 a professora colocou uma proposta de atividade na lousa:

- Fazer um desenho sobre Rômulo e Remo [a partir das informações do texto recém copiado no caderno].

Seguiram-se instruções a respeito dos procedimentos para a realização do desenho. Por fim, verificação dos cadernos, até que soasse o sinal anunciando o término da aula, às 10:00.

5ª. Série B (aula dobrada: 2 aulas seguidas)

Às 10:15 ocorreu o início da aula. Apagou a lousa e em seguida fez a chamada dos alunos. Em seguida, às 10:25 fez anúncio da leitura e sorteio do número dos alunos [para lerem].

- Vamos ler. É preciso respeito para que o colega leia [dois alunos foram colocados para fora da sala de aula].

Às 10:47 iniciou-se a avaliação. A professora solicitou aos alunos que retirassem uma folha do caderno para copiar as (4) questões. Antes do início da segunda aula da dobra, às 10:49 foi feita a exposição das questões. Às 10:55 soou o sinal e ela passou a percorrer a sala de aula. Parou em algumas carteiras para tirar dúvidas. Enquanto se deteve com algum aluno, outros “colavam” as respostas dos colegas.

Às 11:30’ alguns alunos finalizaram e entregaram a prova à professora, passando a conversar e brincar. Finalmente, às 11:40’ a professora recolheu as provas de todos os alunos.

Os conteúdos e procedimentos utilizados na maior parte das aulas constituíram transposições diretas do livro didático. Assim, essa diversidade não significou clareza

de objetivos, caracterizando um rol de experiências didáticas nas quais cópias de textos, desenhos sobre o tema, exposição oral, verificação do cumprimento da atividade pelos cadernos, atribuição de conceitos se superpõem de maneira desordenada.

A análise das práticas dessa professora revela que diante das às precárias condições para o exercício profissional à que está submetida, bem como pela ausência na escola de uma proposta de trabalho pedagógico que propicie a continuidade do processo de ensino da disciplina quando ela substitui a professora titular, seu trabalho se limita a administrar a aula sem se comprometer com as pautas previstas no planejamento da disciplina. Como foi possível observar ao acompanhar o seu cotidiano, isso ocorre mediante um processo de “naturalização” dessa precarização, que passa a ser vista pelos sujeitos da escola – e até por ela mesma – como inerente à sua não titularidade, impossibilitando-lhe estabelecer vínculo afetivo e profissional com a escola, que propicie sua efetiva inserção no coletivo escolar.

5.5.1.4 Algumas considerações sobre as práticas das professoras em relação aos conteúdos históricos

A professora Flora desenvolve um roteiro em que procura trabalhar o conteúdo com os alunos da seguinte forma: após breve exposição oral sobre o tema/assunto, costuma variar em relação às fontes e às estratégias/procedimentos de abordagem. Em algumas aulas inicia pela atividade de leitura de texto do livro didático, em outras inicia a aula chamando os alunos para observarem as fotografias do livro didático, ou ainda mediante a exibição de fita de vídeo.

Na seqüência das aulas tematizando a pré-História, esses procedimentos estiveram presentes em algum momento: transposição de textos avulsos ou do livro didático para o caderno, leitura de texto do livro didático, “leitura” de imagens, aulas expositivas, produção de textos e até a produção de ilustrações pelos alunos sobre aspectos relacionados ao tema.

Durante as atividades, a professora circulava pela sala de aula para verificar se os alunos estavam fazendo as atividades ou para orientá-los sobre como realizá-las. Em classes com cerca de trinta alunos, em que eles são estimulados a participar dos

processos de construção do conhecimento, o transcurso da atividade algumas vezes é marcado por descontinuidades e interrupções devido às intervenções da professora ou alguma intervenção “fora de hora” dos alunos, situação que induz o observador menos atento a acreditar que reina certa anarquia na sala de aula.

Entretanto, a observação contínua do trabalho da professora mostra que essa aparente “anarquia” precisa ser contextualizada em relação à maneira pela qual a professora Flora organiza o processo ensino-aprendizagem. Nas suas aulas ela estabelece uma relação com os alunos baseada em regras hierárquicas difusas, que dificultam ao observador identificar com clareza o “lugar” reservado a cada um – professor e aluno – no interior do processo pedagógico. Os modos de transmissão e aquisição do conhecimento que se realizam entre eles pressupõem o protagonismo dos estudantes.

O acompanhamento e análise das práticas da professora Yasmin permite afirmar que ela procurou estabelecer uma seqüência didática, na qual os conteúdos e estratégias de ensino estivessem “amarrados”, representando uma tentativa [do professor] de estruturar o processo de ensino por meio de um roteiro prévio.

Em relação às fontes, ela explorou várias possibilidades de trabalho, principalmente por meio do livro didático: textos escritos, relatos orais, representações em imagens, cultura material (arquitetura). No entanto, em diversas ocasiões ela esbarrou na dificuldade de conciliar a História geral à História do Brasil e à História local, pois nem sempre era possível fazer analogias entre povos e sociedades que tiveram processos históricos diversos e que, portanto, não podem ser enquadrados em um mesmo modelo de análise.

Outro problema, debatido por Chesneaux (1995), diz respeito ao viés eurocêntrico que a História assume na ordenação cronológica quadripartite, feição que geralmente ela assume quando se faz a opção pela História integrada. Nessa perspectiva, a História do Brasil é caudatária da História européia, decorrência lógica da expansão ultramarina portuguesa, que demarca o início do “processo civilizatório” em nosso território.