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1 INTRODUÇÃO

2.3 Antropotecnologia

2.3.2 Modelo de análise proposto para estudos utilizando a abordagem

2.3.2.4 Prognóstico da atividade futura

Esta etapa prevê o estabelecimento de recomendações ergonômicas elaboradas a partir da análise da situação de referência, objetivando a concepção de espaços, de meios técnicos e de organização de trabalho compatíveis com o funcionamento humano e objetivos de trabalho pretendidos (SANTOS et al., 1997b, p. 174).

Ao se utilizar métodos escolhidos em função dos meios técnicos disponíveis recomenda-se antecipar o futuro sistema de trabalho, fazendo preliminarmente uma experimentação, simulação, ou representação em forma de planos, maquetes ou documentos técnicos (DANIELLOU, 1998, p. 359).

Santos et al. (1997b, p. 171) contribuem para elucidar as diferentes formas de representação prévia das atividades de trabalho citadas por Daniellou (1998, p. 360)

e descrevem que: a experimentação é possível quando os elementos do futuro sistema estão disponíveis integralmente; a simulação pode ocorrer quando se tem a possibilidade de substituir uma parte ou o conjunto das instalações e gerar situações incidentais ou acidentais nas quais os trabalhadores são confrontados e as reações são avaliadas e o trabalho sobre maquetes e planos é realizado quando não há disponibilidade de outros meios para pré-configurar as futuras instalações.

A presença de operadores que conduzirão o sistema, a prefiguração dos meios de trabalho e a seleção de uma série de ações-tipo a serem utilizadas no futuro sistema podem fornecer indicações se o que foi descrito está compatível com os conhecimentos e funcionamento humanos. Podem ser avaliados aspectos relativos à continuidade cronológica - passagem de um curso de ação a outro - à continuidade cognitiva - passagem de um curso de ação que oriente a exploração perceptiva, as operações efetuadas, a antecipação e o controle de seus resultados - assim como a postura prevista para as diferentes ações, os esforços e constrangimentos perceptíveis (DANIELLOU, 1987, p. 522).

Levantadas essas considerações e constatadas inadaptações, novos estudos poderão ser efetuados, sejam eles de natureza técnica ou organizacional, e as soluções propostas podem novamente ser submetidas à prova das atividades futuras antes de serem tomadas decisões definitivas de realização ou transferência.

2.3.2.5 Análise da atividade real

Esta etapa, de acordo com Santos et al. (1997b, p. 138), corresponde a uma análise ergonômica realizada na situação local de transferência após ter sido implantada a tecnologia.

Como estudos mais abrangentes da situação de implantação da tecnologia, que podem compor a etapa da demanda na análise ergonômica do trabalho, já foram abordados, explicita-se neste item aspectos relacionados à tarefa e à atividade.

Autores como Leplat e Hoc (1998, p. 164), Castillo e Villena (1998, p. XVII), Montmollin (1997, p. 234) e Noulin (1992, p.32) indicam que a tarefa corresponde ao que é prescrito, ao que deve ser feito, incluindo: objetivos da produção, com performances exigidas e resultados esperados como contrapartida de remuneração;

recursos organizacionais traduzidos pela organização coletiva de trabalho, repartição de tarefas, relações hierárquicas e de procedimentos: maneiras pelas quais o trabalhador deve alcançar os objetivos pretendidos; elementos técnicos englobando máquinas, ferramentas, meios de proteção, meios de informação e de comunicação; meio ambiente físico composto por ambiente acústico, térmico, lumínico, vibratório, tóxico, concepção e adaptação do posto de trabalho a partir de dados antropométricos; condições temporais verificadas pela duração, horários e ritmo de trabalho, cadências, pausas, espaços de regulação e condições sociais relacionadas à formação do trabalhador, experiência profissional exigida, qualificação reconhecida, possibilidade de promoção e de plano de carreira, enquanto que Montmollin (1990, p. 30) refere-se à atividade, como um “processo complexo, original e em evolução, destinado a adaptar-se à tarefa e ao mesmo tempo a transformá-la.”

