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2 O PROFISSIONAL NO CONTEXTO DA GESTÃO INTERNACIONAL

2.3 O gestor no contexto internacional

2.3.3 Profissionais cosmopolitas

Os movimentos de internacionalização de empresas sediadas em diferentes partes do mundo, bem como fusões, aquisições e novos empreendimentos conduzem a um cenário organizacional em constante transformação, que demanda profissionais cada vez mais capacitados e abertos à mobilidade internacional. Segundo Kanter (1996), a mobilidade de capital, pessoas e ideias é um dos “quatro processos abrangentes associados à globalização” (p. 32). Freitas (2006) reforçou a glamourização das carreiras internacionais, motivadas pela mídia e pelos imperativos do mercado. A fala de executivos entrevistados em estudos qualitativos feitos no Brasil sobre expatriação (FONSECA, MEDEIROS e CLETO, 2000; MENEZES, 2008) também reforça essa premência:

O respondente ‗Tree‘ disse (...) que não é politicamente correto recusar uma proposta de ir ao exterior e que trabalhar fora do seu país permite a criação de novas oportunidades que colocam o expatriado numa posição mais visível (FONSECA, MEDEIROS e CLETO, 2000, p. 6).

A moda na [empresa] é globalização. (...) E todos os líderes que iam lá falar falavam: ‗olha, se você quer crescer na sua carreira você vai ter que ir pra um país emergente, e ter uma experiência lá, e vai viajar‘, e dava uma importância, de você entender as outras culturas. (...) A empresa quer ser global. E o que que [sic] eles estão querendo? Que é mais importante... Eles estão querendo desenvolver talentos regionais (MENEZES, 2008, p. 10).

Enquanto o processo de expatriação praticado nas décadas de 80 e 90 envolvia principalmente um processo de aprendizagem, ajustamento e aculturação posterior à mudança de país (JOLLY, 1996; HOMEM, 2005), nos dias de hoje, ao assumir uma designação internacional de longa duração, o profissional precisa já ter adquirido as competências e aprendizados considerados importantes (ECHEVESTE et al., 1999; MCCALL e HOLLENBECK, 2003; GONDIM et al., 2009). De acordo com os autores, a melhor forma para adquiri-las passa por viagens de curta duração, participação em projetos globais e intercâmbios corporativos. Outros fatores que, parece, também podem contribuir são a formação acadêmica, a experiência anterior com mobilidade internacional (incluindo intercâmbios estudantis, viagens frequentes na infância e adolescência), programas de formação continuada e experiências profissionais similares realizadas anteriormente.

Kanter (1996) descreveu o perfil do executivo cosmopolita, dito cidadão do mundo, que deve ser preparado por meio de atribuições internacionais para lidar com as variadas questões acerca do processo de fazer negócios em nível mundial:

Os cosmopolitas [...] transportam conceitos de um lugar para outro e integram atividades dispersas no mundo inteiro. Agem como fruticultores globais, distribuindo sementes em todos os lugares por onde passam, que crescem se transformando em pomares espalhados pelo mundo. Os cosmopolitas levam alternativas de um lugar para outro. Embora estejam familiarizados com vários lugares e conheçam as características de locais distintos, vêem além dos interesses de um lugar específico, pois estão ligados a um mundo mais amplo e são capazes de se movimentar em vários lugares (KANTER, 1996, p. 57).

Reproduzida nos trabalhos de Tung (1998); Selmer (2001); Bueno, Domingues e Del Corso (2004); Homem (2005); Homem e Dellagnello (2006) e Bueno e Domingues (2008), a noção do gestor cosmopolita esbarra em uma visão imperialista em que o global sobrepõe-se ao local: “A medida que espalham idéias universais e alteram exigências de locais diversos, os cosmopolitas gerenciam a resistência à mudança por parte dos habitantes locais que vêem a erosão de seu poder” (KANTER, 1996, p. 58). Dentro de uma perspectiva multicultural, a

experiência do executivo no exterior deveria basear-se na troca de experiências e habilidades, no aprendizado mútuo e não exclusivamente em relações de dominação e sobreposição de uma cultura sobre a outra, num pretenso processo colonizador. O aprendizado se processa na mente do receptor da mensagem, que decide se vai considerá-lo como informação ou conhecimento (BHAGAT et al., 2002).

Uma outra linha de pesquisa trata das características do chamado gestor global, aquele que entende os negócios internacionais, tem a habilidade para trabalhar de modo a cruzar fronteiras multiculturais, organizacionais e funcionais (PARKER, 1999). A autora classifica essas fronteiras como: mensuráveis (aquelas que dizem respeito às fronteiras externas das nações, espaço, tempo ou responsabilidades); menos tangíveis (como cultura, pensamento ou relacionamento entre a organização e os outros); e fronteiras internas (barreiras verticais e horizontais, relacionadas a tarefas ou a posições ocupadas dentro da empresa). O profissional que assume designações internacionais lida em seu cotidiano com esses três tipos de fronteiras, tendo muitas vezes que desenvolver sua própria maneira de fazê-lo.

McCall e Hollenbeck (2003) entrevistaram 101 executivos originários de 36 países, que trabalhavam em 16 empresas de destaque global. De forma resumida, eles definiram executivos globais como “aqueles que desempenham trabalho global [...] que atravessa simultaneamente fronteiras de negócios e de culturas, mas a travessia que o define é a cultural‖ (p. 50). Para lidar com esse desafio de transposição de fronteiras e culturas, são necessárias habilidades e conhecimentos específicos, que, em parte, são adquiridos quando o profissional passa por designações no exterior, independentemente de serem de natureza de longo prazo (expatriação), curto prazo, viagens frequentes ou intercâmbios internacionais de curta duração (FENWICK, 2000).

O processo de seleção profissionaliza-se cada vez mais. Ir para o exterior passa a ser visto como uma necessidade premente ou reconhecimento a uma carreira bem sucedida, e apenas os que estão melhor preparados chegam ao topo de uma espécie de Babel Corporativa (ABRANTES, 2010). A seleção desse profissional levou algumas empresas a investirem no denominado Recursos Humanos Internacionais, objeto de estudo do livro de Sebben (2009), no qual acadêmicos e gestores apresentam suas reflexões sobre os desafios da seleção de profissionais qualificados para a ocupação de posições estratégicas em organizações globais. Autores como Pucik e Saba (1998); Black e Gregersen (1999); Caligiuri (2000/1) e Caligiuri e Di Santo (2001) estudam aspectos importantes para a efetividade dos processos de recrutamento e seleção de profissionais para designações internacionais. O perfil desse profissional, delineado a partir da revisão da literatura, será apresentado a seguir.