Teiger (1998, p. 145-152) assinala que a atividade compromete integralmente a pessoa, seu corpo biológico, sua inteligência e afetividade. Ela é construída no desenvolvimento de sua história e das relações estabelecidas com os outros acontecendo numa confluência de tempo e lugar, espaço onde são revelados os saberes dos operadores, onde o corpo é mobilizado para concretizar os compromissos operativos e onde se constroem as relações subjetivas com o trabalho.

A originalidade da atividade, para a autora, é que ela corresponde a um processo, uma construção, um objeto que se constitui e reconstitui com os operadores ou com o seu auxílio, quando se quer explicitá-lo. Pode ser apreendida por intermédio de uma co-produção de conhecimentos, pela restituição aos operadores dos dados coletados e pela confrontação e discussão com os mesmos a fim de poder inferir os processos que lhe deram origem, mas não diretamente.

Christol e Mazeau (1991, p. 385 e 387) também sinalizam que analisar a atividade de trabalho implica em considerar os processos mentais e o conjunto dos diversos níveis de funcionamento humano e suas imbricações utilizadas para construir as estratégias na resolução de problemas.

Enfatizando os componentes cognitivos das atividades, Teiger (1998, p. 150) lembra que mesmo aquelas aparentemente mais simples, denominadas de automatizadas, implicam em uma elaboração mental, embora essa atividade mental não signifique necessariamente interesse do trabalhador pelo que está realizando.

Pode-se dizer então, que no desenvolvimento do trabalho real, a atividade corresponde a um processo de construção permanente dos trabalhadores seja de estratégias ou de modos operatórios para atender às exigências impostas pelo trabalho prescrito ou pelas situações vividas. Para dar conta do que é proposto pelo contexto específico de trabalho e pelas prescrições ocorre uma mobilização do corpo e também do conjunto de experiências formais e informais. Mesmo que a tarefa seja previsível, a sua realização tem um componente de imprevisibilidade.

A atividade resulta, entre outros, da forma como a tarefa é interpretada, do conjunto de meios técnicos de que se dispõe, de como e quais componentes situacionais são tidos ou não em conta em sua execução e também de como os componentes subjetivos encontram expressão em sua realização. Franco (2001, p. 40) chama a atenção para o fato de as experiências pessoais ou profissionais vividas pelos indivíduos na execução das tarefas serem fontes de informações junto com aquelas originadas de procedimentos prescritos, de sinais encontrados no próprio ambiente e de instruções constantes em manuais ou folhetos técnicos.

Pela complexidade do trabalho de análise das atividades, Wisner recomenda (1994, p.18) validá-lo através de discussões com os trabalhadores. Essas discussões têm uma dupla finalidade: a) restituir a informação a quem a forneceu e b) corrigir e completar as análises efetuadas.

A análise, segundo Wisner (1995a, p. 600-603; 1995b, p. 1549; 1996b, p. 6), possibilita saber como os trabalhadores formulam os problemas encontrados em seu trabalho, considerando a situação e a ação, e como eles os resolvem facultando subsidiar a concepção de situações: a) que preservem a saúde dos trabalhadores; b) onde possam exercer suas competências e tenham as suas capacidades valorizadas e c) em que os objetivos econômicos fixados pela empresa, considerando-se investimentos realizados ou futuros, sejam alcançados (GUERIN et al., 1991, p. 17).

As etapas consideradas indicam a multiplicidade de aspectos abrangidos no estudo de uma situação quando da transferência de tecnologia. Neste trabalho, o objetivo é compreender os conhecimentos utilizados no cultivo de ostras, e, para tal, busca-se identificar os aspectos concretos do trabalho e também a intermediação psicológica, cognitiva, em sua execução. Assim, tanto os modos operatórios, as informações utilizadas como, de uma forma geral, os elementos que podem influenciar as decisões tomadas em sua realização são objeto de análise.

Na seção 2.4 destacam-se as contribuições das abordagens situadas da cognição na transferência de tecnologia.

2.4 Abordagens Situadas da Cognição e Transferência de